O Schistosomum mansoni e a esquistossomatose segundo observações feitas no Brasil*
Introdução1
A biologia e a evolução dos trematódeos do gênero Schistosomum, até há pouco, eram muito mal conhecidas, mas desde 1911 apareceram várias memórias, anunciando a solução dos problemas mais importantes para quatro espécies desse gênero. Nos estudos que vão aqui expostos, tratarei em primeiro lugar de repetir e controlar as experiências recentes, referindo-se à única espécie que se observa no Brasil; em segundo lugar, de investigar as condições locais da infecção e determinar entre nós o hospedador intermediário do parasito. Com o fim de dar mais valor prático a este trabalho e facilitar a orientação, resolvi, enfim, recordar brevemente os fatos mais importantes que se referem ao parasitismo dos esquistossomos em geral e da espécie mansoni em particular. Da literatura só mencionarei os trabalhos fundamentais ou aqueles que mais estreitamente se referem ao meu assunto; para os outros recomendo a bibliografia de Leiper, que é facilmente acessível e muito rica, contendo 521 números.
Tratarei em primeiro lugar do capítulo que se refere à parte histórica e geográfica dos nossos conhecimentos a respeito do gênero Schistosomum e das moléstias por ele produzidas.
A esquistossomatose ou bilharziose na África
As lesões produzidas pelos esquistossomos eram conhecidas muito tempo antes do causador e existiam no Egito já em tempos muitos remotos, como se verificou pelo exame das múmias. Foram observadas com grande freqüência ao tempo da invasão de Napoleão e até os últimos anos. Nesse terreno clássico Bilharz descobriu em 1851 os parasitos causadores, dando-lhes o nome Distoma haematobium, por causa do seu habitat intravascular. Bem preparado para esses estudos, ele reconheceu que se tratava de um trematódeo muito especial, caracterizado pela separação dos sexos e seu bimorfismo, tão novo como inesperado. O nome Schistosoma2 Weinland, hoje geralmente latinizado em Schistosomum, deve referir-se ao macho cujo corpo parece fendido.3 A fissura aparente dá entrada para um canal, que serve para carregar a fêmea, o que explica o nome Gynaccophorns dado por Diesing em 1859.
No mesmo ano Cobbold, em honra ao descobridor, introduziu o nome Bilharzia que (com os seus derivados Bilharziosis e Bilharziasis) foi muito usado.
Segundo Blanchard, o nome de Weinland foi publicado em 5 de agosto de 1858; o de Diesing, proposto em sessão da Academia de Ciências em Viena, só foi publicado em 21 de outubro, e o nome de Cobbold dataria de 20 de janeiro de 1859; por isso conclui Blanchard que o nome de Weinland deve ser aceito (Laveran & Blanchard, Les Hématozoaires, p.2, p.40). De fato, o uso do nome Schistosomum, antigamente pouco conhecido, tem se generalizado nas últimas publicações.4
Já as primeiras observações, feitas no Egito, mostravam sintomas, localizados ora nas vias urinárias, ora no intestino, e, às vezes, combinados; ligavam-se à eliminação de ovos com espinho ora apical, ora lateral.
Sendo ambos os processos muito comuns, combinavam-se freqüentemente num doente, que então eliminava as duas qualidades de ovos. Por isso a opinião geral continuou a considerar os dois processos como dependentes do mesmo parasito, posto que a idéia da duplicidade já muito cedo fosse discutida. Esse resultado foi em razão principalmente de algumas observações que eram sempre citadas nas discussões e pareciam conclusivas.
Hoje, todavia, não se pode duvidar de que seja na observação, seja na interpretação, houve erros, aliás, bastante naturais. Por essa fatalidade o conhecimento das referidas infecções sofreu grande atraso.
A primeira observação em um foco, onde existiam apenas ovos de espinho terminal, foi feita no sul da África por Harley, que julgou tratar-se de um parasito diferente chamando-o Distoma capense. (Este nome, a meu modo de ver, deveria ter sido conservado para a forma designada.) Em 1912, Bour encontrou, na ilha Maurício, 33 meninos com ovos de Schistosomum na urina. Não falou de ovos nas fezes, nem mencionou a posição do espículo no ovo. Em Tunis, as duas localizações e ambas as formas de ovos foram encontradas por muitos observadores; no Sudão, na região dos lagos e, geralmente, em zonas quentes e ricas em águas, mais ou menos dormentes, observa-se com freqüência a moléstia que acomete as vias urinárias. Existe também nas ilhas Madagascar, Nossi-Bé e Reunião. A forma intestinal, freqüentemente associada à outra, encontra-se isolada no Congo Belga.
Esquistossomatose nos outros continentes
A esquistossomatose com localização nas vias urinárias tem sido observada em várias partes da Ásia, onde existem focos endêmicos.
Quanto ao continente americano, é bastante certo que nunca houve foco endêmico dessa forma; os raros casos observados, aparentemente, referem-se todos a pessoas que vieram ou voltaram infectados de outros continentes.
É notável que na América tropical, que recebeu tantos escravos africanos, a forma observada nas vias urinárias não conseguisse localizar-se, quando a forma intestinal (como todos os dias se torna mais evidente) é muito espalhada nas Antilhas e em vários países sul-americanos. Ambas as formas foram, sem dúvida, importadas muitas vezes, mas só uma delas conseguiu propagar-se. Esse contraste acha-se hoje perfeitamente explicado pelo fato de que nos dois casos tanto o parasito como o hospedador intermediário são diferentes, de modo que a possibilidade de localização depende da fauna de moluscos, encontrada no lugar.
Duplicidade do Schistosomum haematobium Bilharz
A idéia de que o nome dado por Bilharz compreendia um conjunto de duas espécies foi de novo defendida em 1903 por Manson, beseado em observações americanas. Em 1904 a descoberta de um novo Schistosomum (japonicu) (precedida em 1876 pela observação de uma espécie bovina, o Sch. crassum Sonsino) veio apoiar essa suposição. Em 1907 Sambon introduziu para a forma americana o nome Sch. mansoni que foi aceito; realmente devia ter ficado com o nome haematobium, visto que a outra forma já foi separada com o nome capense.
A duplicidade da espécie foi combatida por vários autores, principalmente por Looss, que procurou explicar a diferença dos ovos na mesma espécie por argumentos que absolutamente não convencem. É singular que o mesmo autor, que tanto se apaixonou para defender a unidade das duas formas, em outras ocasiões seja muito inclinado a estabelecer novas espécies e até gêneros sem melhores argumentos. Hoje, todavia, essa polêmica perdeu todo o valor, porque a duplicidade do antigo Sch. haematobium já é geralmente conhecida. Conhecem-se hoje mais seis espécies de Schistosomum, todas diferenciadas pelos ovos; nenhuma tem mais de uma forma de ovos.5
Alguns autores declararam ter encontrado ovos das duas formas, seja no intestino, seja nas vias urinárias. Onde não houve engano, essas observações, aliás, muito raras, podem geralmente ser referidas à infecção dupla e já existem algumas explicações para a heterotopia dos ovos nesses casos.6 Na América, nesses últimos tempos, numerosos observadores, entre milhares de ovos com espinho lateral, nunca encontraram um só com espículo terminal; mas é preciso levar em conta que o espinho lateral pode parecer terminal em certas posições, a menos que se tenha o cuidado de rolar o ovo. Como aparece nas figuras 10 e 11, os ovos podem também ter um prolongamento obtuso, bem diferente de um espinho e situado ao pólo mais distante do espinho lateral. A localização nas vias urinárias faz sintomas muito mais característicos que a outra, que facilmente passa despercebida; entretanto, já Wucherer não conseguiu encontrar os ovos na urina em casos de hematúria e isso na Bahia, onde hoje a outra forma é verificada com freqüência. Grande número de exames de urina, feitos por mim durante 36 anos, nunca me deixaram encontrar um ovo de Bilharzia (cuja forma me era bem conhecida), o que, combinado com a experiência de muitos colegas, permite excluir a existência dessa forma nas partes mais conhecidas do Brasil. Do outro lado examinei no Rio as fezes de muitos doentes de esquistossomatose intestinal, adquirida no Norte (em alguns casos durante muito tempo), sem encontrar um ovo com espinho terminal. O dr. Oswino Alvares Penna, que observou os mesmos casos e muitos outros, confirma a minha observação, que está de acordo com os resultados obtidos nas Antilhas, na Guiana Holandesa e na Venezuela.
Discutirei em outro lugar os caracteres que diferenciam as duas espécies. O nosso trabalho só se ocupa do Sch. mansoni Sambon, por ser o único observado no Brasil e mesmo em toda a América, a menos que se trate de casos importados. Nestes tem-se observado algumas vezes o Schistosomum localizado nas vias urinárias; geralmente eram de origem africana. Com a imigração asiática sempre crescente podiam facilmente aparecer infecções de origem asiática, devidas a Sch. haematobium ou mesmo japonicum, mas o transmissor destes é diferente de todos os nossos moluscos indígenas, de modo que não precisamos recear a importação do parasito japonês.
O Schistosomum mansoni na América
Casos de Sch. mansoni foram observados na América ou em pessoas lá infectadas desde 1902. Os primeiros focos, indicados pelos doentes, eram nas Antilhas. Citamos os casos de Manson (1903, infecção em Antilhas), de Letulle (1903, caso de Martinique), Mac Donell (1905, caso de Culebra), Lahille (1906, ibidem). Em Porto Rico, que é um foco importante, Gonzalez-Martinez observou e publicou os primeiros casos em 1904. Mais tarde Ashford, King e Gutiérrez Igaravidez encontraram freqüentemente os ovos durante estudos sobre a ancilostomíase endêmica.
Esses e outros trabalhos posteriores mostram que entre os focos principais deve constar Martinica, Guadalupe, (Vicques?), Culebra, Porto Rico e Cuba (v. Holcomb, 1907).
Na literatura existe mais um caso inexplicado de esquistossomatose urinária com ovos correspondentes, observado por Cortez em 1905, em pessoa nascida em Guatan, Guatemala. Cita-se também que o dr. Butler observou em San Juan, num habitante de Porto Rico, dois ovos com espinho terminal, evacuados na urina, sem saber onde foi infectado. Em vista do enorme número de doentes, examinados em Porto Rico por médicos conhecedores do assunto, há pouca probabilidade de existir lá um foco endêmico dessa forma de bilharziose; os médicos dessa ilha são unânimes em reconhecer a freqüência do Sch. mansoni e a falta da forma de ovos com espinho terminal.
Outros casos, constatados na zona do Canal do Panamá por Zeiller (1900), aparecem na literatura sem informação sobre o foco de infecção. Entre eles menciona-se um caso em que coexistiam as duas espécies de ovos com as duas formas de infecção. Se o caso for autêntico, desconfio tratar-se de infecção importada de outro continente.
No continente sul-americano, foram observados casos de Sch. mansoni na Guiana Holandesa (Flu, 1908), na Venezuela (Brem, Jesus Risquez), na Colômbia (Abtes) e no Peru. De um trabalho mais recente de Jesus Risquez resulta que a infecção é muito comum na Venezuela, tendo sido por ele encontrada em 25 por cento das autópsias feitas em Caracas, o que constitui um foco intenso.
Esquistossomatose no Brasil
Blumgart, de Nova York, observou em 1915 o Sch. mansoni num alemão, provavelmente infectado no Brasil onde esteve 7 anos.
Em 1908 e 1909 o dr. Manoel Pirajá da Silva fez uma série de comunicações sobre a esquistossomatose na Bahia, mostrando a sua freqüência. Procurou caracterizar o parasito como espécie diferente, que denominou Sch. americanum. Descreveu também debaixo do nome Cercaria blanchardi, uma cercária observada na Bahia. Pela forma geral combinada com a sua ocorrência numa espécie grande de Planorbis pode-se, em vista de estudos posteriores, concluir que essa forma faz parte da evolução do Schistosomum mansoni. Jonhn Miller (em 1914) e vários outros autores se referiam à observação do mesmo parasito na Bahia.
Ovos de Schistosomum com espículo lateral foram encontrados, no Rio de Janeiro, em fezes por Gomes de Faria, em tumores do reto por Vianna e no pâncreas por D'Utra. Essas observações e outras, mais recentes, foram feitas no Rio de Janeiro, mas a anamnese, quando conhecida, indicava tratar-se de infecções adquiridas no Norte do Brasil. O mesmo se dava em numerosos casos, observados por Penna e outros, em que os ovos apareceram na ocasião de pesquisas sobre a freqüência da ancilostomíase.
Tratava-se principalmente de marinheiros e soldados navais nortistas, tendo chegado de escolas dessa região, onde se infeccionaram antes de entrar na escola, geralmente por banhos em lagoas habitadas por caramujos.
Em alguns a infecção já datava de muitos anos. Eram originários dos estados Bahia, Sergipe, Alagoas, Paraíba e Rio Grande do Norte, que constituem zona certamente infecciosa. A estes pode-se adicionar Goiás, onde Neiva observou uma vez os ovos característicos. A infecção provavelmente também existia numa lagoa de Óbidos7 e talvez numa outra no estado do Espírito Santo. Sendo a infecção pouco característica, só pode ser reconhecida nas autópsias ou durante a vida pelo exame microscópico das fezes. É graças a esse exame, que se vulgarizou pela pesquisa da Uncinaria e do Necator, que a infecção foi descoberta em tantos focos novos.
As condições indispensáveis para o estabelecimento de um foco epidêmico são, de um lado, um clima quente, do outro, a existência de umas espécies de Planorbis que se prestem para hospedador intermediário. Entre nós o Pl. olivaceus e mais duas espécies satisfazem essa condição, mas não consta que existam no Rio de Janeiro e de lá para o Sul.
Theophilo Martins, empregado deste Instituto, seguiu, em 1916, para Aracaju e lá verificou a existência da infecção em várias pessoas que costumaram banhar-se em lagoas onde existia Pl. olivaceus, que nessa região é muito abundante. Da Bahia recebemos remessas das mesmas espécies dos colegas N. Pirajá da Silva e Octavio Torres; usamo-las para infecção artificial. Na última, achamos também seis exemplares naturalmente infectados que já davam saída a cercárias de Schistosomum mansoni.
Observações mais recentes
No segundo semestre de 1917 resolveu-se mandar, por conta deste Instituto, uma comissão médica que devia percorrer os estados Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Sergipe e Bahia (onde constava haver focos de infecção), a fim de investigar as condições locais. A comissão, constituída pelos drs. Adolpho Lutz e Oswino Penna e dois serventes de laboratório, encontrou casos de esquistossomatose em todos esses estados, mas principalmente em Sergipe e Pernambuco, onde se demorou mais tempo. Verificaram que o Planorbis olivaceus era limitado aos estados Bahia e Sergipe; mais ao norte o hospedador intermediário deve ser um Planorbis menor que foi descrito com o nome de centimetralis na monografia dos Planorbis sul-americanos, publicada por Lutz nas Memórias do Instituto (Tomo X, Fasc. 1, 1918). No extremo norte do território percorrido aparece outra espécie, Planorbis guadaloupensis Sowerby, que é o transmissor do parasito na Venezuela e talvez também em todas as Antilhas, onde ele existe. As últimas duas espécies não forneceram exemplares com infecção espontânea, em razão provavelmente da estação, pouco favorável no caso do centimetralis. (No guadaloupensis realizei a infecção artificial, usando exemplares obtidos do Maranhão pelo obséquio do sr. Fabricio Caldas de Oliveira. A infecção do centimetralis não foi completada ainda; todavia, observei várias vezes a penetração dos miracídios). Do Planorbis olivaceus encontraram exemplares infectados uma vez em Sergipe e três vezes em pontos diferentes do estado da Bahia.
Mais recentemente obtivemos informações que permitem incluir Minas na lista dos estados infectados. Soubemos do dr. Henrique Villela que o dr. Abel Tavares de Lacerda observou em Belo Horizonte vários doentes que expeliam ovos com espículo lateral e cuja infecção deve ter-se dado em Minas. O dr. Oswino Penna também encontrou um doente procedendo de Minas, da zona do Rio Pomba.
(Informações mais recentes, obtidas do prof. Samuel Libanio e do dr. Mello Teixeira, já elevam o número dos casos a perto de trinta.)
Verifiquei que o Planorbis centimetralis existe também em Belo Horizonte. Espécies maiores não foram encontradas. Com isso combina uma observação de Lutz sobre a existência do Planorbis centimetralis em Minas (Retiro, perto de Juiz de Fora).
Uma observação recente, provando a existência do Sch. mansoni no Acre, me foi comunicada pelo dr. Carlos Chagas; assim, hoje quase todo o território ao norte do Rio de Janeiro pode ser considerado infectado.
Para terminar este capítulo dou uma
Recapitulação dos dados mais importantes
1851 Descoberta do Distomum haematobium por Bilharz no Egito.
1858 Weinland propõe o nome Schistosomum.
1864 Harley propõe o nome Distomum capense para os esquistosomas sulafricanos cujos ovos têm um espículo terminal.
1876 Cobbold não consegue descobrir o hospedador intermediário.
1874 Sonsino descobre o Schistosomum crassum em bovinos, mas não acha o hospedador intermediário do parasito humano.
1888 Allan indica a infecção por banhos (também Brock em 1897).
1892-1903 Casos importados de Sch. haematobium observados nos Estados Unidos e no Panamá.
1902-1903 Começam as observações de ovos com espículo terminal em doentes das Antilhas por Manson, Letulle, Gonzales-Martinez e outros.
1906 Blumgart em Nova York observa ovos de Sch. mansoni em um alemão que esteve 7 anos no Brasil.
1907 Sambon propõe o nome Schistosomum mansoni.
1908 Primeira comunicação do dr. M. Pirajá sobre a ocorrência do Sch. mansoni na Bahia.
1911 Primeira comunicação de Flu sobre o Sch. mansoni na Guiana Holandesa.
1911-1913 Descoberta do Sch. japonicum e da sua biologia.
1915 A comissão Leiper estuda a evolução dos Schistosomum do homem no Egito.
1916 Lutz estuda no Brasil a evolução do Sch. mansoni no Planorbis olivaceus.
1916 Iturbe e González verificam que o Pl. guadaloupensis é o hospedador do Sch. mansoni na Venezuela.
1917 Verificação que parte dos focos brasileiros depende da presença dos Pl. centimetralis e guadaloupensis.
1918 Verificação do hospedador do Schistosomum spindale do boi por Glen Liston & Soparkar.
Passo agora à parte descritiva e começo com
O gênero Schistosomum
(Fig. 1-8)
O gênero Schistosomum compreende várias espécies de trematódeos parasitos do sangue e munidos de duas ventosas (bucal e abdominal), razão por que foram colocados a princípio no gênero Distomum, hoje subdividido em muitos gêneros que formam a família Distomidae. Distingue-se de quase todos os outros por ter os dois sexos distribuídos sobre dois indivíduos, em vez de serem reunidos em um só. Outro caráter é o habitat nas veias, a que o verme é especialmente adaptado. Poucos gêneros, vizinhos e só recentemente separados, participam nesses caracteres, formando uma subfamília que se pode chamar Schistosominae. Cito os gêneros Bilharziella e Ornithobilharzia, observados em pássaros.
O dimorfismo sexual é muito acentuado. O Schistosomum macho tem o corpo achatado e bastante largo, a musculatura desenvolvida e a pele guarnecida de escamas agudas que facilitam a locomoção; a fêmea tem o corpo filiforme como os nematódeos e a musculatura fraca; as escamas faltam ou são pouco distintas.
O corpo do macho alarga-se por trás do processo cefálico, mas as partes laterais, em vez de estendidas, são enroladas, formando do lado ventral o “canalis gynaecophorus,” dentro do qual se costuma encontrar uma fêmea, raras vezes mais. Os órgãos genitais são reduzidos a um testículo subdividido, às vezes terminado por vesícula espermática e um vaso deferente sem órgão copulador.
Na fêmea há um corpo vitelígeno, um ovário e um canal comprido que representa o útero e a vagina. Um pequeno segmento, que contém o último ou o único ovo com casca perfeita, pode ser designado pelo nome ootipo.
Nos dois sexos falta um bulbo faríngeo ou esofageano e o intestino, dividido a princípio, se une outra vez em extensão maior ou menor.
(Há três espécies que são parasitos do homem e mais cinco que vivem em animais domésticos. Todas se distinguem facilmente pela forma dos ovos. As espécies humanas podem ser observadas em macacos e roedores, espontaneamente ou em conseqüência de tentativas de infecção. O Sch. japonicum ataca quase todos os animais domésticos.)
Tratarei agora da descrição e diferenciação:
Schistosomum mansoni
(Fig. 1-8, 15)
A morfologia e a anatomia do Schistosomum haematobium foram estudadas pelo descobridor e depois por Leuckart, R. Blanchard, Chatin e Fritsch, já antes de 1888. O assunto foi resumido novamente por Blanchard em 1989 e por Leuckart na segunda parte da sua obra clássica, com colaboração de Looss. Podia-se considerar o assunto esgotado se os autores tivessem trabalhado com uma espécie só e não com uma mistura das duas, quando não se referiam unicamente à forma localizada nas vias urinárias. Assim, os dados têm um valor apenas relativo e as descrições devem ser emendadas para cada uma das espécies, reunidas debaixo do nome Sch. haematobium.
As diferenças já foram apontadas por Pirajá, Flu, Holborn e outros autores que estudaram a espécie americana. Faltando uma comparação com exemplares frescos das outras espécies, o valor de alguns dos caracteres podia ser posto em dúvida, se Leiper (que ainda ultimamente teve ocasião de comparar as duas espécies no Egito) não tivesse confirmado o valor dos caracteres mais importantes que garantem a diferenciação fácil e segura. Nos nossos exemplares verifiquei também todos os caracteres que ele dá como específicos do Schistomum intestinal do Egito, que deve ser identificado com o Sch. mansoni. A essa opinião também já tinha chegado González Martínez, como se acha registrado numa publicação recente.
Os caracteres de gênero, comuns às duas espécies, são os seguintes:
Habitat no sistema circulatório. Alimentação com sangue.
Bissexualidade. Machos com canal ginecóforo, fêmeas filiformes.
Produção de ovos sem tampa, contendo um miracídio quando expelidos pelo hospedador.
Penetração do miracídio em moluscos de água doce, onde formam esporocistos e cercárias que emigram espontaneamente.
Cercárias sem bulbo faríngeo com a cauda bifurcada, munidas de grandes células glandulares e capazes de infectar animais penetrando pela pele em contato com água.
Para distinguir as espécies haematobium e mansoni bastam as seguintes diferenças que parecem bem estabelecidas:
haematobium
♂ Testículo composto de 4 ou 5 lobos.
Vesícula seminal anterior aos lobos do testículo.
♀ Ovário na metade anterior do corpo.
Ovo perfeito com espinho terminal.
Útero comprido com muitos ovos.
Vitelígeno curto no quarto caudal
♂ ♀ Ceco curto.
Primeiros estados em Physopsis.
mansoni
♂ Testículo com cerca de oito lobos.
Não foi observada vesícula seminal.
♀ Ovário na metade caudal do corpo.
Ovo perfeito com espinho lateral.
Útero curto, quase sempre com um ovo só.
Vitelígeno ocupando os dois terços posteriores do corpo.
♂ ♀ Ceco comprido.
Primeiros estados em Planorbis.
Além dessas diferenças, pode haver outras, menos seguras e de apreciação mais difícil, referindo-se ao tamanho do corpo e das ventosas, à distância, e terminação do ceco e ainda ao corpo e à armação da pele nos dois sexos. É certo que a forma dos testículos e do intestino é um tanto variável, mas as diferenças vão muito além de variações.
Para diferenciação clínica basta a forma do ovo encontrado nas fezes e a localização da moléstia.
As dimensões dependem (no material morto) tanto do modo de fixação como das condições que precederam e influíram sobre a contração ou relaxamento muscular. Estes são muito pronunciados no material vivo, de modo que os dados têm apenas um valor aproximativo. Os velhos autores não discriminaram as duas espécies e nenhum autor moderno parece ter comparado as duas em condições idênticas. Dos autores modernos, Brumpt dá para o haematobium macho 10 e 15 mm de comprimento, a largura não excedendo 1, e para a fêmea 15 a 20 para 0,1 a 0,2 mm de largura maior. Pirajá dá para mansoni no macho o comprimento de 12 e a largura no meio de 0,448 mm. Na fêmea as mesmas medidas importam em 14,5 a 15 para 0,168 mm. Não posso calar a minha impressão de que as dimensões de mansoni parecem ser um tanto inferiores às do Sch. haematobium.
A coloração também varia conforme as circunstâncias; julgo pouco provável que nesse ponto haja uma diferença fundamental entre as espécies.
Ovos de Schistosomum mansoni
(Fig. 9-15)
Caracteres dos ovos encontrados nas fezes
A evolução do Sch. mansoni, fora do corpo humano, principia com os ovos eliminados nas evacuações alvinas que merecem um estudo especial por fornecer o principal meio de diagnóstico. Desprezando este, é quase impossível chegar a um diagnóstico seguro, e por isso a freqüência do parasito na América do Sul só se tornou conhecida em conseqüência da prática de procurar os ovos dos outros parasitos intestinais.
Os ovos de Schistosomum são grandes, mas a sua casca é transparente e frágil. Por isso, não aparecem bem em preparações um pouco opacas e podem ser destruídos por pressão. Por causa da pequena produção são comparativamente raros e facilmente escapam ao exame direto, quando as fêmeas adultas não são muito numerosas. Infecções pequenas ou recentes não podem ser seguramente excluídas, porque os ovos levam bastante tempo para chegar ao intestino quando não encalham definitivamente, o que parece freqüente.
(O exame torna-se mais fácil pela lavagem repetida das fezes, seguida de sedimentação simples ou centrifugação. Com estas combina-se o uso de tecido de arame e de gaze de moleiro para reter todos os corpos mais grossos. Assim obtém-se um sedimento que contém quase exclusivamente corpusculus amilaceos e ovos de parasitos, sendo fácil de examinar.)
A aparência do ovo está bem representada nas figuras que damos. Os ovos normais (Fig. 15) são munidos apenas de um espinho lateral e contêm um embrião bem visível. Em ovos patológicos o tamanho pode ser diminuído, faltando o embrião. Pode haver num dos pólos um prolongamento mais ou menos comprido (Fig. 10 e 11), mas este só pode ser confundido com um espículo terminal quando o exame for pouco cuidadoso. A existência de dois espículos laterais não foi ainda assinalada. A figura 12 mostra o único caso dessa anomalia rara que verifiquei no exame de milhares de ovos. Os ovos com ou sem embrião podem ser calcificados ou incrustados por cristais (Fig. 13 e 14).
Os ovos com espinho lateral foram recentemente estudados nas publicações de Holcomb e Gonzalez-Martinez. Ambos deram figuras que são um tanto esquemáticas, principalmente as do último autor. Dou também uma figura tirada do natural (Fig. 15). A casca exterior do ovo ou córion tem uma forma ovóide bastante regular, apenas interrompida pelo espículo cujo ápice agudo é compacto, sendo a base cônica e escavada. A sua grossura é apreciável, principalmente nos pólos onde é muito aumentada (Fig. 15).
As dimensões dos ovos são um pouco variáveis em estado normal. Holcomb dá 112 a 162 micra para o eixo maior e 60-70 para o menor. Baseado em trinta medições, Gonzáles-Martinez indica uma média de 147 para 67,09. Essas medidas combinam melhor do que as do espículo, cujo comprimento o primeiro autor dá como 15-17 contra 22,7 do segundo (largura 7,5), mas isso pode depender do modo de medir. O ponto de inserção, segundo Holcomb, é afastado do pólo próximo pela quarta parte do eixo maior.
A membrana interior amnion ou membrana vitelina acompanha a outra de perto, mas não entra no espículo e deixa nos pólos uma calota de dimensões variáveis, geralmente maior no pólo mais distante do espículo, que se pode considerar o anterior, por ser mais freqüentemente ocupado pela extremidade cefálica do embrião. Assim, o espículo fica dirigido para trás.
Ambas as membranas são finas e transparentes, mas o córion é mais amarelado, sendo o amnion hialino: todavia esse pigmento, como em outros ovos de entozoários, é derivado dos materiais fecais e falta em exemplares que foram protegidos por densa camada de muco.
O embrião ou miracídio dentro do ovo maduro
(Fig. 15)
Os ovos normais saem do intestino com o embrião completamente formado e vivo. (Os invólucros transparentes não impedem o estudo, mas os poderes fracos não bastam para apreciar todos os detalhes de estrutura. Usando lentes de imersão é indispensável fixar a lamínula na lâmina, o que pode ser feito por parafina ou terebintina. Assim, obteremos imagens nítidas, mas os contornos dos órgãos internos são sempre muito delicados e a superposição não permite ver tudo no mesmo ovo. Por isso, convém examinar muitos ovos em posições variadas.)
O embrião é revestido de cílios que na parte anterior são mais compridos e dirigidos para frente. Faltam na papila bucal, e no resto do corpo são virados para trás.
Há também quatro aberturas tubulares do sistema excretório contendo membranas vibráteis. Os troncos maiores com lâminas ciliadas também aparecem às vezes em parte do seu decurso.
A existência de fibrilas contráteis, orientadas em duas ou três direções, é indicada pelos movimentos enérgicos que o embrião faz, antes de sair. Ao contrário do que a literatura do assunto parece indicar, acho a demonstração óptica muito difícil e incerta.
Há um saco gástrico que se distingue facilmente quando está cheio de grânulos vitelinos. Abre-se na boca por meio de um canal, largo na base e mais estreito em direção à boca. As paredes do saco e do canal parecem muito frouxas.
Ao lado do estômago reconhecem-se mais duas grandes células glandulares cujo núcleo não consigo ver a fresco. O canal excretório começa largo e diminui gradualmente até chagar à papila cefálica, onde é defletido para fora, terminando num poro oblíquo.
Quando cheios, os canais e as glândulas são facilmente percebidos, estas podem ser viradas para dentro e cobrir o saco gástrico. (Na figura 15 as glândulas e o saco não são muito cheios e aparecem claramente no mesmo plano.) O conteúdo das glândulas não é granular, como se podia deduzir de figuras que se referem ao embrião da outra espécie.
Também não consigo ver uma indicação clara do sistema nervoso, nem mesmo com as figuras publicadas, mas uma grande célula vesicular, abaixo dos órgãos descritos e quase no centro do embrião, e mais uma ou duas semelhantes, posto que menores. Parece-me que a sua função pode ser comparada à de um balonete no meio de um balão, dando ao corpo certa rigidez e elasticidade, necessárias para os movimentos. O resto do corpo é formado por massas esféricas, maiores e menores; são pouco definidas e representam sem dúvida as células germinativas.
(Holcomb dá a figura de um embrião com seis vesículas claras que se pareciam com glândulas. Já vi um com seis no mesmo nível e mais para diante outros três. Simulavam glândulas, mas parece-me que se deve tratar de outras células vesiculares.)
Os cílios exteriores e interiores só se metem em movimento quando o ovo está num ambiente líquido e há penetração de água por osmose. Isto se dá quando os ovos são isolados por lavagem em água comum.
Ecdise e vida livre dos embriões ou miracídios
(Fig. 15-17)
As condições que favorecem a ecdise ou saída do embrião são água pura, luz e uma temperatura apropriada, vizinha a 30o. No inverno do Rio de Janeiro, há muitos dias que não se prestam para essa observação, e em zonas temperadas as condições naturais só excepcionalmente permitem a ecdise.
O melhor processo para observar o miracídio na sua vida livre consiste em lavar, tamisar e sedimentar as fezes mais ricas em ovos usando água de temperatura baixa. O sedimento é colocado com pouca água em pequenos cristalizadores, placas de Petri etc. e depois exposto ao sol. O mesmo resultado pode ser obtido aproximando uma lâmpada elétrica a uma distância que basta para levantar a temperatura da água a cerca de 30o.
Mesmo em condições ótimas, quando os primeiros miracídios aparecem logo, nunca se obtém a saída de todos, talvez porque uma parte não atingiu ainda a maturidade completa. Recolhendo o resto em lugar menos iluminado e quente, a experiência, repetida uma vez por dia, dá ainda resultados positivos durante os três ou quatro dias que seguem. Mesmo depois de oito dias, acham-se ainda ovos com embriões vivos, mas estes não procuram mais sair dos ovos.
A ecdise é precedida por penetração de água exterior na casca que se dilata um tanto. Talvez a secreção das glândulas facilite esse processo. Notam-se movimentos brownianos nos grânulos vitelinos e começa o jogo dos diferentes cílios e membranas vibráteis. Depois seguem, em intervalos, contrações enérgicas do embrião que se pode virar completamente dentro da casca. A saída é instantânea e por isso facilmente passa despercebida. Numa observação minha era precedida por uma rotação muito enérgica e rápida do embrião, contraindo até assumir uma forma quase esférica.
A casca vazia geralmente mostra uma abertura fusiforme, atravessando obliquamente o equador da casca. Essas cascas vazias oferecem um contorno característico e tão facilmente reconhecido como o aspecto do ovo cheio.
Depois de saído do ovo, o miracídio alonga-se, tomando uma forma cilíndrica, e nada, em grandes curvas, com direção à luz, até ser detido pela margem da placa.
Com forte iluminação oblíqua é facilmente reconhecido pelo movimento característico. (Deve-se evitar uma confusão com certos infusórios e principalmente com rotatórios.) Em temperaturas menos favoráveis o embrião torna-se mais piriforme e vai ao fundo. O mesmo acontece depois de ter nadado algumas horas, sem encontrar um hospedador adequado.
Fechados em capilares e expostos na geleira à temperatura muito baixa, os miracídios tornam-se piriformes; depois ficam imóveis e morrem em pouco tempo, a menos que sejam retirados logo. Neste caso podem reassumir a sua atividade. Sempre são muito mais sensíveis ao frio do que as cercárias, o que faz compreender como uma infecção já realizada das antenas do caramujo pode ser interrompida em conseqüência de alguns dias frios.
Penetração dos miracídios nos moluscos
(Fig. 18, 39a.)
Para observar a penetração, introduzem-se os moluscos em placas de Petri que contêm os miracídios. Um binocular é de grande utilidade, mas basta qualquer lente de poder fraco. No princípio, os miracídios continuam nas suas evoluções, passando às vezes perto dos caramujos, sem fazer caso. Depois aproximam-se pouco a pouco das espécies preferidas. Subitamente um ou outro fixa-se em alguma parte exposta. Seguem outros, pouco a pouco, mas ainda por muito tempo observam-se exemplares refratários.
As espécies experimentadas eram dos gêneros Planorbis, Physa, Lymnaeus, Ancylus e Ampullaria. Com raras exceções, explicadas talvez por contato prévio com exemplares das outras espécies, as três últimas eram completamente desprezadas. As Physa e Planorbis (de sangue vermelho) ofereciam igual atração, sendo preferidos os exemplares já crescidos; ao contrário do que esperava, a atração parecia aumentar com o tamanho. O ponto preferido é a antena, que se presta muito bem para as observações ulteriores. O resto da cabeça e a região pós-antenal também são muito atacados. O pálio exposto é pouco procurado nos Planorbis, um pouco mais nas Physa; o pé é quase sempre desprezado.
O miracídio, no momento de penetrar, tem uma forma alongada cilíndrica, como se vê na fig. 18. Penetra por meio de movimentos que lembram um pistão de bomba ou uma broca. O tempo necessário regula 10 a 15 minutos. Depois destes o miracídio é encontrado estendido no tecido subcutâneo. Mostra ainda os cílios, mas as glândulas ficaram vazias. Muitas vezes o embrião cai ou abandona o lugar depois de várias tentativas de penetrar.
Até hoje, só se conhecem quatro espécies de Planorbis que se prestam para o papel de hospedadores intermediários. São o Planorbis boyssyi do Egito, o guadaloupensis das Antilhas, da Venezuela e do Norte do Brasil, o olivaceus, encontrado na Bahia e em Sergipe, com que realizei a maior parte das minhas experiências, e, finalmente, o centimetralis mihi, encontrado nos estados do Norte, principalmente em Pernambuco, e também no estado de Minas. As outras espécies, estudadas na minha monografia dos Planorbis brasileiros, não se prestam para esse papel. Em algumas delas, como na Physa, a penetração do miracídio ocorre normalmente, mas a evolução posterior dos parasitos pára depois dos primeiros estádios.
Parece que os miracídios que procuram penetrar em outras regiões que as antenas e a região dos olhos não o conseguem ou morrem pouco depois, porque nunca encontrei os estados ulteriores em outros pontos. Todavia, é possível que um ou outro miracídio passe pela abertura respiratória e se localize na parte visceral.
Os meus estudos foram todos feitos nas antenas, que são facilmente observadas e podem ser amputadas, sem prejudicar o caramujo. Mesmo as antenas destacadas de Physa ou Planorbis (que se deslocam pela ação do epitélio vibrátil como se fossem vivas) infectam-se facilmente.
As tentativas de penetração, bem ou malsucedidas, produzem na antena do caramujo uma reação local, caracterizada por tumefação, acompanhada de hiperemia, bem apreciável por causa do sangue vermelho.
É, sem dúvida, devida à secreção glandular cuja inoculação deve amolecer os tecidos, facilitando a penetração. Os caramujos são bastante indolentes, mas, quando atacados por maior número de miracídios, procuram recolher as partes expostas ou fugir da água.
Essa primeira reação retrocede em poucas horas, a ponto de deixar apenas um ou mais pequenos nódulos. (Uma antena, decepada dois dias depois da penetração do miracídio, tinha aparência edematosa. Achatada debaixo de uma lamínula e fechada com soro fisiológico, tornou-se bastante transparente permitindo o exame com lente de imersão. O esporocisto ainda aparecia estendido em sentido longitudinal, mas tinha, do lado de fora, um espaço claro onde se viam os restos da membrana vibrátil. Os cílios de epitélio já tinham desaparecido, deixando apenas restos indistintos. O contorno era agora muito fino e os dois pólos não se distinguiam, porque a papila, o saco gastrintestinal, as glândulas com seus tubos excretórios e as grandes células vesiculares tinham desaparecido. Por dentro viam-se pequenos grânulos, corpúsculos redondos com aspecto de núcleos, elementos vesiculares e algumas células hialinas maiores, no meio de uma massa protoplasmática sem estrutura aparente. Ainda existiam os quatro orifícios tubulares mostrando no interior o jogo animado da membrana vibrátil que, depois de cinco horas, ainda continuava com a mesma rapidez. Também o epitélio vibrátil da antena estava ainda em bom estado, mas, dez horas mais tarde, todo o movimento tinha cessado, os epitélios da antena estavam destacados e os seus cílios tinham desaparecido ou achavam-se soltos.)
Os miracídios que não acham ocasião de penetrar caem pouco a pouco ao fundo e morrem, depois de ter expelido a secreção das glândulas.
Desenvolvimento dos esporocistos de primeira e segunda geração
(Figs. 18-50)
Examinando uma antena de Pl. olivaceus logo depois da infecção encontra-se o miracídio debaixo da pele, estendido longitudinal; as glândulas e o intestino, pouco apreciáveis, parecem vazios, mas as lâminas do sistema excretório e os cílios do epitélio exterior continuam a vibrar. Observam-se também contrações e deslocamento do miracídio. Finalmente sossega tudo. O epitélio destaca-se e fica apenas um saco ovular com membrana fina, no qual as células germinativas proliferam e tornam-se mais distintas.
Depois de três ou quatro dias uma tumefação secundária das antenas indica a evolução dos esporocistos. Esses tumores simples ou moniliformes aumentam nos primeiros quinze dias. Depois de vinte dias, mais ou menos, empalidecem e murcham, sem desaparecer completamente. Assim os exemplares infectados podem ser reconhecidos ainda muito tempo depois. Convém, todavia, lembrar que lesões semelhantes podem ser produzidas pelo parasitismo de outros trematódeos.
Depois de poucos dias a membrana torna-se tão fina que é dificilmente reconhecida; nem se consegue tingi-la na antena achatada. Esmagando um dos tumores, cinco ou seis dias depois da infecção, vê-se grande número de massas redondas, formadas por células com grânulo central que parece um núcleo. Parte delas infiltra a região intumescida da antena e outra escapa pela ruptura. O exame em cortes coloridos não oferece maior vantagem.
Alguns dias mais tarde, as massas alongam-se, constituindo esporocistos secundários curtos e grossos, dotados de movimentos que se podem observar na linfa das antenas e por pouco tempo no soro fisiológico. Há constrições que parecem indicar uma multiplicação por estrangulamento. Na água alteram-se logo. Nesse período começa a migração para o saco visceral, onde, depois de vinte dias, se acham esporocistos muito compridos que parecem ramificados e contêm outras massas ovais, destinadas a formar novos esporocistos ou cercárias. Na última o corpo é formado em primeiro lugar, depois aparece a parte ímpar e finalmente a parte bifurcada da cauda. O corpo inteiro está ainda revestido de um epitélio cujos núcleos se coloram facilmente. Cercárias vivas e ativas só aparecem com trinta e poucos dias. Outras vezes, com temperaturas menos favoráveis, parece haver formação de novos esporocistos.
Cercárias de cauda bifurcada8
(Fig. 48, 51-68)
Já faz muito tempo que se conhecem cercárias de cauda bifurcada, mas o seu destino era desconhecido; passavam mais por uma curiosidade sem grande importância. Nos países europeus parecem mais raras, em comparação com outras regiões mais quentes, onde podem constituir cerca da metade das espécies, facilmente encontradas. Entre nós, conheço quatro espécies bem distintas, encontradas em Planorbis, e mais uma, observada num Semisinus.
Em 1913, Miyairi e Suzuki publicaram um trabalho importante em que descreveram a evolução do Schistosomum japonicum. A cercária foi encontrada num molusco de água doce, que me parece bastante vizinho do gênero Bithynia.
Foi considerado novo e passa hoje sob o nome Blanfordia ou Katsayama nosophora Robson. A descrição e as figuras mostram que se trata de uma cercária de cauda bifurcada, sem bulbo faríngeo e com seis grandes glândulas unicelulares na parte posterior do corpo. Segundo os autores nasceriam em rédias secundárias, mas parece tratar-se realmente de esporocistos. Verificou-se a infecção percutânea de animais de experiência.
As observações dos autores japoneses foram confirmadas e ampliadas por observações independentes de Leiper. Este, como chefe de uma comissão, continuou os seus estudos no Egito, onde pesquisadores anteriores, entre muitas cercárias observadas, não reconheceram aquelas do Schistosomum.
Encontrou quatro cercárias que correspondiam aos caracteres conhecidos e conseguiu obter esquistossomos em animais de experiência, tanto por infecção cutânea como por ingestão de cercárias. Indicou como hospedadores intermediários do Sch. haematobium caramujos que se filiam aos gêneros Physa e Planorbis.
Mais tarde concordou na separação em Sch. haematobium e Sch. mansoni indicando Physopsis africana como principal hospedador intermediário do primeiro e Planorbis boissyi como o de mansoni. Comparou a anatomia e a biologia das duas espécies.9
Descrição das cercárias de Schistosomum mansoni
(Figs. 48, 51-63)
As cercárias recém-formadas, que abundam nas vísceras dos caramujos infectados, são cobertas, corpo e cauda, por um epitélio com núcleos grandes conchegados, revestindo também as ventosas que assim se salientam muito. Despido deste por uma espécie de muda, o corpo torna-se muito mais translúcido, sem mostrar mais distintamente a sua estrutura (Fig. 62).
Em preparações frescas ou fixadas em ácido ósmico, em outras fixadas em formalina e coradas por vários processos e finalmente nos cortes de caramujos infectados, tingidos por hematoxilina, só ou seguida de eosina ou Van gieson, cheguei a verificar as seguintes particularidades e estruturas, que não se conseguem perceber facilmente, empregando apenas um método.
O corpo da cercária mostra, nos movimentos, as formas variadas, geralmente observadas nos trematódeos e devidas à sua contratibilidade extraordinária. No estado de repouso assume a forma de um ovo com pólo largamente truncado. O comprimento maior é de 0,14mm, a maior largura importa em 0,04-0,05 mm. A cauda, bastante contrátil, é formada por uma parte longitudinal que tem no repouso uma forma obcónica alongada; a sua extremidade truncada se adapta a uma peça transversal, em forma de fuso alongado, que pode ser dobrada em direção apical, de modo a formar um prolongamento da outra parte. A peça basal tem cerca de 0,27 mm de comprimento por 0,03 mm de maior largura, a transversal, em cada metade, um comprimento de cerca de 0,08 mm. Assim o comprimento total pode alcançar, mais ou menos, meio milímetro. Essas dimensões são suficientes para se perceber, com boa iluminação, a cercária imóvel em forma de um pequeno risco branco. Em movimento de natação toma uma forma de 8, em conseqüência dos seus movimentos rápidos, e torna-se completamente característica.
Todo o corpo, inclusive a cauda, é translúcido, ligeiramente opalescente e coberto de espinhos extremamente finos.
O corpo, que representa o Schistosomum completamente novo, tem duas ventosas, das quais a anterior, com 0,06 mm de comprimento e 0,03 de largura, é muito maior. Tem a forma de 3/4 de um ovo sendo limitada por uma cápsula rija, provavelmente quitinosa. A musculatura parece pouco acusada, mas toda a porção bucal e faríngea, situada na abertura posterior da ventosa, pode entrar nela chegando à abertura exterior e funcionando com um pistão de seringa, fato esse que se verifica constantemente.
Dentro da abertura exterior da ventosa existe uma coroa de seis ou mais pequenos espinhos que, junto com a região que a suporta, pode ser protusa na forma de uma pequena probóscide. Perto desses espinhos se abrem os canais excretores das glândulas abdominais; assim parecem destinados a inocular nos tecidos a secreção dessas células. Os canais, em número de três de cada lado, são dispostos como as cordinhas de uma corda. Perfuram a ventosa bucal e correm para o abdome em trajetos sinuosos, sendo tão conspícuos, que se podia confundi-los com alças intestinais. Terminam em seis ou mais células relativamente enormes (de 0,03 mm de diâmetro), com grande núcleo (de 0,01 mm) e protoplasma granuloso, situadas em parte atrás da ventosa ventral e ocupando um grande espaço, caracterizado por maior transparência. A ventosa abdominal (com 0,016 mm de diâmetro) parece muito pequena e situada bastante para trás, podendo ser retraída e extrusa. Para trás da ventosa vê-se (em preparações coloridas) uma aglomeração de núcleos pequenos, em grande parte alongados; há outros entre a ventosa bucal e as glândulas unicelulares e em redor das ventosas. O intestino não pode ser percebido distintamente; parece ser formado por um saco simples e curto, em continuação do esófago e faringe, que não têm bulbo e são pouco visíveis. Não se distingue claramente um esboço do sistema genital; ele devia ser variável conforme os sexos. Os numerosos núcleos que se percebem nas cercárias parecem, pela maior parte, ligados ao sistema muscular; outros pertencem talvez aos dutos excretórios, ao intestino, ou servem para a formação do aparelho sexual, mas este parece ainda tão pouco diferenciado que (apesar de muito estudo) não consegui obter dele imagens claras.
A cauda e a sua peça transversal são formadas por células nucleadas bastante grandes. Gozam de movimentos independentes, mesmo algum tempo depois de separadas do corpo, com que a cauda forma uma espécie de articulação.
No Schistosomum novo, depois da penetração, não se encontram mais as grandes células glandulares cuja função evidentemente terminou. Pelo resto percebe-se a mesma estrutura; apenas os dutos glandulares parecem em vias de retrocesso (Fig. 69).
Nessa espécie, a parte forquilhada da cauda é uma peça subfusiforme, separada, porém adaptada pelo meio à extremidade truncada da cauda; é capaz de dobrar-se no meio, até formar um prolongamento desta.
Na superfície da água assume uma posição transversal retilinear e sustenta a cercária, que fica com o tronco dependurado. As duas extremidades acham-se freqüentemente enroladas. Ao nadar, a cauda vibra com muita rapidez, facilitando assim o reconhecimento da cercária, aliás, apenas perceptível, a menos de iluminação lateral intensa. A parte anterior, pouco desenvolvida, dá às cercárias, examinadas com poder fraco, o aspecto de espermatozóide (Fig. 51).
Pelo exame dos moluscos infectados verifica-se que as cercárias nascem em esporocistos que se encontram em grande número no fígado e na glândula bissexual. Nos folículos infectados do fígado o tecido glandular desaparece, o que explica o estado de atrofia e marasmo, muitas vezes observado nos Planorbis infectados. O caramujo que mais durou morreu com três meses de infecção, depois de ter provavelmente produzido alguns milheiros de cercárias; no fim desse período, a produção já estava muito diminuída.
Condições da saída das cercárias maduras
Na ausência completa da luz as cercárias maduras não mostram disposição para sair do caramujo, mesmo com temperatura de 30 a 31oC. Podem acumular-se em grande número em mucosidades aderentes aos caramujos. Na geleira, com bastante frio e obscuridade completa, as cercárias livres ficam no fundo da água, fixadas pela ventosa bucal; nessas condições conservam-se vivas durante mais de 24, porém menos de 48 horas. Quando o caramujo se retrai no fundo da casca, como faz antes de morrer, também não sai, de modo que pelo esmagamento da casca podem-se obter centenas de cercárias vivas em água onde antes não havia uma.
Expondo os caramujos ao sol ativo, durante algumas horas, obtém-se grande número de cercárias, de modo que as infecções experimentais são feitas de preferencia às três ou quatro horas da tarde. Pode-se concluir que também a essa hora os banhos são muito mais perigosos do que o são de manhã cedo.
A luz só, sem calor correspondente, também não é favorável para a saída das cercárias.
Quando as cercárias são ativas, vêm à superfície, onde podem descansar muito tempo dependuradas pela parte transversal da cauda. Com qualquer abalo da água, assumem logo a mobilidade excessiva que faz o corpo aparecer em figura de 8.
Em tubo capilar, colocado durante um quarto de hora sobre o gelo, conservaram vida e mobilidade; congelados em água durante alguns minutos, mostraram-se mortas.
Três caramujos conservados durante a noite numa temperatura de cerca de 30o sem darem saída a cercárias produziram enorme número, depois de terem sido expostos (sem vidro azul) aos raios de uma lâmpada de Nernst (para microscopia), até obter-se uma temperatura favorável. A luz difusa da manhã não teve esse efeito.
Em condições favoráveis de temperatura as primeiras cercárias podem aparecer depois de 30 e poucos dias. Com temperaturas mais baixas o seu aparecimento é demorado, ao que parece, por causa da formação de novos esporocistos em vez de cercárias.
No princípio o número de cercárias que sai dos caramujos infectados e se espalha na água é pequeno, de modo que facilmente passam despercebidas. Com o tempo tornam-se mais abundantes e a imigração pode continuar por várias semanas. Não é fácil observar a saída, mas verifiquei ocasionalmente que se dava pelo intestino, sem querer afirmar que seja o único caminho. Parece provável que todos os canais que conduzem à superfície do corpo sejam ocasionalmente aproveitados.
Penetração das cercárias
As cercárias da água podem penetrar pelas mucosas, no ato de ingeri-la, ou pela pele, na ocasião de banhos e trabalhos na água. Em outras ocasiões, os pés descalços e as mãos servem de pontos de entrada. Esta se dá com facilidade, mas dificilmente poderá ser observada de modo direto. Há, todavia, provas claras do fato que consiste no desaparecimento dos corpos das cercárias do líquido, a demonstração deles em cortes da pele, a reação no ponto de entrada e o aparecimento dos parasitos adultos depois do tempo necessário.
Leiper já verificou a infecção de roedores e macacos. Nas minhas experiências cobaias e coelhos deram resultados muito demonstrativos. A penetração parece realizar-se em todos os animais experimentados, mas em muitos destes a evolução não continua até o estado adulto.
Nas experiências podem-se empregar banhos parciais em água contendo cercárias ou amarrar os animais por um modo que seja bem suportado e banhar uma região da pele raspada por meio de um tubo largo. Depois de meia hora encontra-se a água cheia de caudas, destacadas no ato da penetração do corpo das cercárias. Os animais, principalmente os ratos brancos, podem dar sinais de comichão, seguida de reação local apreciável durante alguns dias.
Examinando um fragmento de pele, retirado depois de 20 a 60 minutos do ponto de aplicação do tubo, se pode demonstrar o corpo das cercárias nos cortes. Obtive resultados positivos na cobaia, no rato e num leitão que forneceu o material para a figura 69. Vê-se o esquistossômulo na rede de Malpighi, a cabeça tocando a cútis. As glândulas estão vazias, como verifiquei até num exemplar que estava apenas em vias de penetração.
A penetração nas mucosas deve ser muito mais fácil, mas mesmo a camada córnea da pele cede ao emprego combinado da secreção glandular e da ação mecânica. Os folículos pilosos e orifícios glandulares não são procurados, como já verificou Leiper que experimentou com um camundongo recém-nascido. Neste a penetração se realizou em 10 minutos. Todavia, baseado em muitas experiências, considero esse tempo insuficiente para obter um resultado completo em animais adultos.
Evolução dos esquistossomos nos mamíferos
Depois da penetração, há um período em que a evolução dos esquistossomos é pouco conhecida. É provável que penetrem logo na corrente circulatória que os leva para diferentes órgãos; depois de um tempo indeterminado, param na circulação portal. Obtive resultados positivos nos roedores, quando o número das cercárias era bastante elevado e haviam decorrido algumas semanas, o que permite a esses trematódeos alcançar um tamanho suficiente para serem percebidos com alguma facilidade. Na falta dessas condições, as pesquisas dos esquistossomos podem dar um resultado negativo.
Nos roedores, o desenvolvimento de um número considerável de Sch. mansoni é compatível com todas as aparências de saúde. Os vermes são evidentemente bem adaptados à vida nos vasos, e a absorção de sangue não é suficiente para produzir uma anemia séria. Os sintomas são geralmente devidos à postura e migração dos ovos, que só começa depois de algumas semanas. Nas fezes das cobaias infectadas, os ovos foram encontrados só depois de 2 meses e meio, e ainda em pequeno número. Nos cortes do intestino do coelho mais infectado, os ovos ainda eram bastante raros na submucosa e não havia sinais de eliminação. Em fezes de outros coelhos não encontrei ovos mesmo depois de três meses. É possível que no homem as condições sejam diferentes, mas em relação a cobaias e coelhos, pode-se concluir que a eliminação dos ovos é um processo lento, que muitas vezes só se verifica bastante tempo depois de terem os vermes chegado ao estado adulto.
Algumas observações de patologia humana e parte das experiências de Leiper parecem indicar que a eliminação dos ovos já foi verificada bastante cedo, cinco a seis semanas depois da infecção. Creio, todavia, que nos casos averiguados, tratava-se de infecções muito intensas e que o número de ovos era muito inferior ao que se teria achado mais tarde.
Já depois de três semanas, encontram-se os vermes quase adultos nas veias mesentéricas que geralmente estão muito congestas. As veias do fígado contêm, na média, um número igual. Depois de cinco semanas os órgãos sexuais estão bem desenvolvidos; as fêmeas têm um ovo no útero. As dimensões variam consideravelmente, conforme os graus de contração muscular. Os exemplares que morreram lentamente nos tecidos do hospedador estão inteiramente relaxados. Nem por isso, as dimensões são um pouco inferiores às medidas dadas na literatura antiga. Não creio que se possa atribuir isso à diferença dos hospedadores, porque os vermes encontrados eram distintamente maiores; mas talvez a espécie mansoni seja um pouco menor do que a haematobium, cujas fêmeas contêm muitos ovos, em vez de um só.
O intestino da fêmea costuma destacar-se muito bem, por estar cheio de massas enegrecidas, provenientes da digestão do sangue ingerido (o mesmo se observa no macho em grau menor). Em cortes do fígado, as fêmeas secionadas transversalmente seriam pouco conspícuas, se não fossem caracterizadas pelo intestino, cortado em um ou dois pontos, conforme a região. Além deste, percebe-se também o lume dos canais excretórios. O macho é mais característico, por causa da sua forma e dos espinhos de sua pele.
Sintomatologia da esquistossomatose
Dispomos de vários métodos para determinar as manifestações da infecção com Sch. mansoni. Podemos estudar os homens (naturalmente) e os animais (experimentalmente) infectados, verificando os sintomas subjetivos e notando as queixas dos doentes, ou podemos principiar com as alterações anatómicas, macro e microscópicas. Temos ainda um grande recurso no estado comparativo das lesões produzidas por outras espécies de Schistosomum no homem e nos animais domésticos. Aqui se destaca principalmente o Schistosomum japonicum, observado tanto no homem como nos animais domésticos, em infecções muito intensas. Localizam-se geralmente nos mesmos órgãos e já foram bastante estudadas.10
As observações mais antigas, feitas no velho mundo, podem ser utilizadas, mas somente com bastante reserva, visto que nelas se confundem sintomas produzidos por duas espécies de Schistosomum e outros parasitos intestinais, freqüentes no mesmo lugar.
O parasitismo dos vermes adultos nas veias é geralmente bem suportado, de acordo com as leis gerais do parasitismo, o que é provado pelo fato de que um coelho pode conter nas veias do mesentério e do fígado meio milheiro de vermes adultos, sem apresentar sintomas que chamem atenção. De outro lado Letulle atribui ao parasitismo dos adultos processos endoflebíticos, observados em casos de longa duração.
Não conhecemos nos esquistossomos adultos glândulas com secreção irritante ou tóxica, mas é claro que os produtos do seu metabolismo devem ser derramados no sistema circulatório do hospedador.11 Todavia, devem ser logo diluídos e acarretados quando a circulação é livre, como acontece nas veias maiores. Quanto ao sangue absorvido que constitui o único alimento aos esquistossomos, o volume total, em infecções moderadas, não é bastante grande para não ser facilmente substituído. Por isso a anemia não tem importância para o diagnóstico da infecção.
O povo, muitas vezes, atribui diarréias ao parasitismo de vermes e alguns autores, entre estes Gonzales-Martinez, consideram-nas como sintoma comum da infecção com Sch. mansoni. Na minha experiência não passam de complicações freqüentes, como em outras verminoses; é antes a prisão de ventre que se observa nos casos crónicos, o que aqui se explica pela esclerose do intestino. Nos casos recentes o número das evacuações, geralmente, não é alterado.
Jesus Risquez chamou atenção sobre pirexias mal definidas e de origem incerta que se podem atribuir a uma infecção com Sch. mansoni. Também vi a autópsia de um indivíduo que tinha esses parasitos e sucumbiu a uma pirexia pouco característica. Este assunto merece ser investigado.12 Na infecção por Sch. japonicum já parece estabelecido que infecções agudas, quando intensas e recentes, podem produzir febre, muitas vezes acompanhadas de erupção que lembra a urticária.
Há um outro sintoma, mais freqüente na minha experiência e que se pode explicar, levando em conta observações anatómicas feitas em indivíduos infectados com Sch. japonicum e M. pulmonalis. Os nossos doentes freqüentemente referem ataques de tontura que atribuo a embolias de vermes ou ovos destes.
Alguns doentes, que estavam no hábito de tomar banhos prolongados em lagoas, referem ter sentido “coceira” depois. Duas das lagoas por nós visitadas têm mesmo o nome popular “Lagoa da Coceira”. Se não se pode chamar esse sintoma patogênico, entretanto fornece uma boa indicação para reconhecer águas infecciosas e desconfiar da penetração de cercárias. Que esta produz comichão pode se observar muito bem nas experiências feitas em ratos brancos.13
Há uma série de sintomas (observados apenas em caso de infecção muito intensa ou continuada por muito tempo) que se refere ao intestino e ao fígado e se explica pelas lesões anatômicas, observadas nesses órgãos. Depende, todavia, menos dos vermes que dos ovos, encalhados nos tecidos, como veremos na anatomia patológica. Os sintomas hepáticos e intestinais são realmente pouco característicos e podem ser encontrados em muitas outras afecções, de modo que a sua importância depende da exclusão de complicações ou moléstias acidentais, observadas em indivíduos infectados que, em muitos lugares, representam uma grande proporção da população.14 Podia-se também procurar demonstrar pela estatística a maior freqüência de certos sintomas, mas neste ponto, entre nós, tudo está por fazer.
Mucosidades sanguinolentas podem ser atribuídas ao Sch. mansoni, se contêm maior número de ovos, faltando as amebas, icterícia, hepato e esplenomegalia -retração do fígado e ascite são sintomas suspeitos, quando não há probabilidade de outra etiologia.
A eosinofilia é observada na esquistossomatose como em outras formas de helmintíase, sem que o fato tenha muita importância para o diagnóstico, visto que o maior número de doentes também tem outros vermes. Não é pelo exame do sangue, mas por aquele das fezes, que se chega a obter a maior garantia do diagnóstico, com única exceção das infecções completamente recentes.
Os outros órgãos afetados não produzem sintomas claros. Nas primeiras fases da sua evolução os vermes provavelmente passam pela circulação pulmonar; observam-se manifestações pouco características como sejam tosse e bronquite. O pâncreas é muitas vezes comprometido; por isso convinha procurar indícios de aglicosúria, o que não tem sido feito de modo sistemático.
Além das tonturas podem-se observar em alguns casos perturbações nervosas que talvez dependam também da esquistossomatose, como falta de memória e de iniciativa, fraqueza de compreensão e de raciocínio, períodos de apatia e mau humor etc.
Complicações e moléstias consecutivas
Numa moléstia tão generalizada como a infecção por Sch. mansoni, a coincidência com outras moléstias deve ser freqüentíssima.
Assim, há casos de amebíase que podem conduzir a abscessos hepáticos que a constatação de ovos não permite atribuir aos vermes. Pode haver uma apendicite de outra etiologia num apêndice infiltrado por ovos. Nos próprios sintomas que podem ser produzidos pelo Sch. mansoni, às vezes, concorrem outras moléstias como tuberculose, sífilis, alcoolismo e moléstias cardíacas. Nas alterações intensas do reto, observadas freqüentemente no Egito, parece concorrer o Sch. haematobium. Hemorróidas podem ser independentes ou consecutivas à cirrose. Fístulas anais parecem ser complicações ou devidas a infecções mistas. Adenomas e papilomas, observados desde o intestino delgado até o ânus em freqüência crescente, podem ser uma conseqüência de infecções intensas e antigas, mas a degeneração maligna dessas lesões deve ser considerada uma complicação. Em casos crónicos a hemoptise pode ser devida a outras causas.
De outro lado é provável que o parasitismo do Sch. mansoni favoreça complicações e moléstia secundária. Podemos também afirmar que ele indica a existência de condições higiênicas que permitem a infecção não somente com outros vermes, mas também com protozoários e moléstias causadas por bactérias.
Anatomia patológica
Os fatos que se ligam à infecção com Sch. mansoni conhecem-se pelo exame anatómico macro e microscópico, melhor do que pela observação durante a vida. O resultado desses exames nos permite discutir certas questões que permanecem bastante obscuras.
Tratarei, em primeiro lugar, das observações feitas em animais de experiências, baseando-me em material meu.
Nos primeiros tempos das infecções artificiais de coelhos, cobaias ou ratos brancos, é difícil encontrar os esquistossomos novos, evidentemente porque levam bastante tempo para chegar a seu habitat definitivo. O mesmo se observa em outras experiências helmintológicas. Estados relativamente novos foram encontrados por Leiper no fígado de ratos brancos.
De três semanas para diante pode-se contar com um resultado positivo. Abrindo o animal, percebe-se sem dificuldade no mesentério transparente as veias cheias de sangue e neste os machos contrastando por sua cor branca. Ocupam as ramificações maiores desde o estomago até o reto, sem preferência da última parte. Esmigalhando o fígado dentro de solução fisiológica obtém-se um número aproximadamente igual de vermes. As fêmeas geralmente são encontradas, em número mais ou menos igual, no canal ginecóforo dos machos, mas abandonam este, se o exame for muito demorado.
Nos animais recentemente infectados, as veias, posto que cheias de parasitos, não mostram alterações apreciáveis. O tecido vizinho, o fígado e o intestino não apresentam lesões macroscópicas.
O desenvolvimento completo com produção de ovos demora mais uma a duas semanas. Os ovos não aparecem imediatamente nas fezes, mesmo em infecções fortes, o que prova que o processo de eliminação é geralmente demorado.
Examinando os animais depois de meses podem-se encontrar as veias maiores vazias, mas cortes do fígado e do intestino mostram machos e principalmente fêmeas isoladas em veias menores.
No fígado as fêmeas são encontradas nas pequenas veias interlobulares, mais raramente em capilares dilatadas ou em pequenas artérias, nunca nas vias biliares ou no tecido glandular. Não há reação inflamatória em redor delas, mas os vasos parecem muito cheios de sangue. Os ovos, nos primeiros tempos, são muito mais raros que os cortes dos vermes. Em redor daqueles nota-se freqüentemente uma infiltração com leucócitos. Em infecções intensas, já um pouco mais antigas, todo o tecido intersticial pode ser infiltrado com células redondas, o que se pode considerar com o primeiro estado de um processo cirrótico. As capilares parecem muito dilatadas.
No intestino acham-se os machos perto da serosa; as fêmeas podem penetrar até a submucosa. Os ovos são encontrados em pequenos grupos na mucosa, na base das glândulas e isolados entre estas, mas raramente e sem indicação clara sobre o processo que os faz chegar até a superfície da mucosa.
Em redor dos grupos de ovos há sempre uma infiltração que lembra um tubérculo. Células gigantes formam-se exclusivamente em redor e por dentro de cascas vazias. Células eosinófilas podem ser encontradas no tecido e nos vasos.
Quando a infecção for mais antiga, os ovos podem também ser numerosos na submucosa.
Sobre as lesões, observadas no homem, há uma literatura bastante extensa. A parte mais antiga não distingue entre as duas espécies, encontradas na África, e tanto esta, como a mais moderna, referem-se de preferência a casos que vieram a falecer, depois de terem sido infectados durante muitos anos. Nestes casos os vermes eram raros ou faltavam nos cortes. O que predomina são as lesões causadas pelos ovos retidos e acumulados em quantidade, muitas vezes, fabulosa. Da adição constante de pequenas lesões sem maior importância resultam finalmente alterações extensas e graves das vísceras mais atacadas.
Para os estados anteriores o material é mais raro. Todavia tenho elementos para reconstituí-los, aproveitando observações próprias e outras contidas na literatura do assunto.
As únicas alterações evidentes, observadas por mim em infecções poucas intensas ou mais recentes, eram tumor do baço e infiltração medular dos gânglios mesentéricos, ambos comuns em outras moléstias. Os vermes não aparecem nos vasos do mesentério e o melhor lugar para procurá-lo é no tronco e nas ramificações intra-hepáticas da veia porta.
Em infecções mais intensas e antigas observam-se alterações do fígado que podem parecer-se com cirroses hiper e atróficas e causar icterícia e ascite. O baço, que, geralmente, não é sede direta de vermes e ovos, pode ser hipertrófico ou pequeno. O peritônio e os gânglios linfáticos podem ser comprometidos na vizinhança dos órgãos lesados. Dos outros órgãos apenas o intestino apresenta lesões evidentes. São principalmente uma esclerose geral, mais ou menos acusada, e alterações da mucosa, ambas localizadas principalmente no reto e diminuindo em direção ascendente.15 A diferença de localização, observada no homem e nos animais domésticos, explica-se em grande parte pelos efeitos da gravitação.
Quanto às alterações microscópicas, encontradas nos órgãos, pude verificá-las em material daqui e da Venezuela (mandado por J. Risquez) e compará-las com material muito bom de infecção por Sch. japonicum que recebi dos professores Crowell (vísceras humanas das Filipinas) e Askanazy (fígado de cavalo e de boi infectados). Essas infecções, muitas intensas, mostram bem as lesões análogas.
Em pessoas que sofrem de infecção por Sch. mansoni desde os primeiros anos da vida, o número dos vermes pode ser pequeno, em comparação com o grande número de ovos que se acumulam nos tecidos, sem a menor probabilidade de sair de lá durante a vida do hospedador. São encontrados principalmente na parede intestinal e no fígado, mas existem, posto que em número menor, também em outros órgãos como sejam o mesentério e as suas glândulas linfáticas, o pâncreas, o pulmão e o cérebro. Como também os ovos do Sch. japonicum, são freqüentemente encontrados no tecido intersticial das vísceras, no meio de um tecido fibroso, sem infiltração celular; podem ser mais ou menos calcificados, o que indica uma longa permanência. São esses depósitos que produzem a esclerose que se nota principalmente na última parte do tubo intestinal e no fígado. Neste observa-se, às vezes, uma espécie de cirrose com ou sem esplenomegalia, icterícia e ascite.
A esclerose intestinal dificulta a função do intestino e produz prisão de ventre. É localizada, principalmente, no reto, mas vai muito mais para cima, porque há vários exemplos de apêndices espessados e infiltrados por ovos. Pode estender-se ao intestino delgado, mas as suas lesões geralmente não chamam a atenção do observador.
As lesões macro e microscópicas do intestino foram minuciosamente estudadas por Letulle num caso da Martinica, certamente infectado apenas com Sch. mansoni, posto que o autor fale também, aliás de modo vago, em ovos com espinho terminal. Os processos que ele encontrou estão de acordo com as descrições de outros autores que observam casos especialmente graves. Parte deles pode ser verificada em casos mais leves. Na infecção com Sch. japonicum que freqüentemente é de grande intensidade, encontram-se lesões muito parecidas.
Letulle descreve ulcerações superficiais da mucosa que se distinguem daquelas produzidas pelas amebas. Em outros lugares há uma proliferação que conduz a tumores polipóides e pedunculados com caráter de adenomas. Podem ser atravessados por um eixo fibroso e a superfície pode ser ulcerada.
As glândulas de Lieberkuehn podem ser destruídas por ulceração, atrofia e dilatação cística, seguida de supuração, ou tornam-se hipertrofiadas ou hiperplásticas. O epitélio mostra as alterações correspondentes, sem, todavia, entrar em proliferação atípica.
O tecido intersticial da mucosa também prolifera, às vezes extraordinariamente. As capilares podem aparecer muito numerosas e dilatadas. No processo de hipertrofia, o tecido intersticial pode afastar as glândulas e alargar-se na superfície da mucosa, abaixo do epitélio quando este não for destruído. Nunca se observam hemorragias intersticiais, nem depósitos de pigmento.
A muscular da mucosa não é atingida pela ulceração e não mostra alterações, além de uma hiperplasia.
A submucosa transforma-se gradualmente em tecido esclerótico com desaparecimento das células adiposas.
As camadas da muscularis propria não mostram alterações, a não ser uma hipertrofia geral, verdadeira ou aparente.
A serosa era também esclerosada no caso de Letulle, mas faltavam os depósitos parasitários, observados em outros casos.
Os vasos linfáticos, além de uma infiltração celular perto dos focos de inflamação e ulceração, não se mostram alterados e geralmente não são aproveitados para a migração dos vermes e dos ovos. Os folículos linfáticos não participam no processo parasitário. Os nervos e gânglios também não mostram lesões.
As veias (com exceção dos trechos que passam pelas camadas musculares) mostram um processo especial e característico de endoflebite vegetante que pode chegar a ser obliterante. A cavidade restante das veias é geralmente excêntrica, porque a lesão se estende também às veias do mesentério e até as veias da bacia que não fazem parte da circulação portal. Aqui, nota-se também uma hiperplasia da média.
Postura e migração dos ovos
As questões que se impõem são: como é que os ovos chegam ao tecido extravascular e como podem aparecer nas dejeções dos hospedadores? Essas questões que, na verdade, são de solução difícil, não parecem ter incomodado a maioria dos autores. Declaram, seguindo Letulle, que as fêmeas procedem nas pequenas veias até um ponto em que enchem completamente o calibre diminuído e que lá depositam os ovos dentro dos vasos. Esses ovos, em razão da pressão aumentada pela oclusão da veia, penetrariam pela parede vascular e de lá se encaminhariam para os diferentes pontos em que são encontrados. Os ovos, observados no pulmão, cérebro etc., seriam carregados pela corrente circulatória.
Qual será a força que impele esses ovos, elementos relativamente grandes e sem movimento próprio, a progredir nos tecidos? Aqui os autores certamente tinham em vista os ovos com espículo terminal, o qual podia facilitar o progresso numa direção, enquanto o outro pólo, completamente rombo, impediria o movimento retrógrado. Mas a espícula lateral não pode favorecer o progresso e, quando muito, pode opor-se a todos os movimentos, em que o pólo inerme não vai na frente. E o ovo do Sch. japonicum nem espículo tem. É verdade que se descreveu um espinho minúsculo, mas este geralmente não é terminal e falta muitas vezes, tanto nas preparações feitas com dejeções, como nos cortes dos tecidos. Parece ser pouco constante. A ponta é muitas vezes recurvada e geralmente não é muito aguda.
Ninguém parece ter-se lembrado que seria muito mais fácil para o verme perfurar ou usar a parede vascular e passar por ela, se não com todo o corpo, pelo menos com a parte anterior; todavia, a posição da abertura genital e a analogia com outros entozoários falam muito mais nesse sentido. A própria endoflebite obliterante (que não ocupa geralmente todo o contorno da veia) parece indicar uma lesão localizada.
A verdade é que o processo da oviposição não se deixou surpreender nas preparações, a julgar pela literatura e pelas observações próprias, feitas por mim em bastante material, mas o mesmo se pode dizer da postura nas veias.
Compreende-se mais facilmente que os ovos, tão freqüentemente observados na base da mucosa, possam ser dirigidos para a superfície, posto que a circulação venosa e linfática não favoreça esse processo. A eliminação, na regra, me parece ser feita no tecido mole que se acha entre as glândulas de Lieberkuehn, e não por estas; a única força motriz que pode explicá-la é a renovação desse tecido que deve se fazer no mesmo sentido. Nunca se observa um processo de supuração que poderia explicar a eliminação e, quando há ulceração, esta é completamente superficial.
Não posso aderir à opinião de Letulle que pensa que as glândulas de Lieberkuehn, dilatadas e, às vezes, supuradas, possam servir para eliminar ovos e embriões. Tampouco posso admitir que os ovos vivos tenham todos passado pelos adenomas verrucosos ou polipóides que se encontram na mucosa em casos velhos. Estes, mais provavelmente, forneceram os ovos degenerados e calcificados que abundam nas dejeções de certos casos.
Quanto aos ovos, depositados na submucosa e debaixo da serosa intestinal, no fígado, pâncreas, baço, pulmão e cérebro, a maior parte não pode chegar ao ambiente em estado vivo, senão no caso da morte do hospedador. Acumulam-se nos tecidos em que são encontrados com maior freqüência e, depois de produzir por breve tempo uma reação inflamatória, ficam presos por dentro de um tecido conectivo cicatricial, sem sinal de reação. Sobrevém a calcificação depois de um período indeterminado, mas provavelmente sempre muito longo; talvez indique a morte definitiva do ovo.
Não me consta que ovos vivos tenham sido achados na bile ou no suco pancreático. Examinei algumas vezes o conteúdo da vesícula biliar com resultado sempre negativo. Nos cortes, os ovos nunca aparecem nos canalículos biliares.
Conhecemos outros parasitos que depositam os seus ovos em vísceras. Há principalmente um Trichosomum cujos ovos são muito comuns no fígado dos ratos domésticos e já por várias vezes foram confundidos com coccídios. Nesse caso, não há a menor dúvida de que o verme mesmo deposita os ovos, morrendo depois no mesmo lugar. Os ovos só chegam ao ambiente se o hospedador for comido ou morrer de outro modo.
Ao lado de ovos, aparentemente vivos, mas pouco desenvolvidos, e outros calcificados, não é raro encontrar cascas vazias, das quais deve ter escapado um embrião, como indica a forma e posição típica da abertura e a formação de células gigantes. Esses ovos são encontrados em várias situações e não somente perto das glândulas de Lieberkuehn, como se podia deduzir da descrição de Letulle, que considera o escapamento do embrião pela cavidade dessas glândulas como um meio normal da propagação da infecção. Convém dizer que nem ele nem outros autores conseguiram surpreender um embrião livre nas preparações. Pelas minhas observações, é muito duvidoso que embriões que porventura saem dos ovos nos tecidos, consigam sair do intestino em estado vivo; mesmo assim pereceriam logo, se as dejeções não chegavam sem muita demora em contato com água. Não acredito que o fato, aliás, raro, de o embrião abandonar a casca do ovo, ainda nos tecidos, tenha qualquer vantagem para a propagação da espécie, mas nem por isso é muito notável e difícil de explicar.
Em todos os casos pode-se afirmar que na esquistossomatose, como em muitas outras afecções verminosas, há um enorme desperdício de ovos, que aqui nem é compensado por uma grande produção. A verdadeira compensação é fornecida pela extraordinária multiplicação no organismo do caramujo infectado.
A eliminação de ovos maduros, intimamente misturados com as dejeções e não acompanhados de mucosidades e de sangue, é o que se observa na grande maioria dos casos. Essa eliminação (que é constante e assegura a conservação da espécie) indica que há um processo relativamente rápido e seguro que conduz os ovos por fora do organismo infectado, sem produzir lesões apreciáveis, e assim se explica como essa infecção facilmente passa despercebida.
Prognóstico, terapêutica e profilaxia de esquistossomatose
Das nossas observações anteriores já se pode deduzir que a esquistossomatose, observada entre nós, é de natureza bastante benigna. González Martínez estima em 45% a proporção de infectados que não apresentam sintomas acusados e creio que, entre nós, a proporção dos casos que passam completamente despercebidos seja antes maior do que menor. De outro lado não é certo que o processo parasitário possa ser curado ou melhorado por meios terapêuticos16 e tenho observações que indicam que os vermes podem permanecer vivos no corpo humano durante muitos anos. Assim é a prevenção e não a cura que deve formar o objeto principal dos nossos cuidados.
A infecção sempre se produz por meio da água, seja que esta sirva para bebida ou que venha em contato com o tegumento externo. Sendo a existência de Planorbis nela a conditio sine qua non da infecciosidade, é claro que a profilaxia mais natural deverá, em primeiro lugar, ser dirigida contra esse hospedador intermediário. Limpando os reservatórios ou caixas d’água, quer dizer, retirando a lama e a vegetação aquática e apanhando os exemplares que vêm à tona, pode-se livrar as águas desses moluscos, mas, precisamente lá onde o perigo é maior, essas medidas serão impossíveis ou pouco práticas.
Há outras medidas que tendem a evitar a infecção dos caramujos; bem aplicadas fariam ao mesmo tempo desaparecer a opilação (que é mais generalizada e mais perigosa que a esquistossomatose). Consistem em evitar a contaminação do solo e das águas por excrementos humanos. É claro que esgotos despejados em rios usados para banhos e lavagem de roupa não correspondem a esse quesito.
Na necessidade de usar água suspeita, é suficiente que esta seja guardada durante 24 a 48 horas, para perder o poder infectante. De manhã cedo há pouca probabilidade de que a água contenha cercárias ativas, de modo que estas, tiradas pouco abaixo da superfície e guardadas mais algumas horas, certamente perderão o poder infeccioso. Este naturalmente é destruído também pelo aquecimento (que não precisa chegar ao ponto de ebulição) ou por desinfetantes. Segundo Leiper basta levar a água a 50oC ou juntar um grama de bisulfato de sódio para um litro de água.
Perigo dos banhos em águas estagnadas
Os Planorbis encontram-se em lagoas ou águas fluviais, mais ou menos estagnadas, não sujeitas à dessecação completa e geralmente caracterizadas por vegetação aquática fixa ou flutuante. Essas águas, quando ingeridas, são perigosas, mas por causa da natureza são menos usadas para beber. O contato com a pele nua dos braços e pernas, por exemplo, na ocasião de pescar ou lavar roupa, pode facilmente produzir infecções mais ou menos intensas, mas o perigo maior está na imersão completa do corpo na ocasião de banhos um tanto prolongados, porque as probabilidades de infecção crescem em relação com a superfície exposta e o tempo de exposição. Assim, o hábito de banhar-se diariamente nessas águas infecciosas poderá produzir infecções muito intensas.
Os observadores de hoje são quase unânimes em responsabilizar a infecção cutânea pelo maior número das infecções observadas. Já verifiquei a história de vários doentes que costumavam banhar-se em águas paradas com vegetação aquática onde havia aruás (Ampullaria). Esse molusco que, por seu maior tamanho e por ser comestível, chama mais a atenção, pode servir de indicador para águas suspeitas. Alguns doentes até haviam reparado na existência de numerosos Planorbis. Em alguns lugares, como em Aracaju, eles são tão abundantes que são usados para alimentação dos porcos, nas ocasiões em que as águas baixam. Tanto em Aracaju como em Laranjeira há uma lagoa chamada dá coceira, porque os que lá tomam banho sentem coceira depois. Ora, essa coceira (como se verifica em vários animais e principalmente no rato branco) é sintoma característico da penetração dos esquistossomos.
Para os banhos se tornarem perigosos, é preciso que sejam as águas contaminadas com ovos de Schistosomum, provenientes do intestino de homens ou animais infectados. Essa contaminação pode ser contínua ou apenas ocasional, devida a chuvas e enchentes. Também é preciso que nessas águas haja caramujos infectáveis. Dada uma temperatura bastante elevada, bastam então 4 a 5 semanas para que haja caramujos infectados e capazes de fornecerem cercárias durante dois a três meses, de modo que, com uma infecção bimensal, as águas seriam sempre suspeitas.
A experiência prova que as cercárias não saem a qualquer hora. De manhã cedo custa observar um exemplar em água que contém caramujos infectados, quando de tarde, depois de algumas horas de insolação ativa, são abundantíssimas. Assim um banho curto de manhã quase não oferecerá perigo, quando um banho demorado, durante ou depois das horas mais quentes, fornecerá extraordinariamente uma infecção múltipla. A estação seca, com a sua insolação muito maior, deve trazer diminuição de água, com aumento de sua temperatura, de modo que as infecções serão adquiridas principalmente nesse tempo.
Bibliografia
A literatura sobre os esquistossomos e os efeitos do seu parasitismo é muito extensa. Só o relatório de Leipper numera 562 trabalhos (alfabeticamente), sem incluir os mais recentes. Outros autores deram listas que incluem mais alguns títulos. Aqui só cito os trabalhos que mais estreitamente se referem a meu assunto, principalmente aqueles que foram citados ou estudados. Não menciono a maioria dos tratados de helmintologia, moléstias tropicais e de medicina geral por serem bastante conhecidos ou dispensáveis.
A bibliografia do Sch. japonicum é mais extensa porque se trata de um assunto moderno e estreitamente ligado ao nosso. De fato o Sch. mansoni e o japonicum produzem sintomas muito semelhantes, mas no caso do japonicum o estudo é mais fácil, por serem as infecções geralmente mais puras, mais agudas e mais intensas. Assim o seu estudo é de grande utilidade.
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VII - Bibliografia
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Explicação das estampas 37-43.
Estampa 37 (Figs. 1-8)
Fig. 1. Casal do Schistosomum haematobium. A fêmea mostra muitos ovos com espículo terminal. X28. Copiado de FRITSCH.
2. Casal de Schistosomum haematobium. A fêmea mostra o intestino ramificado até perto da extremidade caudal. Copiado de BILHARZ.
3. Casal de Schistosomum mansoni; preparado em bálsamo mostrando bem a ramificação do intestino, que nos dois sexos se une antes do meio do corpo. X40. Original.
4. Terço anterior de uma fêmea de Schistosomum mansoni com um ovo de espinho lateral. X40. Original. Preparação colorida com hematoxilina.
5. Macho de Schistosomum mansoni mostrando o aparelho testicu-lar. X20. Original.
6a, b e c. Macho de Schistosomum mansoni mostrando o aparelho testicu-larem três posições diferentes. Original.
7a e b. Mostram o mesmo de dois outros machos com a aparência comum de oito vesículas. Não se distingue uma vesícula seminal. X70. Original.
8. Macho de Sch. haematobium, copiado de Bilharz.
Estampa 38 (Figs. 9-38)
Fig. 9 - 14. Ovos anormais. 9-11: com a casca alongada no pólo anterior, podendo simular um espículo terminal; 12: ovo com 2 espículos; 13: com cristais na casca; 14: ovo calcificado. X150. Todos os ovos foram observados em fezes de homens infectados no Norte do Brasil.
15. Ovo normal de Schistosomum mansoni mostrando o embrião. X400.
16. Embrião observado algum depois da saída. Preparação colorida. X400.
17. Embrião que não conseguiu penetrar, muito tempo depois da saída. X400.
18. Penetração dos miracídios na antena. X20. 2 miracídios já penetraram.
19. Planorbis olivaceus com antenas normais; 20 e 21: com as antenas infectadas; os exemplares não são adultos. Tamanho anterior.
38-38. Aparência de antenas em vários degraus de infecção. As figuras 19 a 27 em tamanho natural; as outras (28 a 38), um tanto aumentadas. A figura 32 representa uma antena normal.
Todas as figuras destas estampa são originais e, com exceção da figura 16, tiradas de preparações observadas a fresco, sem coloração.
Estampa 39. (Figs.39-47)
Fig. 39a. Esporocisto novo dentro da antena, mostrando ainda os órgãos tubulares vibráteis e o epitélio vibrátil periférico, em vias de destacar-se; b: o mesmo desenvolvimento em vias de formar esporocistos secundários. X100.
40. Conteúdo de um esporocisto primário quase maduro escapando da antena comprida. X150.
41. Corte de antena contendo um esporocisto primário quase maduro. Preparação colorida por hematoxilina. X140.
42. Esporocisto secundário. X500.
45-45. Esporocistos secundários das vísceras de Planorbis. Iluminação lateral.
47-47. Os mesmos vistos por transparência.
Todas as figuras desta estampa são originais, tiradas de preparações e observadas em estado natural, com exceção de Fig. 41.
Estampa 40. (Figs.48-63)
Fig. 48. Corte de fígado de Planorbis infectado mostrando uma seção longitudinal de uma cercária quase madura. Preparação colorida. X250.
50-50. Seções de esporocistos secundárias do fígado de um Planorbis infectado. X700.
51. Cercárias vivas de Sch. mansoni. X30.
52 a 61. Cercárias do mesmo, tiradas de várias preparações. X120.
62. Cercária do mesmo. Desenho combinado de observações de cercárias vivas.
63. Corte colorido mostrando, na seção oblíqua de uma cercária, os dutos glandulares entortilhados e as células glandulares superiores.
Estampa 41. (Figs.64-70)
Fig. 64. Dicranocercaria ocellifera, viva. X250.
65. A mesma colorida em glicerina. X250.
66. A mesma de um preparado não colorido. X250.
68-68. Dicranocercaria valdefissa. De um preparado não colorido. X250.
69. Corte de pele de porco mostrando um esquistossômulo penetrado. Preparado colorido. X600.
70. Alça intestinal de cobaia infectada mostrando as veias mesentéricas dilatadas e cheias de parasitos. Conservação em formol (10%). Tamanho natural.
Estampa 42.
Fig.1 e 2: Cortes de fígado de caramujos infectados.
3: Cortes do mesentério de uma cobaia infectada, mostrando os esquistossomos dentro das veias em seção longitudinal e transversal.
4 e 5: Corte do fígado de uma cobaia infectada, mostrando uma seção transversal de uma fêmea de Sch. mansoni.
As figuras são fotografias tiradas de preparações coloridas.
Estampa 43
Fig. 1a-d. Exemplar adulto de Planorbis olivaceus. - Casca de cima, de baixo, em perfil e em corte; exemplar adulto com a metade superior da casca removida, ficando todo o animal exposto (desenho combinado); e corte de um exemplar pequeno e aberrante. Tamanho normal.
2. Casca de Planorbis guadalupensis, a de cima, d de baixo, b em corte X2; c tamanho natural.
3. Casca de Planorbis centimetralis; a-d: como na Fig. 2.
4. Casca de Planorbis boissyi do Egito; a-d: como nas figs. 2 e 3.
Nesta estampa, os cortes das cascas, quando horizontais, mostram a boca à direita do espectador. Sendo a casca considerada sinistral, assim o lado ventral está por cima e o dorsal para baixo. Nos cortes em posição vertical a abertura da casca está em baixo.
Nota: As estampas 42 e 43 foram tiradas de fotografias feitas pelo Sr. J. Pinto, fotógrafo do Instituto.
Aditamento (jan. 1920).
Sobre o tratamento de doentes de Schistosomum pelo tartarato de antimônio. Christopherson fez várias publicações, das quais cito uma em colaboração com J. R. Newlove no Journ of Trop. Med., v.XXII, p.128, 1919, que se refere ao tratamento de 70 casos. Declara que os resultados, em parte conferidos durante dois anos, foram ótimos.
O autor refere-se principalmente ao Sch. haematobium e recomenda uma dose total de 25 a 30 grãos, aprox. dois gramas.
Começa com a injeção de meio grão em cerca de três gramas de soro fisiológico. As injeções que devem ser feitas nas veias são repetidas de 2 em 2 dias, aumentando de três centigramas cada vez, até alcançar 12 a 15 centigramas (5 grãos). Depois de alguns dias desaparece o sangue na urina. Duas semanas depois de se ter chegado a 20 grãos, os ovos eliminados são estéreis.
Esses resultados precisam ser confirmados em relação ao Sch. mansoni. De uma experiência, feita aqui em cobaia, resulta que não se pode obter cura com poucas doses, mesmo quando estas forem relativamente grandes. O tratamento há de ser forçosamente demorado, quando é feito pelo método indicado, e não poderá ser abreviado, visto que se trata de uma substância bb. que deve ser usada com muito cuidado. [N.A.]