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PROCESSO CAUTELAR

8.1  FINALIDADE DA AÇÃO CAUTELAR E SUA DISTINÇÃO EM RELAÇÃO ÀS DEMAIS ESPÉCIES DE MEDIDAS DE URGÊNCIA

Algumas ações judiciais, como a cautelar, conferem ao autor (e somente ao autor) a prerrogativa de receber resposta jurisdicional no início ou no curso do processo, até mesmo antes da ouvida da parte contrária, ou seja, antes do estabelecimento do contraditório.

Apenas como ilustração, destacamos o mandado de segurança e a ação de qualquer natureza com pedido de tutela antecipada, sendo espécies do gênero medidas de urgência, marcadas pela preocupação em se tutelar o direito material, evitando que pereça pelo decurso de tempo, sem resposta jurisdicional de proteção.

Não obstante a semelhança, são marcantes as diferenças existentes entre a medida cautelar e os demais instrumentos que contemplam a possibilidade do deferimento de liminar no início ou no curso do processo. O mandado de segurança objetiva a declaração de uma ilegalidade ou do abuso de poder, escorando-se na existência de direito líquido e certo, ou seja, direito apoiado em prova pré-constituída, sabido que a ação mandamental não apresenta fase de instrução probatória, reclamando que todas as provas venham em companhia da petição inicial, sob pena de o magistrado concluir que não é caso de mandado de segurança, justificando o indeferimento da inicial (art. 10 da Lei 12.016/2009), por ausência de interesse de agir, consubstanciado na inadequação da via eleita.

Na demanda de qualquer natureza (ação de cobrança, ação de indenização por perdas e danos, ação possessória de força velha, ação de execução etc.), que apresenta pedido de tutela antecipada, defere-se ao autor, no início do processo e por meio da liminar que o beneficia, a possibilidade de conviver com os efeitos da própria sentença final, que não foi sequer prolatada.

Confere-se ao autor parcela do próprio direito material e/ou da resposta jurisdicional almejada, diante da demonstração da existência de verossimilhança da alegação e de requisito em acréscimo (periculum in mora ou manifesto propósito protelatório do réu), com nítido caráter de satisfatividade, podendo o magistrado revogar a decisão a qualquer tempo durante o curso do processo, desde que fundamente o pronunciamento, em respeito ao princípio previsto no inciso IX do art. 93 da CF, demonstrando que não mais se fazem presentes os requisitos que autorizaram a concessão da medida de urgência em momento anterior.

Na ação cautelar, ao contrário, a liminar não tem força para deferir ao autor a parte ou a totalidade do direito que se pretende seja conferido por meio da sentença final, na ação principal. Defere-se apenas uma providência cautelar com o propósito de assegurar o resultado útil do processo principal, protegendo o bem ou o direito a ser disputado pelas partes na ação por vir.

Não fosse assim, a cautelar estaria atuando como a própria ação principal, dispensando sua propositura. Apenas como exemplo, perceba a hipótese de particular que decide ingressar com ação cautelar contra empresa que aliena veículos, por ter sido surpreendido com ato praticado por representante legal da pessoa jurídica, que, de forma indevida, alienou a um terceiro o bem adquirido pelo autor em momento anterior.

Em outras palavras, o automóvel foi vendido a duas pessoas, com duplo pagamento do preço, sendo a posse transferida a apenas um dos compradores, que não é o autor.

Ao propor a ação, o autor não pode pleitear que a liminar lhe atribua a propriedade do veículo, posto que essa pretensão é própria da ação principal. Ali sim se disputará o próprio direito, no caso o de propriedade.

Na ação cautelar, como resultado da liminar, ao autor apenas pode ser destinada a posse do veículo ou a nomeação de depositário para que conserve a coisa como se sua fosse, ou o veículo ser posto sob a guarda de um terceiro até julgamento final da pretensão. O pedido liminar refere-se à proteção do direito em disputa, sendo medida de índole processual, servil ao processo principal, não ao direito em confronto.1

Desse modo, com pretensão didática, podemos estabelecer as diferenças principais entre as medidas de urgência da seguinte forma:

 

AÇÃO CAUTELAR

TUTELA ANTECIPADA

MANDADO DE SEGURANÇA

Natureza jurídica

Ação judicial

Pedido, que pode ser formulado em qualquer espécie de ação

Ação judicial

Finalidade principal

Proteger o bem ou o direito a ser disputado na ação principal, sendo-lhe servil, com caráter conservativo

Permitir ao autor a convivência com os efeitos da sentença com caráter satisfativo

Obter a declaração e o reconhecimento da ilegalidade ou do abuso de poder denunciado na petição inicial

Requisitos

Fumus boni juris e periculum in mora

Prova inequívoca da verossimilhança da alegação e periculum in mora ou prova inequívoca da verossimilhança da alegação e manifesto propósito protelatório do réu

Direito líquido e certo, ato de autoridade e periculum in mora

8.2  CARÁTER ACESSÓRIO DA MEDIDA CAUTELAR E SUAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICO-PROCESSUAIS

A ação cautelar é acessória em relação à demanda principal. A constatação acarreta como consequências:

a)   A fixação da competência para a propositura da medida cautelar em face da competência para a demanda principal, ou seja, a cautelar deve ser distribuída perante o juízo competente para a propositura da ação principal (foro de domicílio do réu, nas ações fundadas em direito pessoal – art. 94 do CPC – ou foro de situação da coisa, nas ações fundadas em direito real – art. 95 da mesma Codificação).

b)   A extinção do processo cautelar em ocorrendo a extinção da demanda principal (ver inciso III do art. 808 do CPC).

O Código de Processo Civil trata algumas medidas cautelares como satisfativas, dispensando o autor de propor a demanda principal dentro do prazo de 30 dias, contados da efetivação de liminar deferida em favor do promovente. Estas cautelares são as seguintes:

a)   Notificação.

b)   Interpelação.

c)   Protesto.

d)   Antecipação de prova.

e)   Exibição.

f)   Justificação.

A justificativa do tratamento diferenciado decorre da constatação de que a providência judicial exarada pelo magistrado nos casos indicados não tem o condão de acarretar prejuízo processual e/ou econômico, a determinar o açodamento do ingresso da ação principal como forma de equilibrar a relação processual, com a concessão de oportunidade ao réu para apresentação da sua defesa, em respeito aos primados do contraditório e da ampla defesa. O recebimento da inicial, nas situações estudadas, é seguido do deferimento de providência jurisdicional despida de gravame processual (a simples expedição de mandado judicial de caráter não constritivo; a nomeação de perito para a elaboração de laudo; a exibição de documento ou coisa; a designação de audiência em regime de urgência etc.).

A essas cautelares não se aplica a regra do inciso III do art. 801 do CPC, que exige do autor a indicação da “lide e seu fundamento” na petição inicial da demanda cautelar, ou seja, a indicação do nomen juris da ação principal a ser proposta. O requisito em exame é específico, somando-se aos previstos no art. 282 do CPC, incidentes na redação de toda e qualquer petição inicial, independentemente do rito que a ação venha a assumir (comum ordinário, sumário, especial ou sumaríssimo) ou da espécie de jurisdição (de conhecimento, cautelar ou executiva).

A ação principal pode até ser proposta como consequência do desatendimento ou das conclusões da ação cautelar, mas sem o açodamento, como se dá com as demais cautelares típicas ou atípicas, do seu ingresso no prazo de 30 dias.

Além disso, as cautelares ditas satisfativas não previnem a competência para a propositura da ação principal, que pode ser ajuizada perante juízo diverso do que processou a demanda cautelar.

De qualquer sorte, sendo a cautelar acessória em relação à demanda principal, inclina-se para assegurar o resultado útil desta, resguardando a higidez do bem ou do direito a ser disputado na ação em referência.

8.3 PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE

Às cautelares aplica-se o chamado princípio da fungibilidade, podendo o magistrado processar medida equivocada, recebendo-a como se a correta houvesse sido intentada. Apenas para exemplificar, o juiz pode receber e processar como sequestro medida cautelar que recebeu da parte a denominação de arresto, por manifesto equívoco.

Com o princípio da fungibilidade se confirma a regra de que o nomen juris não tem qualquer relevância ou importância para o julgamento do processo. Fundamental é que os elementos da ação se encontrem presentes, em sintonia, ou seja, partes, causa de pedir e pedido.

8.4 CAUTELARES TÍPICAS

As cautelares típicas ou nominadas, previstas a partir do art. 813 do CPC, não são hierarquicamente superiores às cautelares atípicas ou inominadas, não havendo qualquer diferença processual entre as espécies, igualando-se no modo procedimental e nos requisitos gerais, comuns a todas as cautelares, como tais o fumus boni juris e o periculum in mora.

Dentre as nominadas, destacamos as seguintes espécies, pela repetição de trato em provas de Exames de Ordem, desprezando outros modelos pouco explorados pelas Comissões:

8.4.1 Arresto

a)   Objetiva a apreensão de bens integrados ao patrimônio do devedor, para conversão em penhora em futura ação de execução por quantia certa a ser proposta em momento posterior, sendo esta a demanda principal mais corriqueira. A cautelar incide sobre coisa indeterminada, servindo como instrumento de garantia em favor do autor, para que a coisa seja transformada em dinheiro na ação principal, permitindo a satisfação do credor.

b)   Exige a presença de um devedor qualificado no processo, não de um devedor qualquer, qualificação de natureza negativa, consistindo em devedor que não apresenta domicílio certo, que intenta ausentar-se ou alienar bens do seu patrimônio, como forma de evitar o cumprimento da obrigação assumida com um credor.

c)   Exige a presença de um credor qualificado, sendo a virtude consubstanciada no fato de portar título executivo judicial ou extrajudicial. O autor não tem apenas expectativa de direito em relação ao réu, mas crédito líquido e certo, apoiado no título correspondente.

d)   Em relação a essa espécie cautelar, por impor prejuízo ao devedor, aplica-se a contagem do prazo de 30 dias para a propositura da ação principal.

e)   Como medida preparatória de futura ação de execução, deve ser proposta perante o juízo competente para a ação ou para a fase executiva, seguindo as regras que emanam dos arts. 575 e 576 do CPC (juízo de formação do título, sendo este judicial; juízo do lugar do pagamento, do domicílio do réu ou foro contratual, sendo o título extrajudicial).

f)   Como o arresto será convertido em penhora na ação de execução, apenas poderá incidir sobre bens penhoráveis, com as mesmas regras que se aplicam à execução.

g)   O credor não tem direito ao bem arrestado, servindo este à garantia do juízo, devendo ser levado à hasta pública, no término da execução (ressalvada a possibilidade de o credor requerer a adjudicação do bem, como espécie preferencial de pagamento – ver art. 685-A do CPC), convertendo-se em favor do credor eventual crédito apurado com a venda judicial do bem, reforçando a tese de que o arresto incide sobre coisa indeterminada.

h)   Para o deferimento do arresto, o magistrado pode designar dia e hora para a realização da audiência de justificação, com o objetivo de colher o depoimento de testemunhas arroladas pelo autor, ato que pode ser consumado em segredo de justiça, evitando que a ciência do réu possa tornar a medida inócua.

i)   A audiência em exame é dispensada se a medida for requerida pela União, Estado-membro ou Município, ou se o credor prestar caução, no gênero, com as espécies da caução real e da caução fidejussória.

j)   O arresto cessa pelo pagamento (representando a extinção da própria obrigação), pela novação ou pela transação.

8.4.2 Sequestro

a)   Semelhante à cautelar de arresto (porque também importa a apreensão de bem que se encontra na posse do réu), o sequestro diferencia-se por incidir sobre coisa determinada, que se encontra em poder do réu e que será disputada na ação principal, de direito real ou pessoal.

b)   A essa espécie se aplica o art. 806 do CPC, forçando o autor a ingressar com a ação principal no prazo de 30 dias, contados da efetivação da liminar de sequestro.

c)   Ao deferir a providência liminar, o juiz nomeia depositário para que permaneça na posse e guarda do bem, até que se defina o seu destino na ação principal, sendo a coisa entregue ao auxiliar do juízo após a assinatura do termo de compromisso.

d)   Se a ação principal for a de execução, reclama a espécie da execução para entrega de coisa certa, não execução por quantia certa (como no arresto), visto que a medida cautelar de sequestro incide sobre coisa certa, como afirmado em linhas anteriores, podendo referir-se a bens móveis ou imóveis e mesmo a coisas coletivas.

8.4.3 Busca e apreensão

a)   Incide sobre coisas ou pessoas. No caso das pessoas, a medida só pode incidir em relação aos relativa ou absolutamente incapazes, com previsão nos arts. 3.º e 4.º do CC (menores de dezesseis anos; os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática dos atos da vida civil; os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade; os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido; os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo; os pródigos).

b)   A ação cautelar de que cuidamos é de uso residual, sendo admitida quando o autor pretender efetuar a apreensão de coisa ou de pessoa, sem preencher os requisitos das cautelares de arresto e de sequestro. Assim, se determinada pessoa pretende obter a apreensão de bem que se encontra na posse de outra pessoa, mas não é credor qualificado (pois não porta título judicial ou extrajudicial), pode obter o resultado útil esperado por meio da cautelar de busca e apreensão, desde que preencha os requisitos gerais, como tais fumus boni juris e periculum in mora.

c)   À busca e apreensão se aplica o art. 806 do CPC, forçando o autor a ingressar com a ação principal no prazo de 30 dias, contados da sua efetivação.

8.4.4 Produção antecipada de prova

a)   Consiste no interrogatório da parte, na inquirição de testemunhas e/ou no exame pericial.

b)   O autor deve demonstrar a necessidade de antecipação de parte ou da totalidade da fase de instrução probatória da ação principal, sustentando que a demora na colheita das provas pode importar o seu perecimento (testemunha que se encontra com idade avançada, podendo falecer antes da instrução da ação principal; coisa que está se deteriorando e que necessita ser periciada etc.).

c)   A parte contrária será citada para acompanhar a realização da audiência designada para a ouvida de testemunhas ou da parte, ou ainda para formular quesitos e indicar assistente técnico.

d)   A sentença proferida nesta espécie de cautelar é apenas homologatória da prova, demonstrando a regularidade do procedimento, não ingressando no mérito do conteúdo da prova, na sua valoração.

e)   Não obstante o fato, a parte que se sentir prejudicada com as conclusões da prova pode ingressar com recurso de apelação contra a sentença, apontando vícios meramente formais da decisão.

f)   Não corre o prazo de 30 dias para a propositura da ação principal.

g)   Finda a sua tramitação, os autos permanecem em cartório, possibilitando às partes a obtenção de certidões.

8.4.5 Justificação

a)   Consiste na tomada de depoimentos para formação de prova relativa a determinado fato (existência de união estável; ratificação de tempo de serviço, visando apoiar pedido administrativo de concessão de aposentadoria etc.), sem a urgência própria da medida cautelar de antecipação de prova, ou seja, sem a ameaça de que a prova venha a perecer.

b)   É medida cautelar não contenciosa, que não admite a apresentação de contestação.

c)   A sentença que a desata não ingressa na análise do mérito da prova colhida (para atestar a existência ou a inexistência de união estável, por exemplo), sendo apenas homologatória da prova.

d)   Não corre o prazo de 30 dias para o ingresso da demanda principal pelo fato de a providência deferida pelo magistrado após o recebimento da petição inicial não apresentar o condão de causar prejuízo imediato ao réu.

e)   Considerando a possibilidade de a prova ser utilizada em outra demanda, é indispensável a citação dos interessados.

f)   Se a citação não puder ser realizada de forma pessoal, é necessária a intervenção do Ministério Público, acompanhando a colheita da prova.

8.4.6 Atentado

a)   Tem por finalidade preservar os fatos da causa principal, a fim de que permaneçam íntegros até a sentença, evitando que qualquer das partes viole penhora, arresto, sequestro, imissão na posse, prossiga em obra embargada ou que pratique qualquer outro ato tendente a inovar no estado fático do processo.

b)   É medida de proteção voltada à tutela dos fatos do processo, dando ao magistrado condições de conhecê-los tal como ocorridos no início do embate.

c)   Exige-se que a alteração fática seja ilegal, além de prejudicial à parte contrária, tentando o seu responsável dificultar o julgamento da ação ou levar vantagem descabida, como, por exemplo, com o réu que alega ter realizado benfeitorias na coisa disputada (com vistas a exercitar retenção posterior), tratando de edificar outras benfeitorias no curso da possessória, como forma de dificultar o pagamento pela parte contrária, como pré-condição para sua imissão na posse em decorrência da procedência da demanda possessória.

d)   É sempre incidental, reclamando ação principal em curso.

e)   Embora não previsto no Código de Processo Civil, doutrina e jurisprudência admitem o deferimento de liminar no início do processo.

f)   A competência para apreciá-la será sempre do juiz da causa principal, ainda que os autos se encontrem no tribunal.

g)   A sentença que a desfecha tem natureza mandamental, determinando ao réu que restabeleça o status quo ante, e eventualmente condenatória, se o atentado causou prejuízos ao autor.

8.5 CAUTELARES ATÍPICAS

Além das cautelares típicas indicadas em linhas anteriores, o magistrado pode deferir outra providência cautelar em favor do autor, para tanto se exigindo a demonstração do preenchimento dos requisitos gerais, comuns a toda cautelar (seja típica ou atípica), a saber: fumus boni juris e periculum in mora.

Estamos diante do poder geral de cautela, previsto no art. 798 do CPC, sempre respeitando a filosofia de que a ação cautelar deve assegurar o resultado útil da demanda principal, não podendo ser satisfativa, exceto nas hipóteses previstas na Lei de Ritos, antes detalhadas.

A medida cautelar de sustação de protesto, assim nominada pela praxe forense, na verdade é medida cautelar inominada, já que não prevista no capítulo relativo aos procedimentos cautelares específicos, que se inicia pelo art. 813 do CPC.

Não se pode, contudo, em alusão ao poder geral de cautela, conceder-se liminar em medida cautelar inominada com a determinação, dirigida ao réu, de não ingressar com ação judicial contra o autor, posto que tal pedido é juridicamente impossível, ferindo o direito de ação, consagrado na Carta Magna como direito individual e coletivo.2

8.6 CAUÇÃO

O magistrado pode condicionar o deferimento da liminar à prestação de uma caução, no gênero, com as espécies da caução real (materializada por meio da oferta de bens, tornando-se inalienáveis, por ordem judicial, até decisão ulterior) e da caução fidejussória (materializando-se por intermédio da apresentação de um fiador judicial, que garante, por meio do seu patrimônio, o pagamento de eventual prejuízo que venha a ser causado ao promovido como consequência do cumprimento da liminar).

A prestação da caução por terceiro, em sendo causado prejuízo ao réu do processo em decorrência do cumprimento da liminar deferida e a posteriori revogada, impõe a ele (terceiro) o dever de indenizar o prejuízo, de forma objetiva, sem indagar o elemento culpa em relação à sua pessoa.

A determinação de prestação da caução encerra uma faculdade para o magistrado. O ato é discricionário do juiz, segundo pacífico entendimento jurisprudencial.3

De qualquer modo, sendo decisão de natureza interlocutória, pode ser impugnada pelo recurso de agravo, e o não cumprimento da determinação, no prazo assinalado, não importa a extinção do processo cautelar, mas tão somente a revogação da liminar deferida (se o foi para posterior prestação de caução) ou a não concessão da liminar (na hipótese de ter sido condicionada à prestação da caução).

8.7 PERDA DE EFICÁCIA DA MEDIDA CAUTELAR

Em questões de Exame de Ordem, as Comissões têm explorado a matéria relativa à perda de eficácia da medida cautelar, interpretando-se de forma açodada que a hipótese se referiria apenas ao fato de a ação principal não ter sido ajuizada no prazo de 30 dias, contados da efetivação da liminar, regra que é específica para as cautelares preparatórias, não se aplicando às incidentais.

A perda da eficácia da medida cautelar não decorre apenas de a demanda principal não ter sido proposta no prazo referido. Além dessa hipótese, verifica-se a perda da eficácia – ainda – quando a parte não cumpre, em idêntico prazo, a liminar que foi deferida em seu favor.

Temos, assim, dois prazos a considerar, estabelecidos em momentos sucessivos:

a)   um primeiro prazo de 30 dias, contado do deferimento da liminar, visando seu cumprimento, como forma de evitar a manipulação da liminar pelo autor;

b)   um segundo prazo de mais 30 dias, contado da efetivação da liminar, para propositura da ação principal.

A ação principal, assim, pode ser em tese proposta no prazo de até 60 dias, contado do deferimento da liminar, desde que o requerente providencie seu cumprimento nos 30 dias seguintes.4

Apenas para exemplificar, perceba a situação de autor que ingressa com medida cautelar inominada visando obter autorização do magistrado para realização de procedimento cirúrgico, que vem sendo negado pelo réu em arrepio ao que se encontra disposto em contrato firmado (contrato de plano de saúde).

Deferida a liminar, é conferido ao requerente o prazo de 30 dias para efetivá-la, ou seja, para que chegue ao conhecimento do promovido, iniciando-se as restrições relativas ao seu direito. Cumprida dentro do prazo, inicia-se a contagem de nova dilação, também de 30 dias, para a propositura da ação principal.

Em quaisquer das hipóteses, não sendo a liminar cumprida nos 30 dias do seu deferimento, ou não sendo proposta a demanda principal nos 30 dias da efetivação da liminar deferida, haverá caducidade, que deve ser declarada de ofício por sentença terminativa.

8.8 LIMINAR – VEDAÇÃO PARA O SEU DEFERIMENTO

O art. 5.º da revogada Lei 4.348/1964 proibia a concessão de “medida liminar de mandados de segurança impetrados visando à reclassificação ou equiparação de servidores públicos, ou à concessão de aumento ou extensão de vantagens”.

Embora a liminar não pudesse ser deferida em mandado de segurança, percebeu-se que nada obstava, contudo, que fosse deferida no âmbito de medida cautelar, desde que os seus requisitos específicos fossem preenchidos (fumus boni juris e periculum in mora).

Percebendo a brecha, o legislador infraconstitucional editou a Lei 7.969, de 22.12.1989, que previa em seu art. 1.º:

“Aplica-se às medidas cautelares previstas nos arts. 796 a 810 do CPC o disposto nos arts. 5.º e seu parágrafo único e 7.º da Lei 4.348, de 26.06.1964”.

Ou, seja, proibiu-se a concessão de liminar que importasse em reclassificação ou equiparação de servidores públicos, bem como o aumento ou a extensão de vantagens funcionais, também nas ações cautelares.

Posteriormente, a Lei 1.533/1951 (Lei do Mandado de Segurança) e a Lei 4.348/1964 foram revogadas pela Lei 12.016/2009, que agora prevê:

“Art. 7.º (...) § 2.º Não será concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza. (...) § 5.º As vedações relacionadas com a concessão de liminares previstas neste artigo se estendem à tutela antecipada a que se referem os arts. 273 e 461 da Lei n. 5.869, de 11 janeiro de 1973 – Código de Processo Civil.”

Assim, a atual Lei do Mandado de Segurança ainda proíbe a concessão de liminar em alguns casos, estendendo essa proibição à tutela antecipada e à tutela específica da obrigação, previstas, respectivamente, nos arts. 273 e 461 do CPC.

8.9 DINÂMICA DO PROCESSO CAUTELAR

Em linhas anteriores, verificamos uma multiplicidade de ações cautelares, todas se apoiando na coexistência dos requisitos relacionados ao fumus boni juris e ao periculum in mora, sem descuidar da possibilidade de o legislador prever requisitos específicos, que se somam aos gerais, como se dá com a cautelar de arresto, exigindo que o autor seja qualificado e o réu desqualificado em termos de conduta, praticando atos na tentativa de evitar o adimplemento de obrigação constante de título judicial ou extrajudicial.

Alguns processos cautelares têm curso diferenciado do modelo tradicional, admitindo a designação e a realização de audiências, como se verifica em relação às cautelares de arresto e de sequestro. Em outros casos, o recebimento da inicial é seguido da nomeação de perito, que fica encarregado da elaboração de laudo em prazo de logo fixado pelo magistrado, situação que marca a cautelar de antecipação de prova, quando perseguir a realização de perícia de qualquer natureza.

Sem descuidar dessa variedade de procedimentos, cabe-nos detalhar um modelo geral de dinâmica das cautelares, tendo início com a apresentação e a distribuição da petição inicial, qualificando-se como pressuposto de constituição do processo, ato da maior importância no que se refere ao autor, fixando os limites subjetivos e objetivos da ação (quem pede; em face de quem o pedido é formulado; o que pede; e a ratio de pedir).

Quatro caminhos principais se abrem para o magistrado após o recebimento da petição inicial:

a)   Pode indeferi-la, nas situações previstas no art. 295 do CPC.

b)   Pode determinar sua emenda, quando não preencher requisito essencial.

c)   Pode designar dia e hora para a realização da audiência de justificação, quando não se encontrar convicto do preenchimento dos requisitos reclamados para o deferimento de pronto da providência cautelar.

d)   Pode deferir ou indeferir a liminar pleiteada pelo autor por decisão fundamentada, em respeito ao princípio constitucional previsto no inciso IX do art. 93 da CF.

Na última das situações, encontramo-nos diante de decisão interlocutória, que pode ser desafiada pela interposição do recurso de agravo de instrumento, sem prejuízo da apresentação do recurso de embargos de declaração, no caso de o pronunciamento se encontrar marcado pela omissão, pela obscuridade e/ou pela contradição. O cabimento do agravo de instrumento, ao invés do retido, encontra apoio no art. 522 do CPC, já que a decisão combatida tem o condão de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, justificando o uso da espécie destinada ao tribunal competente, com a possibilidade de o relator atribuir-lhe efeito suspensivo.

Com ou sem o deferimento da liminar, o magistrado ordena a citação do réu, a fim de que apresente defesa no prazo de cinco dias, contados da juntada aos autos:

a)   Do mandado de citação.

b)   Do mandado de execução da medida cautelar, quando concedida após o recebimento da inicial ou a justificação prévia.

Com a contestação nos autos, o magistrado abre vista ao autor para que sobre ela se manifeste (em respeito aos primados do contraditório e da ampla defesa e do princípio da bilateralidade da audiência), remetendo o processo à fase de instrução probatória (diante da necessidade de colheita da prova oral), com a prolação de sentença, que não será de mérito (por esta razão não produzindo coisa julgada material), exceto se reconhecer a decadência ou a prescrição.

O pronunciamento final não se projeta para atingir a sentença da ação principal, de modo que, mesmo diante do insucesso do processo cautelar, o autor pode alcançar êxito na ação principal.

8.10 QUESTÕES

1.   (OAB Nacional 2010 – I)   No que se refere ao procedimento cautelar, assinale a opção correta.

a)   Salvo decisão judicial em contrário, a medida cautelar cessa a sua eficácia durante o período de suspensão do processo.

b)   Tratando-se de medida cautelar, o indeferimento da medida não obsta a que a parte intente a ação nem influi no julgamento desta, salvo se o juiz, no procedimento cautelar, acolher a alegação de decadência do direito do autor.

c)   Cabe ao requerente da cautelar propor ação principal no prazo prescricional de trinta dias, contado da data da efetivação da medida, quando esta tiver sido concedida em procedimento preparatório.

d)   Somente quando admitido recurso, eventual medida cautelar será requerida diretamente ao tribunal.

Referência legislativa: art. 810 do CPC.

2.   (OAB 2010.2 – FVG) As medidas cautelares estão expressamente previstas no CPC como forma de instrumentalizar a tutela, tendo natureza eminentemente acessória. Assinale a alternativa que apresente uma regra que disciplina a concessão de medidas cautelares.

a)   o Juiz, como regra, deve deferir medidas cautelares sem a prévia audiência do requerido.

b)   o direito brasileiro admite apenas medidas cautelares incidentais, sendo vedado o uso de medidas prévias.

c)   interposto recurso nos autos principais, fica vedado o requerimento de cautelares.

d)   salvo decisão em contrário, a cautelar conserva sua eficácia mesmo durante o período de suspensão do processo principal.

Referência legislativa: art. 807, parágrafo único, do CPC.

3.   (OAB/SP 134.º) A ação cautelar tem a finalidade própria de

a)   interromper a decadência.

b)   satisfazer direito material.

c)   satisfazer direito já declarado.

d)   garantir a viabilidade da propositura e o desenvolvimento a ação principal.

4.   (OAB/SP 135.º) João, que não tem domicílio certo e é devedor de uma obrigação de dar, tenta ausentar-se ou alienar os bens que possui para alterar a sua situação patrimonial e obrigacional, com o objetivo de prejudicar seus credores. Nessa situação, a medida judicial cabível para evitar que João prejudique o credor da obrigação é

a)   a busca e apreensão.

b)   o sequestro.

c)   o arresto.

d)   o arrolamento de bens.

Referência legislativa: arts. 813 e ss. do CPC.

5.   (OAB/SP 136.º) De acordo com a legislação processual civil, a interposição de ação cautelar preparatória obriga o autor a propor a ação principal no prazo de 30 dias, contados da data

a)   da efetivação da medida cautelar.

b)   da interposição da medida cautelar.

c)   em que o mandato de citação foi juntado aos autos.

d)   do deferimento da medida cautelar.

Referência legislativa: art. 806 do CPC.

6.   (XI Exame de Ordem Unificado – FVG) O arresto e o sequestro constituem procedimentos cautelares específicos. Portanto, constituem medidas concedidas mediante cognição sumária, nas quais o juiz, para a sua concessão, deve verificar a existência de fumus boni iuris e periculum in mora. No que tange a estas medidas cautelares, assinale a afirmativa incorreta.

a)   O arresto busca garantir a efetividade da futura execução de pagar quantia certa, consistindo na apreensão de bens indeterminados do patrimônio do devedor.

b)   No sequestro, considerando que o objetivo é assegurar a entrega de coisa, sempre haverá certeza sobre quem é o dono da coisa. Ou seja, no sequestro a coisa não é e nunca será litigiosa.

c)   A futura execução garantida pelo sequestro não precisa ser desenvolvida, necessariamente, por meio de processo autônomo, sendo admitida que esta seja desenvolvida através de mera fase procedimental (cumprimento de sentença).

d)   O sequestro tem por objetivo assegurar a eficácia de futura execução para a entrega de coisa, consistindo na busca e apreensão de determinado bem do patrimônio do requerido.

7.   (OAB/MG – AGOSTO/2008) Sobre o PROCESSO CAUTELAR aponte a alternativa INCORRETA:

a)   Para o deferimento da medida liminar faz-se necessária a produção de prova inequívoca aliada à verossimilhança das alegações do requerente.

b)   O prazo para oferecimento de contestação é o de 05 (cinco) dias.

c)   O não ajuizamento da ação principal no prazo de 30 dias da efetivação da liminar impõe o término da eficácia da medida de urgência, deferida em ação cautelar preparatória.

d)   Poderá ser preparatório de uma ação de execução.

8.   (OAB Nacional 2009_I) Acerca do processo cautelar, assinale a opção correta de acordo com a legislação processual civil.

a)   Para a concessão de medida cautelar, não se exige prova inequívoca do direito invocado.

b)   A medida cautelar não faz coisa julgada material, ainda que o juiz acolha alegação de decadência ou de prescrição do direito do autor.

c)   Não se admite, no procedimento cautelar, qualquer das espécies de intervenção de terceiros.

d)   No procedimento cautelar, exige-se a cognição exauriente do alegado.

9.   (OAB Nacional 2009_II) Assinale a opção correta com relação aos procedimentos cautelares específicos.

a)   Na busca e apreensão, cabe audiência de justificação prévia.

b)   Os alimentos provisionais têm por finalidade prover o sustento definitivo da parte postulante.

c)   Denomina-se arresto a apreensão cautelar de bens com a finalidade de garantir futura execução para entrega de coisa certa.

d)   O sequestro é medida cautelar destinada a apreender tantos bens quantos forem necessários para garantir futura ação de execução.

10.   (OAB 2011.3 – FGV) A Lei Civil afirma que, a despeito de a personalidade civil da pessoa começar com o nascimento com vida, ao nascituro serão assegurados os seus direitos desde a concepção. Para tanto, é correto afirmar que, na ação de posse em nome de nascituro,

a)   a nomeação de médico pelo juiz para que emita laudo que comprove o estado de gravidez da requerente, assim previsto na lei processual civil, não poderá ser dispensado em qualquer hipótese.

b)   por se tratar de mera expectativa de nascimento com vida, portanto, não tendo o nascituro personalidade civil, fica dispensada a intervenção do Ministério Público na causa.

c)   reconhecida a gravidez, a sentença declarará que seja a requerente investida na posse dos direitos que assistam ao nascituro; não cabendo àquela o exercício do pátrio poder, o juiz nomeará curador.

d)   são documentos indispensáveis à ação o laudo comprobatório do estado gestacional emitido pelo médico nomeado pelo juiz e a certidão de óbito da pessoa de quem o nascituro é sucessor.
No curso de um processo, todos os participantes, a qualquer título, devem agir de forma leal, litigando de boa-fé e tendo por paradigma uma atuação ética.

GABARITO: As respostas destes testes encontram-se no final do livro.

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1     Preciso o ensinamento da doutrina: “De tudo quando se expôs até então subjaz fixada a ideia instrumental-processual da tutela cautelar no sentido de que a sua servilidade é ao processo e não ao direito material da parte. Assim, o juiz, quando arresta, protege a futura penhora. No sequestro, a preservação é à entrega que se pretende na ação principal manejada para esse fim” (NERY JUNIOR, Nelson. Código de Processo Civil comentado e legislação processual civil extravagante em vigor. São Paulo: RT, 1999. p. 1.231).

2      Nesse sentido: “Não é cabível medida cautelar para impedir que a parte contrária ingresse em juízo com a ação ou a execução que tiver contra o requerente (RSTJ 10/474, 12/418, 19/394, 56/317 e 58/200, STJ – RT 661/186, STJ – RT 663/190, STJ – RT 665/183, JTA 105/156). Se o juiz a conceder, sua decisão poderá ser cassada através de mandado de segurança (RSTJ 27/218 e STJ – RT 693/224)”.

3     Nesse sentido: “A jurisprudência do STJ acolhe entendimento no sentido de que não ofende o disposto na parte final do art. 804 do CPC a decisão que deixa de determinar que o requerente de medida cautelar de sustação de protesto de título cambial preste caução real ou fidejussória, pois que tal preceito encerra uma faculdade. De outro modo, a exigência de caução como contracautela é ato de discrição do juiz, mas seu arbítrio pode ser abrandado, sem se lhe retirar o controle da idoneidade da caução” (STJ, REsp 33.172-2/RJ, 3.ª Turma, rel. Min. Waldemar Zveiter, j. 30.08.1993, DJU 11.10.1993, p. 21.317).

4     Nesse sentido, precisa a lição da jurisprudência sobre o assunto: “Concedida a medida liminar ou, se for negada, julgada procedente a ação cautelar, o requerente tem 30 dias para efetivar ou executar a medida, sob pena de caducidade (art. 808, II). Efetivada ou executada, terá mais 30 dias para intentar a ação principal (art. 806), também sob pena de caducidade (art. 808, I). Existindo restrição ao direito do réu, desde o primeiro ato de execução, deste conta-se o prazo, não importando que a medida compreenda outros, efetuados em dias subsequentes. Releva, para fluência do prazo, o momento em que efetivada a medida e não aquele em que se juntou o mandado aos autos” (RSTJ 20/403 e STJ – JTAERGS 77/340).