Contribuição ao conhecimento do ciclo evolutivo dos holostomídeos*
Nesta comunicação preliminar o autor descreve observações originais de grande interesse biológico. Referem-se aos holostomídeos, família bastante aberrante dos trematódeos.
Certas formas larvais de trematódeos, conhecidas pelo nome de Tetracotyle foram observadas em vários animais, sendo consideradas, com razão, como a última fase dos holostomos1 anterior ao estado adulto. A opinião reinante e aceita nos tratados modernos atribui aos holostomídeos um desenvolvimento direto. Assim cada Tetracotyle seria formado por um miracídio saído de um ovo de Holostomum, ao contrário do que se dá nos outros trematódeos, que têm fases de multiplicação intercaladas. Baseia-se esta opinião no tamanho dos ovos e na impossibilidade de descobrir as cercárias dos holostomídeos. Segundo o autor, estes argumentos não procedem porque o tamanho dos ovos nada tem de extraordinário, e as cercárias existem. Foram descritas por vários autores que deixavam, entretanto, de reconhecer que pertenciam ao ciclo evolutivo dos holostomídeos.
Por ocasião dos seus trabalhos sobre o Schistosomum mansoni, o autor observou várias cercárias de cauda bifurcada que se distinguiam das cercárias dos esquistossomídeos por possuírem um bulbo faríngeo e a cauda mais profundamente dividida, sem que os ramos laterais formem uma peça separada. Nascem de esporocistos, encontrados em moluscos de água doce dos gêneros Planorbis, Spirulina e Physa, e não penetram na pele de mamíferos e aves. O seu segundo hospedador, que é apenas intermediário, é encontrado entre os moluscos, vermes e larvas de batráquios.
O autor acompanhou a evolução de três espécies destas cercárias denominadas, provisoriamente, Dicranocercanias molluscipeta, D. gyrinipeta e D. bdellocystis. A primeira penetra em caramujos de água doce, a segunda, em girinos, e a terceira, em sanguessugas. A penetração pela pele foi observada em todas as três, mas pode também se dar pelas cavidades internas.
Ao penetrarem, as cercárias abandonam a cauda, mas ao contrário do que ocorre nas cercárias de cauda simples, não se encistam logo. Passam por um período precístico, que dura vários dias, durante os quais vivem em estado livre nos tecidos dos hospedadores. A princípio finos e transparentes, os pequenos holostomos crescem muito, tornando-se mais largos e opacos. Os capilares do sistema excretório enchem-se de grânulos. As ventosas são pequenas e pouco distintas, mas percebe-se muitas vezes um rudimento no segundo segmento, tão conspícuo nos holostomos adultos. A última forma precística é longa e larga, mas pouco grossa. No encistamento, expelem bastante material que se transforma em cisto gelatinoso de paredes espessas. Nos cistos, a forma de Tetracotyle torna-se cada vez mais evidente.
Fazendo ingerir estes cistos por hospedadores apropriados, encontrados entre as aves, o autor obteve holostomos adultos.
Os holostomídeos eram os últimos endotrematódeos aos quais se atribuía uma evolução direta, depois que esta ficou excluída para os esquistossomos. Sendo aceitas as conclusões do autor, ficará, pois, definitivamente eliminada esta hipótese para todos os endotreraídeos,2 tornando-se geral a regra que os miracídios penetram em moluscos onde se formam esporocistos, rédias e cercárias ou excepcionalmente dístomos sem cauda, isto é, que todos os endotrematódeos têm um desenvolvimento indireto, o que forma um interessante subsídio à biologia.
O autor observou muitas outras espécies de cercárias com cauda dividida que corresponderão provavelmente a outros gêneros de holostomídeos.
G. A.