“Uma ralé pavorosa”
I
Se poloneses eram cidadãos de segunda classe no Governo Geral, judeus então mal se qualificavam como seres humanos aos olhos dos ocupantes alemães, soldados e civis, nazistas e também não nazistas. Os alemães levaram consigo o medo e o desprezo em relação aos judeus que fora instilado na grande maioria deles pela incessante propaganda nazista ao longo dos seis anos e meio anteriores. Nesse período, os judeus da própria Alemanha, menos de 1% da população, haviam sido submetidos a uma crescente discriminação e desapropriação do governo e a surtos periódicos de violência dos ativistas nazistas. Metade deles havia emigrado. Os que permaneceram foram privados dos direitos civis e de seus meios de vida, impedidos de interagir socialmente com os outros alemães, recrutados para esquemas de trabalho forçado e efetivamente eliminados do resto da sociedade alemã. Em novembro de 1938, haviam sido submetidos a uma série de pogroms em escala nacional nos quais praticamente todas as sinagogas alemãs foram destruídas, milhares de lojas de proprietários judeus destroçadas, apartamentos e casas de judeus saqueados e 30 mil homens judeus detidos e colocados em campos de concentração, onde foram espancados e aterrorizados ao longo de várias semanas até serem soltos, depois de dar garantias de que emigrariam. Em seguida, o restante da população judaica da Alemanha foi destituída de suas últimas posses. O processo pelo qual alemães não judeus vieram a considerar seus compatriotas judeus uma raça à parte, a despeito de os judeus da Alemanha compartilharem de todos os aspectos centrais da cultura alemã e não se vestirem nem parecerem diferentes dos outros alemães, foi gradual e desigual, mas, em 1939, já havia percorrido um longo caminho1.
Entretanto, quando os alemães invadiram a Polônia, depararam com uma situação muito diferente. Em 1939, a Polônia continha a maior proporção de judeus de qualquer Estado europeu, somando quase 3,5 milhões, 10% da população, calculados por afiliação religiosa. Mais de três quartos deles viviam nas cidades e nos burgos da Polônia. Havia mais de 350 mil apenas em Varsóvia, somando quase 30% da população da capital. Mais de 200 mil viviam em Lódź, exatamente um terço de seus habitantes. Em mais de 30% das cidades do Governo Geral, os judeus compunham a maioria; 85% deles falavam iídiche ou hebreu como primeira língua, em vez de polonês. A maioria esmagadora praticava o judaísmo. Muitos vestiam-se de forma diferente dos poloneses cristãos e usavam barbas ou cachos laterais por motivo religioso. Formavam uma minoria nacional distinta que o governo militar polonês antissemita havia discriminado cada vez mais na segunda metade da década de 1930. A maioria dos judeus poloneses era de pequenos comerciantes e lojistas, artesãos e mercadores ou operários assalariados; menos de 10% eram profissionais liberais ou outros membros bem-sucedidos das classes médias; muitos eram bem pobres, e, em 1934, mais de um quarto deles vivia de benefícios. Pouco mais de 2 milhões de judeus viviam nas áreas tomadas pela Alemanha em setembro de 1939, dos quais mais de 350 mil escaparam imediatamente para a parte oriental da Polônia, da Lituânia ou da Hungria. Para os alemães que chegavam, esses eram “judeus orientais”, uma minoria totalmente alienígena e desprezada, considerada pela maioria deles como não europeus, a ser tratada com desdém e desconfiança ainda maiores que os judeus da Alemanha em si2. De fato, 18 mil judeus poloneses haviam sido expulsos à força da Alemanha através da fronteira com a Polônia em outubro de 1938, seguidos de outros 2 mil em junho do ano seguinte3.
Na Polônia, as políticas nazistas de supressão e extermínio racial foram aplicadas plenamente pela primeira vez, em um experimento gigantesco que mais tarde seria repetido em escala ainda maior em outras partes da Europa oriental. O domínio alemão na Polônia foi implacável e exclusivamente projetado para fomentar o que os nazistas percebiam como os interesses dos alemães, inclusive os interesses raciais da Alemanha. A redução deliberada da Polônia a um estado de natureza, a exploração sem limite de seus recursos, a degradação radical da vida cotidiana, o exercício arbitrário de poder desmedido, a expulsão violenta dos poloneses de sua casa – tudo isso abriu caminho para o terror desenfreado contra os judeus poloneses. Além disso, a situação caótica do país e a repetida insistência de Hitler na primazia da política racial na Polônia facilitaram ali desde o começo o exercício de poder autônomo pelos mais fanáticos e determinados elementos do Partido e da SS4. A Força-Tarefa Especial do Serviço de Segurança da SS sob Udo von Woyrsch foi particularmente ativa nos ataques aos judeus. Em Bedzin, em 8 de setembro de 1939, assassinou várias crianças judias e queimou a sinagoga local com lança-chamas, ateando fogo às casas próximas no bairro judaico da cidade; os soldados da força-tarefa atiraram indiscriminadamente nos judeus que encontraram pelas ruas. Quando foram embora, cerca de 500 dos habitantes judeus da cidade estavam mortos. Ao se reunir com Heydrich e Streckenbach em Cracóvia em 11 de setembro de 1939, Woyrsch foi informado de que Himmler havia ordenado a adoção das medidas mais rígidas possíveis contra os judeus, de modo que fossem forçados a fugir para o leste, para fora da zona controlada pelos alemães. A Força-Tarefa Especial redobrou os esforços para aterrorizar a população judaica em fuga, queimando um grupo de judeus vivos na sinagoga de Dyńow e realizando fuzilamentos em massa em vários locais do país5.
Soldados comuns e oficiais de baixa patente compartilhavam de muitos dos preconceitos contra “judeus orientais”, encorajados pela propaganda nazista desde 19336. As atitudes alemãs foram bem exemplificadas pelo chefe do Estado-Maior Geral do VIII Exército do general Blaskowitz, Hans Felber, que, em 20 de setembro de 1939, descreveu os judeus de Lódź como “uma ralé pavorosa, imunda e astuciosa”. Tinham de ser deportados, disse ele7. Felber estava ecoando as impressões obtidas pelo próprio Hitler em visita ao bairro judeu de Kielce em 10 de setembro de 1939; seu chefe de imprensa, Otto Dietrich, que o acompanhou, registrou: “A aparência dessa gente é inimaginável [...] Vivem em uma imundície inconcebível, em choças onde nem mesmo um vagabundo passaria a noite na Alemanha”.149 “Isso não é mais gente”, observou Goebbels após visitar Lódź no início de novembro de 1939, “são animais. De modo que a tarefa não é humanitária, mas cirúrgica. Devem-se tomar medidas aqui, e medidas realmente radicais. Do contrário a Europa perecerá da doença judaica.8” Goebbels mandou equipes para fazer filmagens para o cinejornal semanal exibido nos cinemas alemães, e congregações judaicas e rabinos foram forçados a encenar serviços religiosos especiais para as equipes de filmagem alemãs, que também foram aos matadouros judaicos fazer imagens do abate ritual de gado. Todo o material foi coletado sob direção pessoal de Goebbels e com o envolvimento pessoal de Hitler para um documentário de longa-metragem intitulado O judeu eterno, lançado um ano depois, em novembro de 19409.
A atmosfera geral de ódio e de desprezo racial encorajada pelas instruções de Hitler aos generais antes da eclosão da guerra deu aos soldados um claro incentivo para pegar o que quisessem dos judeus da Polônia. Quando o Exército alemão entrou em Varsóvia, as tropas imediatamente começaram a saquear lojas judaicas e a roubar judeus sob a mira das armas na rua10. O mestre-escola judeu Chaim Kaplan registrou em seu diário, em 6 de outubro de 1939, que soldados alemães haviam invadido seu apartamento e estuprado sua empregada cristã (ele achou que as tropas não estivessem estuprando mulheres judias por causa das Leis de Nuremberg – embora na prática isso não tenha se revelado um grande empecilho). A seguir espancaram-na para que revelasse onde ele havia escondido o dinheiro (na verdade, Kaplan havia retirado o dinheiro). Kaplan registrou que até mesmo oficiais estavam maltratando judeus nas ruas e cortando grosseiramente a barba deles. Forçavam moças judias a limpar latrinas públicas com suas blusas e cometiam inúmeros outros atos de sadismo contra os habitantes judeus de Varsóvia11. Zygmunt Klukowski registrou muitos exemplos de furto e pilhagem de soldados alemães, com frequência auxiliados e incitados por poloneses da localidade, particularmente no que se referia a lojas e prédios judaicos. O furto com frequência era seguido de incêndio e destruição gratuita, nos quais o povo local, com o preconceito alimentado por anos de propaganda antissemita e doutrinação dos nacionalistas poloneses, inclusive de membros importantes da Igreja Católica polonesa, participava com entusiasmo12.
Em 22 de outubro de 1939, soldados alemães trouxeram caminhões de carga para levar os artigos de lojas judaicas em Zamość, a maior cidade perto de onde Klukowski vivia. Oito dias depois, oficiais do Exército alemão começaram a levar dinheiro vivo e joias das casas judaicas da cidade13. Cada vez mais os saqueadores e os ladrões usavam de violência contra as vítimas judaicas14. Quando os alemães estabeleceram-se em Zamość em meados de outubro de 1939, Zygmunt Klukowski anotou em seu diário que eles mandaram os judeus “varrer as ruas, limpar todas as latrinas públicas e tapar todas as trincheiras de rua [...] Mandam os judeus fazer pelo menos meia hora de ginástica exaustiva antes de qualquer trabalho, o que pode ser fatal, em especial para gente mais idosa”. “Os alemães estão tratando os judeus com muita brutalidade”, ele anotou em 14 de outubro de 1939: “Cortam a barba deles; às vezes arrancam-lhes os cabelos15”. Em 14 de novembro de 1939, a sinagoga da cidade foi queimada, bem como as casas judaicas vizinhas. Tudo isso foi uma imitação direta do pogrom de 9-10 de novembro de 1938 na Alemanha e de seus desdobramentos. A comunidade judaica recebeu ordens de pagar uma pesada multa como “indenização16”. E, de 22 de dezembro de 1939 em diante, todos os judeus a partir de 10 anos de idade deveriam usar uma estrela amarela na manga, e as lojas tinham de exibir placas indicando se eram judaicas ou não17. O tratamento médico foi vetado aos judeus, exceto por médicos judeus. Chamado para ver um homem judeu doente, o doutor Klukowski escreveu no diário em 29 de março de 1940: “fui indagando-me se alguém estava me espionando. Me senti péssimo”. “Em minha receita omiti até mesmo o nome do doente. Então agora chegamos a isso: a meta de todo médico é prestar auxílio médico, mas agora tornou-se crime, passível até de prisão18”
Era impressionante que esses atos fossem praticados não só pela SS, mas por oficiais e soldados regulares do Exército alemão. Grupos de sorridentes soldados alemães atiravam a esmo nas casas ao passar em marcha pelos bairros judeus das cidades onde entravam, ou juntavam homens judeus na rua, forçando-os a lambuzar uns aos outros com excrementos, obrigando-os a comer carne de porco ou talhando a estrela judaica na testa deles com facas19. Para muitos soldados comuns, aquele foi o primeiro confronto com judeus poloneses, muitos dos quais, no aspecto geral, pareciam ostentar todos os clichês da propaganda aos quais os alemães haviam sido submetidos nos seis anos anteriores. Eram, como um cabo escreveu em agosto de 1940: “judeus genuínos, com barbas e imundos, para ser exato piores ainda do que Der Stürmer [O Atacante] sempre os descreveu20”. Conforme outro cabo escreveu em dezembro de 1939, ali estavam “judeus – raras vezes vi figuras tão desmazeladas andando por aí, embrulhadas em farrapos, imundas, sebosas. Essa gente nos parece uma praga. O jeito asqueroso como olham para você, as perguntas traiçoeiras e a bajulação enganosa com frequência nos instigaram a pegar nossas pistolas para chamar esses sujeitos excessivamente curiosos e intrometidos à realidade21”.
Tão logo a guerra eclodiu, um estudioso judeu em particular decidiu registrar tanto quanto conseguisse desse comportamento para a posteridade. Nascido em 1900, Emanuel Ringelblum se formara historiador, obtendo o doutorado em 1927. Ativo sionista de esquerda, ele decidiu registrar tudo o que estava acontecendo com os judeus de Varsóvia sob o domínio alemão e manteve um extenso diário dos acontecimentos cotidianos. As volumosas e precisas notas de Ringelblum registram os cotidianos roubos, espancamentos, fuzilamentos e humilhações de judeus por soldados alemães e homens da SS. O estupro de mulheres polonesas e judias por soldados alemães foi comum nos primeiros meses de ocupação. “Em Tlomackie, número 2”, ele registrou no início de 1940, “três amos e senhores violentaram algumas mulheres; os gritos ecoaram pela casa. A Gestapo está preocupada com a degradação racial – arianos associando-se com não arianas –, mas tem medo de relatar22.” Propina e corrupção espalharam-se rapidamente. “Só gente pobre vai para os campos”, ele anotou23. Ringelblum registrou que, às vezes, cristãos poloneses saíam em defesa dos judeus atacados por jovens poloneses arruaceiros, mas eram impotentes para fazer qualquer coisa contra os alemães24. À medida que a situação dos judeus deteriorava-se, Ringelblum começou a registrar o humor mordaz com que eles tentavam aliviar o fardo. Uma piada contava que uma mulher acordou o marido quando ele começou a rir e a gritar alternadamente durante o sono. O marido disse a ela: “Eu estava sonhando que alguém havia rabiscado em um muro: ‘Surrem os judeus! Abaixo o abate ritual!’”. “Então você estava feliz com o quê?”, perguntou a esposa. “Você não entende?”, ele replicou: “Isso significa que os velhos bons tempos haviam voltado! Os poloneses mandavam nas coisas de novo!25”. Dava para se lidar com os atos familiares de perseguição dos poloneses, mas não com a desumanidade dos alemães: “Um chefe de polícia alemão foi ao apartamento de uma família judaica e quis levar algumas coisas. A mulher disse chorando que era viúva e tinha um filho para criar. O chefe disse que não levaria nada se ela conseguisse adivinhar qual dos olhos dele era artificial. Ela acertou que era o olho esquerdo. Perguntaram como ela sabia. “Porque o esquerdo”, ela respondeu, “tem um olhar humano26.”
Em muitas partes da Polônia além de Varsóvia, unidades do Exército tomaram judeus como reféns, e em muitos lugares houve fuzilamentos de judeus individualmente ou em grupos. Os 50 mil prisioneiros de guerra poloneses que o Exército classificou como judeus foram recrutados para esquemas de trabalho como os outros prisioneiros, mas passaram por fome e maus-tratos em tamanha extensão que 25 mil já estavam mortos na primavera de 194027. Chaim Kaplan anotou em 10 de outubro de 1939 que homens judeus estavam sendo detidos e levados para projetos de trabalho28. Frank, de fato, já havia ordenado a introdução do trabalho compulsório para judeus no Governo Geral e começou a montar campos de trabalho, onde homens judeus detidos nas ruas ou em batidas policiais em casa eram mantidos em condições miseráveis. Um relatório médico sobre um grupo de campos de trabalho em Belzec registrou em setembro de 1940 que a acomodação era escura, úmida e infestada de parasitas; 30% dos trabalhadores não tinham sapatos, calças ou camisas; dormiam no chão, 75% em uma peça medindo cinco metros por seis metros, tão apinhada que precisavam deitar uns por cima dos outros. Não havia sabão nem instalações sanitárias nas choças; os homens tinham de se aliviar no chão durante a noite, visto que era proibido sair. As rações eram inteiramente inadequadas para o trabalho braçal pesado que se exigia que fizessem, basicamente em obras rodoviárias e no reforço de barreiras de rios29.
O deterioramento da situação foi calmamente registrado pelo estudante judeu Dawid Sierakowiak em seu diário. “Os primeiros sinais da ocupação alemã”, escreveu ele em 9 de setembro de 1939. “Estão pegando judeus para cavar.” Embora as aulas estivessem começando, seus pais não o deixaram frequentá-la com medo de que ele fosse detido pelos alemães. Dois dias depois, ele registrava “espancamentos e roubos”, anotando que a loja onde o pai trabalhava fora saqueada. “Os alemães locais fazem o que querem.” “Todas as liberdades humanas básicas estão sendo destruídas”, ele anotou, enquanto os alemães fechavam sinagogas e forçavam as lojas a abrir em um feriado religioso judaico. Enquanto sua mãe era obrigada a ficar duas horas na fila da padaria todos os dias às cinco da manhã para conseguir pão, Sierakowiak registrou que os alemães estavam tirando os judeus das filas de comida. Seu pai perdeu o emprego. A seguir, os alemães fecharam a escola de Sierakowiak e ele devia caminhar cinco quilômetros por dia até a outra porque a família não tinha mais dinheiro para pagar sua passagem de bonde. Em 16 de novembro de 1939, Sierakowiak foi forçado, junto com outros judeus, a usar uma braçadeira amarela quando saía à rua; no início de dezembro, ela foi substituída por uma estrela de Davi amarela, de dez centímetros, que devia ser usada no lado direito do peito e atrás no braço direito. “Nova atividade à noite”, ele registrou, “arrancar as braçadeiras e costurar os novos ornamentos.” Quando a primeira neve do inverno começou a cair, sua escola foi fechada, e os livros didáticos entregues aos alunos: “Recebi uma história alemã sobre os judeus, algumas cópias de poetas alemães e textos em latim, além de dois livros em inglês”. Dawid Sierakowiak começou a testemunhar alemães espancando judeus nas ruas. A situação agravava-se em ritmo quase diário30.
No outono do ano seguinte, cenas chocantes de violência contra os judeus ocorriam nas ruas de muitas cidades da Polônia, inclusive Szczebrzeszyn. Em 9 de setembro de 1940, Klukowski anotou:
Esta tarde eu estava na janela de minha sala quando testemunhei um acontecimento horrível. Em frente ao hospital há algumas casas judaicas queimadas. Um velho judeu e algumas judias estavam parados perto de uma das casas quando passou um grupo de três soldados alemães. De repente, um dos soldados agarrou o velho e jogou-o dentro do porão. As mulheres começaram a se lamentar. Em poucos minutos, chegaram mais judeus, mas os soldados foram embora calmamente. Fiquei intrigado com o incidente, mas minutos depois o homem foi trazido a mim para ser tratado. Disseram-me que ele se esqueceu de tirar o chapéu quando os alemães passaram. As normas alemãs exigem que judeus fiquem em posição de sentido e os homens tirem o chapéu sempre que um soldado alemão passa31.
O que Klukowski testemunhou não era apenas o exercício arbitrário de poder por uma força invasora sobre uma minoria desprezada; era o produto final de um processo prolongado de atividade política em Berlim, auxiliado por novas estruturas institucionais no cerne do Terceiro Reich que desempenhariam um papel cada vez mais importante nos anos seguintes32.
II
De início, o plano nazista para a Polônia divisou três cinturões de assentamento – alemão, polonês e judeu – em três blocos, ocidental, central e oriental, grosso modo. Sua implementação não foi de modo algum uma prerrogativa exclusiva da SS: já em 13 de setembro de 1939, o chefe do serviço de intendência do Comando Supremo do Exército ordenou ao Grupo de Exércitos do Sul que deportasse todos os judeus da zona leste da Alta Silésia para a área que em breve seria ocupada pelo Exército Vermelho. Mas isso logo adquiriu uma forma mais centralizada de direção. No dia seguinte, Heydrich registrou que Himmler estava prestes a submeter a Hitler uma política global para lidar com o “problema judeu na Polônia [...] que apenas o Líder pode decidir”. Em 21 de setembro de 1939, Hitler havia aprovado um plano de deportação que deveria ser posto em prática nos 12 meses seguintes. Os judeus, em especial os ligados à agricultura, deveriam ser arrebanhados imediatamente. Todos os judeus – mais de meio milhão – seriam deportados dos territórios incorporados junto com os restantes 30 mil ciganos e judeus de Praga e Viena e de outras partes do Reich e do Protetorado. Heydrich disse que isso era um passo na direção da “meta final”, a ser mantida totalmente secreta, que era a remoção dos judeus da Alemanha e das zonas ocupadas a leste para uma reserva especialmente criada.
No comando da operação estava o chefe do Escritório Central para Emigração Judaica da SS (Zentralstelle für jüdische Auswanderung) em Praga, Adolf Eichmann, que se lançou ao trabalho com vigor, assegurando que os oficiais regionais relevantes concordassem com o plano de deportação e montando um centro de trânsito em Nisko, no rio San. Um trem com mais de 900 homens judeus deixou Ostrava, no Protetorado da Boêmia e Morávia, em 18 de outubro de 1939, seguido por outro transporte de 912 homens judeus de Viena dois dias depois. Em Nisko, porém, não havia acomodações para eles. Enquanto uns poucos foram designados para começar a construção de alojamentos, o resto simplesmente foi levado uns poucos quilômetros adiante por um destacamento da SS e então enxotado pelos guardas, que dispararam as armas e gritaram para eles: “Vão lá para os seus irmãos vermelhos!”. O acordo fechado por Himmler com a União Soviética em 28 de setembro de 1939 para a transferência de alemães étnicos para os territórios ocupados deu um basta a toda essa ação, inclusive porque os meios de transporte e pessoal seriam necessários para atender os imigrantes alemães vindos do leste. Em todo caso, conforme Hitler destacou, a criação de uma grande reserva judaica na área de Nisko minaria a futura função da região como uma cabeça de ponte militar para a invasão da União Soviética. O grandioso esquema de Eichmann deu em nada. Os judeus abandonados ficaram onde estavam, amparados pela comunidade judaica de Lublin e vivendo em abrigos improvisados até abril de 1940, quando a SS mandou que se dispersassem e encontrassem uma casa; no fim, apenas 300 conseguiram fazer isso33.
Todavia, o projeto não foi considerado um fracasso. Mostrou que era possível deportar grandes números de judeus de sua casa no Reich e no Protetorado para o leste, inclusive disfarçando os laivos homicidas da ação com o uso de eufemismos como “reassentamento” em “colônias” ou “reservas” autogovernadas. Eichmann foi promovido a chefe do Departamento IVD4 do Escritório Central de Segurança do Reich, no comando geral da “evacuação” e do “reassentamento34”. Seu fracasso em prover acomodações adequadas na reserva planejada para Nisko não foi produto de incompetência organizacional: foi intencional. Em resumo, os judeus da Alemanha e da Europa central ocupada pelos alemães simplesmente foram atirados ali e deixados ao deus-dará. Conforme Hans Frank observou: “É um prazer ter, finalmente, condições de lidar com a raça judaica em termos físicos. Quanto mais morrerem, melhor; atacar os judeus é a vitória de nosso Reich. Os judeus têm de sentir que chegamos”. O relatório sobre uma visita de lideranças oficiais do Governo Geral à aldeia de Cyców em 20 de novembro de 1939 comentou: “Esse território, com sua natureza bastante pantanosa, poderia servir como uma reserva para os judeus, de acordo com o governador do distrito, Schmidt. Essa medida levaria a uma importante dizimação de judeus”. Afinal de contas, conforme um membro do Instituto Alemão de Assuntos Internacionais escreveu da Polônia em dezembro de 1939: “a aniquilação desses sub-humanos seria do interesse do mundo inteiro”. Era melhor, pensava ele, que isso fosse realizado por meios “naturais”, como inanição e doenças35.
Durante os meses seguintes, vários planos alternativos para o reassentamento dos judeus da Europa central foram debatidos no Escritório Central de Segurança do Reich, no Ministério de Relações Exteriores alemão e em outros centros de poder; todos envolviam, implícita ou explicitamente, o assassinato de grandes quantidades de judeus por um meio ou outro. Em fevereiro e março de 1940, praticamente toda a comunidade judaica de Stettin, somando mais de mil pessoas, foi deportada por ordem de Heydrich sob condições tão estarrecedoras que quase um terço morreu de fome, frio e exaustão na jornada. Ao longo de 1939, 1940 e dos primeiros meses de 1941, uma série de ações não coordenadas levou à deportação de mais de 63 mil judeus para o Governo Geral, incluindo mais de 3 mil da Alsácia, acima de 6 mil de Baden e do Sarre, e até 280 de Luxemburgo. Nenhuma dessas deportações levou à adoção de nenhuma política sistemática em maior escala; a maioria foi resultado de iniciativas de nazistas locais impacientes, mais notadamente do líder regional de Wartheland, Arthur Greiser, cuja ambição era livrar seu território dos judeus o mais rápido possível. O plano de Nisko fora abortado, e o tamanho e a velocidade das transferências de população na Polônia baixaram sob o impacto das pressões e das circunstâncias dos tempos de guerra. A despeito de tudo isso, a ideia de forçar os judeus da Europa central para dentro de uma reserva em algum lugar no leste do país permaneceu em discussão. Como primeiro passo, Hitler imaginou a concentração de todos os judeus restantes no Reich, inclusive nos territórios recém-incorporados, em guetos localizados nas principais cidades polonesas, o que, de acordo com ele, Himmler e Heydrich, facilitaria sua eventual expulsão36. O correspondente americano William L. Shirer concluiu em novembro de 1939 que a “política nazista é simplesmente exterminar os judeus poloneses”, pois qual outra poderia ser a consequência de sua transferência para guetos? Se os judeus não tivessem condições de ganhar a vida, como sobreviveriam?37
III
Os guetos já haviam sido discutidos na Alemanha logo depois dos pogroms de 9-10 de novembro de 193838. Como poucos achavam que os guetos teriam uma existência de longo prazo, não foram emitidas ordens de Berlim sobre como deveriam ser administrados. Heydrich propôs que os judeus fossem confinados em certos bairros das principais cidades, mas não sugeriu como. Ciente de que sua administração estava longe de preparada para acolher e gerenciar um influxo tão grande de refugiados indigentes, Hans Frank tentou bloquear a deportação de judeus de Wartheland para o Governo Geral, de modo que Greiser partiu para a ação por conta própria, dentro dessa estrutura geral da política39. Ele determinou a concentração dos judeus restantes em Wartheland dentro de um “gueto fechado” na parte norte da cidade de Lódź, um bairro pobre no qual já vivia um número considerável de judeus. Em 10 de dezembro de 1939, a administração regional traçou planos para as fronteiras do gueto, o reassentamento de não judeus que ali viviam, o abastecimento de comida e outros mantimentos e artigos, e demais arranjos. Em 8 de fevereiro de 1940, chegaram guardas nas fronteiras e começaram a erguer barricadas para lacrar a área. Conforme Dawid Sierakowiak anotou, as detenções em massa de judeus começaram na cidade já em dezembro. “Todo mundo, em toda parte”, ele registrou, “tem as mochilas prontas, arrumadas com roupas de baixo e vestimentas e equipamentos domésticos essenciais. Todo mundo está extremamente nervoso.” Muitos judeus fugiram da cidade, levando consigo o que podiam em carrinhos de mão40. Quando o gueto enfim foi lacrado, em 30 de abril e 1º de maio de 1940, continha cerca de 162 mil da população judaica original da cidade, de 220 mil41. Essas pessoas tinham de viver em um bairro tão parcamente provido de comodidades que mais de 30 mil habitações não tinham nem água encanada, nem ligação com o sistema de esgoto42. Como resultado, elas logo pareceram confirmar a associação que os nazistas faziam entre judeus e sujeira e doença.
Mapa 3. Guetos judaicos na Polônia sob ocupação alemã, 1939-44
Em 21 de setembro de 1939, Heydrich estabeleceu o princípio geral de que cada gueto seria gerido por um conselho de decanos judeus, chefiados por um ancião. Esses anciãos deveriam ser tratados como reféns para garantir que impedissem qualquer tipo de agitação ou rebelião no gueto; deveriam criar uma força policial judaica para manter a ordem; seriam responsáveis pela vida da comunidade; deveriam redigir listas dos habitantes, organizar a distribuição de mantimentos e, acima de tudo, executar as ordens da administração alemã43. Como ancião do gueto de Lódź, os alemães escolheram Chaim Rumkowski, que, após uma série de fracassos empresariais, havia acabado como chefe da administração dos orfanatos judaicos na cidade. Agora na casa dos 70 anos, Rumkowski, com certeza, era talhado para a função: cabelos brancos, em boa forma, enérgico, com um rosto e expressão que os contemporâneos com frequência descreveram como nobre, majestoso ou mesmo real; ele assumiu o comando rapidamente, tornando-se na prática o ditador do gueto. Rumkowski imprimiu uma moeda especial para uso exclusivo no gueto, criou um sistema de cantinas, creches e serviços sociais e barganhou com a administração alemã para que permitisse trabalho produtivo no gueto. Isso envolveu a importação de matérias-primas para processamento, fornecimento de mão de obra judaica não qualificada para serviços de construção do lado de fora e obtenção de renda para a compra de provisões essenciais de comida e outras mercadorias, de modo a permitir a sobrevivência da população do gueto. Em outubro de 1940, ele atingira grande êxito, em colaboração com o pragmático prefeito alemão de Lódź e seu gerente do gueto, um empresário de Bremen, que queria reduzir o fardo para os cofres públicos de sustentar os judeus, 70% dos quais não dispunham de outros meios para se alimentar. Superando a oposição na administração alemã, que via o gueto basicamente como uma forma de reduzir a população judaica por um processo de desgaste, Rumkowski e o prefeito tiveram sucesso na introdução de indústrias e oficinas no gueto e em sua transformação em um elemento da economia de guerra alemã44. Mas o poder também subiu à cabeça de Rumkowski. Ele andava pelo gueto cercado por uma comitiva de guarda-costas e, em certa ocasião, atirou balas para a multidão que assistia. Fazendo-se indispensável para os alemães enquanto o gueto durou, ele atraiu crítica generalizada, até ódio, da comunidade judaica; todavia, por outro lado, ele podia, com certa plausibilidade, apresentar-se como essencial à sobrevivência do grupo45.
No Governo Geral, Hans Frank, não obstante a brutalidade de sua retórica, logo foi forçado a confrontar o problema de estabelecer algum tipo de ordem à medida que milhares de poloneses e judeus expulsos e destituídos chegavam sem que houvessem sido feitos preparativos para recebê-los. Enquanto aplicava uma forte pressão – em grande parte bem-sucedida – em Berlim para deter o influxo, Frank também começou a criar guetos nos quais a população judaica fosse concentrada antes da próxima expulsão para uma reserva em alguma zona indefinida mais a leste. O primeiro gueto do Governo Geral foi criado em Radomsko em dezembro de 1939, seguido de muitos outros. Alguns eram pequenos, alguns duraram poucos meses; mas os maiores logo assumiram um ar mais permanente, à medida que, como o gueto de Lódź, tornaram-se centros importantes de exploração econômica. Esse foi o caso, especialmente depois de janeiro de 1940, quando Frank anunciou que o Governo Geral não deveria mais ser visto apenas como um objeto de pilhagem, precisando, em vez disso, dar sua contribuição à economia do Reich46. Em 19 de maio de 1940, Frank ordenou que os judeus de Varsóvia fossem concentrados em uma zona exclusivamente judaica da cidade, de início justificando a medida com a afirmação cínica de que os judeus espalhavam doenças como tifo e deveriam ficar de quarentena por questões de saúde pública; também acusou-os, no estilo nazista característico, de causar inflação nos preços por meio de seu mercado negro47. Durante o verão, o trabalho de construção dos muros do gueto foi suspenso, pois Frank começou a ter esperanças de que os judeus fossem mandados para Madagascar. Mas, em outubro, a obra recomeçou48. Quando o gueto foi lacrado, em 16 de novembro de 1940, a maioria dos judeus da cidade havia sido arrebanhada, junto com muitos outros de fora, para dentro da área.
A operação foi acompanhada de cenas de brutalidade aterrorizante, como registrou Emanuel Ringelblum:
Na esquina das ruas Chlodna e Zelazne, aqueles que demoram para tirar o chapéu para os alemães são forçados a fazer ginástica usando pedras do calçamento ou telhas como pesos. Judeus idosos também são obrigados a fazer flexões. Eles [isto é, os alemães] picam papel, jogam os pedacinhos na lama e mandam as pessoas juntá-los, espancando-as enquanto elas se abaixam. No bairro polonês, mandam os judeus deitar no chão e caminham por cima deles. Na rua Lezno, um soldado chegou de caminhonete e parou para surrar um pedestre judeu. Mandou ele deitar na lama e beijar o chão. – Uma onda de maldade passou por toda a cidade, como que em reação a um comando vindo de cima49.
A área do gueto fora criada, conforme relatou um administrador alemão, “com a utilização de muros existentes e muramento de ruas, janelas, portas e espaços entre prédios. Os muros”, acrescentou, “têm três metros de altura e são elevados em mais um metro pelo arame farpado colocado no topo. Também são guardados por patrulhas de polícia montada e motorizada”. Havia 15 postos de controle onde a polícia polonesa e alemã regulavam o tráfico para dentro e para fora do gueto, que se dividia em uma seção maior e outra menor, separadas por uma rua “ariana” atravessada por uma ponte de madeira50.
Dentro dos muros, o gueto era dirigido, segundo linhas já estabelecidas em Lódź, por um conselho judaico chefiado por um ancião, neste caso o engenheiro Adam Czerniaków, uma liderança da comunidade judaica local, na época na metade da casa dos 60 anos. Trabalhando por longas horas, Czerniaków fez o máximo para obter pequenas concessões, explorando divisões entre as autoridades alemãs da ocupação e chamando a atenção constantemente para as más condições do gueto. Ele era muito crítico da atitude imperiosa e das práticas corruptas de Rumkowski, ancião do gueto de Lódź (“um homem presunçoso e ignorante. Um homem perigoso também, visto que vive dizendo às autoridades que está tudo bem em sua reserva”)51. A atitude de Czerniaków levou-o à detenção pela SS em 4 de novembro de 1940 e de novo em abril de 1941. Ele foi torturado e humilhado, mas recusou-se a modificar as tentativas obstinadas de defender os interesses dos habitantes do gueto. Apenas ocasionalmente ele conseguia registrar algum sucesso na conquista de concessões dos alemães. Muitas das promessas que faziam a ele ao final de longas rodadas de negociação permaneciam não cumpridas. “Toda essa labuta, pelo que vejo”, escreveu em 1o de novembro de 1941, “não rende frutos. Minha cabeça rodopia e meu pensamento está ficando embaralhado. Nenhum único feito positivo52.”
A criação do gueto de Varsóvia envolveu a concentração de quase um terço da população da cidade em 2,4% de seu território. Depois que mais 66 mil judeus do distrito circundante foram trazidos no primeiro trimestre de 1941, umas 445 mil pessoas foram amontoadas em uma área com cerca de 400 hectares de extensão, com uma densidade média, segundo uma estimativa oficial alemã, de mais de 15 pessoas por apartamento ou de seis a sete por cômodo, o dobro da densidade da população que vivia no resto da cidade. Algumas peças com não mais de 24 metros quadrados de área tinham de
proporcionar moradia para até 25 ou 30 pessoas53. O combustível era tão escasso que poucos apartamentos eram aquecidos, mesmo no rigor do inverno. A taxa de mortalidade entre a população judaica de Varsóvia subiu de um para mil em 1939 para 10,7 em 1941; em Lódź era ainda maior, de 43,3 em 1940 e 75,9 no ano seguinte. As crianças ficaram particularmente vulneráveis; apenas em junho de 1941, uma em cada quatro crianças nos abrigos do gueto de Varsóvia morreu, e a situação geral das crianças era tão ruim que várias famílias tentaram dar seus filhos para famílias não judias na cidade ao redor54. Crianças órfãs começaram a perambular pelas ruas do gueto em números crescentes. “Uma impressão apavorante, simplesmente monstruosa, é causada”, confessou Emanuel Ringelblum, pela “lamúria de crianças que [...] suplicam por esmolas, ou queixam-se de que não têm onde dormir. Na esquina das ruas Leszno e Markelicka”, ele registrou, “crianças choram amargamente à noite. Embora eu ouça essa choradeira toda noite, não consigo dormir até altas horas. Os tostões que dou a elas todas as noites não conseguem aliviar minha consciência55”.
As taxas de mortalidade atingiram novo pico na primavera de 1941, quando o tifo espalhou-se entre a população excessivamente apinhada e infestada de piolhos do gueto de Varsóvia. “Passa-se por cadáveres com indiferença”, confessou Emanuel Ringelblum em maio de 1941. “Os cadáveres são meros esqueletos, com uma fina cobertura de pele sobre os ossos56.” Ao percorrer o gueto, Stanislav Royzicki viu os habitantes como “figuras de pesadelo, fantasmas de outrora seres humanos” e notou “os olhos salientes ao redor das órbitas, a cor amarela do rosto, a pele flácida e pendente, o definhamento e adoecimento alarmantes. E, somada a isso, a expressão miserável, assustada, inquieta, apática e resignada”. Os pacientes jaziam em dois ou três por cama nos hospitais57. No outono de 1941, os hospitais tratavam cerca de 900 casos de tifo por dia, com mais 6 mil doentes em casa. A tuberculose também se espalhou, e a contaminação do abastecimento de água levou a muitos casos de febre tifoide. A desnutrição debilitava a resistência das pessoas a doenças, e os serviços médicos não tinham como combatê-las. A morte tornou-se uma característica incontornável da experiência do gueto de Varsóvia; durante seu período de existência, umas 140 mil pessoas morreram dentro dele58. Andando de bonde através do gueto judaico no início de setembro de 1941, Zygmunt Klukowski notou as terríveis condições de vida e a elevada taxa de mortalidade dos judeus. “É quase impossível imaginar como algo assim pode acontecer”, ele escreveu59. Enquanto tudo isso acontecia, conforme registrou Ringelblum, uma equipe de filmagem alemã visitou o gueto, encenando tomadas para as plateias de cinema da Alemanha nas quais soldados alemães gentis apareciam para proteger os judeus da crueldade da polícia polonesa60.
A fome levou à deterioração das relações sociais, e as pessoas lutavam por migalhas, falsificavam cartões de racionamento ou arrancavam alimentos dos transeuntes, comendo enquanto fugiam correndo. As famílias começaram a se desentender por causa das cotas de ração, e os que chegavam vendiam tudo o que tinham para pagar pela comida no mercado negro. Criancinhas esgueiravam-se para fora do gueto por onde havia apenas cerca de arame farpado, arriscando-se a levar um tiro dos guardas, a fim de ir para os arredores da cidade catar comida no lixo. Operários dos grupos de trabalho fora do gueto com frequência conseguiam contrabandear comida para dentro, enquanto gangues de contrabandistas travavam uma espécie de guerrilha com os guardas alemães61. Cerca de 28 mil judeus de todas as idades deram jeito de achar esconderijos fora do gueto de Varsóvia, na maioria com a ajuda de poloneses não judeus, usando contatos sociais, amizades e conhecimentos pessoais que existiam antes da chegada dos alemães. Os pais frequentemente tentavam mandar os filhos para fora da fronteira do gueto por medida de segurança. Às vezes escondidas em sótãos ou porões, às vezes passando-se por “arianas”, as crianças viviam uma vida precária; muitas foram detidas e, se os pais não estavam mais vivos, o que com frequência era o caso, eram colocadas em orfanatos semelhantes a presídios. Alguns poloneses ajudaram a esconder judeus por ganho financeiro, outros por nada além de solidariedade humana; outros, ainda, entregavam-nos à polícia alemã se descobriam que eram judeus. Uns poucos até mesmo empregaram judeus em trabalhos que conseguiram classificar como essenciais, e contrataram mais do que realmente era necessário, defendendo esses funcionários judeus de todas as tentativas dos alemães de levá-los embora. A maioria dos 11 mil judeus que sobreviveram à guerra na capital polonesa deveu a vida a poloneses que os ajudaram. Entretanto, os poloneses que ajudaram judeus dessas e de muitas outras formas eram uma pequena minoria, sobrepujada de longe pelos antissemitas que de bom grado participaram da – e lucraram com a – criação do gueto e a remoção da população judaica da cidade no geral. Nem o “exército doméstico” nacionalista polonês clandestino, nem o governo polonês no exílio em Londres, nem, por fim, a Igreja Católica polonesa assumiram uma conduta clara contra as políticas homicidas alemãs em relação aos judeus; talvez até fosse o oposto disso, com as três instituições considerando a população judaica polonesa a favor do “bolchevismo”. Conforme um relatório semioficial da Igreja polonesa para o governo exilado declarou no verão de 1941, os alemães “haviam mostrado que a libertação da sociedade polonesa da praga judaica é possível62”.
A polícia polonesa também fez a sua parte para manter o gueto fechado para o resto da cidade tanto quanto possível. Passando a pé pelo gueto em setembro de 1941, Wilm Hosenfeld notou:
Existem galerias de esgoto na parede do gueto, e crianças judias que vivem do lado de fora contrabandeiam batatas para dentro por ali. Vi um policial polonês bater em um garoto que tentou fazer isso. Ao vislumbrar as pernas magras por baixo do casaco da criança, e seu rosto repleto de pavor, fui tomado de uma enorme pena. Gostaria muito de ter dado minha fruta para o menino63.
Mas as penalidades para um gesto desse tipo, até mesmo para um oficial alemão, eram graves demais para ele se arriscar. Mesmo uma simpatia em silêncio como a de Hosenfeld era extremamente rara. Oficiais, soldados, policiais e homens da SS alemães com frequência entravam no gueto, surrando e dando cacetadas à vontade nos judeus que encontravam. Olhando pela janela em certo dia de fevereiro de 1941, Chaim Kaplan viu multidões correndo em pânico selvagem pela rua abaixo, antes de “um homicida nazista, com a cara vermelha como fogo, avançar a passos largos, com um passo singularmente pesado, em busca de uma vítima. Havia um chicote em sua mão”. Quando deparou com um mendigo, começou a surrá-lo impiedosamente; depois, quando o mendigo caiu no chão, o alemão pisoteou, chutou e socou o homem “por 20 minutos”, até muito depois de este estar morto. “É difícil entender o segredo desse fenômeno sádico”, Kaplan escreveu em seu diário:
Afinal de contas, a vítima era um estranho, não um velho inimigo; não falou com ele em tom grosseiro, que dirá tocá-lo. Por que então essa ira cruel? Como é possível atacar um estranho para mim, um homem de carne e sangue como eu, feri-lo e pisotear em cima dele, e cobrir seu corpo de feridas, contusões e chicotadas sem nenhum motivo? Todavia, juro que vi tudo isso com meus olhos64.
Para muita gente das forças alemãs de ocupação, o gueto oferecia a oportunidade de dar vazão a uma violência quase inimaginável sobre os judeus desamparados, sem a mais leve ameaça de represália.
Alguns alemães, de fato, passavam pelo gueto regularmente selecionando vítimas. Outros iam apenas assistir, fotografar ou, em certos casos, tirar fotos posadas para fins de propaganda. O governo polonês no exílio chegou a afirmar que a organização nazista de lazer Força pela Alegria planejava visitas turísticas ao gueto, onde as condições criadas pelos próprios alemães confirmavam para os visitantes a noção de superioridade sobre os judeus esfarrapados, famintos e infestados de doenças que encontravam65. Ao passar por um gueto judeu em Kutno, Melita Maschmann ficou chocada ao ver a pobreza letárgica das pessoas encerradas atrás da cerca alta de arame. Algumas crianças mendigavam com as mãos estendidas através do arame.
A desgraça das crianças causou um nó em minha garganta. Mas cerrei os dentes. Aprendi gradativamente a desligar meus “sentimentos privados” de forma rápida e total nessas situações. Isso é terrível, disse a mim mesma, mas a expulsão dos judeus é uma das coisas desafortunadas com que temos de barganhar para que o “Warthegau” possa tornar-se uma terra alemã.
Ela viu alguns funcionários da ferrovia alemã irem até a cerca e observarem os judeus como se fossem animais de zoológico66. O que viam, embora fosse resultado da opressão alemã, confirmava seus preconceitos contra os “judeus orientais”. Conforme um oficial subalterno do Exército escreveu em 30 de junho de 1941:
Percorremos de carro o bairro dos judeus e das epidemias. Não posso descrever as condições da área e de seus habitantes [...] Muitas centenas de pessoas em fila nas mercearias, lojas de cigarro e de bebidas [...] Ao passar, vimos um homem cair sem causa aparente; deve ter sido a fome que o fez tombar, pois vários dessa gentalha morrem de fome todos os dias. Uns poucos ainda estão bem-vestidos em trajes de antes da guerra, mas a maioria está envolta em sacos e andrajos, um quadro terrível de fome e pobreza. Crianças e mulheres correm atrás de nós e gritam: “Pão, pão!67”.
Deveras raro era um oficial alemão como Wilm Hosenfeld, que considerou as “condições terríveis” do gueto, quando o visitou em serviço no começo de 1941, “uma total acusação contra nós68”.
Apesar dessas condições miseráveis e com frequência aterrorizantes, os moradores do gueto deram um jeito de manter algum tipo de vida cultural, religiosa e social em curso, mesmo quando as pressões impostas pelo trabalho para sobreviver dificultavam que se respeitasse o sabá, e as condições desesperadoras de higiene e saneamento impediam a maioria dos judeus de manter as normas tradicionais de asseio pessoal. Em Varsóvia, atores e músicos encenavam produções teatrais e concertos, ao passo que em Lódź, como de hábito, Rumkowski organizava toda a atividade cultural. Adam Czerniaków registrou em seu diário visitas regulares a recitais de música de câmara, e ainda, em 6 de junho de 1942, ele considerava a encenação de uma ópera – Carmen, ou talvez Os contos de Hoffman. Um dos projetos mais importantes do gueto de Varsóvia foi concebido pelo jovem historiador Emanuel Ringelblum, que reuniu pessoas de muitas facções políticas diferentes para compilar um arquivo de diários, cartas, memórias, entrevistas e documentos e para manter um registro da história do gueto para a posteridade. Conseguiu até mesmo redigir um estudo sério sobre as relações polono-judaicas durante a guerra, ao mesmo tempo que tentava sobreviver nas condições de vida cada vez mais intoleráveis do gueto69.
IV
Na Alemanha, as condições da população judaica remanescente continuaram a se deteriorar de modo constante nos dois primeiros anos da guerra. Somando 207 mil em setembro de 1939, de acordo com a classificação racial oficial dos nazistas, essa população era basicamente de meia-idade ou idosa. Os judeus da Alemanha haviam sido espoliados de quase todos os bens. Estavam efetivamente banidos da sociedade alemã e dependiam de suas próprias organizações para a manutenção de qualquer tipo de vida coletiva. Muitos dos rapazes judeus que ficaram na Alemanha já tinham sido recrutados para os esquema de trabalho forçado bem antes da eclosão da guerra. O trabalho compulsório – muitas vezes em serviços braçais árduos ou sujos, como cavar valas ou limpar neve – continuou ao longo de 1940. Na primavera daquele ano, porém, o arquivamento dos planos de se criar uma reserva judaica na zona de Lublin, combinado com uma grave escassez de mão de obra na indústria bélica, levou a uma mudança na política. Homens judeus em idade militar foram proibidos de emigrar, na hipótese de que pegassem em armas contra a Alemanha, e foi ordenado que todos os judeus com idade entre 15 e 55 anos no caso dos homens e 15 e 50 no das mulheres se registrassem para trabalhar. Em outubro de 1940, havia 40 mil judeus em projetos de trabalho forçado, com um número crescente em indústrias relacionadas à guerra. De fato, Goebbels anotou em seu diário, em 22 de março de 1941, que 30 mil judeus de Berlim estavam trabalhando em fábricas de armas (“quem pensaria que isso fosse possível?”). Os operários judeus podiam ser conseguidos a um custo muito baixo e não requeriam o fornecimento de acomodação especial, nem a contratação de tradutores, como no caso dos trabalhadores poloneses ou tchecos70.
A emigração, que havia visto mais da metade dos habitantes judeus da Alemanha partir desde o início de 1933, tornou-se assim uma prioridade menor sob o impacto da demanda por mão de obra judaica. Talvez apenas mais uns 15 mil judeus tenham conseguido encontrar refúgio em um país neutro ao longo de 1940. Cerca de mil chegaram ao Brasil com o auxílio de vistos arranjados pelo Vaticano em 1939, custeados por doadores norte-americanos. De modo quiçá um tanto surpreendente, um cônsul japonês designado sucessivamente para a Lituânia, Praga e Königsberg em 1939-41, Chiune Sugihara, cuja principal função supostamente era observar os assuntos militares, começou por iniciativa própria a emitir vistos de trânsito para o Japão para todo judeu que o abordasse, embora os judeus não tivessem permissão para entrar no país; dos talvez 10 mil judeus que obtiveram tais documentos, possivelmente a metade deu jeito de ir para o Canadá, para os Estados Unidos ou para outros destinos de forma ilegal71. A emigração ilegal para a Palestina continuou, encorajada pela Gestapo, mas as autoridades superiores britânicas no país começaram a colocar obstáculos no caminho, temendo que aquilo aborrecesse os palestinos: em novembro de 1940, recusaram um navio de refugiados judeus que foram para lá via Danúbio e mar Negro; os refugiados foram transferidos para outro navio para serem levados de volta à Romênia; apenas depois de o navio explodir e afundar, matando 251 passageiros, as autoridades britânicas permitiram que o restante desembarcasse e se instalasse. O porto livre internacional de Xangai, em contraste, impôs poucas restrições à imigração e permaneceu aberto até dezembro de 1941, quando a guerra eclodiu no Pacífico; até o verão de 1941, mais de 25 mil refugiados judeus de vários países europeus, inclusive da Alemanha, haviam conseguido fugir para lá, viajando através da Hungria ou da Escandinávia via ferrovia transiberiana e a seguir por mar72.
Aqueles que permaneceram na Alemanha agora estavam maciçamente concentrados em Berlim. A despeito da situação extremamente difícil, conseguiram prosseguir com algum tipo de vida social e cultural, até em razão da existência da Liga de Cultura Judaica, que publicava livros e periódicos, produzia concertos e peças, organizava palestras e promovia sessões de cinema. Claro que tudo tinha de ser aprovado por seu chefe nazista, Hans Hinkel, que proibiu a disseminação da herança cultural “alemã” pela liga. Sob as condições restritivas dos tempos de guerra, também era mais difícil continuar essas atividades do que antes, em especial fora de Berlim73. O conjunto dos interesses da comunidade judaica do Reich era representado pela Associação de Judeus do Reich na Alemanha, que recebeu do regime, por ordens explícitas de Hitler, a tarefa de propiciar caridade, organizar a educação e os aprendizados, arranjar a emigração e encontrar serviço para membros da comunidade judaica onde possível. Em janeiro de 1939, a Liga de Cultura foi efetivamente integrada à associação por ordem dos nazistas, até para tornar seus recursos financeiros disponíveis a esta última para ajudar na emigração judaica. Foi instalado um novo comitê executivo, consistindo de representantes da associação e de congregações religiosas judaicas de Berlim e Viena. A despeito de seus fundos depauperados, a qualidade das atrações da liga continuou elevada, com a apresentação de peças clássicas francesas de Molière e outros, sinfonias de Mahler, Tchaikovski e grupos de música de câmara tocando em cidades provincianas para plateias judaicas. A vida religiosa também prosseguiu para os que pertenciam à fé judaica, embora, é óbvio, em escala reduzida depois da destruição das sinagogas alemãs no pogrom de 9-10 de novembro de 193874.
Não foram implantados guetos dentro do Reich, mas, ao longo de 1940 e 1941, os judeus começaram a ser despejados de sua residência e deslocados para “casas de judeus”, onde eram forçados a viver em condições de superlotação cada vez maior, em um eco do que acontecia simultaneamente e de forma bem mais brutal aos judeus da Polônia ocupada. Embasando suas ações em uma lei de 30 de abril de 1939 que permitia aos locatários despejar inquilinos judeus se houvesse acomodação alternativa disponível, as prefeituras começaram a concentrar a população judaica, usando poderes adicionais criados pela mesma lei para compelir proprietários judeus a aceitar inquilinos judeus. Em muitos casos, a acomodação alternativa era encontrada em alojamentos desativados e em prédios assemelhados: em Müngersdorf, perto de Colônia, 2 mil judeus foram colocados em um forte degradado, 20 por cômodo. Cerca de 38 “acampamentos residenciais” desse tipo foram criados após a deflagração da guerra. A guerra também trouxe o confisco de todos os aparelhos de rádio de judeus alemães, seguido dos telefones em 1940. Foram impostas novas taxas a suas agora minguadas rendas. Os cartões de racionamento para sapatos, roupas e tecidos foram retirados dos judeus. Uma leva de novos regulamentos e decretos policiais tornou a vida deles mais difícil e aumentou as chances de se envolverem em problemas com a lei. Imediatamente depois da eclosão das hostilidades, os judeus alemães foram submetidos a toque de recolher, e impuseram-se restrições severas quanto aos horários em que podiam ir às compras. Só tinham permissão para comprar mantimentos em determinadas lojas de propriedade ariana, em certos horários (não havia mais lojas de donos judeus). Recebiam rações menores para comida e vestuário que os não judeus e foram proibidos de comprar chocolate. Em outubro de 1939, Himmler anunciou que qualquer judeu que infringisse alguma norma, deixasse de obedecer qualquer instrução ou mostrasse algum tipo de resistência ao Estado e a seus ditames seria detido e colocado em um campo de concentração. Os poderes da polícia e de outras autoridades para assediar e perseguir judeus cresceu de modo análogo: por exemplo, na cidade de Krefeld, na Renânia, questões envolvendo judeus, que somavam 20% de todos os casos tratados pela Gestapo antes da guerra, subiram para 35% após o início da guerra. E, na primavera de 1941, Himmler anunciou que qualquer judeu aprisionado em um campo de concentração permaneceria lá enquanto durasse a guerra75.
Já em outubro de 1940, Hitler ordenara pessoalmente a deportação de dois grupos específicos de judeus alemães que viviam nos estados de Baden, Sarre e Palatinato, no sudoeste alemão. O Escritório Central de Segurança do Reich foi colocado no comando da operação. Os judeus foram arrebanhados com base em listas detalhadas compiladas pela polícia e colocados em ônibus. Foi permitida uma mala de 50 quilos por indivíduo, roupa de cama e gêneros alimentícios. Cada um podia levar no máximo cem reichsmarks; suas residências, mobília e bens de valor tiveram de ser deixados e foram tomados pelo Reich. A mesma sina já se abatera sobre a população judaica da Alsácia-Lorena em 16 de julho de 1940, ao ser ocupada pelos alemães após a derrota da França. O Sarre, o Palatinado e a Alsácia-Lorena deviam ser unidos para formar um novo distrito único do Partido Nazista que deveria ser inteiramente “livre de judeus”. Todas essas pessoas foram levadas através da fronteira francesa e largadas em acampamentos na zona não ocupada; outras mais seriam levadas para o Governo Geral. As autoridades francesas prometeram que o resto seria deportado em breve para a colônia francesa de Madagascar. Por enquanto, esses seriam os únicos judeus deportados do território alemão, junto com os habitantes judeus de Schneidemühl e Stettin, levados à força para Lublin em fevereiro de 1940, e os judeus levados de Viena e do Reich para Nisko76.
Ao lado da população judaica remanescente no resto da Alemanha, havia também um grupo significativo definido como “raça mista”, ou seja, metade judeu ou 1/4 judeu. Esses foram submetidos às mesmas medidas discriminatórias introduzidas pelos nazistas ao longo dos seis anos anteriores, mas não a todas. Não podiam trabalhar em empregos pagos pelo Estado, inclusive magistério e administração local, mas podiam, pelo menos até 1941, servir no Exército; se fossem meio-judeus não podiam casar-se com não judeus, e se praticassem a religião judaica eram classificados como plenamente judeus. Por outro lado, um judeu casado com um não judeu podia escapar da maioria das políticas antissemitas do regime desde que os filhos do casal não fossem criados na fé judaica; mesmo que não tivessem filhos, ficavam isentos em certa medida, contanto que não praticassem a fé judaica77. Um casal desse tipo era Victor Klemperer, judeu e professor aposentado de literatura francesa, e sua esposa não judia Eva, uma ex-pianista, cuja vida nesse período pode ser reconstruída em grande detalhe graças à sobrevivência dos volumosos diários de Klemperer. Aparentemente, ele perdeu seu cargo não por ser judeu, mas porque a função foi declarada supérflua, de modo que tinha uma pequena aposentadoria para seu sustento. Em 1939, não podia mais frequentar as bibliotecas de Dresden, onde vivia, foi banido da maioria das instalações públicas da cidade e tinha de carregar um documento de identidade judeu com o nome “Israel” adicionado ao seu. Escrever suas memórias e diários e tomar conta da casa e do jardim em Dölzschen, subúrbio de Dresden, eram praticamente as únicas atividades restantes de que ele dispunha. Klemperer também se devotou a compilar uma lista de expressões da linguagem nazista, que chamou de LTI – Lingua Tertii Imperii, a linguagem do Terceiro Reich. Ele confiava seus manuscritos e diários regularmente a uma amiga não judia, Annemarie Köhler, médica que dirigia uma clínica em Pirna, fora de Dresden78.
De início, a guerra teve pequeno impacto sobre Klemperer. Sua casa foi revistada pela Gestapo em busca de rádios e literatura proibida, mas os agentes foram bastante educados, e o principal problema que ele encarou foi a carga exorbitante de impostos especiais que o governo arrancou dele por ser judeu. Entretanto, em 9 de dezembro de 1939, Klemperer foi informado de que ele e a esposa teriam de alugar sua casa para um quitandeiro, que abriria uma loja nela, e se mudar para dois cômodos em uma casa especial da cidade reservada a judeus, que dividiriam com outras famílias. Pelos termos do contrato de aluguel, que entrou em vigor em 26 de maio de 1940, os Klemperer não tinham permissão para chegar perto de sua velha casa, e o quitandeiro tinha direito preferencial de compra, por um valor fixado em 16,6 mil reichsmarks, que Klemperer considerou ridiculamente baixo. Não demorou muito para o novo ocupante começar a procurar um pretexto para fazer valer o direito de compra. Enquanto isso, na casa dos judeus, na Caspar David Friedrich Strasse, 15B, uma vila “abarrotada de gente, todas compartilhando da mesma sina”, Klemperer irritava-se com “a constante interferência e agitação de estranhos” e com a ausência de seus livros, cuja maioria ele foi obrigado a colocar em um depósito. Nervos e ânimos ficaram em frangalhos, e ele se meteu em uma “discussão terrível” com outro habitante da casa, que o acusou de usar água em excesso79.
Os Klemperer saíam em longas caminhadas o máximo que podiam, embora fazer compras fosse uma humilhação constante (“para mim é sempre horrível mostrar a identidade J”). As entregas de empresas não judaicas cessaram, de modo que ele agora precisava sair para comprar tudo, inclusive leite. A vida dos Klemperer continuou desse jeito por uma boa parte do ano, até sobrevir o desastre em junho de 1941. Pedante, com uma atenção para o detalhe que é uma das qualidades que tornam seus diários tão valiosos, Klemperer tinha sobrevivido até ali em parte devido à extrema meticulosidade em observar todas as normas e regulamentações a que os judeus do Terceiro Reich estavam submetidos. “Ao longo de 17 meses de guerra”, ele anotou, “sempre fizemos o blackout com o maior cuidado.” Mas, em certo anoitecer de fevereiro, ele voltou de uma caminhada após escurecer e percebeu que havia esquecido de colocar os tapumes do blackout; os vizinhos haviam reclamado para a polícia sobre a luz que vinha de seu quarto, a polícia registrou o incidente, e Klemperer foi sentenciado a oito dias de prisão. Ele jamais ouvira falar de alguém ser preso por um primeiro delito contra as regulamentações do blackout. “Sem dúvida, devo isso unicamente ao J em meu documento de identidade.” Em 23 de junho de 1940, após seu pedido de clemência ser rejeitado, Klemperer apresentou-se na delegacia de polícia para começar a cumprir a pena. No mundo subterrâneo das celas, os livros que ele havia levado para passar o tempo foram confiscados, junto com os óculos de leitura, e os carcereiros, gritando rispidamente para que ele andasse depressa, conduziram-no para a cela 89, mobiliada com uma cama dobrável e mesa, uns talheres e louça de barro, uma pia, toalha e sabão, e uma privada (cuja descarga era dada duas vezes ao dia do lado de fora). O tempo pesou infindavelmente sobre ele, “o vazio e a imobilidade medonhos de 192 horas”. Consciente de que estava ali em grande parte por ser judeu, ele começou a se indagar se algum dia sairia vivo80.
V
Judeus e poloneses não foram os únicos objetos da radicalização da política e da prática racial nazista nos dois primeiros anos da guerra. Os cerca de 26 mil ciganos da Alemanha também foram incluídos nos planos desenvolvidos pelos nazistas para o reordenamento racial da Europa central e da centro-oriental no decorrer da invasão da Polônia. Em setembro de 1939, Himmler, persuadido pelo criminologista Robert Ritter de que mestiços ciganos em particular eram uma ameaça à sociedade, havia instruído todas as polícias criminais regionais a montar uma seção especial para tratar do “problema cigano”. Ele emitiu uma ordem proibindo ciganos de casar com “arianos” e colocou cerca de 2 mil ciganos em acampamentos especiais81. Com a eclosão da guerra, Heydrich proibiu os ciganos de percorrer suas rotas comerciais itinerantes perto das fronteiras ocidentais da Alemanha. Antes disso, algumas autoridades legais dessas zonas haviam tomado a iniciativa e expulsado ciganos de seus distritos, expressando um temor tradicional em tempos de guerra de que os ciganos eram espiões; ciganos que tinham sido alistados no Exército agora também recebiam baixa por causa do mesmo temor82. Em novembro de 1939, as ciganas foram legalmente impedidas de ler a sorte, sob a alegação de que estavam espalhando falsas previsões sobre o fim da guerra (cuja data, obviamente, era uma questão de intenso interesse para muitos alemães que as consultavam). Como resultado, várias foram encarceradas em um campo de concentração feminino em Ravensbrück. Já em dezembro de 1938, Himmler havia falado sobre “a solução final da questão cigana” e, para a consecução dessa meta, Heydrich informou a seus principais lacaios, em 21 de setembro de 1939, que, a exemplo dos judeus, os ciganos também seriam deportados da Alemanha para o leste da Polônia. Os ciganos alemães receberam ordem de permanecer onde estavam sob pena de serem levados para um campo de concentração enquanto um censo era feito; em seguida, foi permitida uma certa mobilidade, essencial para os ciganos continuarem a ter como se sustentar, mas não foi lá uma grande concessão83.
Enquanto isso, em janeiro de 1940, Himmler começou um planejamento detalhado para a expulsão dos ciganos, que foram arrebanhados e colocados em campos de reunião. Em maio de 1940, cerca de 2,5 mil deles foram colocados em trens e levados para o Governo Geral a partir de sete centros de embarque na Renânia, em Hamburgo, em Bremen e em Hanover. Tiveram permissão para levar uma quantidade limitada de bagagem e receberam alimentação e atendimento médico, mas as propriedades e os bens que deixaram para trás foram por fim tomados e confiscados. Ao chegar ao Governo Geral, foram dispersos em cidades, aldeias e campos de trabalho; um trem chegou a parar no meio da zona rural, onde os guardas largaram os ciganos e os deixaram por sua própria conta. Muitos deles morreram de desnutrição ou doenças, em especial nas duras condições dos campos, e alguns pereceram em um massacre perto de Radom. Entretanto, na maioria dos casos, eles conseguiram deslocar-se com liberdade, e grande parte encontrou algum tipo de trabalho. Muitos aproveitaram a oportunidade para voltar à Alemanha, onde em geral foram detidos, mas não enviados de volta à Polônia. Porém, assim como as planejadas deportações de judeus, a expulsão dos ciganos foi logo sustada; Frank fez objeção a mais deportações em massa para o Governo Geral e a suposta necessidade militar de removê-los das fronteiras ocidentais do Reich desapareceu após a conquista da França. De momento, os ciganos que permaneciam na Alemanha foram deixados onde estavam. Números crescentes de aptos e capazes foram recrutados para esquemas de trabalho forçado84.
Como os judeus, os ciganos da Alemanha haviam vivenciado uma drástica deterioração em sua situação desde o começo da guerra. Estava claro para eles que seu futuro a longo prazo não residia na Alemanha e que, quando a deportação em massa finalmente acontecesse, seria efetuada com violência, brutalidade e assassinato. Interesses conflitantes na Polônia, combinados com a situação rapidamente cambiante da guerra, haviam provocado uma suspensão temporária nas expulsões e dado uma folga aos ciganos. Todavia, a intenção declarada de Hitler de livrar o Reich de todos os judeus e ciganos não foi abandonada de modo algum. Sua plena realização seria apenas uma questão de tempo.
1 Para o antissemitismo nazista, ver Evans, The Coming of the Third Reich, p. 172-4; idem, The Third Reich in Power, p. 536-610.
2 Wladyslaw Bartoszewski, “Polen und Juden in der deutschen Besatzungszeit”, em Klessmann (ed.), September 1939, p. 139-55, nas p. 139-41; Evans, The Third Reich in Power, p. 605-7; Peter Longerich, Politik der Vernichtung: Eine Gesamtdarstellung der nationalsozialistischen Judenverfolgung (Munique, 1998), p. 252; Friedländer, The Years of Extermination, p. 24-30.
3 Evans, The Third Reich in Power, p. 578-9; Sybil H. Milton, “The Expulsion of Polish Jews from Germany, October 1938 to July 1939: A Documentation”, Leo Baeck Institute Yearbook, 29 (1984), p. 169-74.
4 Longerich, Politik, p. 249-50; também Werner Röhr, “Zum Zusammenhang von nazistischer Okkupationspolitik in Polen und dem Völkermord an den polnischen Juden”, em idem et al. (eds.), Faschismus und Rassismus: Kontroversen um Ideologie und Opfer (Berlim, 1992), p. 300-16.
5 Rossino, Hitler Strikes Poland, p. 88-115; Halder, Kriegstagebuch, I, p. 67 (10 de setembro de 1939).
6 Walter Manoschek (ed.), “Es gibt nur Eines für das Judentum: Vernichtung”: Das Judenbild in deutschen Soldatenbriefen 1939-1941 (Hamburgo, 1997 [1995]).
7 Citado em Browning, The Origins, p. 114.
8 Fröhlich (ed.), Die Tagebücher, I/VII, p. 177-9 (2 de novembro de 1939).
9 David Welch, Propaganda and the German Cinema 1933-1945 (Oxford, 1983), p. 292-3.
10 Böhler, Auftakt, p. 197-200, para um relato geral sucinto; ibid., p. 188-97, para os preconceitos e as ações antissemitas dos soldados comuns
11 Kaplan, Scroll, p. 25 (4 de outubro de 1939), p. 28 (6 de outubro de 1939), p. 69 (16 de dezembro de 1939); Umbreit, Deutsche Militärverwaltungen, p. 205-11; ver o relato sucinto e um tanto inconclusivo sobre estupros em Böhler, Auftakt, p. 186-7, e exemplos de estupro de mulheres judias por soldados alemães em ibid., p. 197-200.
12 Klukowski, Diary, p. 30, 45-8.
13 Ibid., p. 78; ver também Gross, Polish Society, p. 92-109; exemplos adicionais em Kaplan, Scroll, p. 30 (12 de outubro de 1939); para a Igreja, Dawid Sierakowiak, The Diary of Dawid Sierakowiak (ed. Alan Adelson, Londres, 1996), p. 54; Anna Landau-Czajka, “The Jewish Question in Poland: Views Expressed in the Catholic Press between the Two World Wars”, Polin: Studies in Polish Jewry, 11 (1998), p. 263-78; Brian Porter, “Making a Space for Antisemitism: The Catholic Hierarchy and the Jews in the Early Twentieth Century”, Polin: Studies in Polish Jewry, 16 (2003), p. 415-29; e Klukowski, Diary, p. 40.
14 Ibid., p. 45.
15 Ibid., p. 38-42.
16 Ibid., p. 52-3.
17 Ibid., p. 62-3.
18 Ibid., p. 83.
19 Präg e Jacobmeyer (eds.), Diensttagebuch, p. 176-7; Omer Bartov, Hitler’s Army: Soldiers, Nazis, and War in the Third Reich (Nova York, 1991), p. 64; Alexander Rossino, “Destructive Impulses: German Soldiers and the Conquest of Poland”, Holocaust and Genocide Studies, 11 (1997), p. 351-65.
20 Gefr. H. K., 12 de agosto de 1940, citado em Manoschek (ed.), “Es gibt nur Eines”, p. 15.
21 O. Gefr. J. E., 30 de dezembro de 1939, citado em ibid., p. 12.
22 Emanuel Ringelblum, Notes from the Warsaw Ghetto: The Journal of Emanuel Ringelblum (Nova York, 1958 [1952]), p. 24, 27, 34.
23 Ibid., p. 47, também p. 33, 254.
24 Ibid., p. 68.
25 Ibid., p. 79.
26 Ibid., p. 84.
27 Mark Spoerer, Zwangsarbeit unter dem Hakenkreuz: Ausländische Zivilarbeiter, Kriegsgefangere und Häftlinge im Deutschen Reich und im besetzten Europa 1939-1945 (Stuttgart, 2001), p. 45; Böhler, Auftakt, p. 177-8; Shmuel Krakowski, “The Fate of Polish Prisoners of War in the September 1939 Camps”, Yad Vashem Studies, 12 (1977), p. 296-333.
28 Kaplan, Scroll, p. 29 (10 de outubro de 1939); exemplos adicionais em Emanuel Ringelblum, Polish-Jewish Relations during the Second World War (Jerusalém, 1974), p. 23-57 (também com detalhes sobre a participação polonesa).
29 Tatiana Berenstein et al. (eds.), Faschismus – Getto – Massenmord: Dokumentation über Ausrottung und Widerstand der Juden in Polen während des Zweiten Weltkrieges (Berlim, 1960), p. 219-21; Dieter Pohl, Von der “Judenpolitik” zum Judenmord: Der Distrikt Lublin des Generalgouvernements 1939-1944 (Frankfurt am Main, 1993), p. 22-5.
30 Sierakowiak, The Diary, p. 37 (10 de setembro de 1939), p. 38 (13 de setembro de 1939), p. 39 (15 de setembro de 1939), p. 40 (17 de setembro de 1939), p. 41 (19 de setembro de 1939), p. 52 (14 de outubro de 1939), p. 56 (27 de outubro de 1939), p. 63 (16 de novembro de 1939), p. 66 (30 de novembro de 1939), p. 69-70 (12 de dezembro de 1939).
31 Ibid., p. 111 (9 de setembro de 1940).
32 Ver mais genericamente Madajczyk, Die Okkupationspolitik, p. 258-60, para a deportação de judeus no contexto do programa de reassentamento alemão.
33 Longerich, Politik, p. 251-61; Hans Safrian, Die Eichmann-Männer (Viena, 1993), p. 68-86; Christopher Browning, The Path to Genocide: Essays on Launching the Final Solution (Cambridge, 1992), p. 3-11; idem, Nazi Policy, Jewish Workers, German Killers (Cambridge, 2000), p. 1-15; idem, The Origins, p. 36-43; David Cesarani, Eichmann: His Life and Crimes (Londres, 2004), p. 78-81; Pohl, Von der “Judenpolitik”, p. 15-21, 26-31, 47--55; a ordem de Himmler para a deportação de todos os judeus dos territórios incorporados relatada em 31 de outubro de 1939 em Präg e Jacobmeyer (eds.), Das Diensttagebuch, p. 52; mais detalhes em Seev Goshen, “Eichmann und die Nisko-Aktion im Oktober 1939: Eine Fallstudie zur NS-Judenpolitik in der letzten Etappe vor der ‘Endlösung’’’, VfZ 29 (1981), p. 74-96, e idem, “Nisko – Ein Ausnahmefall unter den Judenlagern der SS”, VfZ 40 (1992), p. 95-106.
34 Safrian, Die Eichmann-Männer, p. 87-104.
35 Aly e Heim, Architects, p. 156-9; Longerich, Politik, p. 253-61.
36 Browning, The Path to Genocide, p. 28-30; idem, The Origins, p. 36-81, 89-110 (números na p. 109); Longerich, Politik, p. 266-9.
37 Shirer, Berlin Diary, p. 197-8.
38 Evans, The Third Reich in Power, p. 660-1.
39 Gustavo Corni, Hitler’s Ghettos: Voices from a Beleaguered Society 1939-1944 (Londres, 2002), p. 22-4; preocupações de Frank em Präg e Jacobmeyer (eds.), Das Diensttagebuch, p. 95, 146-7.
40 Sierakowiak, The Diary, p. 71 (15 de dezembro 1939).
41 Browning, The Origins, p. 111-8; também Berenstein et al. (eds.), Faschismus, p. 78-81, para a ordem de 10 de dezembro de 1939; também Lucjan Dobroszycki (ed.), The Chronicle of the Lodz Ghetto 1941-1944 (New Haven, Conn., 1984), em especial a Introdução.
42 Friedländer, The Years of Extermination, p. 105-6.
43 Isaiah Trunk, Judenrat: The Jewish Councils in Eastern Europe under Nazi Occupation (Nova York, 1972), permanece insuperável como o relato abalizado sobre essas instituições. Para a origem, ver ibid., p. 1-55. A filósofa política Hannah Arendt, em seu brilhante e inflexível livro Eichmann in Jerusalem (Nova York, 1963), celebremente acusou esses organismos de cumplicidade com a política de assassinato em massa do Terceiro Reich. Entretanto, a margem de manobra aberta para eles e seus membros era mínima, conforme destaca Friedländer, The Years of Extermination, p. xxiii-xxiv; ver também Aharon Weiss, “Jewish Leadership in Occupied Poland: Postures and Attitudes”, Yad Vashem Studies, 12 (1977), p. 335-65.
44 Browning, The Origins, p. 114-20; Corni, Hitler’s Ghettos, p. 82-3; Aly e Heim, Architects, p. 186-214.
45 Corni, Hitler’s Ghettos, p. 84-6; Isaiah Trunk, Lodz Ghetto: A History (Bloomington, Ind., 2006 [1962]), p. 32-103. Para uma defesa eloquente de Rumkowski, ver Gordon J. Horwitz, Ghettostadt: Lodz and the Making of a Nazi City (Londres, 2008), esp. p. 75-88 e p. 311-7.
46 Corni, Hitler’s Ghettos, p. 24-31, 78-81; Präg e Jacobmeyer (eds.), Das Diensttagebuch, p. 91, 94.
47 Corni, Hitler’s Ghettos, p. 27-9.
48 Friedländer, The Years of Extermination, p. 104-6.
49 Ringelblum, Notes, p. 86-7 (19 de novembro de 1940). Ringelblum sempre teve o cuidado de distinguir soldados regulares, como aqui, de homens da SS e da Gestapo. Ver ibid., p. 114-5, para um exemplo.
50 Berenstein et al. (eds.), Faschismus, p. 108-13; Browning, The Origins, p. 121-31.
51 Czerniakow, The Warsaw Diary, p. 237 (17 de maio de 1941).
52 Nachman Blumenthal, “A Martyr or Hero? Reflections on the Diary of Adam Czerniakow”, Yad Vashem Studies, 7 (1968), p. 165-71; Joseph Kermish, “Introduction”, em Czerniakow, The Warsaw Diary, p. 1-24, na p. 19; Czerniakow, The Warsaw Diary, p. 295 (1o de novembro de 1941); Trunk, Judenrat; minutas da reunião de 6-7 de junho de 1940 em Präg e Jacobmeyer (eds.), Das Diensttagebuch, p. 232, 239 (ponto 8).
53 Berenstein et al. (eds.), Faschismus, p. 138; Friedländer, The Years of Extermination, p. 105--7; Trunk, Judenrat, p. 165; ver também Yisrael Gutman, The Jews of Warsaw, 1939-1943: Ghetto, Underground, Revolt (Bloomington, Ind., 1982).
54 Corni, Hitler’s Ghettos, p. 204-7, 215.
55 Ringelblum, Notes, p. 241.
56 Ibid., p. 181, 194.
57 Berenstein et al. (eds.), Faschismus, p. 152-3.
58 Charles G. Roland, Courage under Siege: Starvation, Disease, and Death in the Warsaw Ghetto (Nova York, 1992), p. 39, 99-101, 154-65.
59 Klukowski, Diary, p. 168 (3 de setembro de 1941).
60 Ringelblum, Notes, p. 268.
61 Ibid., p. 224 (19 de fevereiro de 1941); Corni, Hitler’s Ghettos, p. 119-56; Trunk, Judenrat, p. 96-9.
62 Ibid., passim, esp. p. 100-55; e em especial Gunnar S. Paulsson, Secret City: The Hidden Jews of Warsaw, 1940-1945 (Londres, 2003); e Yisrael Gutman e Shmuel Krakowski, Unequal Victims: Poles and Jews during World War Two (Nova York, 1986), p. 32-3.
63 Hosenfeld, “Ich versuche”, p. 534 (nota de 27 de setembro de 1941).
64 Kaplan, Scroll, p. 221-2 (14 de fevereiro de 1941).
65 Szarota, Warschau, p. 46; Ringelblum, Notes, p. 181.
66 Maschmann, Account Rendered, p. 81-2.
67 Uff. H. Z., 30 de junho de 1941, citado em Manoschek (ed.), “Es gibt nur Eines”, p. 30.
68 Hosenfeld, “Ich versuche”, p. 452 (nota de 3 de março de 1941).
69 Corni, Hitler’s Ghettos, p. 139-56; Czerniakow, The Warsaw Diary, p. 363 (6 de junho de 1942), p. 373 (2 de julho de 1942); Ringelblum, Polish-Jewish Relations; Ringelblum, Notes.
70 Browning, The Origins, p. 175-8; ver também Wolf Gruner, Die geschlossene Arbeitseinsatz deutscher Juden: Zur Zwangsarbeit als Element der Verfolgung, 1938-1943 (Berlim, 1997); e Dieter Maier, Arbeitseinsatz und Deportation: Die Mitwirkung der Arbeitsverwaltung bei der nationalsozialistischen Judenverfolgung in den Jahren 1938-1945 (Berlim, 1994).
71 Friedländer, The Years of Extermination, p. 193-4; Hillel Levine, In Search of Sugihara: The Elusive Japanese Diplomat Who Risked His Life to Rescue 10,000 Jews from the Holocaust (Nova York, 1996).
72 JulianeWetzel, “Auswanderung aus Deutschland”, em Wolfgang Benz (ed.), Die Juden in Deutschland 1933-1945: Leben unter nationalsozialistischer Herrschaft (Munique, 1988), p. 413-98, esp. p. 472-98.
73 Volker Dahm, “Kulturelles und geistiges Leben”, em Benz (ed.), Die Juden, p. 75-267, esp. p. 223-57 (“Kulturelles und geistiges Leben 1939-41”).
74 Günter Plum, “Deutsche Juden oder Juden in Deutschland?”, em Benz (ed.), Die Juden, p. 35-74, esp. p. 71-2.
75 Browning, The Origins, p. 169-75; Eric A. Johnson, Nazi Terror: The Gestapo, Jews, and Ordinary Germans (Nova York, 1999), p. 355-8, 382-95; casos de “contaminação racial” em Patricia Szobar, “Telling Sexual Stories in the Nazi Courts of Law: Race Defilement in Germany 1933-1945”, Journal of the History of Sexuality, 11 (2002), p. 131-63. Para o racionamento, ver Marion Kaplan, “Jewish Daily Life in Wartime Germany”, em David Bankier (ed.), Probing the Depths of German Antisemitism: German Society and the Persecution of the Jews, 1933-1941 (Jerusalém, 2000), p. 395-412, nas p. 396-8.
76 Friedländer, The Years of Extermination, p. 93-4.
77 Ibid., p. 51-2.
78 Evans, The Third Reich in Power, p. 567-8, 601-2.
79 Victor Klemperer, I Shall Bear Witness: The Diaries of Victor Klemperer 1933-41 (Londres, 1998 [1995]), p. 114, 266-9, 279, 292-336, citações na p. 324 (26 de maio de 1940), p. 325 (26 de maio de 1940), p. 336 (11 de agosto de 1940); idem, To the Bitter End: The Diaries of Victor Klemperer 1942-45 (Londres, 1998 [1995]), p. 31 (24 de março de 1942).
80 Klemperer, I Shall Bear Witness, p. 337-99.
81 Evans, The Third Reich in Power, p. 524-7.
82 Michael Zimmermann, Rassenutopie und Genozid: Die nationalsozialistische “Lösung der Zigeunerfrage” (Hamburgo, 1996), p. 193-9.
83 Browning, The Origins, p. 178-84; Henry Friedlander, The Origins of Nazi Genocide: From Euthanasia to the Final Solution (Chapel Hill, N. C., 1995), p. 246-62; Sybil H. Milton, ‘‘‘Gypsies’ as Social Outsiders in Nazi Germany”, em Robert Gellately e Nathan Stolzfus (eds.), Social Outsiders in Nazi Germany (Princeton, N. J., 2001), p. 212-32, esp. p. 223-5.
84 Guenter Lewy, The Nazi Persecution of the Gypsies (Nova York, 2000), p. 65-81; Zimmermann, Rassenutopie, p. 167-84, 200-7.