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Como era

Art. 319. A prisão administrativa terá cabimento: I – contra remissos ou omissos em entrar para os cofres públicos com os dinheiros a seu cargo, a fim de compeli-los a que o façam; II – contra estrangeiro desertor de navio de guerra ou mercante, surto em porto nacional; III – nos demais casos previstos em lei. § 1.º A prisão administrativa será requisitada à autoridade policial nos casos dos ns. I e III, pela autoridade que a tiver decretado e, no caso do n. II, pelo cônsul do país a que pertença o navio. § 2.º A prisão dos desertores não poderá durar mais de 3 (três) meses e será comunicada aos cônsules. § 3.º Os que forem presos à requisição de autoridade administrativa ficarão à sua disposição.

Como ficou

Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: I – comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II – proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III – proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV – proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; V – recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI – suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII – internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; VIII – fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX – monitoração eletrônica. § 1.º (Revogado.). § 2.º (Revogado.). § 3.º (Revogado.). § 4.º A fiança será aplicada de acordo com as disposições do Capítulo VI deste Título, podendo ser cumulada com outras medidas cautelares.

8.1 MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS: ROL TAXATIVO

A prisão administrativa, antes prevista no art. 319 do CPP, já era objeto de controvérsia na doutrina. Muitos autores defendiam a sua não recepção pela Constituição Federal de 1988. Os casos práticos inexistiam, motivo pelo qual não se formou jurisprudência a respeito. Em boa hora, desaparece do sistema processual penal.

O novo art. 319 traz o rol das medidas cautelares, alternativas à prisão, podendo significar uma mudança de mentalidade dos operadores do Direito e também no quadro prisional brasileiro. Muitos acusados, que merecem algum tipo de restrição em sua liberdade, pelo fato de estarem respondendo a processo-crime, em virtude da prática de crime grave, não precisam, necessariamente, seguir para o cárcere fechado. Por vezes, medidas alternativas serão suficientes para atingir o desiderato de mantê-lo sob controle e vigilância.

Conferir: STJ: “Com a inovação legislativa introduzida pela Lei 12.403/2011, o Código de Processo Penal passou a capitular diversas providências substitutivas à prisão, sendo essa aplicada apenas quando aquelas não se mostrarem suficientes à repressão e a reprovabilidade do delito.” (HC 219.101/RJ, 5.ª.T., v.u., rel. Min. Jorge Mussi, 10.04.2012).

TRF-1.ª Reg.: “Ademais, com a edição da Lei 12.403/2011, que alterou significativamente o regime de medidas cautelares e liberdade provisória do Código de Processo Penal, houve uma predisposição veemente do legislador pátrio pela substituição da prisão preventiva por outras medidas cautelares que, quando pertinentes, atendam mutatis mutandis à mesma finalidade processual da medida extrema, ou mesmo pela aplicação autônoma de tais medidas, de acordo com cada caso.“ (HC 0020808-41.2012.4.01.0000-MG, 3.ª T., v.u., rel. Assusete Magalhães, 25.05.2012).

TRF-1.ª Reg.: “A Lei 12.403/2011, que alterou a sistemática das medidas assecuratórias da ação penal, elenca um rol de medidas restritivas de direitos menos gravosas ao réu, em estrita obediência aos princípios constitucionais da presunção de inocência, ampla defesa e devido processo legal, sendo certo que a prisão preventiva, medida excepcional, se revela como última providência a ser adotada, quando as demais não se mostrarem suficientes.” (HC 0074612-55.2011.4.01.0000-BA, 3.ª T., v.u., rel. Carlos Olavo, 13.04.2012).

TRF-2.ª Reg.: “É legitima a prisão preventiva quando provada a materialidade e autoria, bastando seja demonstrada a insuficiência das medidas cautelares em substituição previstas no art. 319 do CPP.” (HC 2011.02.01.016718-8-RJ, 2.ª T., v.u., rel. Nizete Antonia Lobato Rodrigues, 14.02.2012).

TJSP: “Tráfico ilícito de entorpecentes. Conversão da prisão em flagrante em preventiva – Vedação da liberdade provisória aos flagrados pelo crime de tráfico declarada inconstitucional pelo Pleno do STF (HC 104.339/SP, j. 10.05.2012) Análise da prisão cautelar sob o enfoque do art. 312, CPP, sob a ótica da Lei 12.403/2011 – Prisão cautelar que se mostra como exceção no nosso sistema – Inexistência de elementos que, concretamente, justifiquem a prisão preventiva Liberdade provisória concedida.” (HC 0151464-57.2012.8.26.0000-SP, 16.ª Câm. Dir. Crim., rel. Newton Neves, 05.09.2012).

TJSP: “Ausentes os requisitos ensejadores da prisão preventiva, de rigor o deferimento da liberdade provisória, sem fiança, mediante a imposição de medidas cautelares, nos termos do artigo 319, incisos I, II, IV e V, do Código de Processo Penal, com sua nova redação dada pela Lei 12.403/2011.” (HC 0139079-77.2012.8.26.0000-12.ª Câm. Dir. Crim., rel. Paulo Rossi, 05.09.2012).

TJMG: “A Lei 12.403/2011, que alterou substancialmente o sistema das prisões no Código de Processo Penal, prevê de forma expressa o princípio da proporcionalidade, composto por dois outros, quais sejam: adequação e necessidade. 5. A prisão preventiva, espécie de medida cautelar, passou a ser exceção na sistemática processual, dando, o quanto possível, promoção efetiva ao princípio constitucional da não culpabilidade. 6. Possível a aplicação de outras medidas cautelares, a prisão deve ser evitada.” (HC 0874003-36.2012.8.13.0000-MG, 7.ª Câm. Crim, rel. Marcílio Eustáquio Santos, 30.08.2012).

TJMG: “A prisão preventiva, como medida excepcional que é – e, agora, com edição da Lei 12.403/2011, muito mais ainda –, não pode ser assentada em hipóteses e meras conjecturas, ou mesmo na gravidade em abstrato do delito, devendo resultar de fatos concretos, que demonstrem a presença dos requisitos do artigo 312 do CPP” (RSE 0408558-93.2012.8.13.0079-MG, 2.ª Câm. Crim., rel. Beatriz Pinheiro Caires, 23.08.2012).

TJPB: “No novo regramento da Lei 12.403/2011 – o confinamento, mesmo provisório, é exceção, pois o regramento prevalente é o da liberdade. Por isso, imprescindível à demonstração cabal da colisão, no caso, do princípio da preservação da paz social com o da liberdade individual e, o eventual comprometimento daquela por esta.” (HC 09820120008887001-PB, Câm. Crim., rel. Carlos Martins Beltrão Filho, 19.06.2012).

Os requisitos para a decretação das medidas cautelares estão previstos no art. 282, I e II, do CPP: a) necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou instrução criminal e para evitar a prática de infrações penais; b) adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado.

Esse rol do art. 319 é taxativo ou exemplificativo? Pensamos seja taxativo, pois, cuidando-se de medidas restritivas à liberdade, deve-se respeitar a estrita legalidade, vale dizer, previsão expressa em lei. No mesmo prisma, Gustavo Badaró (Medidas cautelares no processo penal – prisões e suas alternativas, Og Fernandes (coord.), São Paulo: Ed. RT, 2012, p. 231).

Em contrário: TRF-4.ª Reg.: “Tem há muito admitido esta Corte a criação jurisprudencial de medidas cautelares, ainda que sem específica previsão normativa, dentro dos limites da necessidade e suficiência, pois além de se constituírem em medidas ínsitas à jurisdição, são elas criadas em favor do processado, substitutivamente à mais gravosa cautelar legal de prisão. Política criminal encampada na Lei 12.403/2011, ampliadora do rol legal de cautelares no processo penal.” (HC 5015479-13.2011.404.000, 7.ª T., v.u., rel. Néfi Cordeiro, 08.11.2011).

Em perspectiva diferenciada, Silvio Maciel argumenta: “sem ingressarmos na discussão sobre a existência ou não do poder geral de cautela do juiz penal, temos que o extenso rol das medidas cautelares diversas da prisão (e ainda a prisão domiciliar) trazidas pelo CPP torna inútil a criatividade judicial de imaginar, no caso concreto, outras medidas não previstas em lei. Se todas essas medidas, aplicadas isolada ou cumulativamente (art. 282, § 1.º, CPP), não forem suficientes, parece-nos que será mesmo o caso de se recorrer à medida extrema da prisão” (Prisão e medidas cautelares, 2. ed., Luiz Flávio Gomes e Ivan Luís Marques (coord.), São Paulo: Ed. RT, 2011, p. 179).

8.2 ESPÉCIES DE MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS

São elas:

1. comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades.

Essa medida cautelar não é desconhecida do sistema penal brasileiro. Na realidade, tem funcionado como condição para o gozo de vários benefícios, tais como, exemplificando, o regime aberto (art. 115, II, LEP), o livramento condicional (art. 132, § 1.º, LEP) e o sursis (art. 78, § 2.º, c, CP).

Aufere, agora, o status de medida cautelar, significando uma restrição à liberdade a ser imposta, com cautela, para crimes compatíveis com tal necessidade. Parece-nos medida ideal para os agentes de delitos patrimoniais, mormente os mais graves, quando se perceber que o autor não tem emprego certo ou residência fixa. O acompanhamento da sua vida, durante o inquérito ou processo, constitui medida positiva. Afinal, se não cumprir ou se apresentar conduta incompatível com as atividades esperadas de quem responde a processo-crime, pode ser preso preventivamente.

2. proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações.

A proibição de frequentar lugares também não é novidade. Sempre foi utilizada como condição de outros benefícios, tais como sursis (art. 78, § 2.º, a, CP) e livramento condicional (art. 132, § 2.º, LEP). Além disso, por meio da Lei 9.714/1998, cometeu-se a impropriedade de elegê-la como pena alternativa (art. 47, IV, CP). Admitindo-se que fosse útil como condição para a fiscalização de medidas penais, calcadas em política criminal, como o sursis ou o livramento condicional, não havia sentido em inseri-la no contexto de pena autônoma, substituindo pena privativa de liberdade, de até quatro anos, pois a tendência natural seria gerar impunidade.

Outra não foi a conclusão extraída das diversas sentenças condenatórias, proferidas nos últimos anos: a proibição de frequentar lugares, como pena autônoma, foi raramente aplicada. O motivo sempre foi óbvio, pois implicava ineficácia e excessiva benevolência. Nunca houve a devida fiscalização e jamais se conseguiu afirmar como sanção penal, levando-se em conta o seu caráter retributivo e preventivo.

Porém, como medida cautelar, é possível que tenha maior eficiência. Buscar-se-á, com sua imposição, evitar o cometimento de novos crimes, contornando-se os conflitos tipicamente existentes em certos locais, como botequins e demais lugares onde se serve bebida alcoólica sem controle algum. Serve para autores de crimes agressivos (lesão corporal, rixa etc.). Ou, sob outro prisma, para quem estiver envolvido com prostituição, focando os locais onde tal prática é realizada, comumente.

3. proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante.

Essa medida surgiu, pela primeira vez, na Lei 11.340/2006, tutelando a violência doméstica e familiar, como medida protetiva de urgência, que obriga o agressor a se manter afastado da ofendida, de seus familiares e de testemunhas, estabelecendo-se um limite mínimo de distância entre estes e o agente (art. 22, III, a, Lei 11.340/2006).

Surge, agora, em caráter geral, no Código de Processo Penal, abrangendo variadas situações, em particular, focando-se nos crimes em que autor e vítima se conhecem, motivo pelo qual podem continuar seus conflitos, após o início da investigação ou do processo.

É medida válida para tentativa de homicídio, lesão corporal, delitos contra a honra, crimes contra a dignidade sexual, dentre outros similares.

4. proibição de se ausentar da Comarca, quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução.

Esta é providência representativa de condição de sursis (art. 78, § 2.º, b, CP), livramento condicional (art. 132, §§ 1.º e 2.º, LEP) e do regime aberto (art. 115, III, LEP).

Não é fácil apontar a sua relevância como medida processual, durante a instrução (ou mesmo durante a investigação), exceto em alguns casos, onde for necessário promover o reconhecimento de pessoa ou a acareação. No mais, o réu tem direito de acompanhar a instrução do feito – e não obrigação. Logo, pode afastar-se quando bem entender, desde que tal atitude não signifique fuga.

A imposição dessa medida cautelar, segundo nos parece, deve vir acompanhada de outra, mais relevante ao caso concreto.

5. recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos.

A nova medida cautelar repete a figura do regime aberto, na modalidade de prisão albergue domiciliar. Neste caso, o condenado deve recolher-se à sua casa todos os dias, no período noturno, bem como nos fins de semana e dias de folga.

Pode ser que, como medida processual, obtenha mais sucesso do que como pena, afinal, se descumprida, pode acarretar prisão preventiva, um justo temor de quem ainda nem mesmo é condenado. No campo da pena, tem se mostrado ineficaz o regime aberto, quando cumprido em residência.

Parece-nos lógica a exigência de se fixar essa medida somente quando o indicado ou réu tiver residência estabelecida, porém, ter trabalho fixo não nos soa necessário.

Pode ser medida aplicável a crimes em geral, evitando-se que o acusado se mantenha em contato social, quando fora da sua atividade laborativa.

6. suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais.

A medida pode ser ideal para crimes contra a administração pública (ex.: corrupção, concussão, prevaricação etc.), bem como para delitos econômicos e financeiros, evitando-se a preventiva, que tenha por fundo a garantia da ordem econômica. Como já mencionamos, uma das razões para a decretação da prisão cautelar, nesse cenário, é a persistência do réu na continuidade de negócios escusos. Assim, a sua suspensão do exercício da atividade pode ser suficiente para aguardar o desenvolvimento do processo.

7. internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração.

Supre-se, finalmente, a lacuna existente, até hoje, em relação à prisão provisória de doentes mentais e perturbados. A medida de segurança provisória foi extinta, com o advento da Lei de Execução Penal. A única possibilidade de se manter seguro o enfermo mental, que tenha cometido fato criminoso grave, era pela decretação da prisão preventiva. Porém, quando esta era concretizada, o sujeito costumava ser mantido no mesmo cárcere, sem a devida transferência para um hospital ou casa de custódia e tratamento.

Agora, substituindo-se a prisão preventiva, adota-se a denominada internação provisória, que deve realizar-se em locais apropriados, separados do cárcere comum.

Apesar de se exigir a conclusão pericial de inimputabilidade ou semi-imputabilidade para a adoção da medida, conforme o caso, deve o juiz valer-se de seu poder geral de cautela, determinando a internação provisória, antes mesmo do laudo ficar pronto, pois é incabível manter-se em cárcere comum o doente mental, que exiba nítidos sinais de sua enfermidade. Sendo necessário, pode-se colher um parecer médico prévio ou fiar-se em documentos emitidos por médico particular para se chegar a tal medida, em caráter urgente.

8. fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada a ordem judicial.

A fiança é uma garantia real, consistente no pagamento de determinado valor em dinheiro ou na entrega de bens ao Estado, com o fim de assegurar o direito de permanecer em liberdade, no curso de investigação ou processo.

O instituto era utilizado, apenas, para servir de alternativa à prisão em flagrante; quando o juiz verificasse a sua legalidade, mas não estando presentes os requisitos da preventiva, concedia liberdade provisória, com ou sem fiança. Imposta a fiança, ficava o réu seguro pelo valor desembolsado, ou seja, se fugisse, poderia perder o que pagou.

Hoje, ainda se mantém a liberdade provisória, na avaliação do auto de prisão em flagrante, com ou sem fiança (art. 310, III, CPP). Nesse prisma, a fiança permanece com seu caráter de garantia real.

Porém, inovando, insere-se a fiança como medida cautelar, desvinculada da prisão em flagrante. Pode-se, em qualquer crime, seguindo-se os requisitos do art. 282 do CPP, estabelecer o pagamento de determinada quantia, como forma de assegurar a presença do réu nos atos processuais e evitar sua ausência do distrito da culpa, sob pena de perda econômica.

Parece-nos medida útil, especialmente para crimes econômicos, financeiros e tributários, onde o agente, como regra, tem maior poder aquisitivo. É uma forma alternativa à prisão preventiva, para a garantia da ordem econômica.

Temos dúvida quanto à sua eficiência para evitar a obstrução do andamento do processo ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial. Essas hipóteses soam como causas típicas de prisão preventiva, por conveniência da instrução criminal. Afinal, se alguém está prejudicando o andamento do feito ou não quer cumprir ordem judicial, não vemos razão para aplicar-lhe fiança; pode até recolher o seu valor e continuar a perturbar a instrução. E quanto o juiz resolver decretar a preventiva, pode ser tarde demais, com graves prejuízos para a produção da prova.

Por derradeiro, cabe ressaltar que a fiança poderá ser imposta isolada ou cumulativamente com outras medidas cautelares.

9. monitoração eletrônica.

A Lei 12.258/2010 criou a viabilidade legal de se determinar a monitoração eletrônica de condenados para dois fins: saída temporária no regime aberto e prisão domiciliar (art. 146-B, LEP).

Muito tímidas foram as possibilidades instituídas e não chegam a provocar nenhuma alteração de monta no sistema carcerário. Quem possuía o direito à saída temporária, continuará gozando do benefício, embora possa ser monitorado. O condenado que conseguiu a prisão domiciliar (P. A.D.) pode ser fiscalizado por monitoração eletrônica.

Nota-se, pois, não ter havido nenhum incremento à desprisionalização de sentenciados.

Surge, agora, a monitoração eletrônica, como medida cautelar, servindo para fiscalizar os passos do indiciado ou réu. Pode ser que, nesta hipótese, o juiz deixe de decretar a prisão preventiva, optando pela monitoração eletrônica e, com isso, diminuindo a população carcerária.

Entretanto, a lei processual não fornece parâmetros para a aplicação dessa nova medida cautelar, ficando ao critério de cada magistrado regular as suas condições e limites. Além disso, será preciso implantar centrais de monitoração eletrônica em várias regiões para que se possa utilizar desse novo instrumento como medida cautelar.

Não somente o juiz da execução penal terá acesso a tal controle por meio eletrônico, mas também o juiz processante. Haverá verba e interesse suficientes para instalar essas centrais de monitoração, além de permitir que todos os juízes brasileiros fixem tal medida? Enquanto os recursos não vierem e a viabilidade prática não ocorrer, trata-se de medida cautelar inoperante.

8.3 DETRAÇÃO PENAL

Quanto à possibilidade de detração, manifestamo-nos em outras de nossas obras, pela possibilidade de se utilizar a medida cautelar alternativa para tal efeito se e somente se a pena aplicada for idêntica à cautelar experimentada pelo acusado. Exemplo: aplicada a medida cautelar de proibição de frequentar lugares, seguida pela pena restritiva de direitos de proibição de frequentar lugares, por óbvio, há que se operar a detração. Afinal, o réu não deve cumprir duas vezes a mesmíssima restrição. Seria um inadmissível bis in idem.

Porém, se a medida cautelar restringe algum direito, como a proibição de manter contato com pessoa determinada, seguindo-se pena privativa de liberdade, em qualquer dos regimes (fechado, semiaberto ou aberto), inexiste palco para a detração. São sanções penais completamente diversas, não se podendo compensá-las.

Por fim, caso a medida cautelar estabelecida pelo magistrado for considerada mais grave que a própria pena, pode-se, também, falar em detração, por analogia in bonam partem. É o que temos defendido quando o acusado enfrenta um período de prisão cautelar, para, ao final, ser apenado ao pagamento de multa. Não há sentido algum em lhe cobrar a sanção pecuniária se o pior já lhe adveio, que foi a prisão.

No mesmo sentido: Silvio Maciel (Prisão e medidas cautelares. 2. ed., Luiz Flávio Gomes e Ivan Luís Marques (coord.), São Paulo: Ed. RT, 2011, p. 180).

Como era

Art. 320. A prisão decretada na jurisdição cível será executada pela autoridade policial a quem forem remetidos os respectivos mandados.

Como ficou

Art. 320. A proibição de ausentar-se do País será comunicada pelo juiz às autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional, intimando-se o indiciado ou acusado para entregar o passaporte, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas.

8.4 PROIBIÇÃO DE SE AUSENTAR DO PAÍS

O disposto no anterior art. 320, agora substituído, era supérfluo. Mencionava o óbvio: a prisão decretada por juiz civil (devedor de alimentos) deveria ser cumprida pela polícia. Essa sempre foi a regra.

A atual disposição contempla, principalmente, a medida cautelar prevista no art. 319, IV (proibição de se ausentar da Comarca). Não sendo permitido deixar o local onde vive, por óbvio, não cabe ao indiciado ou réu ausentar-se do País. Por isso, em boa hora, deixa-se claro ser adequada a comunicação às autoridades federais, que fiscalizam as saídas do território nacional, recolhendo-se o passaporte, em 24 horas, após a intimação, sob pena de desobediência.

Na jurisprudência:

STJ: “1. Para se restringir o direito do indivíduo, necessária se faz a normatização da medida, não cabendo ao julgador, com espeque no poder geral de cautela, cominá-la ao seu talante, em atenção aos princípios da presunção da inocência e da legalidade. 2. A posterior Lei 12.403/2011 elencou algumas medidas cautelares pessoais passíveis de aplicação pelo magistrado; dentre as quais, a proibição de ausentar-se do País, com a retenção do passaporte. 3. In casu, não se determinou a entrega do passaporte, apenas a inviabilidade da acusada e do corréu de ausentarem-se do País, oficiando-se às autoridades competentes. 4. De se notar que a condição imposta para a liberdade decorre do termo de compromisso aceito pela paciente, no qual se compromete a comparecer a todos os atos processuais, estando a medida aplicada em consonância com o ordenamento jurídico vigente à época. 5. Estipulada a proibição de afastar-se do distrito da culpa para os delitos afiançáveis – artigo 328 do Estatuto Processual Repressivo –, com mais propriedade deve ser imposto para os crimes inafiançáveis. 6. Ordem denegada” (HC 139.235/GO, 6.ª T., v.u., rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 26.06.2012).

RESUMO DO CAPÍTULO

Elimina-se do cenário processual penal qualquer modalidade de prisão administrativa.

Criam-se várias medidas cautelares, alternativas à prisão preventiva, quando possível a substituição.

Várias delas já são conhecidas como condições para o gozo de sursis, livramento condicional ou regime aberto. Há, inclusive, medida cautelar utilizada como pena alternativa, caso da proibição de frequentar lugares.

O sucesso ou fracasso das novas medidas dependerá de dois fatores preponderantes: a) a efetiva aplicação pelos juízes; b) o apoio, em forma de recurso estatal, para muitas delas, como, por exemplo, a monitoração eletrônica.

A mais importante novidade diz respeito à internação provisória, que permite o recolhimento cautelar de enfermos e perturbados mentais, que tenham cometido fato criminoso grave, sob suspeita de reiteração. Havia lacuna nesse sentido, pois a medida de segurança provisória fora revogada pela Lei de Execução Penal.

A fiança é ampliada, deixando de ser somente uma garantia real, aplicada na concessão de liberdade provisória, para tornar-se medida cautelar, passível de cumulação com outras medidas provisórias.

Instaura-se a monitoração eletrônica como medida cautelar, dilatando, sobremaneira, a sua relevância, antes restrita às saídas temporárias de presos no regime semiaberto e às prisões domiciliares (P. A. D.).