VII

AÇÃO DECLARATÓRIA INCIDENTAL (CPC, arts. 5º, 325 e 470)

1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O art. 297 do CPC é insuficiente para descrever as formas pelas quais o réu pode se defender no processo civil, gerando a falsa impressão de que as únicas respostas possíveis são a contestação, as exceções processuais e a reconvenção. A “ação declaratória incidental”, “pedido incidental de declaração”, ou simplesmente “declaração incidente” (CPC, art. 325), pode ser pedida pelas partes (autor ou réu) mediante a existência de alguma questão prejudicial no processo.

A fundamentação legal da declaração incidente é desestruturada dentro do CPC, mas o seu fundamento básico são os arts. 5º, 325 e 470 do CPC.

O conteúdo da ação declaratória incidental sempre é uma controvérsia em torno de relação jurídica cuja existência ou inexistência condiciona o julgamento da lide. Depende sempre da ocorrência de “questões prejudiciais”, que “são aquelas cuja resolução, implicando valoração jurídica de fato, subordina a outra questão, dita ‘principal’ ou ‘subordinada’, de modo a predeterminar-lhe, no todo ou em parte, o conteúdo, sendo por outro lado, apta virtualmente a constituir ‘principal’ de outro processo”1.

Quando o autor formula o pedido, alegando ser ele resultante de uma relação jurídica, para a qual não formulou expresso pedido de declaração, a coisa julgada não alcançará a relação jurídica subordinante ao pedido, mas apenas o pedido em si.

Exemplo: “se o autor postula cobrança de algum acessório da locação (taxa de condomínio) e o réu contesta, alegando que a relação jurídica não é de locação, mas de comodato, no pedido do autor não está contida a declaração de existência ou inexistência da locação. É uma questão prejudicial, ou seja, terá necessariamente de ser analisada pelo juiz para julgar o pedido, que é de cobrança. A sentença assim proferida não formará coisa julgada acerca da relação locatícia, mas tão somente se a taxa de condomínio é ou não devida. Nessa circunstância, pode interessar ao autor que, além da questão relativa à taxa de condomínio, também ocorra a declaração acerca da locação, para evitar que tal questão possa, futuramente, ser levantada pelo réu, em uma eventual ação de despejo. Todavia, não poderá o autor intentar ação declaratória incidental caso o réu já o tenha feito, no prazo da resposta”2.

2. TERMINOLOGIA

2.1. Diferença entre “ponto” e “questão”

Ponto é a matéria a respeito da qual o juiz deve decidir, ou seja, matéria que se encontra no processo e que deve receber atividade cognitiva. “Ponto é toda e qualquer afirmação feita em juízo por quaisquer dos sujeitos do processo, isto é, pelas partes, eventuais terceiros e pelo próprio juiz. Se este ‘ponto’ vier a ser controvertido por alguém, isto é, se alguém questionar o seu acerto, e pouco importa o motivo que fundamenta uma tal controvérsia, surge o que é chamado de ‘questão’. Questão, por isso mesmo, é o ‘ponto controvertido’, é uma afirmação que, tendo relevância para o plano do processo, tornou-se controvertida, impondo, assim, sua solução”3.

Questão é o ponto a respeito do qual não estão de acordo autor e réu. Melhor dizendo, “questão” é um ponto controvertido, pois é matéria sobre que o autor e réu discordam e sobre a qual o juiz deve proferir decisão.

Só é possível falar em “questões” após a contestação, pois sem ela não existem controvérsias e consequentemente não existem questões a serem identificadas. Como o juiz deve decidi-las “previamente” antes de raciocinar sobre os pedidos do autor (objeto da ação descrito na petição inicial correspondente ao direito material pretendido), tais questões são também chamadas de “questões prévias”.

2.2. “Questões prévias”: questões preliminares e questões prejudiciais

Questões prévias são pontos controvertidos que o juiz deve analisar antes de outros, por isso “prévias”. Dividem-se em questões preliminares (matéria processual) e questões prejudiciais (matéria de mérito). Esta classificação não é nada pacífica, merecendo crítica de José Carlos Barbosa Moreira e também de Fredie Didier. “O exame das questões prévias sempre pressupõe a existência de ao menos duas questões: a que precede e subordina e a que sucede e é subordinada. Quando entre duas ou mais questões houver relação de subordinação, dir-se-ão que a questão subordinante é uma questão prévia. As questões prévias dividem-se em prejudiciais e preliminares”4.

“A compreensão de ‘preliminar e prejudicial’ pressupõe o entendimento de seu gênero designado pela palavra ‘prévio’. ‘Prévio’ é todo ponto ou questão que deve ser resolvido antes de um outro. O grau de influência da resolução prévia do ponto ou questão é que dá ensejo àquelas duas categorias. Uma em que a resolução prévia não influencia no exame e no conteúdo do ponto ou questão seguinte. Outra, diferentemente, que a resolução prévia influencia, vinculando o conteúdo do ponto ou questão seguinte. Neste caso, o ponto ou questão é prejudicial em relação ao seguinte; naquele, o ponto ou questão é preliminar em relação ao seguinte”5.

2.2.1. Questões preliminares

“A preliminar é uma espécie de obstáculo que o magistrado deve ultrapassar no exame de uma determinada questão. É como se fosse um semáforo: acesa a luz verde, permite-se o exame da questão subordinada; caso se acenda a vermelha, o exame torna-se impossível. As questões preliminares referem-se à possibilidade de exame da questão de mérito”6. José Carlos Barbosa Moreira identifica três tipos de questões preliminares que serão descritas a seguir.

a) Preliminares ao conhecimento do mérito da causa

Tais “questões preliminares” ou simplesmente “preliminares” determinam se o juiz pode ou não decidir a lide e analisa questões de ordem pública (CPC, art. 301). Dividem-se em dilatórias e peremptórias e são em regra debatidas na contestação.

 

“Questões preliminares” ou simplesmente “preliminares”

(defesa processual)

“Peremptória”(P) ou “Dilatória” (D)

Art. 301.  Compete-lhe, porém, antes de discutir o mérito, alegar:

I – inexistência ou nulidade da citação; 

Dilatória

II – incompetência absoluta; 

Dilatória

III – inépcia da petição inicial; 

Peremptória

IV – perempção;  

Peremptória

V – litispendência;  

Peremptória

VI – coisa julgada; 

Peremptória

VII – conexão;  

Dilatória

VIII – incapacidade da parte, defeito de representação ou falta de autorização; 

Dilatória

IX – convenção de arbitragem;

Peremptória

X – carência de ação; 

Peremptória

XI – falta de caução ou de outra prestação, que a lei exige como preliminar.

Dilatória

§ 1º Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada, quando se reproduz ação anteriormente ajuizada.

§ 2º Uma ação é idêntica à outra quando tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido.

§ 3º Há litispendência, quando se repete ação, que está em curso; há coisa julgada, quando se repete ação que já foi decidida por sentença, de que não caiba recurso.

§ 4º Com exceção do compromisso arbitral, o juiz conhecerá de ofício da matéria enumerada neste artigo.

 

b) Preliminares de recurso

São as questões cuja solução depende a possibilidade de se julgar o mérito do recurso, e consiste na análise do juízo (ou requisitos) de admissibilidade dos recursos, como cabimento, legitimidade, interesse recursal, inexistência de fato impeditivo ou extintivo do direito de recorrer ou do recurso, tempestividade, regularidade formal e preparo.

c) Preliminares de mérito (ou questões prejudiciais)

São questões situadas no mérito da causa, mas suscetíveis, se decididas em certo sentido, de dispersar o órgão julgador de prosseguir em sua atividade cognitiva (exemplos: prescrição e decadência).

2.2.2. Questões prejudiciais (pressuposto fundamental da ação declaratória incidental)

A questão prejudicial determina ao juiz o modo como ele deve decidir o mérito da causa. É uma espécie de premissa sobre a qual se baseia a sentença. Exemplo: filiação é questão prejudicial em relação à ação de petição de herança. Somente as questões prejudiciais podem ser objeto de ação declaratória incidental. Questão prejudicial é aquela cuja solução, prévia e necessária, predetermina o resultado de questão ainda pendente de exame. Tal questão prejudicial deve tratar do próprio objeto litigioso, do próprio pedido mediato do autor, e influenciará decisivamente na sua apreciação.

“A questão prejudicial funciona como uma espécie de placa de trânsito, que determina para onde o motorista (juiz) deve seguir. Costuma-se dizer que as questões prejudiciais podem ser objeto de um processo autônomo. São exemplos de questões prejudiciais: a) a validade do contrato, na demanda em que se pretende sua execução; b) a filiação, na demanda por alimentos; c) a inconstitucionalidade da lei, na demanda em que se pretenda a repetição do indébito tributário, etc. (...) a questão prejudicial pode ser interna, quando surge no mesmo processo em que está a questão subordinada, ou externa7, quando está sendo discutida em outro processo. A distinção é relevante para fins de suspensão do processo (art. 265, IV, a, do CPC)”8.

“As questões prejudiciais, portanto, são questões (pontos de fato ou de direito controvertidos) que constituem antecedente lógico para o conhecimento da pretensão do autor, mas que não são decididas pelo juiz da causa, e sim, incidentalmente, resolvidas por ele, porque sobre elas ninguém pede decisão específica do magistrado, já que não compõem o bojo do pedido formulado pelo autor – e o juiz somente pode proferir sentença, que seja efetivamente de mérito, acolhendo ou rejeitando, no todo ou em parte, o pedido formulado pelo autor (art. 459, caput, primeira parte, do CPC) (...) o exame, portanto, das questões prejudiciais, embora relevantes para que o juiz possa considerar a pretensão exposta pelo autor, se faz incidentalmente, sem que sobre elas o magistrado efetivamente decida (na forma em que o CPC emprega este vocábulo). No entanto, no curso do processo, pode surgir o interesse, para sobre uma (ou alguma) questão prejudicial, porque essa questão poderá ser apresentada novamente em ação futura, dependendo de sua análise a resolução de outra pretensão que possa ser deduzida no futuro. Para atender a essa intenção, surgida no curso do processo já instaurado para a ‘decisão’ de outra demanda, é que surge a ação declaratória incidental”9.

3. OBJETIVO DO PEDIDO INCIDENTAL DE DECLARAÇÃO: REVESTIR DE COISA JULGADA MATERIAL A SOLUÇÃO DE UMA “QUESTÃO PREJUDICIAL DE MÉRITO” POR MEIO DE TUTELA JURISDICIONAL DECLARATÓRIA

“O pedido incidental de declaração é o que é chamado em geral de ‘ação declaratória incidental’ pela doutrina tradicional que, a exemplo do que se dá com a reconvenção, vê na iniciativa tradução de legítimo ‘direito de ação’ exercitado pelo réu em face do autor no mesmo processo por ele iniciado. Um tal pedido tem previsão expressa nos arts. 5º, 325 e 47010.

Trata-se de pedido de tutela jurisdicional declaratória, formulado incidentalmente a um processo em curso, prestigiando o princípio da economia processual, e corresponde a uma verdadeira cumulação de pedidos para uma atuação jurisdicional mais eficiente. Com a declaração incidental, aquilo que seria apreciado incidenter tantum será examinado no dispositivo da sentença, com todas as consequências daí decorrentes (ampliam-se os limites objetivos da coisa julgada).

Nesse sentido, pode-se afirmar que “a questão prejudicial de mérito poderia, ela própria, ensejar um outro processo, autônomo, em relação àquele em que ela se configura. A admissão de sua ‘declaração incidente’ no mesmo processo é providência que bem se afina ao princípio da economia e da eficiência processuais11.

A fundamentação legal do instituto é esparsa, truncada e desestruturada dentro do CPC, que “só se refere a uma ‘ação declaratória incidental’ (arts. 34 e 280) ou a uma ‘ação declaratória incidente’ (art. 109) quando se ocupa de assuntos marginais ao instituto aqui analisado. No que ele tem de maior relevo, silenciam-se os arts. 5º e 470 a se referirem a ele com algum nome, limita-se, o art. 325, a se referir a ela como ‘declaração incidente’ e vale-se, o art. 321, da expressão ‘demandar declaração incidente’, fórmulas mais próximas daquela aqui proposta (...) o pedido tem como objetivo revestir de coisa julgada material a solução de uma ‘questão prejudicial de mérito’, tornando-a imune a qualquer questionamento futuro”12.

Na ação de alimentos o réu pode contestar e levantar uma “questão prejudicial”: não existe paternidade. A decisão que aceitar tal defesa do réu irá gerar uma sentença de improcedência do pedido do autor, mas não inibe que em outra ação a mesma relação jurídica (o réu ser ou não pai do autor) seja novamente discutida. Se o conflito inicial fosse resolvido simplesmente com a contestação apresentada, a relação de “paternidade” não faria coisa julgada, pois não havia sido objeto de pedido inicial (CPC, art. 469, III). Outro exemplo: numa ação de cobrança de aluguel, o réu pode contestar e levantar uma “questão prejudicial”: não existe locação, e sim comodato.

E é exatamente para evitar a insegurança jurídica que o pedido de declaração incidental ou “ação declaratória incidental” foi concebido. Com ela, a questão da “paternidade”, por exemplo, também transita em julgado, impedindo que seja discutida novamente em outro processo, uma vez que a coisa julgada é pressuposto processual negativo e sua ocorrência inibe a formação e o desenvolvimento válido de outro processo que tenha o mesmo objeto.

A exemplo do que ocorre com a reconvenção, o objeto do conhecimento do juiz é ampliado, e tudo o que for decidido tende a se submeter à regra da imutabilidade.

Destaca-se que a “ação declaratória incidental” (expressão tradicional) pode ser movida por qualquer das partes, e seu objetivo é o de ampliar os limites objetivos da coisa julgada, pois com a ação declaratória incidental a relação jurídica que não era objeto do pedido da ação principal será alcançada pela coisa julgada. “A questão prejudicial, que normalmente é decidida de modo a não fazer coisa julgada (CPC, art. 469, III), passa a ter essa autoridade com a propositura da ação declaratória incidental (CPC, art. 470)”13. Com isso, a análise da questão prejudicial determina o conteúdo da sentença. Assim, a relação jurídica subordinante adquire autoridade de coisa julgada.

Outro exemplo: “se o autor promove ação de despejo, pode o réu propor ação declaratória incidental visando a declaração da inexistência da locação. Essa relação jurídica (locação) não era objeto do pedido, embora necessariamente integrasse a causa de pedir. Assim, caso não proposta a declaratória incidental, a sentença, em sua parte dispositiva, somente poderia versar sobre a procedência ou não do despejo, mas a locação em si não faria coisa julgada. Proposta a ação declaratória incidental, também a relação locatícia integrará a coisa julgada, evitando futuras demandas versando sobre o mesmo tema”14.

Além disso, são pressupostos para o pedido de declaração incidente:

a) a existência de um pedido que esteja subordinado a uma relação jurídica para a qual não se pede expressamente a declaração;

b) a existência de contestação, que impugne a relação jurídica subordinante, tornando-a litigiosa;

c) competência (o juízo da causa principal deve ser também competente para a ação declaratória incidental (art. 109);

d) compatibilidade de procedimento.

4. PRAZOS, PROCEDIMENTOS, TÉCNICA PROCESSUAL E A INSTRUMENTALIDADE DO PROCESSO

Para o réu: o prazo para a propositura da ação declaratória incidental é o da resposta (15 dias). Para o autor: O prazo para a ação declaratória incidental é de 10 dias (CPC, art. 325) após a contestação.

Salienta-se que o prazo para a “resposta” à ação declaratória incidental, pelo adversário, será de 15 dias, o mesmo prazo da contestação no procedimento ordinário, uma vez que só cabe declaração incidental neste procedimento, o que admite aplicação analógica.

O CPC não previu prazo para o réu apresentar ação declaratória incidental, mas como o réu, ao contestar a ação promovida pelo autor, já sabe das questões controvertidas e prejudiciais, cabe a ele aforá-la simultaneamente com a contestação. A propósito, a ação declaratória incidental possui grandes semelhanças com a reconvenção, o que justifica a aplicação analógica do art. 299 do CPC, que determina que a contestação e a reconvenção serão oferecidas simultaneamente, em peças autônomas. E da mesma forma que a reconvenção, a ação declaratória incidental e a ação principal deverão ser julgadas na mesma sentença (analogia ao art. 318 do CPC).

Se o réu contestar o direito que constitui fundamento do pedido, deverá o autor ser intimado a se manifestar, abrindo-se o prazo de 10 dias. Proposta a ação declaratória incidental, através de petição inicial com os requisitos do art. 282, o réu será intimado para a resposta (15 dias). Em seguida, ambas as ações, a principal e a incidental, seguem o mesmo procedimento, devendo ser julgadas na mesma sentença, como ocorre na reconvenção.

Destaca-se que, em relação à natureza jurídica da declaração incidental, esta “é nova ação, mas não cria um novo processo. Será processada em conjunto com a ação principal, e ambas serão julgadas pela mesma sentença. Sob esse aspecto, tem semelhanças com a reconvenção, conquanto esta só possa ser ajuizada pelo réu, e aquela por qualquer dos litigantes. Somente pretensões declaratórias poderão ser formuladas por quem as ajuizar, jamais condenatórias ou constitutivas”15.

Quanto à iniciativa, a ação declaratória incidental pode ser proposta tanto pelo autor quanto pelo réu. Todavia, se o réu intentá-la, estará obstado ao autor promover outra ação declaratória incidental. Para Humberto Theodoro Júnior, “para o réu, a ação declaratória pode normalmente ser manejada através da reconvenção. Para o autor, o momento adequado para a propositura da declaratória incidental são os 10 dias seguintes à intimação da contestação que tenha gerado controvérsia sobre a questão prejudicial (art. 325)”16.

Pode-se afirmar que a ação declaratória incidental é uma forma específica de reconvenção, mas com conteúdo declaratório.

Analisando-se a posição de Cândido Rangel Dinamarco sobre a instrumentalidade do processo e sua noção lúcida de técnica processual, “tem-se por técnica a predisposição ordenada de meios destinados a obter certos resultados. Toda técnica, por isso, é eminentemente instrumental, no sentido de que só se justifica em razão da existência de alguma finalidade a cumprir e de que deve ser instituída e praticada com vistas à plena consecução da finalidade. Daí a ideia de que todo objetivo traçado sem o aporte de uma técnica destinada a proporcionar sua consecução é estéril; e é cega toda técnica construída sem a visão clara dos objetivos a serem atuados. Nesse contexto bipolar, acontece então que se todo instrumento, como tal, destina-se a ajudar o homem a obter determinados resultados, por outro lado ele exige do homem a sua manipulação segundo normas adequadas, sob pena de inutilidade ou distorção (...) a técnica está a serviço da eficiência do instrumento, assim como este está a serviço dos objetivos traçados pelo homem e todo o sistema deve estar a serviço deste”17.

Afinado com a instrumentalidade e com o modelo constitucional de direito processual civil parece adequado o entendimento exposto por Cassio Scarpinella Bueno, uma vez que os atos processuais não dependem de forma específica quando não exigida pela lei (CPC, art. 154, caput), e mesmo se houvesse tal exigência ela não traria nenhuma mácula para o processo, o réu “pode formular o seu pedido incidental de declaração por mera petição e, até mesmo, na própria contestação, independentemente da apresentação de quaisquer outras respostas, inclusive a reconvenção. O que importa, é que o réu evidencie estar formulando o pedido incidental de declaração para os fins já apontados e que se trate de uma ‘questão prejudicial de mérito’”18.

5. REQUISITOS DA “AÇÃO DECLARATÓRIA INCIDENTAL”

5.1. Ação pendente

A ação declaratória é incidental a uma outra ação, principal. Por isso, só é possível se existir uma ação pendente.

5.2. Existência de “questão prejudicial”.

É necessário que o pedido da ação principal esteja subordinado a uma relação jurídica para a qual não se pede expressamente a declaração. Sobre a existência ou inexistência dessa relação jurídica é que versará a ação declaratória incidental. Se não houver prejudicialidade, ou seja, se o pedido principal não depender da relação jurídica, será incabível a ação declaratória incidental. Além disso, é imprescindível a existência de contestação, que impugne a relação jurídica subordinante, tornando-a litigiosa. Se o réu não contestar, não há controvérsia a justificar a ação declaratória incidental.

5.3. Competência

O juízo da causa principal é também o competente para ação declaratória incidental (CPC, art. 109). Assim, não é ela admissível se o juiz for absolutamente incompetente para conhecer a matéria.

5.4. Identidade de partes

Como a função da ação declaratória incidental é a alteração dos limites da coisa julgada, é necessário que as partes sejam as mesmas.

5.5. Compatibilidade de procedimento.

Como a ação declaratória incidental seguirá no mesmo processo da ação principal, e será julgada na mesma sentença, é necessário que ocorra compatibilidade de procedimento.






1 FABRÍCIO, Adroaldo Furtado. Ação declaratória incidental. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 50.

2 WAMBIER, Luiz Rodrigues; ALMEIDA, Flávio Renato Correia; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil – teoria geral do processo e processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, v.1, p. 387.

3 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civilprocedimento comum: ordinário e sumário. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, v. 2, t. I, p. 207.

4 DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil – teoria geral do processo e processo de conhecimento. 12. ed. Salvador: JusPodivm, 2010, p. 311.

5 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil – procedimento comum: ordinário e sumário. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, v. 2, t. I, p. 207-208.

6 DIDIER JR, Fredie. Curso de direito processual civil – teoria geral do processo e processo de conhecimento. 12. ed. Salvador: JusPodivm, 2010, p. 312.

7 Exemplo de questão prejudicial externa: no juízo criminal tramita demanda que versa sobre “lesões corporais”, e no juízo cível tramita ação de indenização pelo mesmo fato. O juiz suspende o processo para aguardar decisão sobre a “questão prejudicial externa” que é a autoria da lesão corporal a ser decidida no juízo criminal (de competência absoluta distinta).

8 DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil – teoria geral do processo e processo de conhecimento. 12. ed. Salvador: JusPodivm, 2010, p. 312-313.

9 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil – processo de conhecimento. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 154.

10 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil – procedimento comum: ordinário e sumário. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, v. 2, t. I, p. 206.

11 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil – procedimento comum: ordinário e sumário. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, v. 2, t. I, p. 208.

12 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil – procedimento comum: ordinário e sumário. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, v. 2, t. I, p. 206-207.

13 WAMBIER, Luiz Rodrigues; ALMEIDA, Flávio Renato Correia; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil – teoria geral do processo e processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, v.1, p. 386.

14 WAMBIER, Luiz Rodrigues; ALMEIDA, Flávio Renato Correia; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil – teoria geral do processo e processo de conhecimento. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, v.1, p. 387.

15 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito processual esquematizado. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 339.

16 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Forense, 2009. v. 1, p. 399-440.

17 DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 224-225.

18 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil – procedimento comum: ordinário e sumário. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, v. 2, t. I, p. 210.