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Como era

Art. 282. À exceção do flagrante delito, a prisão não poderá efetuar-se senão em virtude de pronúncia ou nos casos determinados em lei, e mediante ordem escrita da autoridade competente.

Como ficou

Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: I – necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; II – adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado. § 1.º As medidas cautelares poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente. § 2.º As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público. § 3.º Ressalvados os casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, o juiz, ao receber o pedido de medida cautelar, determinará a intimação da parte contrária, acompanhada de cópia do requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos em juízo. § 4.º No caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva (art. 312, parágrafo único). § 5.º O juiz poderá revogar a medida cautelar ou substituí-la quando verificar a falta de motivo para que subsista, bem como voltar a decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem. § 6.º A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319).

3.1 INTRODUÇÃO DA REFORMA TRAZIDA PELA LEI 12.403/2011

Conforme havíamos sugerido, desde a primeira vez em que tecemos comentários a seu respeito (Anexo do Código de Processo Penal comentado, 9.ª e 10.ª edições), o Projeto de Lei 4.208-F de 2001 merecia ser aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado pelo Presidente da República, pois era muito superior à legislação vigente em matéria de prisão cautelar e liberdade provisória.

As inovações introduzidas, na maioria das hipóteses, estão em perfeita harmonia com o texto constitucional de 1988 e com a reforma processual penal de 2008. Por outro lado, a superlotação dos presídios, em particular, dos locais que abrigam presos provisórios, esperava a modificação do Código de Processo Penal para que houvesse maior coerência na aplicação de medidas cautelares eficientes, sem necessidade de automática segregação. A sociedade em geral somente tem a ganhar com a aprovação do texto ora comentado. Seus eventuais equívocos serão, certamente, suplantados pelos acertos.

Inicialmente, introduz-se no Título IX, além da prisão e da liberdade provisória, a expressão medidas cautelares, dando ensejo à criação de várias alternativas à prisão, que podem ter resultado positivo, quando aplicadas em casos concretos. Aliás, vale ressaltar, muitas delas já constituem penas alternativas (v. g., art. 319, II, CPP, em confronto com o art. 47, IV, CP) ou condições para a suspensão condicional da pena (v. g., art. 319, I, CPP, em confronto com o art. 78, § 2.º, c, CP). Ora, se a legislação brasileira considera tais medidas eficientes para punir o indivíduo, naturalmente não se pode negar o seu caráter intimidativo para efeito de acautelamento no âmbito processual penal.

Na jurisprudência:

TJRJ: “Com o advento da Lei 12.403/2011, o Poder Judiciário passou a contar com mecanismos diversificados para preservação da ordem pública e da efetividade de suas decisões, traduzidos no elenco de outras medidas cautelares, que podem substituir a ordem prisional, oferecendo soluções mais adequadas ao caso concreto.” (HC 0044260-46.2012.8.19.0000-MG, 1.ª Câm. Crim., rel. Antonio Jayme Boente, 27.08.2012).

TJRS: “Com o advento da Lei 12.403/2011, a prisão preventiva é a última cautelar a ser aplicada. Antes dela, devem ser verificadas a necessidade e a adequação das medidas alternativas à prisão preventiva. Portanto, a prisão preventiva ocupa o último patamar da cautelaridade, na perspectiva de sua excepcionalidade, cabível quando não incidirem outras medidas cautelares (art. 319 do CPP). O artigo 282, § 6.º é claro: a prisão preventiva será aplicada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar. Não se decreta a prisão preventiva para depois buscar alternativas. Após, verificado que não é o caso de manter o sujeito em liberdade sem nenhuma restrição (primeira opção), há que ser averiguada a adequação e necessidade das medidas cautelares alternativas ao recolhimento ao cárcere (segunda opção). Somente quando nenhuma dessas for viável ao caso concreto é que resta a possibilidade de decretação da prisão processual (terceira opção).” (HC 70049556533-RS, 3.ª Câm. Crim., rel. Nereu José Giacomolli, 09.08.2012).

3.2 CONCEITOS DE PRISÃO, MEDIDAS CAUTELARES E LIBERDADE PROVISÓRIA. ESPÉCIES DE PRISÃO

Em primeiro plano, fundado no perfil do estado democrático de direito, deve-se ressaltar constituir a liberdade a regra, no Brasil; a prisão, a exceção. O direito à liberdade, como um dos principais direitos humanos fundamentais, somente pode ser cerceado, de maneira legítima, quando houver a aplicação da prisão-pena, fruto de condenação, com trânsito em julgado.

Porém, em caráter excepcional, buscando-se assegurar o curso do processo, sem qualquer espécie de deturpação, além de proporcionar, em situações específicas, segurança à sociedade, pode-se decretar a prisão cautelar.

Prisão é a privação da liberdade, tolhendo-se o direito de ir e vir, por meio do recolhimento da pessoa humana ao cárcere. A prisão-pena advém da imposição de sentença condenatória, com trânsito em julgado. A prisão cautelar é fruto da necessidade de se obter uma investigação ou instrução criminal produtiva, eficiente e livre de interferências. Embora ambas provoquem a segregação do indiciado ou acusado, a primeira constitui efetiva sanção penal; a segunda não passa de uma medida de cautela, com o fim de assegurar algo. Não é um fim, mas um meio.

Constituem espécies de prisão processual cautelar, quanto ao momento de decretação: a) prisão temporária; b) prisão em flagrante; c) prisão preventiva; d) prisão em decorrência de pronúncia; e) prisão em decorrência de sentença condenatória recorrível; f) condução coercitiva de réu, vítima, testemunha, perito ou de outra pessoa que se recuse, injustificadamente, a comparecer em juízo ou na polícia. Neste último caso, entendemos tratar-se de nítida modalidade de prisão (quem é conduzido coercitivamente pode ser algemado e colocado em cela até que seja ouvido pela autoridade competente), razão pela qual somente o juiz pode decretá-la. Aliás, nessa ótica, cumpre ressaltar o disposto no art. 3.º da Lei 1.579/1952 (modificada pela Lei 10.679/2003): “Indiciados e testemunhas serão intimados de acordo com as prescrições estabelecidas na legislação penal. § 1.º Em caso de não comparecimento da testemunha sem motivo justificado, a sua intimação será solicitada ao juiz criminal da localidade em que resida ou se encontre, na forma do art. 218 do Código de Processo Penal”. Se as Comissões Parlamentares de Inquérito, com poder investigatório, segundo a Constituição Federal (art. 58, § 3.º), próprio das autoridades judiciais, não devem ter outro procedimento senão o de requerer ao magistrado a intimação e condução coercitiva da testemunha para prestar depoimento, logo, nenhuma outra autoridade pode prender a testemunha para conduzi-la à sua presença sem expressa, escrita e fundamentada ordem do juiz competente (art. 5.º, LXI, CF).

A medida cautelar, tal como estampada no Código de Processo Penal, é um instrumento restritivo da liberdade, de caráter provisório e urgente, diverso da prisão, como forma de controle e acompanhamento do acusado, durante a persecução penal, desde que necessária e adequada ao caso concreto. Estão previstas no art. 319 do CPP.

A liberdade provisória é um benefício concedido ao preso em flagrante, não sendo a prisão convertida em preventiva, nem relaxada por ilegalidade. Admite a fixação de fiança ou de outras condições diversas do pagamento de valor ao Estado. Pode-se estranhar a terminologia utilizada (liberdade provisória), pois o estado de inocência é o prevalente, assim como a liberdade é a regra. Logo, em tese, não teria sentido denominar esse favor legal como provisório. Mais adequado seria mencionar a hipótese de liberdade fiscalizada.

Na jurisprudência:

STJ: “O Estatuto Processual Penal admite a adoção de medidas cautelares diversas da prisão, observando-se a adequação e necessidade de tais imposições. É de ver que, no processo penal de cariz democrático, a liberdade é a regra, a qual deve ser prestigiada diuturnamente.” (RHC 42.049-SP, 6.ª T., rel. Maria Thereza de Assis Moura, 17.12.2013, v.u.).

STJ: “A liberdade, não se pode olvidar, é a regra em nosso ordenamento constitucional, somente sendo possível sua mitigação em hipóteses estritamente necessárias. Contudo, a prisão de natureza cautelar não conflita com a presunção de inocência, quando devidamente fundamentada pelo juiz a sua necessidade, como é o caso dos autos.” (RHC 38.537-RS, 5.ª T., rel. Marco Aurélio Bellizze, 06.08.2013, v.u.).

3.3 MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS À PRISÃO CAUTELAR: REQUISITOS PARA A DECRETAÇÃO E FORMALIDADES

Em linhas gerais, os requisitos para a aplicação das medidas cautelares concentram-se, basicamente, na necessidade e na adequação, como se pode constatar da leitura dos incisos I e II do art. 282.

Conferir: TJMG: “Com o advento da Lei 12.403/2011, entende-se que para a aplicação das medidas cautelares, dentre as quais se destaca a prisão preventiva, deverá ser observado o binômio necessidade e adequação.” (HC 0747340-42.2012.8.13.0000-MG, 6.ª Câm. Crim., rel. Jaubert Carneiro Jaques, 24.07.2012).

TJRJ: “Com o advento da Lei 12.403/2011, antes de decretar a custódia preventiva, é necessário examinar a possibilidade de aplicação de medida cautelar mais branda. Essas medidas seguem os princípios da necessariedade e adequação (à gravidade do delito e circunstâncias do fato).” (HC 0037299-89.2012.8.19.0000-MG, 7.ª Câm. Crim., rel. Marcia Perrini Bodart, 31.07.2012).

TJPB: “Conforme consta do art. 282 do CPP, consoante as alterações trazidas pela Lei 12.403/2011, a medida cautelar deve ser aplicada com observação da necessidade de aplicação da lei penal e também com adequação à gravidade do crime, suas circunstâncias e condições pessoais do acusado, o que não se coaduna com o caso ora analisado.” (HC 20020110311640004-PB, Câm. Crim., rel. João Benedito da Silva, 31.05.2012).

Não se pode olvidar que as medidas cautelares, previstas no Título IX do Código de Processo Penal, envolvem várias modalidades de restrições à liberdade individual, desde a mais grave, consistente na própria prisão, até a mais leve, baseada na proibição de contato com determinada pessoa. Por isso, não podem ser decretadas sem base legal e fática, uma vez que, acima das regras processuais, encontra-se o princípio constitucional da presunção de inocência (art. 5.º, LVII, CF).

O estado de inocência pressupõe que as eventuais restrições à liberdade individual sejam, efetivamente, indispensáveis. Eis o primeiro caráter das novas medidas, que se associam à prisão cautelar: necessariedade.

O art. 282, I, abraçando esse requisito, empresta dois fatores diretamente ligados à prisão preventiva (art. 312, CPP), embora com módicas alterações, que são: garantia de aplicação da lei penal e conveniência de investigação ou instrução criminal. Além desses, cria um novo fator, consistente na evitabilidade da prática de infrações penais, nos casos expressamente previstos em lei.

Note-se não se referir o mencionado inciso aos outros dois fatores de decretação da prisão preventiva, que são a garantia da ordem pública e a garantia da ordem econômica. Quer-se crer, por uma questão de lógica, que somente a prisão preventiva pode ser cabível nessas hipóteses.

Aliás, há sentido nessa interpretação, pois se o indiciado ou réu coloca em risco a segurança pública, não há cabimento para a substituição da prisão por medida cautelar alternativa, muito menos abrangentes e eficazes.

Outro ponto importante, não mencionado pelo art. 282, diz respeito à prova da materialidade e indício suficiente de autoria para que se possa decretar qualquer medida cautelar, diversa da prisão cautelar. Pode-se argumentar sob dois prismas: a) seguindo-se a linha da prisão preventiva, esses dois requisitos são também indispensáveis para outras medidas cautelares (art. 319, CPP); b) seguindo-se o trajeto da prisão temporária, tais requisitos não são indispensáveis para as medidas cautelares do art. 319.

Preferimos a segunda posição, pois defendemos que a prisão temporária, um substitutivo à antiga prisão para averiguação, não depende da prova inequívoca da materialidade e de indício suficiente de autoria para que seja decretada (Leis penais e processuais penais comentadas, Prisão Temporária, nota 3 ao art. 1.º). Aliás, se ambos os fatores fossem considerados fundamentais para a temporária, essa modalidade de prisão cautelar se igualaria à preventiva e perderia a razão de ser. Portanto, basta seguir o preceito básico de que quem pode o mais, pode o menos. Sendo possível decretar a prisão temporária sem a prova segura da materialidade ou de indício suficiente de autoria, por óbvio, pode-se deferir medida cautelar de menor peso, como as previstas pelo art. 319 do CPP.

O segundo caráter das novas medidas cautelares liga-se à adequabilidade. Esse fator, sem dúvida, concerne ao princípio constitucional da proporcionalidade. Observa-se, cada vez mais, a vinculação e a integração entre os princípios constitucionais penais e processuais penais. Nesse prisma, já havíamos apontado a umbilical ligadura entre a proporcionalidade e a individualização da pena, além de indicar a união entre legalidade e prisão cautelar (nossa obra: Princípios constitucionais penais e processuais penais). Agora, nota-se o vínculo entre as medidas cautelares e a proporcionalidade, ou seja, tal como se fosse uma autêntica individualização da pena, deve-se analisar o fato e seu autor, em detalhes, para aplicar a mais adequada medida cautelar restritiva da liberdade. Cuida-se da individualização da medida cautelar, vez que existem várias à disposição do magistrado para a aplicação ao caso concreto.

Quanto aos requisitos de adequabilidade, o primeiro deles concerne à gravidade do delito. É preciso avaliá-la concretamente e não em abstrato; do contrário, cometer-se-á o mesmo erro, que tem sido criticado pelos Tribunais Superiores, inclusive com a edição de súmulas (Súmula 718, STF; Súmula 440, STJ), em relação à escolha do regime de cumprimento da pena. Noutros termos, não se pode eleger o regime inicial de cumprimento da pena (fechado, semiaberto ou aberto), de acordo com a opinião do julgador em relação à gravidade abstrata do delito, vale dizer, exemplificando, tratando-se de roubo, crime grave, o regime inicial deve ser sempre o fechado.

Repetindo-se o equívoco suprarreferido, somente para argumentar, qualquer delito de roubo comportaria a decretação de medidas cautelares, previstas no art. 319 do CPP, caso se levasse em consideração a abstrata gravidade do crime ou a mera opinião do juiz.

Deve-se avaliar a gravidade real da infração, podendo-se decretar – ou não – medidas cautelares em crimes como roubo, extorsão, homicídio etc.

Aliás, se tais delitos atentaram diretamente contra a segurança pública (garantia da ordem pública), cabe a prisão preventiva e não medidas cautelares alternativas.

Ilustrando, se o acusado de roubo, embora primário e sem antecedentes, não possua emprego ou endereço fixo, por cautela, para assegurar a aplicação da lei penal, pode-se fixar a medida cautelar de comparecimento periódico em juízo para informar e justificar atividades (art. 319, I, CPP). Vale acrescentar que, se o acusado pretende fugir, o requisito de garantia de aplicação da lei penal pode demandar a prisão preventiva – e não simples medida cautelar alternativa.

As circunstâncias do fato dizem respeito à tipicidade derivada (qualificadoras/privilégios, causas de aumento/diminuição). Há diferença, para efeito de adequabilidade, entre um roubo simples (tipo básico, art. 157, caput, CP) e um roubo com causa de aumento (tipo derivado, art. 157, § 2.º, CP). Por isso, maior cautela deve ter o juiz para decretar medidas cautelares em situações de tipos simples ou básicos, privilegiados ou com causa de diminuição, enquanto se pode apontar como conveniente a cautelaridade nos casos de tipos circunstanciados (qualificados ou com causa de aumento).

As condições pessoais do indiciado ou acusado são as inerentes ao modo de ser do indivíduo ou as qualidades jungidas à pessoa humana, tais como menoridade relativa (menos de 21 anos) ou senilidade (maior de 70 anos), primariedade ou reincidência, bons ou maus antecedentes, personalidade, conduta social, dentre outros. Nota-se, neste quesito, a mais apegada comparação à individualização da pena, considerada, para fins processuais, como individualização da medida cautelar.

Outro ponto positivo pode ser anotado para o fato de serem as medidas cautelares aplicadas isoladamente ou de modo cumulativo (art. 282, § 1.º, CPP). O indiciado ou acusado pode responder ao processo em liberdade, sem nunca ter sido preso, embora deva respeitar alguma medida cautelar judicialmente imposta. É viável, ainda, ser o indiciado ou acusado colocado em liberdade provisória, com fiança, além de ser obrigado a cumprir determinada medida cautelar. Pode ser levado a cumprir duas medidas cautelares ao mesmo tempo. Em suma, várias hipóteses podem coexistir, desde que harmônicas e fundamentadamente impostas.

Para fins de decretação da medida cautelar, distinta da prisão, impõe-se o seguinte quadro: a) o juiz pode deferi-la, de ofício ou a requerimento das partes, durante o processo; b) o juiz pode decretá-la, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público, na fase de investigação criminal.

Portanto, nos mesmos termos da prisão temporária, durante a investigação policial, o magistrado não pode decretar a medida cautelar de ofício; depende de provocação da autoridade policial ou do Ministério Público. Aliás, essa restrição merece aplauso; quanto menos o juiz atuar, de ofício, na fase policial, mais adequado para manter a sua imparcialidade.

Entretanto, há algumas ilogicidades a apontar, merecendo o devido reparo à luz da interpretação da norma. A prisão preventiva pode ser pleiteada, durante a investigação ou processo, pelo Ministério Público, pelo querelante, pelo assistente de acusação ou pela autoridade policial (esta, por representação), conforme se vê do art. 311 do CPP. A medida cautelar, na fase de investigação, somente por ser solicitada pelo Ministério Público e pela autoridade policial (via representação), excluindo-se querelante e assistente de acusação. Pode-se entender que, na fase policial, a vítima (futuro querelante, em caso de ação privada, ou assistente de acusação, em caso de ação pública) ainda não teria legitimidade para agir, pois não haveria ação penal ajuizada, ao menos no tocante ao pleito de medidas restritivas à liberdade do indiciado. Porém, autorizou-se que o ofendido (querelante ou assistente) atue na fase investigatória para pleitear a prisão preventiva. Noutros termos, a vítima pode o mais, mas não poderia o menos. Em interpretação sistemática, parece-nos cabível, então, possa a vítima requerer, também, medidas cautelares, diversas da prisão, na fase de investigação, embora o art. 282, § 2.º, silencie a respeito.

Em juízo, admite-se o pleito de decretação de medidas cautelares pelas partes, mas não se especifica quem pode ser assim considerado. No mesmo prisma sustentado no parágrafo acima, se o querelante e o assistente podem pleitear a prisão preventiva, por óbvio, no conceito de partes, previsto no art. 282, § 2.º, primeira parte, também se deve incluir o assistente de acusação (o querelante, na ação privada, é sempre parte). O assistente é considerado uma parte secundária no processo penal; porém, se pode requerer a preventiva, torna-se evidente poder pleitear a medida cautelar diversa da prisão.

Aliás, a mesma extensão deve ser concedida ao Ministério Público, quando atuar como fiscal da lei, em ação privada, conduzida pelo querelante. Pode pleitear medida cautelar, visto agir como parte imparcial.

Não se aventa a possibilidade de incluir como parte, para fim de requerimento de medida cautelar, o indiciado ou réu, por razões evidentes. Se não cabe a autoacusação, por proteção constitucional, com maior razão é descabida a autorrestrição à liberdade.

Preceitua o art. 282, § 3.º, que o juiz, ao receber o pedido de decretação da medida cautelar, deve intimar a parte contrária (leia-se o indiciado ou réu), encaminhando-lhe cópia do requerimento e das peças necessárias, para que se manifeste, querendo (óbvio). Buscou-se privilegiar, sempre que possível, o contraditório e a ampla defesa, prevendo-se a possibilidade de ouvir o interessado (indiciado ou acusado), antes da decretação da medida cautelar requerida, como regra, pelo órgão acusatório.

Descarta-se a oitiva se houver caso de urgência ou o perigo de ineficácia da medida, o que soa lógico e óbvio. Exemplificando: em processo criminal, envolvendo briga de vizinhos, um deles, considerado vítima, pleiteia a aplicação de medida cautelar ao réu, mantendo-o distante de determinado local, frequentado por ambos, por temer nova agressão. Apresentando ao juiz um boletim de ocorrência, com evidência de ameaça ou lesão corporal, pode-se decretar de imediato a medida cautelar de afastamento de lugar ou pessoa, conforme a situação. No entanto, fundado o pedido em mera alegação, convém ouvir a parte contrária, quando o acusado poderá dar sua versão a respeito do pleiteado.

No mais, durante a fase de investigação, quando ainda se produz provas sem o crivo do contraditório, colhidas evidências de que o indiciado está perturbando a vítima, esta pode solicitar medida cautelar (diretamente ou por intermédio do MP, ou mesmo da autoridade policial), extraindo-se peças do inquérito para encaminhar ao interessado, a fim de que possa se manifestar a respeito.

A tendência, no âmbito das medidas cautelares, será a prevalência dos casos de urgência ou de perigo na demora (periculum in mora), justificando a decretação sem prévia oitiva do indiciado ou réu. Afinal, muitas das medidas substituem a prisão, razão pela qual carregam consigo o mesmo caráter de indispensabilidade.

Torna-se difícil imaginar uma situação sem urgência ou perigo em que se requeira a medida de cautela, possuindo-se tempo suficiente para ouvir o interessado antes da decretação. Noutros termos, se há viabilidade para se instaurar o contraditório em torno da medida cautelar, muitas vezes, ela não seria tão indispensável assim, a ponto de justificar o seu deferimento. Mas, cada caso é um caso. No exemplo supracitado, o vizinho que deseja impedir o outro de frequentar certo lugar, sem ter consigo prova pré-constituída, fomenta o exercício do contraditório, evitando-se a restrição à liberdade individual sem lastro seguro.

Nada impede, por razoável, a instauração do contraditório diferido, ou seja, depois da decretação da medida cautelar, considerada urgente, pode o indiciado ou réu manifestar-se, pleiteando a sua revogação. É o que espelha o § 5.º do art. 282.

3.4 DESCUMPRIMENTO DAS MEDIDAS CAUTELARES E PRISÃO CAUTELAR COMO ULTIMA RATIO

O descumprimento de qualquer medida cautelar, analisado o caso concreto, permite ao magistrado substituir a medida por outra mais eficiente, cumular a medida descumprida com outra harmônica ou decretar a prisão preventiva. É importante ressaltar poder o juiz agir de ofício, tanto na fase investigatória, quando no curso da ação penal. Nesse ponto, divergiram Câmara e Senado. Segundo esta Casa Legislativa, o magistrado somente poderia revogar a medida cautelar, de ofício, na fase processual. Mas a Câmara retificou o projeto e permitiu a atuação do juiz em qualquer fase. Não deixa de ser estranho, pois o magistrado não pode decretar, de ofício, a medida restritiva, na fase investigatória; entretanto, pode revogá-la, de ofício, nessa mesma fase.

Por outro lado, mesmo que a revogue, não poderia decretar, de ofício, a prisão preventiva, pois não há previsão legal para tanto. Resta-lhe substituir por outra, considerada mais eficiente.

No geral, a substituição, cumulação ou conversão da medida em prisão pode ser pedida pelo Ministério Público, seu assistente ou pelo querelante. Importante ganho merece registro: finalmente, concede-se ao ofendido a oportunidade de pleitear, legitimamente, medidas mais severas em relação à liberdade do réu.

Resta corrigir a parte recursal, permitindo-se à vítima apresentar recurso em sentido estrito, quando o juiz negar o deferimento da medida cautelar pleiteada. Hoje, inexiste recurso cabível, por ausência de previsão no art. 581 do CPP.

Outro ponto positivo da nova lei é apresentar a prisão preventiva como ultima ratio (última opção), primando pelo respeito aos direitos e garantias individuais, de acordo com o princípio penal da intervenção mínima. Eis mais um contato entre princípios penais e processuais penais: a prisão preventiva, tanto quanto a lei incriminadora, passa a ter a conotação de subsidiariedade (§§ 4.º e 6.º do art. 282).

Aliás, interessante observar, na jurisprudência, a menção a essa nova visão da prisão cautelar como sendo a extrema ratio da ultima ratio, já que esta simboliza o Direito Penal.

Conferir: TJGO: “Com a vigência da Lei 12.403/2011, editada em harmonia com o movimento político-criminal de descarcerização, a prisão cautelar passa a ser a extrema ratio da ultima ratio, que é o direito penal, devendo, pois, ser mantida apenas quando não for recomendável a imposição de medidas cautelares alternativas, menos traumáticas, em homenagem ao princípio da proporcionalidade, que exige de qualquer providência restritiva de direito fundamental, máxime o da liberdade individual, adequação qualitativa, quantitativa e subjetiva” (HC 201192383885-GO, 1.ª Câm. Crim., v.u., rel. Itaney Francisco Campos, 12.07.2011).

TRF-4.ª Reg.: “A Lei 12.403/2011 trouxe importantes alterações ao Código de Processo Penal, dentre as quais a possibilidade de decretar medidas cautelares diversas da prisão. Por constituírem providências mais brandas, a privação cautelar da liberdade reafirmou-se, mais uma vez, como ultima ratio, somente sendo admitida em casos excepcionais. Assim, poderá o julgador, entendendo-a desproporcional ao caso concreto, determinar alguma das hipóteses de cautelar diversa.” (HC 5006966-22.2012.404.0000, 8.ª T., v.u., rel. Luiz Fernando Wowk Penteado, 25.05.2012).

A flexibilidade adotada nesse contexto é ampla, cabendo ao juiz retroceder de medida cautelar mais severa para outra, mais branda, bem como, simplesmente, revogá-la. Do mesmo modo, pode tornar a decretá-la, entendendo útil e necessário (§ 5.º).

O projeto, quando passou pelo Senado, estabelecia um prazo de reexame obrigatório da medida constritiva: o Judiciário deveria avaliar a conveniência de manter, substituir, alterar ou revogar a medida cautelar imposta (inclusive a prisão preventiva), fundamentadamente, a cada sessenta dias, pelo menos. Se houvesse situação excepcional, em menor prazo. No entanto, buscava-se evitar que o processo de acusado preso, especialmente, terminasse esquecido nas prateleiras dos cartórios e nas pautas das Varas Criminais. A medida cautelar não poderia transformar-se em duradoura, de modo que, ao menos, a cada 60 dias, precisaria ser revista. Essa previsão constava do § 7.º do art. 282, que foi derrubado pela Câmara dos Deputados.

Finalmente, com relação ao conteúdo do antigo art. 282, transferiu-se a sua essência para o art. 283, caput, do CPP, com maior fidelidade ao texto constitucional.

Como era

Art. 283. A prisão poderá ser efetuada em qualquer dia e a qualquer hora, respeitadas as restrições relativas à inviolabilidade do domicílio.

Como ficou

Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. § 1.º As medidas cautelares previstas neste Título não se aplicam à infração a que não for isolada, cumulativa ou alternativamente cominada pena privativa de liberdade. § 2.º A prisão poderá ser efetuada em qualquer dia e a qualquer hora, respeitadas as restrições relativas à inviolabilidade do domicílio.

3.5 CRITÉRIOS PARA REALIZAR A PRISÃO E APLICAÇÃO DAS MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS

A nova redação do art. 283 encontra-se em perfeita harmonia com o art. 5.º, LXI, da Constituição Federal, associada à reforma processual de 2008 e à jurisprudência dominante em matéria de prisão cautelar. A prisão tem os seguintes fundamentos: a) flagrante delito; b) decisão judicial escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente advinda de: b.1) sentença condenatória com trânsito em julgado; b.2) decretação de prisão temporária; b.3) decretação de prisão preventiva.

Lembremos que as prisões para recorrer e para aguardar o julgamento pelo júri, atualmente, concentram suas bases nos mesmos requisitos da prisão preventiva.

As medidas cautelares, por representarem constrição à liberdade individual, não podem ser aplicadas a infrações penais não possuidoras, em abstrato, da cominação, isolada, cumulada ou alternativa, de pena privativa de liberdade.

Logo, não são aplicáveis a contravenções penais, com previsão apenas de pena pecuniária, o que é de lógica evidente: se a pena final é multa, a medida cautelar, antes da decisão condenatória, não pode representar maior gravame ao réu.

Não se admite, ainda, a decretação de medida cautelar a crimes cuja pena final é, unicamente, restritiva de direitos, como ocorre com o art. 28 da Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas).

Finalmente, o conteúdo do antigo art. 283 passou a constar do § 2.º do mesmo artigo. A restrição à inviolabilidade de domicílio consta, basicamente, do disposto pelo art. 5.º, XI, da Constituição Federal, in verbis: “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”.

Ao cuidar do flagrante delito, em nosso entendimento, deve-se aplicar a interpretação restritiva, ou seja, somente se aplica ao flagrante próprio (art. 302, I e II, CPP), por se tratar de violação de direito constitucional (resguardo do domicílio). Os casos de flagrante impróprio (art. 302, III, CPP) e presumido (art. 302, IV, CPP) não comportam a violação sem mandado judicial.

O conceito de delito, para efeito do flagrante, abrange a contravenção penal, pois a expressão flagrante delito é tradicional no direito processual penal. Não teria sentido mencionar-se flagrante infração penal somente para envolver a contravenção. Por isso, do mesmo modo que se aplica o princípio da legalidade tanto para o crime como para a contravenção, embora o art. 5.º, XXXIX, da CF, mencione somente o termo crime (não há crime sem lei anterior que o defina), faz-se o mesmo no tocante ao flagrante delito.

Por outro lado, a determinação judicial, autorizando a invasão domiciliar, somente pode ser cumprida durante o dia. Entenda-se dia o período de exposição solar. Trata-se de uma situação natural e não imposta por horários artificiais (como o denominado horário de verão).

De posse do mandado judicial, cuidando-se do período noturno, caso o morador não concorde com a entrada da polícia, deve-se aguardar o amanhecer para, então, invadir o local.

Inalterados

Art. 284. Não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso.

Art. 285. A autoridade que ordenar a prisão fará expedir o respectivo mandado.

Parágrafo único. O mandado de prisão: a) será lavrado pelo escrivão e assinado pela autoridade; b) designará a pessoa, que tiver de ser presa, por seu nome, alcunha ou sinais característicos; c) mencionará a infração penal que motivar a prisão; d) declarará o valor da fiança arbitrada, quando afiançável a infração; e) será dirigido a quem tiver qualidade para dar-lhe execução.

Art. 286. O mandado será passado em duplicata, e o executor entregará ao preso, logo depois da prisão, um dos exemplares com declaração do dia, hora e lugar da diligência. Da entrega deverá o preso passar recibo no outro exemplar; se recusar, não souber ou não puder escrever, o fato será mencionado em declaração, assinada por duas testemunhas.

Art. 287. Se a infração for inafiançável, a falta de exibição do mandado não obstará a prisão, e o preso, em tal caso, será imediatamente apresentado ao juiz que tiver expedido o mandado.

Art. 288. Ninguém será recolhido à prisão, sem que seja exibido o mandado ao respectivo diretor ou carcereiro, a quem será entregue cópia assinada pelo executor ou apresentada a guia expedida pela autoridade competente, devendo ser passado recibo da entrega do preso, com declaração de dia e hora.

Parágrafo único. O recibo poderá ser passado no próprio exemplar do mandado, se este for o documento exibido.

3.6 FORMALIDADES PARA EFETIVAR A PRISÃO

A realização da prisão admite o emprego de força física, embora deva ser o mínimo indispensável para a sua concretude. Há casos de resistência ou de tentativa de fuga, para os quais convém utilizar de violência moderada.

Não há permissão, de acordo com a legislação brasileira, para matar ou lesar gravemente o sujeito, a pretexto de prendê-lo. Por isso, a fuga não comporta, ilustrando, o disparo de tiro fatal, provocando a morte do suspeito ou acusado. Deve a polícia (ou outros captores) perseguir o indivíduo a ser detido e, quando o alcançar, pode valer-se de força física para dominá-lo, algemando-o e anulando sua resistência. Lesões leves são admissíveis para dar cumprimento ao disposto no art. 284 do CPP, constituindo estrito cumprimento do dever legal, no caso da polícia.

Por certo, se houver resistência ativa do preso, voltando-se contra os captores com violência, pode-se usar a legítima defesa. Nessa hipótese, desde que preenchidos os requisitos do art. 25 do Código Penal, pode até mesmo ocorrer a morte do preso.

Aliás, a resistência ativa justifica a configuração do delito de resistência (art. 329, CP), cumulado com a outra infração penal pela qual está sendo o agente perseguido.

A disciplina do uso de algemas, atualmente, encontra-se prevista por Súmula Vinculante do Supremo Tribunal Federal (Súmula n. 11), nos seguintes termos: “só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado”.

A banalização no uso de algemas pode levar à tipificação do crime de abuso de autoridade, pois se ultrapassa o limite da força razoável para impor a prisão.

A previsão feita pelo art. 285 do CPP visa a dar cumprimento ao disposto pelo art. 5.º, LXI, da Constituição Federal, na parte em que diz “ninguém será preso senão (...) por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente” (grifamos). O preso tem direito de conhecer os termos da ordem judicial de captura, motivo pelo qual todos os detalhes são expostos no mandado de prisão.

Em casos excepcionais, nos termos do art. 287 do CPP, autoriza-se a efetivação da prisão sem a imediata exibição do mandado de prisão. Nessa situação, o preso deve ser apresentado ao juiz expedidor da ordem.

Outra cautela fundamental é evitar o recolhimento de alguém ao cárcere sem a exibição do mandado de prisão ao diretor ou carcereiro, afinal, o controle da constrição se faz pela sua formalização. Não há viabilidade legal em se manter no cárcere qualquer pessoa sem a evidente e comprovada ordem judicial ou auto de prisão em flagrante.

Atualmente, prevê-se a concentração dos mandados de prisão, em todo o Brasil, no banco de dados do Conselho Nacional de Justiça, conforme previsão feita pelo art. 289-A do CPP, dando ensejo à realização da prisão por qualquer agente policial.

Como era

Art. 289. Quando o réu estiver no território nacional, em lugar estranho ao da jurisdição, será deprecada a sua prisão, devendo constar da precatória o inteiro teor do mandado.
Parágrafo único. Havendo urgência, o juiz poderá requisitar a prisão por telegrama, do qual deverá constar o motivo da prisão, bem como, se afiançável a infração, o valor da fiança. No original levado à agência telegráfica será autenticada a firma do juiz, o que se mencionará no telegrama.

Como ficou

Art. 289. Quando o acusado estiver no território nacional, fora da jurisdição do juiz processante, será deprecada a sua prisão, devendo constar da precatória o inteiro teor do mandado. § 1.º Havendo urgência, o juiz poderá requisitar a prisão por qualquer meio de comunicação, do qual deverá constar o motivo da prisão, bem como o valor da fiança se arbitrada. § 2.º A autoridade a quem se fizer a requisição tomará as precauções necessárias para averiguar a autenticidade da comunicação. § 3.º O juiz processante deverá providenciar a remoção do preso no prazo máximo de 30 (trinta) dias, contados da efetivação da medida.

3.7 PRISÃO EM LOCALIDADES DIVERSAS: USO DE MEIOS MODERNOS E DEMORA NA REMOÇÃO

As alterações do art. 289 foram positivas, pois se aperfeiçoou a sua redação, além de serem incluídas modernidades no campo da concretização da prisão.

No caput, acrescentou-se apenas ser a jurisdição do juiz processante, vale dizer, o titular do feito onde foi decretada a prisão. Anteriormente, mencionava-se somente o termo jurisdição, desacompanhado do seu detentor. Cuida-se de aperfeiçoamento da redação.

De qualquer modo, manteve-se a emissão de precatória para a realização da prisão em outra Comarca. A real modificação concentrou-se no § 1.º, antes parágrafo único, onde se permitiu a utilização de qualquer meio de comunicação para a requisição da prisão a outro juízo, desde que haja urgência. Esta se dá, normalmente, em situações de prisão cautelar; a prisão advinda de pena definitiva pode ser transmitida via precatória.

Na antiga redação, previa-se o uso de telegrama, algo que, há muito, em face do avanço tecnológico, deixou de ser utilizado. Aliás, valendo-se da analogia, o que é tolerado em processo, já se utilizava de meios avançados de comunicação, como o fax, para transmitir mandados de prisão. Esse sistema é aceito no Código de Processo Civil, de onde se retirou a mesma valia.

Hoje, pode-se ampliar o sistema, inserindo, por exemplo, o email, que levaria, em anexo, o arquivo contendo a cópia integral da precatória, com a ordem de prisão.

Vários juízes já possuem assinatura digital, em cartão seguro, criptografado, permitindo-se a autenticação de uma ordem de prisão com absoluta segurança, dependendo, por certo, do sistema de transmissão. Aliás, o uso da assinatura digital é mais seguro do que a precatória assinada pelo magistrado, cuja firma é reconhecida pelo escrivão da Vara.

Enfim, abriu-se a possibilidade de emitir ordens de prisão por qualquer meio de comunicação, desde os atualmente existentes até os que começarão a ser usados no futuro.

Previu-se, como medida de cautela, a conferência da origem da requisição de prisão, por parte de quem haverá de efetivá-la. Assim, ilustrando, se um mandado de prisão for transmitido por email, é necessário checar a sua origem, aliás, o que se faz em qualquer situação duvidosa. Por outro lado, com o passar do tempo, aperfeiçoando-se o sistema de transmissão de dados, inclusive com o uso de assinatura digital, essa conferência poderá ser dispensada.

Outro ponto interessante, na reforma, foi a introdução do § 3.º, especificando, finalmente, qual é a autoridade encarregada de providenciar a transferência do indiciado ou réu preso para o local onde deve responder ao processo ou cumprir sua pena.

Cabe ao juiz processante, ou seja, aquele que conduz o feito onde a ordem de prisão foi expedida. Anteriormente, expedida a precatória a outro Estado da Federação, por exemplo, detido o acusado, iniciava-se a disputa em relação à responsabilidade pela transferência do preso. Alegava o juízo deprecante caber ao deprecado providenciar o deslocamento de quem detém sob sua guarda, enquanto o deprecado afirmava ser obrigação do processante fornecer os meios adequados para ter, sob sua tutela, a pessoa que lhe interessava. Somente nessa discussão, vários meses (às vezes, anos) se passavam sem qualquer solução prática, em nítido prejuízo do preso. Em alguns casos, os tribunais terminavam concedendo ordem de habeas corpus para colocar o detido em liberdade, por falha na transferência e lesão ao princípio da duração razoável da prisão cautelar. Entretanto, casos houve em que o sujeito terminou detido por longo tempo, enquanto se arrastava a disputa em relação à autoridade encarregada de providenciar a sua transferência.

Merece registro um caso que conduzimos, quando atuávamos no Tribunal do Júri da Capital de São Paulo. Expedida precatória para a prisão de um réu, após a pronúncia, em outro Estado da Federação, realizada a detenção, solicitamos a transferência ao juízo deprecado. Este, por sua vez, alegando falta de recursos do Executivo local – encarregado, em última análise, de concretizar a transferência – respondeu que aguardava nossas providências. Oficiamos ao Poder Executivo de S. Paulo para concretizar o deslocamento do preso. A resposta, como de hábito, foi no sentido de se aguardar a verba cabível, quando fosse possível. Muito tempo se passou, quando recebemos uma carta do prefeito da cidade onde se encontrava preso o réu. Dizia o alcaide responsabilizar-se pelo comparecimento do acusado, quando fosse marcado o seu julgamento em S. Paulo, desde que ele fosse colocado em liberdade. Noutros termos, o prefeito pagaria a passagem de ônibus do acusado e o obrigaria, pela força moral, a comparecer na data acertada.

Em face do período decorrido, sem solução dada pelo Poder Executivo e sem verba própria do Poder Judiciário, resolvemos revogar a prisão preventiva, por excesso de prazo razoável para o julgamento, ao mesmo tempo em que designamos data para o julgamento pelo Tribunal do Júri e comunicamos ao prefeito da cidade onde o réu se encontrava detido. Estávamos céticos quanto ao comparecimento do acusado, que já estava solto e poderia fugir para outro lugar. Entretanto, no dia marcado, ele compareceu à sessão, sob ordem do prefeito, sendo julgado pelo Tribunal Popular.

Essa situação foi inédita, por certo, mas a responsabilidade pela transferência sempre foi um ponto de debate, agora solucionado, ao menos em tese, pela nova lei. Cabe ao juiz processante, que emitiu a ordem de prisão, providenciar a remoção do preso, no prazo máximo de trinta dias, contados da efetivação da medida.

Não é preciso destacar ser o prazo estabelecido na lei meramente formal, pois a transferência do preso não depende somente de boa vontade do juiz, mas de verba, incluindo o apoio do Executivo, que deve garantir a escolta.

Enfim, o trintídio, em vários casos, não será respeitado. Resta ao Judiciário decidir pelo excesso de prazo e revogar a prisão cautelar ou mantê-la, dentro de um critério de razoabilidade e proporcionalidade, envidando todos os esforços para compelir a autoridade competente do Executivo a dar cumprimento à sua ordem, sob pena de desobediência. Tratando-se de prisão decorrente de pena, a questão é mais delicada, pois não se pode simplesmente revogá-la. Parece-nos que, ausente a remoção, o processo de execução deve ser remetido à Comarca onde se encontra preso o réu, a fim de não prejudicar o ganho de benefícios, tais como a progressão de regime ou livramento condicional.

Finalmente, vale destacar que o projeto aprovado pelo Senado previa a imediata colocação do preso em liberdade, se decorresse o prazo de trinta dias, sem a remoção efetivada. A Câmara dos Deputados eliminou essa possibilidade. Logo, caberá ao Judiciário decidir o que fazer em cada caso concreto.

Inovador

Art. 289-A. O juiz competente providenciará o imediato registro do mandado de prisão em banco de dados mantido pelo Conselho Nacional de Justiça para essa finalidade. § 1.º Qualquer agente policial poderá efetuar a prisão determinada no mandado de prisão registrado no Conselho Nacional de Justiça, ainda que fora da competência territorial do juiz que o expediu. § 2.º Qualquer agente policial poderá efetuar a prisão decretada, ainda que sem registro no Conselho Nacional de Justiça, adotando as precauções necessárias para averiguar a autenticidade do mandado e comunicando ao juiz que a decretou, devendo este providenciar, em seguida, o registro do mandado na forma do caput deste artigo. § 3.º A prisão será imediatamente comunicada ao juiz do local de cumprimento da medida o qual providenciará a certidão extraída do registro do Conselho Nacional de Justiça e informará ao juízo que a decretou. § 4.º O preso será informado de seus direitos, nos termos do inciso LXIII do art. 5.º da Constituição Federal e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, será comunicado à Defensoria Pública. § 5.º Havendo dúvidas das autoridades locais sobre a legitimidade da pessoa do executor ou sobre a identidade do preso, aplica-se o disposto no § 2.º do art. 290 deste Código. § 6.º O Conselho Nacional de Justiça regulamentará o registro do mandado de prisão a que se refere o caput deste artigo.

3.8 MANDADO DE PRISÃO EM BANCO DE DADOS DE ALCANCE NACIONAL

O disposto pelo art. 289-A é uma promissora inovação no sistema processual penal brasileiro, representando o alcance nacional do mandado de prisão de qualquer pessoa, algo lacunoso no anterior corpo legislativo. O Conselho Nacional de Justiça manterá um banco de dados, abrangendo todos os Estados da Federação, de modo que os mandados de prisão expedidos em todas as Comarcas sejam ali registrados. Tal medida permitirá que qualquer policial, tomando conhecimento da ordem judicial de prisão, possa executá-la assim que viável.

Essa providência não elimina o disposto pelo art. 289 do CPP, ou seja, a expedição de carta precatória, com a ordem de prisão, ou mesmo a requisição por outros meios de comunicação. Afinal, esta é uma solicitação direta, enviada do juízo processante ao juízo deprecado, onde se encontra o indiciado ou réu.

No caso da previsão feita pelo art. 289-A, abre-se a oportunidade de consulta ao banco de dados e, com isso, o trabalho policial espontâneo de investigação torna-se mais eficaz. Aliás, o disposto no § 2.º, do art. 289-A, ameniza a norma inscrita no art. 287 do CPP. Noutros termos, mesmo sem o registro do mandado de prisão, mas sabendo que ele existe, o policial pode efetivar a detenção, desde que tenha certeza da autenticidade e providencie a comunicação ao juiz processante para que registre o mandado imediatamente junto ao CNJ. Essa medida evita a apresentação do preso, conforme previsto pelo art. 287, parte final.

Onde quer que se concretize a prisão, os direitos constitucionais serão respeitados e transmitidos ao detido (direito ao silêncio e de ter a assistência da família e de advogado), nos termos do art. 5.º, LXIII, da CF. Não possuindo advogado a indicar, aciona-se a Defensoria do local da prisão, para que tome as medidas cabíveis.

Eventual dúvida quanto à pessoa do executor do mandado de prisão (por exemplo, se ele é realmente policial, vez que pode tratar-se de sequestro) ou em relação à identidade do preso, utiliza-se o disposto pelo art. 290, § 2.º, do CPP.

Coloca-se o preso sob custódia, até que se esclareça a dúvida. A custódia é uma forma de detenção, com a finalidade protetora, retirando-se o preso da alçada do executor e colocando-o em local seguro, enquanto se verifica a autenticidade dos fatos duvidosos.

Espera-se que, acompanhado do cadastro nacional de mandados de prisão, possa-se regularizar e concretizar um banco de dados nacional acerca dos antecedentes de qualquer pessoa, outro entrave ao bom andamento da Justiça Criminal no Brasil.

Sob outro aspecto, a edição da Lei 12.714/2012 disciplinou o acompanhamento da execução das penas, da prisão cautelar e da medida de segurança por meio de sistema informatizado.

Inalterados

Art. 290. Se o réu, sendo perseguido, passar ao território de outro município ou comarca, o executor poderá efetuar-lhe a prisão no lugar onde o alcançar, apresentando-o imediatamente à autoridade local, que, depois de lavrado, se for o caso, o auto de flagrante, providenciará para a remoção do preso. § 1.º Entender-se-á que o executor vai em perseguição do réu, quando: a) tendo-o avistado, for perseguindo-o sem interrupção, embora depois o tenha perdido de vista; b) sabendo, por indícios ou informações fidedignas, que o réu tenha passado, há pouco tempo, em tal ou qual direção, pelo lugar em que o procure, for no seu encalço. § 2.º Quando as autoridades locais tiverem fundadas razões para duvidar da legitimidade da pessoa do executor ou da legalidade do mandado que apresentar, poderão pôr em custódia o réu, até que fique esclarecida a dúvida.

Art. 291. A prisão em virtude de mandado entender-se-á feita desde que o executor, fazendo-se conhecer do réu, lhe apresente o mandado e o intime a acompanhá-lo.

Art. 292. Se houver, ainda que por parte de terceiros, resistência à prisão em flagrante ou à determinada por autoridade competente, o executor e as pessoas que o auxiliarem poderão usar dos meios necessários para defender-se ou para vencer a resistência, do que tudo se lavrará auto subscrito também por duas testemunhas.

Art. 293. Se o executor do mandado verificar, com segurança, que o réu entrou ou se encontra em alguma casa, o morador será intimado a entregá-lo, à vista da ordem de prisão. Se não for obedecido imediatamente, o executor convocará duas testemunhas e, sendo dia, entrará à força na casa, arrombando as portas, se preciso; sendo noite, o executor, depois da intimação ao morador, se não for atendido, fará guardar todas as saídas, tornando a casa incomunicável, e, logo que amanheça, arrombará as portas e efetuará a prisão.

Parágrafo único. O morador que se recusar a entregar o réu oculto em sua casa será levado à presença da autoridade, para que se proceda contra ele como for de direito.

Art. 294. No caso de prisão em flagrante, observar-se-á o disposto no artigo anterior, no que for aplicável.

Art. 295. Serão recolhidos a quartéis ou a prisão especial, à disposição da autoridade competente, quando sujeitos a prisão antes de condenação definitiva: I – os ministros de Estado; II – os governadores ou interventores de Estados ou Territórios, o prefeito do Distrito Federal, seus respectivos secretários, os prefeitos municipais, os vereadores e os chefes de Polícia; III – os membros do Parlamento Nacional, do Conselho de Economia Nacional e das Assembleias Legislativas dos Estados; IV – os cidadãos inscritos no “Livro de Mérito”; V – os oficiais das Forças Armadas e os militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios; VI – os magistrados; VII – os diplomados por qualquer das faculdades superiores da República; VIII – os ministros de confissão religiosa; IX – os ministros do Tribunal de Contas; X – os cidadãos que já tiverem exercido efetivamente a função de jurado, salvo quando excluídos da lista por motivo de incapacidade para o exercício daquela função; XI – os delegados de polícia e os guardas-civis dos Estados e Territórios, ativos e inativos. § 1.º A prisão especial, prevista neste Código ou em outras leis, consiste exclusivamente no recolhimento em local distinto da prisão comum. § 2.º Não havendo estabelecimento específico para o preso especial, este será recolhido em cela distinta do mesmo estabelecimento. § 3.º A cela especial poderá consistir em alojamento coletivo, atendidos os requisitos de salubridade do ambiente, pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequados à existência humana. § 4.º O preso especial não será transportado juntamente com o preso comum. § 5.º Os demais direitos e deveres do preso especial serão os mesmos do preso comum.

Art. 296. Os inferiores e praças de pré, onde for possível, serão recolhidos à prisão, em estabelecimentos militares, de acordo com os respectivos regulamentos.

Art. 297. Para o cumprimento de mandado expedido pela autoridade judiciária, a autoridade policial poderá expedir tantos outros quantos necessários às diligências, devendo neles ser fielmente reproduzido o teor do mandado original.

3.9 PERSEGUIÇÃO, CERCO E RESISTÊNCIA

Além do cumprimento de mandado de prisão, há possibilidade de se prender o suspeito em flagrante delito. Nessa hipótese, autoriza-se a perseguição do autor do crime, até que seja efetivamente detido. Não há que se falar em barreiras, impostas por diferentes territórios de atuação do juiz ou da autoridade policial.

O executor segue o agente, passando por diversos locais, até alcançá-lo; assim ocorrendo, deve apresentá-lo, de imediato, à autoridade policial do lugar da prisão, para que seja formalizado o auto do flagrante.

Para ilustrar, eis um caso concreto, que me coube avaliar, como magistrado competente: o sujeito esfaqueou a vítima num boteco, na cidade de São Paulo; fugiu, mas logo chegou a polícia e obteve os seus dados de identificação; os policiais dirigiram-se, de pronto, à sua casa; o suspeito havia acabado de fazer as malas e seguido para a rodoviária, conforme relato dos vizinhos; a polícia foi em seu encalço; na rodoviária, pesquisando nos guichês, descobriu-se qual ônibus tomou; atingindo a plataforma, o veículo acabara de sair; a viatura pôs-se a persegui-lo pela cidade, mas não o encontrou; avisou a polícia rodoviária; o ônibus passou alguns bloqueios, mas foi parado já no Estado de Minas Gerais, para onde se dirigia o suspeito; foi preso em flagrante, após várias horas de perseguição contínua, em outra Comarca; revistado, encontrou-se a faca, usada no crime, ainda manchada com o sangue da vítima. O quadro fático demonstra a perseguição ininterrupta, sendo preso onde foi alcançado, local em que se lavrou o auto de prisão em flagrante.

Efetivada formalmente a detenção, inicia-se o processo de remoção, transferindo o preso para a Comarca onde o delito se consumou, afinal, neste local encontra-se o magistrado competente para analisar o auto de prisão em flagrante e cuidar do caso dali por diante, inclusive resolvendo sobre a legalidade do auto, a sua conversão em preventiva ou, eventualmente, sobre a concessão de liberdade provisória.

O art. 290, § 1.º, alíneas a e b, do CPP, fornece os parâmetros para a perseguição legítima do suspeito ou acusado.

Registre-se, uma vez mais, o método autorizado por lei para efetivar a prisão: usar a força indispensável para dobrar eventual resistência ou tentativa de fuga (art. 284, CPP). Complementando a referida norma, estabelece o art. 292 que a resistência à ordem de prisão (flagrante ou mandado judicial) poderá ser vencida pelo uso dos meios necessários (força física indispensável) ou será viável ao executor que se valha da legítima defesa, caso seja agredido (art. 25, CP). Tudo isso será devidamente documentado por auto específico.

Porém, alguns detalhes merecem consideração. Se houver resistência passiva, ou seja, sem agressão direta ao executor ou seus auxiliares, apenas com a recalcitrância do preso em colaborar com sua própria detenção, usa-se a força necessária, lavrando-se, apenas, o auto de resistência, mas não o flagrante pelo crime de resistência.

Se ocorrer resistência ativa, com agressão direta contra o executor ou seus auxiliares, como já mencionado, configura-se o delito de resistência (art. 329, CP), devendo-se lavrar auto de prisão em flagrante – e não simples auto de resistência.

Quando o executor for agredido violentamente, valendo-se da legítima defesa para contornar o ataque, havendo mera lesão no preso, o que está dentro da previsível força indispensável para a captura, lavra-se o auto específico, demonstrativo do emprego de violência para concretizar a prisão.

No entanto, se o executor for levado a matar o preso, porque este o agrediu, durante o procedimento da detenção, alcança-se esfera não autorizada em lei para fins de concretização do ato de prisão. Por isso, deve a autoridade policial lavrar o auto de prisão em flagrante do executor, por homicídio doloso ou culposo, conforme o caso, mas não o denominado auto de resistência seguido de morte. Com a devida vênia, essa peça não existe. A morte do preso é completamente fora dos parâmetros processuais penais, atingido âmbito penal. Cuida-se de fato típico, motivo pelo qual a autoridade policial deve lavrar o auto de prisão em flagrante. Cabe ao juiz, após, providenciar a imediata soltura do executor, com base no art. 310, parágrafo único, do CPP. Ao final, concluída a investigação, poderá o Ministério Público requerer o seu arquivamento e o juiz assim determinar.

A lavratura do auto mencionado no art. 292 do CPP (auto de resistência) tem por finalidade registrar os eventuais incidentes ocorridos durante a prisão, mas jamais substituir o auto de prisão em flagrante, quando um crime é constatado. Se o preso praticar resistência (art. 329, CP), lavra-se o flagrante e não auto de resistência. Se o executor matar o preso (art. 121, CP), lavra-se o devido flagrante, igualmente. Resta ao âmbito do singelo auto de resistência a hipótese de defesa com lesões leves ou de resistência passiva, que não constitui crime.

Ainda no contexto da perseguição do agente do crime, é possível que ele ingresse em residência alheia. Diante da inviolabilidade de domicílio, assegurada pela Constituição Federal, não pode a polícia, perseguindo-o, simplesmente invadir o local, sem ordem judicial e sem outras formalidades.

Por isso, estabelece o art. 293 do CPP deva o morador ser intimado a entregar o sujeito perseguido, à vista do mandado de prisão, que lhe será exibido. Se for dia, convocam-se testemunhas, ingressando-se à força no local, em busca do suspeito. Tratando-se de período noturno, cerca-se o lugar, para que, durante o dia, seja devidamente invadido, nos termos já mencionados.

Se for comprovado o dolo do morador, pretendendo favorecer o perseguido pela polícia, poderá ser levado à delegacia para a lavratura do auto de prisão em flagrante do crime de favorecimento pessoal (art. 348, CP).

O mesmo procedimento será adotado em caso de perseguição decorrente de flagrante, conforme preceitua o art. 294 do CPP.

3.10 PRISÃO ESPECIAL

Pelo projeto aprovado no Senado Federal, eliminava-se a prisão especial, tal como prevista pelo art. 295 do CPP, repleta de privilégios incompreensíveis, sob a ótica do Estado Democrático de Direito. A redação era a seguinte: “é proibida a concessão de prisão especial, salvo a destinada à preservação da vida e da incolumidade física e psíquica do preso, assim reconhecida por decisão fundamentada da autoridade judicial ou, no caso da prisão em flagrante ou cumprimento de mandado de prisão, da autoridade policial encarregada do cumprimento da medida”.

Lamentavelmente, o Estado Brasileiro deixou de avançar em questão de igualdade de todos perante a lei, pois a Câmara dos Deputados afastou a modificação referida, mantendo o disposto pelo art. 295, na íntegra. Os debates em torno da mantença da prisão especial não foram os mais elevados, em termos de cidadania. Constatou-se a prevalência do espírito corporativo, buscando manter privilégios.

Por isso, mantém-se a prisão especial para todos os aquinhoados em destaque no rol do art. 295. Ali estão, por óbvio, os que aprovaram a manutenção dessa prisão: os parlamentares.

O fundamental, para fazer cumprir essa forma de prisão, é separar os denominados presos comuns (sem privilégios) dos presos especiais (com privilégios). Na inexistência de estabelecimento específico para cumprir a prisão especial, pode-se utilizar presídio comum, desde que seja usada cela separada.

A referida cela especial pode constituir-se de alojamento coletivo, abrigando vários presos especiais, desde que atendidos os requisitos de salubridade do ambiente, pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequados à existência humana (art. 295, § 3.º, CPP). Cremos inexistir campo para comentário específico quanto a essa norma, exceto uma indagação: não deveriam ser todas as celas dos presídios brasileiros, inclusive para os pobres presos comuns, atendidas pelas mínimas condições de sobrevivência humana? É impressionante como se pode encontrar ardorosos defensores da prisão especial, sem que se visualize nesses dispositivos uma afronta à dignidade humana.

Se todos são iguais perante a lei, também os criminosos deveriam ser equiparados para todos os fins. Somente para argumentar, se a sociedade mantém certo asco dos delinquentes, não se conformando em vê-los inseridos em estabelecimentos penais condizentes e adequados, por que se contentaria em preservar a digna condição do preso especial? Afinal, para quem não consegue enxergar no preso um ser humano em igualdade de condições, tanto faz seja ele comum ou especial. Enfim, se um portador de diploma de curso superior assalta alguém, segue para prisão especial. O iletrado, que faça o mesmo, é inserido em prisão comum, que, a bem da verdade, constitui, em muitos casos, autêntico calvário.

Não bastasse, por leis especiais, há categorias que obtêm outros privilégios, como a prisão especial em sala de Estado Maior das Forças Armadas (advogados, juízes, promotores etc.). Ora, tais salas não existem e não há mesmo justificativa alguma para que existam. Os operadores do Direito não são militares e, se presos provisoriamente, não devem ser conduzidos a quartéis. A regalia parece conduzir a uma triste premissa: na ausência dessas salas, coloca-se o sujeito em prisão domiciliar, valendo-se da Lei 5.256/1967. O exemplo dado pela confraria jurídica é equivocado. A luta deve ser veemente e árdua, em busca de uma prisão provisória justa e digna para todos. Não se deve, mesmo, misturar presos condenados com presos provisórios; dentre estes, não é cabível mesclar os reincidentes com os primários, nem os agressivos com os calmos e assim por diante. A separação não se deve calcar em títulos e falsas premissas, mas em personalidade e na situação pessoal de cada acusado.

Em suma, ninguém, por menos culto que seja, deveria ser inserido em celas insalubres e infectas. Aliás, nem mesmo os condenados, que seres humanos são, deveriam ser submetidos a tal degradação.

Outro argumento sofismável para a mantença da prisão especial diz respeito à possibilidade de policiais e outros agentes públicos, se misturados com outros presos, poderem sofrer toda sorte de violência. O argumento em si é verdadeiro: policiais e outras autoridades não podem ser misturados a outros presos, pois a função que exercem ou exerciam pode levá-los a vinganças e represálias. O sofisma concentra-se no fato de que isso justifica toda a prisão especial existente no Brasil.

A separação dos agentes públicos, que lidam com a segurança, deve ser feita para garantir a sua incolumidade física – e não porque representa um privilégio. Tal medida não é encontrada no tocante a outras profissões e funções públicas, de modo que a prisão especial, nesse ângulo, cai por terra.

Enfim, haverá o dia em que se buscará, com efetividade, a igualdade dos brasileiros diante da lei. Até lá, haveremos de conviver com a prisão especial e tantas outras regalias jurídicas ainda vigentes.

Como era

Art. 298. Se a autoridade tiver conhecimento de que o réu se acha em território estranho ao da sua jurisdição, poderá, por via postal ou telegráfica, requisitar a sua captura, declarando o motivo da prisão e, se afiançável a infração, o valor da fiança.

Como ficou

Art. 298. (Revogado.)

O artigo 298 perdeu o sentido, em face do disposto pelos arts. 289 e 289-A. Não mais se usa a via postal ou telegráfica, pois muitos outros meios de comunicação mais modernos existem. Além disso, haverá o banco de dados nacional, contendo o registro de todos os mandados de prisão expedidos no Brasil.

Como era

Art. 299. Se a infração for inafiançável, a captura poderá ser requisitada, à vista de mandado judicial, por via telefônica, tomadas pela autoridade, a quem se fizer a requisição, as precauções necessárias para averiguar a autenticidade desta.

Como ficou

Art. 299. A captura poderá ser requisitada, à vista de mandado judicial, por qualquer meio de comunicação, tomadas pela autoridade, a quem se fizer a requisição, as precauções necessárias para averiguar a autenticidade desta.

A modificação é mínima, envolvendo, apenas, a eliminação da condição de inafiançável da infração penal para que se possa buscar a captura do procurado pelo meio mais fácil. Qualquer crime pode se submeter a tal processo.

Outro ponto, igualando-se ao disposto pelo art. 289, diz respeito a usar qualquer meio de comunicação válido – e não somente o telefone.

Anote-se que o art. 289 cuida da autoridade judiciária, enquanto o art. 299 trata da autoridade policial. Na essência, ambas podem buscar a prisão do agente da maneira mais simples possível.

Como era

Art. 300. Sempre que possível, as pessoas presas provisoriamente ficarão separadas das que já estiverem definitivamente condenadas.

Como ficou

Art. 300. As pessoas presas provisoriamente ficarão separadas das que já estiverem definitivamente condenadas, nos termos da lei de execução penal.

Parágrafo único. O militar preso em flagrante delito, após a lavratura dos procedimentos legais, será recolhido a quartel da instituição a que pertencer, onde ficará preso à disposição das autoridades competentes.

3.11 SEPARAÇÃO ENTRE PRESOS PROVISÓRIOS E DEFINITIVOS

A alteração legislativa, apesar de sutil, é promissora. Elimina-se o condicional sempre que possível, passando-se a adotar o comando ficarão. Noutros termos, os presos provisórios devem sempre ficar separados dos condenados, o que já consta na Lei de Execução Penal e agora é reiterado pelo Código de Processo Penal. Espera-se o cumprimento da norma cogente.

Preleciona Og Fernandes: “a modificação introduzida no caput do art. 300 do CPP vai ao encontro das aspirações de um tratamento penal digno. A separação entre presos evita a ‘contaminação’ dos que sofrem prisão cautelar pela conduta daqueles em relação aos quais já não se opera a presunção de inocência, em regra condenados por crimes de média ou elevada potencialidade ofensiva” (Medidas cautelares no processo penal – prisões e suas alternativas, Og Fernandes (coord.), São Paulo: Ed. RT, 2012, p. 79).

Acrescenta-se o parágrafo único, no tocante à situação do militar, para que ele não seja colocado em presídio comum, já que a prisão especial pode ser inserida em qualquer estabelecimento, nos termos do art. 295, §§ 1.º e 2.º. Em virtude de sua particular disciplina e destacada vivência profissional, deve ser recolhido em quartel, onde passa a maior parte do seu tempo. A medida é justa, uma vez que até crimes militares são distintos e julgados por Justiça Especial. Porém, é preciso que se trate de militar da ativa, fazendo valer as prerrogativas inerentes à sua função.

RESUMO DO CAPÍTULO

As novas medidas cautelares, alternativas à prisão, submetem-se a dois elementos essenciais: necessariedade e adequabilidade.

São três os requisitos de necessariedade: a) assegurar a aplicação da lei penal; b) conveniência da investigação ou instrução criminal; c) evitar a prática de infrações penais, conforme previsão legal.

São três os requisitos da adequabilidade: a) gravidade do crime; b) circunstâncias do fato; c) condições pessoais do indiciado ou acusado.

Os requisitos de necessariedade são alternativos: é suficiente a presença de apenas um dos três. Os requisitos de adequabilidade são cumulativos: devem ser analisados os três em conjunto.

A decretação de medidas cautelares, alternativas à prisão, pressupõe um mínimo de provas colhidas, pois são afetados direitos individuais, entrando em confronto com o princípio constitucional da presunção de inocência.

As medidas cautelares, diversas da prisão, podem ser decretadas pelo juiz, ainda que não haja prova inconteste da materialidade e indício suficiente de autoria.

A adequabilidade das medidas cautelares equivale à individualização da pena, aplicando-se a medida cabível e proporcional ao indiciado ou réu, no caso concreto.

Cabe a decretação de medidas cautelares isoladas ou cumulativas.

Podem pleitear as medidas cautelares, durante o processo: a) Ministério Público; b) querelante (ação privada); c) assistente de acusação (ação pública). Pode o juiz decretá-las de ofício. Podem requerer as medidas cautelares, durante a investigação criminal: a) Ministério Público; b) autoridade policial (por representação). O juiz não pode decretá-las de ofício.

Em casos de urgência ou perigo na demora, pode-se decretar a medida cautelar sem prévia oitiva do indiciado ou réu. Do contrário, este dever ser intimado a se manifestar em relação ao pedido formulado pela parte. Nada impede que, após a decretação, o interessado apresente os argumentos defensivos que tiver, buscando a sua revogação.

O descumprimento da medida cautelar pode gerar a sua substituição por outra medida, a cumulação com outra restrição ou, em último caso, a decretação da preventiva.

A prisão preventiva passa a ter o caráter subsidiário, valendo como ultima ratio, em plena harmonia com o Direito Penal da intervenção mínima. Unem-se os princípios penais e processuais penais.

Insere-se no Código de Processo Penal o mesmo conteúdo do art. 5.º, LXI, da Constituição Federal, disciplinando as únicas formas legítimas de prisão no Brasil.

Facilita-se a transmissão da ordem de prisão, permitindo-se a utilização de qualquer meio de comunicação, desde que certificada a origem autêntica da medida.

Cria-se um banco de dados nacional, administrado pelo Conselho Nacional de Justiça, contendo o registro de todos os mandados de prisão expedidos, dando margem ao seu cumprimento por qualquer autoridade policial, esteja onde estiver o procurado.

Fixa-se como responsabilidade do juiz processante a remoção do preso em Comarca distinta da sua, no prazo máximo de 30 dias.

As pessoas presas provisoriamente ficarão sempre separadas das que estiverem definitivamente condenadas.