Na seção I deste livro, vimos que a taxa de lucro expressa a taxa de mais-valor sempre mais baixa do que é. Depois, vimos que mesmo uma taxa crescente de mais-valor tende a expressar-se numa taxa decrescente de lucro. A taxa de lucro só seria igual à de mais-valor se c fosse = 0, isto é, se todo o capital fosse desembolsado em salários. Uma taxa decrescente de lucro só expressa uma taxa decrescente de mais-valor se permanece inalterada a relação entre o valor do capital constante e a quantidade de força de trabalho que põe esse capital em movimento ou se essa força de trabalho aumenta em relação ao valor do capital constante.
Ricardo, sob pretexto de analisar a taxa de lucro, examina de fato somente a taxa do mais-valor, e esta apenas sob o pressuposto de que a jornada de trabalho é uma grandeza constante, tanto intensiva como extensivamente.
A queda da taxa de lucro e a acumulação acelerada só são diferentes expressões do mesmo processo na medida em que ambas expressam o desenvolvimento da força produtiva. A acumulação, por sua vez, acelera a queda da taxa de lucro na medida em que com ela está dada a concentração dos trabalhos em grande escala e, com isso, uma composição mais alta do capital. Por outro lado, a queda da taxa de lucro acelera a concentração do capital e sua centralização por meio da expropriação dos capitalistas menores, da expropriação dos últimos produtores diretos que ainda disponham de algo a ser expropriado. Desse modo, a acumulação se acelera na proporção de sua massa, ainda que a taxa de acumulação diminua juntamente com a taxa de lucro.
Enquanto a taxa de valorização do capital total, taxa de lucro, é o aguilhão da produção capitalista (assim como a valorização do capital é seu único objetivo), sua queda torna mais lenta a formação de novos capitais independentes e, assim, aparece como ameaça ao desenvolvimento do processo de produção capitalista; tal queda promove a superprodução, a especulação, as crises e o capital supérfluo, além da população supérflua. Por isso, os economistas que, como Ricardo, tomam o modo capitalista de produção como absoluto sentem aqui que esse modo de produção cria uma barreira para si mesmo e atribuem essa barreira não à produção, mas à natureza (na doutrina da renda). Em seu horror à taxa decrescente de lucro, o que importa é o sentimento de que o modo de produção capitalista encontra no desenvolvimento das forças produtivas uma barreira que não tem nenhuma relação com a produção da riqueza como tal – essa barreira peculiar atesta a estreiteza e o caráter meramente histórico e transitório do modo de produção capitalista; atesta que este não é um modo de produção absoluto para a produção da riqueza, mas que, ao contrário, tendo atingido certo estágio, ele entra em conflito com o desenvolvimento ulterior dessa riqueza.
É verdade que Ricardo e sua escola consideram somente o lucro industrial, no qual estão incluídos os juros. Mas também a taxa da renda fundiária tende a cair, embora sua massa absoluta cresça, assim como ela pode crescer proporcionalmente em relação ao lucro industrial. (Ver Ed.[ward] West, que desenvolveu a lei da renda fundiária antes de Ricardo.) Se considerarmos o capital social total C e chamarmos de l1 o lucro industrial que sobra depois de deduzidos os juros e a renda fundiária, j os juros e r a renda, então m/C = l/C = l1 + j + r/C = l1/C + j/C + r/C.
Vimos que, embora no curso do desenvolvimento da produção capitalista a soma total do mais-valor (m) cresça constantemente, m/C decresce de maneira também constante, pois C cresce ainda mais rápido do que m. Portanto, não há nenhuma contradição no fato de que tanto l1 como j e r possam crescer constantemente, cada qual por sua parte, ao passo que tanto m/C = l/C como l1/C, j/C e r/C decresçam cada vez mais ou que l1 cresça em relação a j, r em relação a l1 ou também relativamente em comparação com l1 e j. Com o aumento do mais-valor ou do lucro total m = l, porém acompanhado de uma taxa decrescente de lucro m/C = l/C, a proporção de grandezas das partes l1, j e r – nas quais m = l se decompõe – pode variar de qualquer maneira dentro dos limites dados pela soma total m, sem que, por isso, seja afetada a grandeza de m ou de m/C.
A variação recíproca de l1, j e r é só uma distribuição diferente de m entre diversas rubricas. Em consequência, também l1/C, j/C ou r/C – a taxa do lucro industrial, a taxa de juros e a relação entre a renda e o capital total – podem aumentar uma em relação às outras, embora m/C, a taxa de lucro, diminua; mantém-se apenas a condição de que a soma das três seja = m/C. Se, por exemplo, a taxa de lucro cair de 50% para 25%, e a composição do capital, com uma taxa de mais-valor = 100%, modificar-se de 50c + 50v para 75c + 25v, então, no primeiro caso, um capital de 1.000 renderá um lucro de 500 e, no segundo, um capital de 4.000 renderá um lucro de 1.000. Assim, m ou l terá se duplicado, mas l’ terá diminuído pela metade. Se dos 50% anteriores 20% eram lucro, 10% juros e 20% renda, então l1/C = 20%, j/C = 10% e r/C = 20%. Se na queda da taxa para 25% as proporções permanecem as mesmas, então l1/C = 10%, j/C = 5% e r/C = 10%. Se, em contrapartida, l1/C cair a 8% e j/C cair a 4%, então r/C aumentará para 13%. A grandeza proporcional de r teria aumentado em relação a l1 e a j, mas, apesar disso, l’ teria permanecido constante. Sob ambos os pressupostos, a soma de l1, j e r teria aumentado, porquanto é o produto de um capital quatro vezes maior. Além disso, o pressuposto de Ricardo, de que o lucro industrial (mais os juros) embolsa originalmente todo o mais-valor, é histórica e conceitualmente falso. Pelo contrário, é apenas o progresso da produção capitalista que 1) dá aos capitalistas industriais e comerciais todo o lucro para sua ulterior distribuição e 2) reduz a renda ao excedente acima do lucro. Sobre essa base capitalista cresce, por sua vez, a renda (que é uma parte do lucro, isto é, do mais-valor considerado produto do capital total), mas não a parte específica do produto que o capitalista embolsa.
Estando pressuposta a existência dos meios de produção necessários, isto é, de uma acumulação suficiente de capital, a criação de mais-valor pode encontrar apenas dois obstáculos: a população trabalhadora, se está dada a taxa de mais-valor, isto é, o grau de exploração do trabalho; e o grau de exploração do trabalho, se está dada a população trabalhadora. O processo de produção capitalista consiste essencialmente na produção de mais-valor, representado pelo mais-produto, ou na alíquota das mercadorias produzidas, na qual o trabalho não pago está objetivado. Não se pode jamais esquecer que a produção desse mais-valor – e a reconversão de parte dele em capital (ou seja, a acumulação) constitui parcela integrante dessa produção do mais-valor – é a finalidade direta e o motivo determinante da produção capitalista. Razão pela qual não se deve apresentá-la como o que ela não é, a saber, como uma produção que tem por finalidade direta o desfrute ou a criação de meios de desfrute para o capitalista. Com isso, abstraímos inteiramente de seu caráter específico, que se apresenta em toda sua configuração nuclear interna.
A obtenção desse mais-valor constitui o processo direto de produção, que, como já dissemos, não encontra outros obstáculos senão os já indicados. O mais-valor estará produzido tão logo a quantidade espoliável de mais-trabalho estiver objetivada. Mas com essa produção do mais-valor está consumado apenas o primeiro ato do processo de produção capitalista, o processo direto de produção. O capital absorveu certa quantidade de trabalho não pago. Com o desenvolvimento do processo que se expressa na queda da taxa de lucro, a massa do mais-valor assim produzido aumenta monstruosamente. Tem-se, então, o segundo ato do processo. É preciso vender a massa inteira das mercadorias, o produto total, tanto a parte que repõe o capital constante e variável como a que representa o mais-valor. Se não se conseguir vendê-la ou se conseguir apenas em parte ou a preços inferiores aos de produção, o trabalhador terá sido explorado, certamente, mas sua exploração não se terá realizado como tal para o capitalista, não terá alcançado em absoluto a realização do mais-valor espoliado ou o terá alcançado apenas parcialmente, podendo inclusive acarretar a perda parcial ou total de seu capital. As condições da exploração direta e as de sua realização não são idênticas. Elas divergem não só quanto ao tempo e ao lugar, mas também conceitualmente. Umas estão limitadas pela força produtiva da sociedade; outras, pela proporcionalidade entre os diversos ramos de produção e pela capacidade de consumo da sociedade. Essa capacidade não é determinada pela força absoluta de produção nem pela capacidade absoluta de consumo, mas pela capacidade de consumo sobre a base de relações antagônicas de distribuição, que reduzem o consumo da grande massa da sociedade a um mínimo só suscetível de variação dentro de limites mais ou menos estreitos. Além disso, ela está limitada pelo impulso de acumulação, de aumento do capital e da produção de mais-valor em escala ampliada. Essa é uma lei da produção capitalista, lei dada pelas constantes revoluções nos próprios métodos de produção, pela constante desvalorização do capital existente acarretada por essas revoluções, pela luta concorrencial generalizada e a necessidade de melhorar a produção e ampliar sua escala, apenas como meio de autoconservação e sob pena de sucumbir. Por isso, o mercado precisa ser constantemente expandido, de modo que seus nexos e as condições que os regulam assumam cada vez mais a forma de uma lei natural independente dos produtores, tornem-se cada vez mais incontroláveis. A contradição interna procura ser compensada pela expansão do campo externo da produção. Quanto mais se desenvolve a força produtiva, mais ela entra em conflito com a base estreita sobre a qual repousam as relações de consumo. Sobre essa base plena de contradições não é em absoluto uma contradição que o excesso de capital esteja ligado a um excesso crescente de população, pois, se os fatores combinados fazem aumentar a massa do mais-valor produzido, justamente com isso se acentua a contradição entre as condições nas quais esse mais-valor é produzido e as condições nas quais ele é realizado.
Partindo de dada taxa de lucro, a massa do lucro dependerá sempre da grandeza do capital adiantado. A acumulação se determina, então, pela parte dessa massa que volta a se converter em capital. Porém, essa parte, por ser igual ao lucro menos a renda consumida pelo capitalista, dependerá não só do valor de tal massa, como também do baixo preço das mercadorias que o capitalista pode comprar com ela – mercadorias destinadas em parte a seu consumo, sua renda, em parte a seu capital constante. (Nesse caso, o salário é pressuposto como dado.)
A massa do capital que o trabalhador põe em movimento e cujo valor ele conserva e faz reaparecer no produto por meio de seu trabalho é totalmente distinta do valor que esse mesmo trabalhador agrega. Se a massa do capital é = 1.000 e o trabalho agregado é = 100, o capital reproduzido será = 1.100. Se a massa é = 100 e o trabalho agregado é = 20, o capital reproduzido será = 120. A taxa de lucro será, no primeiro caso, = 10%; no segundo, = 20%. No entanto, pode-se acumular mais a partir de 100 do que a partir de 20. Assim o fluxo do capital (abstraindo de sua desvalorização em virtude do aumento da força produtiva), ou sua acumulação, avança em proporção ao peso que ele já possui, e não em proporção ao nível da taxa de lucro. Uma alta taxa de lucro, desde que se baseie numa alta taxa de mais-valor, é possível quando a jornada de trabalho é muito longa, ainda que o trabalho seja improdutivo; e é possível porque as necessidades dos trabalhadores são muito exíguas, razão pela qual o salário médio é bem baixo, ainda que o trabalho seja improdutivo. O baixo nível do salário corresponderá à falta de energia dos trabalhadores. Nesse caso, o capital se acumula lentamente, apesar da alta taxa de lucro. A população permanece estacionária, e o tempo de trabalho que custa o produto é grande, ainda que o salário pago ao trabalhador seja pequeno.
A taxa de lucro diminui não porque o trabalhador seja menos explorado, mas porque se emprega menos trabalho em proporção ao capital investido em geral.
Se, como demonstramos, a taxa decrescente de lucro coincide com o aumento da massa de lucro, uma parte maior do produto anual do trabalho será apropriada pelo capitalista sob a categoria capital (como reposição do capital consumido), e uma parte proporcionalmente menor, sob a categoria do lucro. Isso explica a fantasia do padre Chalmers de que, quanto menor for a parte do produto anual desembolsada pelos capitalistas como capital, maiores serão os lucros por eles obtidos; e nisso ele recebe a ajuda da Igreja estatal[a], que zela pelo consumo, em vez de pela capitalização, de uma grande parte do mais-produto. O padre confunde a causa e o efeito. Além disso, ainda que o lucro seja menor, a massa do lucro aumenta com a grandeza do capital desembolsado. Isso condiciona ao mesmo tempo a concentração do capital, já que agora as condições de produção exigem o emprego massivo de capital. E condiciona também sua centralização – isto é, que os pequenos capitalistas sejam engolidos pelos grandes – e a descapitalização dos primeiros. Trata-se, uma vez mais, porém elevada à segunda potência, do divórcio entre as condições de trabalho e os produtores, entre os quais ainda se encontram esses pequenos capitalistas, já que, no caso deles, o trabalho próprio ainda desempenha certo papel; em geral, o trabalho do capitalista se encontra em proporção inversa à grandeza de seu capital, isto é, ao grau em que ele é capitalista. Esse divórcio entre as condições de trabalho, de um lado, e os produtores, de outro, é o que forma o conceito de capital; um divórcio que tem início com a acumulação primitiva (Livro I, capítulo 24) aparece em seguida como processo constante na acumulação e na concentração do capital e, por fim, se expressa aqui na centralização de capitais já existentes em poucas mãos e na descapitalização de muitos (fenômeno no qual se converte agora a expropriação). Esse processo logo provocaria o colapso da produção capitalista, se tendências contra-arrestantes não atuassem constantemente com um efeito descentralizador junto à força centrípeta.
O desenvolvimento da força produtiva social do trabalho revela-se duplamente: em primeiro lugar, na grandeza das forças produtivas já produzidas, no volume do valor e da massa das condições de produção sob as quais tem lugar a nova produção e na grandeza absoluta do capital produtivo já acumulado; em segundo lugar, na relativa pequenez da parte de capital desembolsada no salário em relação ao capital total, isto é, na relativa pequenez do trabalho vivo requerido para a reprodução e a valorização de um capital dado, para a produção em massa. Isso supõe, ao mesmo tempo, a concentração do capital.
Com relação à força de trabalho empregada, o desenvolvimento da força produtiva também se revela de dois modos: primeiro, no aumento do mais-trabalho, isto é, na abreviação do tempo de trabalho necessário para a reprodução da força de trabalho. Segundo, na diminuição da quantidade de força de trabalho (número de trabalhadores) que se emprega, em geral, para pôr em movimento um capital dado.
Ambos os movimentos não só transcorrem paralelamente, mas se condicionam de maneira recíproca, são fenômenos nos quais se expressa a mesma lei. No entanto, atuam em sentido contrário sobre a taxa de lucro. A massa total do lucro é igual à massa total do mais-valor, e a taxa de lucro m/C = mais-valor/capital total adiantado. Mas o mais-valor, como soma total, está determinado, em primeiro lugar, por sua taxa e, em segundo lugar, pela massa do trabalho simultaneamente empregado a essa taxa, ou, o que dá no mesmo, pela grandeza do capital variável. Por um lado, aumenta um dos fatores, a taxa de mais-valor; por outro, diminui (relativa ou absolutamente) o outro fator, o número de trabalhadores. Ao diminuir a parte paga do trabalho empregado, o desenvolvimento da força produtiva provoca o aumento do mais-valor, porquanto aumenta sua taxa; porém, ao diminuir a massa total do trabalho empregado por um capital dado, ele diminui o fator do número pelo qual se multiplica a taxa de mais-valor para obter sua massa. Dois trabalhadores que trabalham 12 horas diárias não podem fornecer a mesma massa de mais-valor que 24 trabalhadores que trabalham apenas 2 horas cada, ainda que pudessem viver de ar e, portanto, não tivessem de trabalhar um só minuto para si mesmos. Por isso, aqui a compensação do menor número de trabalhadores mediante o aumento do grau de exploração do trabalho encontra certos limites insuperáveis; ela pode, portanto, frear a queda da taxa de lucro, mas não a anular.
A taxa de lucro diminui, pois, à medida que se desenvolve o modo de produção capitalista, enquanto sua massa aumenta na proporção do crescimento da massa do capital empregado. Partindo de uma taxa dada, a massa absoluta em que cresce o capital depende da grandeza atual deste último. Por outro lado, dada essa grandeza, a proporção na qual ele cresce – a taxa de seu crescimento – depende da taxa de lucro. O incremento da força produtiva (que, além disso, como já indicamos, acompanha sempre a desvalorização do capital existente) só pode aumentar diretamente a grandeza de valor do capital se, elevando a taxa de lucro, ele aumenta a parte de valor do produto anual que se reconverte em capital. Quando se considera a força produtiva do trabalho, isso só pode ocorrer (pois essa força produtiva nada tem a ver diretamente com o valor do capital existente) na medida em que se eleve o mais-valor relativo ou se reduza o valor do capital constante, isto é, na medida em que as mercadorias que entram na reprodução da força de trabalho ou nos elementos do capital constante baratearem. Ambas as coisas implicam uma desvalorização do capital existente, e ambas correm paralelamente à redução do capital variável em relação ao capital constante. Ambas condicionam a queda da taxa de lucro, e ambas freiam essa queda. Além disso, elevação da taxa de lucro, enquanto provoca elevação na demanda de trabalho, influi sobre o aumento da população trabalhadora e, por conseguinte, do material explorável, que faz com que o capital seja capital.
Mas o desenvolvimento da força produtiva do trabalho contribui indiretamente para o aumento do valor de capital existente ao incrementar a massa e a variedade dos valores de uso nos quais se apresenta o mesmo valor de troca e que constituem o substrato material, os elementos materiais do capital, os objetos materiais em que consistem diretamente o capital constante e, ao menos indiretamente, o capital variável. Com o mesmo capital e o mesmo trabalho, criam-se mais coisas a ser transformadas em capital, abstraindo de seu valor de troca. Coisas que podem servir para absorver trabalho adicional – portanto, também mais-trabalho adicional – e, assim, formar capital adicional. A massa de trabalho que pode ser comandada pelo capital não depende de seu valor, mas da massa das matérias-primas e dos materiais auxiliares, da maquinaria e dos elementos do capital fixo, dos meios de subsistência que compõem esse capital, independentemente do valor desses componentes. Ao crescer assim a massa do trabalho empregado – e, consequentemente, do mais-trabalho –, aumenta também o valor do capital reproduzido e o mais-valor novo que lhe foi adicionado.
Mas esses dois fatores compreendidos no processo de acumulação não devem ser considerados apenas na tranquila justaposição em que os trata Ricardo; eles implicam uma contradição que se manifesta em tendências e manifestações contraditórias. As forças antagônicas operam umas contra as outras.
Simultaneamente ao impulso para o aumento real da população trabalhadora, impulso que emana do incremento da parte do produto social total que funciona como capital, atuam as forças que criam uma superpopulação apenas relativa.
Simultaneamente à queda da taxa de lucro cresce a massa dos capitais, e paralelamente a essa queda ocorre uma desvalorização do capital existente, que detém essa queda e imprime um impulso acelerador à acumulação de valor do capital.
Simultaneamente ao desenvolvimento da força produtiva há o aumento progressivo da composição do capital e a diminuição relativa da parte variável em relação à parte constante.
Essas diversas influências se fazem sentir, ora de maneira mais justaposta no espaço, ora de maneira mais sucessiva no tempo; o conflito entre as forças antagônicas desemboca periodicamente em crises. Estas são sempre apenas violentas soluções momentâneas das contradições existentes, erupções violentas que restabelecem por um momento o equilíbrio perturbado.
A contradição, expressa de maneira bem genérica, consiste no fato de que o modo de produção capitalista implica uma tendência ao desenvolvimento absoluto das forças produtivas, abstraindo do valor – e do mais-valor nele incorporado – e também das relações sociais no interior das quais se dá a produção capitalista; por outro lado, esse modo de produção tem como objetivo a conservação do valor de capital existente e sua valorização na máxima medida possível (isto é, o incremento cada vez mais acelerado desse valor). Seu caráter específico orienta-se para o valor de capital existente como meio para a maior valorização possível desse valor. Os métodos pelos quais ela atinge esse objetivo incluem: o decréscimo da taxa de lucro, a desvalorização do capital existente e o desenvolvimento das forças produtivas do trabalho à custa das forças produtivas já produzidas.
A desvalorização periódica do capital existente, que é um meio imanente ao modo de produção capitalista para conter a queda da taxa de lucro e acelerar a acumulação do valor de capital mediante a formação de capital novo, perturba as condições dadas nas quais se consuma o processo de circulação e reprodução do capital e é, por isso, acompanhada de paralisações súbitas e crises do processo de produção.
O decréscimo relativo do capital variável em relação ao constante, que ocorre paralelamente ao desenvolvimento das forças produtivas, incentiva o crescimento da população trabalhadora, enquanto cria de modo permanente uma superpopulação artificial. A acumulação do capital, considerada em relação ao valor, é desacelerada pela queda da taxa de lucro a fim de acelerar ainda mais a acumulação do valor de uso, enquanto esta, por sua vez, imprime um movimento acelerado à acumulação em relação ao valor.
A produção capitalista tende constantemente a superar esses limites que lhes são imanentes, porém consegue isso apenas em virtude de meios que voltam a elevar diante dela esses mesmos limites, em escala ainda mais formidável.
O verdadeiro obstáculo à produção capitalista é o próprio capital, isto é, o fato de que o capital e sua autovalorização aparecem como ponto de partida e ponto de chegada, como mola propulsora e escopo da produção; o fato de que a produção é produção apenas para o capital, em vez de, ao contrário, os meios de produção serem simples meios para um desenvolvimento cada vez mais amplo do processo vital, em benefício da sociedade dos produtores. Os limites nos quais unicamente se podem mover a conservação e a valorização do valor de capital, as quais se baseiam na expropriação e no empobrecimento da grande massa dos produtores, entram assim constantemente em contradição com os métodos de produção que o capital tem de empregar para seu objetivo e que apontam para um aumento ilimitado da produção, para a produção como fim em si mesmo, para um desenvolvimento incondicional das forças produtivas sociais do trabalho. O meio – o desenvolvimento incondicional das forças produtivas sociais – entra em conflito constante com o objetivo limitado, que é a valorização do capital existente. Assim, se o modo de produção capitalista é um meio histórico para desenvolver a força produtiva material e criar o mercado mundial que lhe corresponde, ele é, ao mesmo tempo, a constante contradição entre essa sua missão histórica e as relações sociais de produção correspondentes a tal modo de produção.
Com a queda da taxa de lucro, aumenta o mínimo de capital de que o capitalista individual precisa dispor para um emprego produtivo do trabalho; trata-se do capital requerido tanto para sua exploração em geral como para que o tempo de trabalho empregado seja o necessário à produção das mercadorias, isto é, para que ele não ultrapasse a média do tempo de trabalho socialmente necessário para produzi-las. Em paralelo, aumenta a concentração, porque para além de certos limites, um grande capital com uma taxa pequena de lucro acumula-se mais rapidamente do que um capital pequeno com uma grande taxa de lucro. Por sua vez, essa crescente concentração, atingindo certo nível, provoca uma nova queda da taxa de lucro, o que faz com que a massa dos pequenos capitais fragmentários seja lançada ao acaso: especulação, fraudes creditícias e acionárias, crises. A assim chamada pletora do capital refere-se sempre essencialmente à pletora daquele capital para o qual a queda na taxa do lucro não é compensada por sua massa – e esse é sempre o caso das novas ramificações de capital, recém-formadas – ou à pletora que esses capitais, incapazes de uma ação autônoma, põem à disposição dos grandes ramos de negócios na forma do crédito. Essa pletora do capital surge das mesmas circunstâncias que produzem uma superpopulação relativa e constitui, por isso, um fenômeno complementar desta última, embora ambos estejam situados em polos opostos: o capital desocupado, de um lado; a população trabalhadora desocupada, de outro.
Por isso, a superprodução de capital, e não de mercadorias individuais – apesar de a superprodução de capital implicar a superprodução de mercadorias –, não significa outra coisa senão a superacumulação de capital. Para entender o que significa essa superacumulação (seu exame mais detalhado será realizado adiante), é preciso apenas supô-la como absoluta. Quando seria absoluta a superprodução do capital? E, mais ainda, uma superprodução que não se limitasse a este, a aquele ou a uns poucos terrenos importantes da produção, mas que fosse absoluta em suas próprias dimensões, ou seja, que englobasse todos os terrenos da produção?
Uma superprodução absoluta de capital teria lugar tão logo o capital adicional para os fins da produção capitalista fosse = 0. Mas a finalidade da produção capitalista é a valorização do capital, isto é, a apropriação de mais-trabalho, a produção de mais-valor, de lucro. Tão logo, portanto, o capital tivesse aumentado em relação à população trabalhadora numa proporção em que não se pudessem ampliar nem o tempo absoluto de trabalho fornecido por essa população nem o tempo relativo de mais-trabalho (de qualquer modo, esta última ampliação não seria praticável num caso em que a demanda de trabalho fosse tão intensa, ou seja, com uma tendência ao aumento dos salários); isto é, tão logo o capital acrescido produzisse uma massa de mais-valor igual ou menor do que antes de seu crescimento, teríamos uma superprodução absoluta de capital, ou seja, o capital incrementado C + ΔC não produziria um lucro maior, mas apenas igual ou até mesmo menor que o lucro do capital C antes de seu incremento por meio de ΔC. Em ambos os casos também ocorreria uma forte e repentina queda na taxa geral de lucro – dessa vez em virtude de uma mudança na composição do capital, não pelo desenvolvimento da força produtiva, mas por um aumento no valor monetário do capital variável (em virtude do aumento dos salários) e pelo correspondente decréscimo do mais-trabalho em relação ao trabalho necessário.
Na realidade, as coisas se apresentariam de tal modo que uma parte do capital ficaria total ou parcialmente inativa (pois para se valorizar ela teria primeiro de deslocar o capital já em funcionamento), enquanto a outra parte, devido à pressão do capital desocupado ou semiocupado, se valorizaria a uma taxa de lucro mais baixa. Para isso, seria indiferente que uma parte do capital adicional assumisse o lugar do capital antigo e este passasse a ocupar um lugar no capital adicional. Teríamos sempre, de um lado, a antiga soma de capital e, de outro, a soma adicional. A queda da taxa de lucro estaria acompanhada, nesse caso, de um decréscimo absoluto da massa de lucro, uma vez que, sob nossos pressupostos, nem a massa da força de trabalho empregada nem a taxa de mais-valor poderiam ser aumentadas, ou seja, que tampouco a massa do mais-valor poderia ser incrementada. E a reduzida massa de lucros deveria ser calculada sobre um capital total aumentado. Porém, supondo também que o capital ocupado continuasse a se valorizar à antiga taxa de lucro, ou seja, que a massa de lucros permanecesse a mesma, esta última continuaria a ser calculada sobre um capital total aumentado, o que também implicaria uma queda da taxa de lucro. Se um capital total de 1.000 produzia um lucro de 100 e, após seu aumento a 1.500, continua a produzir apenas 100, então 1.000 rendem, no segundo caso, somente 66⅔. A valorização do antigo capital teria diminuído de forma absoluta. Sob as novas circunstâncias, o capital = 1.000 não renderia mais do que antes um capital = 666⅔.
Está claro, no entanto, que essa desvalorização efetiva do capital antigo não poderia produzir-se sem luta, que o capital adicional ΔC não funcionaria como capital sem luta nenhuma. A taxa de lucro não diminuiria devido à concorrência resultante da superprodução de capital, mas porque, ao contrário, uma vez que a diminuição da taxa de lucro e a superprodução de capital emanam das mesmas circunstâncias, agora teria lugar a luta concorrencial. Os antigos capitalistas atuantes deixariam mais ou menos em reserva a parte de ΔC que se encontrasse em suas mãos a fim de não desvalorizarem eles mesmos seu capital originário e não reduzirem seu lugar no âmbito da produção ou a empregariam para, ainda que com perdas momentâneas, transferir a inatividade do capital adicional aos novos intrusos e a seus concorrentes.
A parcela de ΔC que se encontrasse em novas mãos tentaria ocupar seu lugar à custa do antigo capital e de consegui-lo, em parte, deixando inativa uma cota do capital antigo, obrigando-o a ceder-lhe seu lugar e até ocupando o lugar do capital adicional apenas parcialmente ocupado ou desocupado por completo.
Em todos os casos, uma parcela do antigo capital teria de ser inativada, isto é, teria de deixar de atuar em sua condição de capital, na medida em que deve funcionar e valorizar-se como capital. A luta concorrencial decidiria que parte resultaria especialmente afetada por essa inativação. Enquanto tudo corre bem, a concorrência, tal como se revela no nivelamento da taxa geral de lucro, atua como uma confraria da classe capitalista, que reparte o butim coletivo comunitariamente e em proporção à grandeza da participação de cada um de seus membros. Quando já não se trata de dividir o lucro, e sim as perdas, cada um procura reduzir o máximo possível sua participação e transferi-las a outrem. As perdas são inevitáveis para a classe. Mas a parte que cabe a cada indivíduo nessas perdas, a participação de cada um no cômputo geral, torna-se uma questão de poder e astúcia, e aqui a concorrência converte-se numa luta entre irmãos inimigos. Deflagra-se, então, o antagonismo entre o interesse de cada capitalista individual e o da classe capitalista, do mesmo modo como antes se impunha praticamente a identidade desses interesses por meio da concorrência.
Como reequilibrar as partes em conflito e restabelecer as condições correspondentes ao movimento “saudável” da produção capitalista? A maneira de chegar a esse equilíbrio já está contida na simples enunciação do conflito que se trata de dirimir. Ela inclui uma inativação, até mesmo uma destruição parcial de capital, no montante de valor de todo o capital adicional ΔC ou de uma parcela dele. Ainda que, como já se depreende da exposição do conflito, a distribuição dessas perdas não se estenda de modo nenhum de maneira uniforme aos diversos capitais particulares, mas seja decidida numa luta concorrencial, distribuindo-se de forma muito desigual e diversa conforme as vantagens particulares ou as posições já conquistadas, de modo que um capital se vê inativado, outro destruído, um terceiro experimenta apenas uma perda relativa ou sofre apenas uma desvalorização transitória etc.
Sob qualquer circunstância, o equilíbrio se estabeleceria por inativação e, em maior ou menor medida, mesmo por aniquilação de capital. Isso se estenderia, em parte, à substância material do capital; isto é, uma parte dos meios de produção, capital fixo e circulante, não funcionaria, não atuaria como capital; uma parte dos empreendimentos produtivos iniciados ficaria paralisada. Ainda que, sob esse aspecto, o tempo ataque e deteriore todos os meios de produção (com exceção do solo), teríamos aqui, em decorrência da paralisação das funções, uma destruição real muito mais intensa de meios de produção. No entanto, o efeito principal, sob esse aspecto, seria o de que esses meios de produção deixariam de atuar como tais; uma destruição mais breve ou mais prolongada de sua função como meios de produção.
A destruição principal, com o caráter mais agudo, teria lugar com relação ao capital e, na medida em que este possui atributo de valor, com relação aos valores de capital. A parte do valor de capital que só se encontra na forma de indicações de futuras participações no mais-valor, no lucro – de fato, como meros títulos de dívida sobre a produção sob diversas formas –, é imediatamente desvalorizada com a diminuição das entradas sobre as quais está calculada. Uma parte do ouro e da prata cunhados encontra-se inativa, não funciona como capital. Uma parte das mercadorias que se encontram no mercado só pode completar seu processo de circulação e reprodução por meio de uma enorme contração de seus preços, isto é, da desvalorização do capital que essa parte representa. Também os elementos do capital resultam mais ou menos desvalorizados. A isso se acrescenta que determinadas relações pressupostas de preços condicionam o processo de reprodução e que, em virtude disso, esse processo, devido à baixa geral dos preços, entra num estado de paralisação e desequilíbrio. Essa perturbação e esse estancamento paralisam a função do dinheiro como meio de pagamento – função dada simultaneamente com o desenvolvimento do capital e baseada naquelas relações pressupostas de preços –, interrompem em inúmeros pontos a cadeia das obrigações de pagamento em determinados prazos e são intensificados pelo conseguinte colapso do sistema de crédito desenvolvido simultaneamente ao capital, o que conduz a violentas e agudas crises, a súbitas desvalorizações forçadas, a um estancamento e uma perturbação reais do processo de reprodução e, com isso, a uma redução efetiva da reprodução.
Ao mesmo tempo, porém, outros agentes teriam entrado em jogo. A paralisação da produção teria inativado uma parte da classe trabalhadora e, com isso, colocado a parte ocupada numa situação em que ela teria de tolerar uma queda do salário, mesmo que abaixo da média; uma operação cujo efeito, para o capital, é exatamente o mesmo que se obteria se, mantendo-se o salário médio, o mais-valor relativo ou absoluto tivesse sido aumentado. A era de prosperidade teria favorecido os casamentos entre trabalhadores e reduzido a dizimação de sua descendência, circunstâncias que, por mais que possam implicar um aumento real da população, não implicam, em contrapartida, um aumento da população realmente trabalhadora, porém atuam na relação entre os trabalhadores e o capital exatamente como se o número de trabalhadores de fato atuantes tivesse aumentado. Por outro lado, a queda de preços e a luta concorrencial teriam estimulado todo capitalista a reduzir o valor individual de seu produto total abaixo de seu valor geral mediante o emprego de novas máquinas, de novos métodos aperfeiçoados de trabalho, de novas combinações, isto é, a incrementar a força produtiva de dada quantidade de trabalho, diminuir a relação entre o capital variável e o constante e, com isso, liberar trabalhadores; em suma, a criar uma superpopulação artificial. Além disso, a desvalorização dos elementos do capital constante seria ela mesma um elemento a implicar a elevação da taxa de lucro. A massa do capital constante empregado teria aumentado em relação à massa do capital variável, mas o valor daquela massa poderia ter diminuído. A paralisação verificada na produção teria preparado uma ulterior ampliação desta última, dentro dos limites capitalistas.
E assim se percorreria novamente o círculo. Uma parte do capital, desvalorizada pela paralisação de suas funções, recuperaria seu antigo valor. Além disso, o mesmo círculo vicioso seria outra vez percorrido com condições de produção ampliadas, um mercado expandido e uma força produtiva aumentada.
Porém, mesmo sob o pressuposto extremo do qual partimos, a superprodução absoluta de capital não é uma superprodução absoluta em geral, uma superprodução absoluta de meios de produção. É uma superprodução de meios de produção somente na medida em que eles funcionam como capital e, por conseguinte, devem implicar – em proporção a seu valor, que aumenta ao aumentar sua massa – uma valorização desse valor, isto é, devem gerar um valor adicional.
Apesar disso, ela seria superprodução, porque o capital seria incapaz de explorar o trabalho num grau de exploração condicionado pelo desenvolvimento “saudável”, “normal”, do processo de produção capitalista, num grau de exploração que aumenta pelo menos a massa de lucro ao aumentar a massa do capital empregado, isto é, que exclui o fato de que a taxa de lucro decresce na mesma medida em que cresce o capital ou mesmo que a taxa de lucro decresce mais rapidamente do que cresce o capital.
A superprodução de capital não significa outra coisa senão a superprodução de meios de produção – meios de trabalho e de subsistência – que podem atuar como capital, isto é, que podem ser empregados para a exploração do trabalho em dado grau de exploração, uma vez que a queda desse grau de exploração abaixo de certo ponto provoca perturbações e paralisações do processo de produção capitalista, crises e destruição de capital. Não constitui uma contradição o fato de essa superprodução de capital ser acompanhada de uma superpopulação relativa maior ou menor. As mesmas circunstâncias que elevaram a força produtiva do trabalho aumentaram a massa dos produtos-mercadorias, expandiram os mercados, aceleraram a acumulação do capital, em relação tanto a sua massa como a seu valor, e rebaixaram a taxa de lucro; essas mesmas circunstâncias geraram e geram constantemente uma superpopulação relativa, uma superpopulação de trabalhadores que o capital excedente deixa de empregar em virtude do baixo grau de exploração do trabalho, único grau em que ela poderia ser empregada, ao menos em virtude da baixa taxa de lucro que ela proporcionaria como grau dado de exploração.
Se capital é mandado para o exterior, isso não ocorre por ser impossível ocupá-lo no interior, mas porque no exterior pode-se investi-lo com uma taxa de lucro mais alta. Mas esse é um capital absolutamente excedente para a população trabalhadora ocupada e para o país em geral. Ele existe como tal junto à população relativamente excedente, e isso é um exemplo de como ambos coexistem e se condicionam de maneira recíproca.
Por outro lado, a queda da taxa de lucro, vinculada à acumulação, provoca necessariamente uma luta concorrencial. A compensação da queda da taxa de lucro mediante o aumento da massa do lucro vale apenas para o capital total da sociedade e para os grandes capitalistas já consolidados. O novo capital adicional, de funcionamento autônomo, não encontra dada nenhuma dessas condições compensatórias; deve lutar por conquistá-las e, desse modo, a queda na taxa de lucro suscita a luta concorrencial entre os capitais, e não o inverso. No entanto, essa luta concorrencial é acompanhada de um aumento transitório dos salários e, como consequência desse aumento, de uma diminuição temporária da taxa de lucro. O mesmo se manifesta na superprodução de mercadorias, no abarrotamento dos mercados. Como o fim do capital não é a satisfação das necessidades, mas a produção de lucro, e como ele só alcança esse objetivo em virtude de métodos que regulam o volume da produção com relação à escala da produção, e não o inverso, deve produzir-se constantemente uma cisão entre as dimensões restritas do consumo sobre a base capitalista e uma produção que tende constantemente a superar essa barreira que lhe é imanente. Além disso, o capital se compõe de mercadorias, razão pela qual a superprodução de capital implica a superprodução de mercadorias. Daí o curioso fenômeno de os mesmos economistas que negam a superprodução de mercadorias admitirem a de capital. Quando se diz que nos diversos ramos da produção não ocorre uma superprodução geral, mas uma desproporção, isso significa apenas que, no interior da produção capitalista, a proporcionalidade entre os diversos ramos da produção se estabelece como um processo constante a partir da desproporcionalidade, na medida em que aqui a relação da produção total se impõe aos agentes da produção como uma lei cega, e não como uma lei compreendida e, portanto, dominada por sua inteligência associada, que submeta o processo de produção a seu controle coletivo. Além disso, exige-se que países onde o modo de produção capitalista não está desenvolvido consumam e produzam numa medida adequada aos países do modo de produção capitalista. Quando se diz que a superprodução é relativa, isso é totalmente correto; mas o modo de produção capitalista inteiro é apenas um modo de produção relativo, cujos limites não são absolutos, mas que o são para ele, sobre sua base. De outro modo, como poderia faltar a demanda das mesmas mercadorias das quais carece a massa do povo e como seria possível buscar essa demanda no exterior, em mercados mais distantes, para poder pagar aos trabalhadores do próprio país a média dos meios de subsistência? Porque é somente nesse contexto específico, capitalista, que o produto excedente assume uma forma em que seu possuidor só pode colocá-lo à disposição do consumo enquanto esse produto se reconverter para ele em capital. Por fim, ao se afirmar que os capitalistas têm apenas de intercambiar entre si suas mercadorias e consumi-las, esquece-se de todo o caráter da produção capitalista e também de que se trata da valorização do capital, não de seu consumo. Em suma, todas as objeções contra os fenômenos palpáveis da superprodução (fenômenos que não se preocupam com tais objeções) tendem a indicar que os limites da produção capitalista não são limites da produção em geral e que, por isso, tampouco são limites desse modo específico de produção, o capitalista. Mas a contradição desse modo de produção capitalista consiste precisamente em sua tendência ao desenvolvimento absoluto das forças produtivas, em permanente conflito com as condições específicas de produção em que o capital se move e tem necessariamente de se mover.
Não se produzem demasiados meios de subsistência em proporção à população existente. Pelo contrário. Produzem-se muito poucos para satisfazer a massa da população de maneira digna e humana.
Não se produzem demasiados meios de produção para ocupar a parte da população capaz de trabalhar. Pelo contrário. Em primeiro lugar, produz-se uma parte excessivamente grande da população que, na realidade, não se encontra em condições de trabalhar e que, pelas circunstâncias, depende da exploração do trabalho alheio ou de atividades que só se podem considerar como trabalho dentro de um modo miserável de produção. Em segundo lugar, não se produzem meios de produção suficientes para que toda a população em condições de trabalhar possa fazê-lo sob as condições mais produtivas, isto é, para que seu tempo absoluto de trabalho seja abreviado pela massa e pela eficácia do capital constante que se emprega durante esse tempo de trabalho.
O que ocorre é que se produzem periodicamente meios de trabalho e meios de subsistência numa quantidade excessiva para ser empregados como meios de exploração dos trabalhadores a uma taxa de lucro determinada. Produzem-se demasiadas mercadorias para realizar o valor e o mais-valor nelas contidos sob as condições de distribuição e consumo dadas pela produção capitalista e reconvertê-los em novo capital, isto é, para efetuar esse processo sem explosões sempre recorrentes.
Não é que se produza demasiada riqueza. O que ocorre é que se produz periodicamente demasiada riqueza sob suas formas capitalistas antagônicas.
O limite do modo de produção capitalista se manifesta:
Se a taxa de lucro diminui, vemos que, de um lado, o capital é tensionado para que o capitalista individual possa comprimir o valor individual de suas distintas mercadorias abaixo de seu valor social médio mediante a utilização de melhores métodos etc. e, desse modo, com um preço de mercado dado, obter um lucro extra; de outro lado, há um movimento de especulação e um estímulo geral à especulação, mediante apaixonados ensaios de novos métodos de produção, novos investimentos de capital e novas aventuras para garantir um lucro extra que seja independente da média geral e se eleva acima dessa média.
A taxa de lucro, isto é, o incremento proporcional de capital, é especialmente importante para todas as novas ramificações do capital que se agrupam de maneira autônoma. Tão logo a formação de capital caísse exclusivamente nas mãos de uns poucos grandes capitais já estruturados, para os quais a massa do lucro compensa a taxa deste último, o fogo que anima a produção se extinguiria por completo. A produção adormeceria. A taxa de lucro é a força motriz na produção capitalista, na qual só se produz aquilo que se pode produzir com lucro e na medida em que se possa produzi-lo com lucro. Daí o medo dos economistas ingleses diante da diminuição da taxa de lucro. O fato de que a mera possibilidade de tal diminuição inquiete Ricardo demonstra precisamente sua profunda compreensão das condições da produção capitalista. Aquilo que nele se reprova, a saber, o fato de que, ao tratar da produção capitalista, ele não se preocupa com os “seres humanos” e leva em conta apenas o desenvolvimento das forças produtivas – não se importando com o custo desse desenvolvimento em termos de sacrifícios de seres humanos e de valores de capital –, é justamente o que esse autor tem de importante. O desenvolvimento das forças produtivas do trabalho social é a missão histórica e a justificação do capital. É precisamente com esse desenvolvimento que o capital cria inconscientemente as condições materiais para uma forma superior de produção. O que inquieta Ricardo é que a taxa de lucro, estímulo da produção capitalista, condição e força motriz da acumulação, seja posta em perigo pelo próprio desenvolvimento da produção. Aqui, a proporção quantitativa é o essencial. Na realidade, isso se baseia em algo mais profundo, que Ricardo mal vislumbra. Aqui se mostra de maneira puramente econômica, isto é, do ponto de vista burguês, dentro dos limites do entendimento capitalista, do ponto de vista da própria produção capitalista, sua limitação, sua relatividade, o fato de não ser um modo de produção absoluto, mas apenas um modo de produção histórico, correspondente a certa época de desenvolvimento limitado das condições materiais de produção.
Como o desenvolvimento da força produtiva do trabalho se dá de maneira muito desigual em diversos ramos da indústria, não só apresentando diferenças quanto ao grau em que se produz, mas também transcorrendo em sentido oposto, o resultado é que a massa do lucro médio (= mais-valor) tem de estar muito abaixo do nível que se deveria supor quando se considera o desenvolvimento da força produtiva nos ramos mais avançados da indústria. O fato de que o desenvolvimento da força produtiva nos diversos ramos da indústria transcorre não só em proporções bastante distintas, mas frequentemente em sentido oposto, deriva não só da anarquia da concorrência e da peculiaridade do modo burguês de produção. A produtividade do trabalho também está ligada a condições naturais que frequentemente se tornam menos rentáveis na mesma proporção em que aumenta a produtividade – na medida em que esta última depende de condições sociais. Daí que se produz um movimento antagônico nessas diferentes esferas: progresso num caso, retrocesso noutro. Basta pensar, por exemplo, na simples influência das estações, de que depende a quantidade da maior parte das matérias-primas, o esgotamento dos bosques, das jazidas de carvão, das minas de ferro etc.
Embora a parte circulante do capital constante, da matéria-prima etc. aumente sempre, quanto a sua massa, na proporção da força produtiva do trabalho, isso não ocorre com o capital fixo, edifícios, maquinaria, instalações de iluminação, calefação etc. Com o aumento de seu volume, a máquina encarece em termos absolutos, porém barateia em termos relativos. Se cinco trabalhadores produzem uma quantidade de mercadorias dez vezes maior que antes, nem por isso se decuplica o desembolso de capital fixo; embora o valor dessa parte do capital constante aumente com o desenvolvimento da força produtiva, está longe de fazê-lo na mesma proporção. Já destacamos diversas vezes a diferença que separa a proporção entre capital constante e capital variável, tal como ela se expressa na queda da taxa de lucro, e a mesma proporção, tal como, ao desenvolver-se a produtividade do trabalho, ela se apresenta em relação a cada mercadoria individual e seu preço.
{O valor da mercadoria está determinado pelo tempo total de trabalho, pretérito e vivo, que é nela incorporado. O incremento da produtividade do trabalho consiste precisamente em diminuir a parte do trabalho vivo e aumentar a do trabalho pretérito, mas de tal modo que diminua a soma total do trabalho contido na mercadoria, isto é, de modo que o trabalho vivo diminua mais do que aumenta o trabalho pretérito. O trabalho pretérito contido no valor de uma mercadoria – a parcela do capital constante – consiste, em parte, no desgaste do capital constante fixo e, em parte, no capital constante circulante, incorporado por completo na mercadoria sob a forma de matérias-primas e materiais auxiliares. A parcela de valor proveniente das matérias-primas e dos materiais auxiliares tem de sofrer uma redução com [o aumento d]a produtividade do trabalho, uma vez que, no que diz respeito a esses materiais, essa produtividade revela-se precisamente no decréscimo do valor destes últimos. Em contrapartida, o que caracteriza o aumento da força produtiva do trabalho é justamente o fato de que a parte fixa do capital constante experimenta um forte aumento – o mesmo ocorre com a parcela de valor desse capital constante que se transfere às mercadorias por meio do desgaste. Ora, para que um novo método de produção possa significar um aumento real da produtividade, a parcela adicional de valor que ele transfere à mercadoria individual por meio do desgaste de capital fixo tem de ser menor que a parcela de valor que se economiza em consequência da diminuição de trabalho vivo; em outras palavras, ele tem de reduzir o valor da mercadoria. E tem de fazê-lo, evidentemente, ainda que – como ocorre em alguns casos – entre na formação de valor da mercadoria, além da parte adicional de desgaste do capital fixo, uma parcela adicional de valor relativa ao aumento ou encarecimento das matérias-primas ou dos materiais auxiliares. Todos esses acréscimos de valor precisam ser mais do que compensados pelo decréscimo de valor resultante da redução do trabalho vivo.
Desse modo, a redução da quantidade total de trabalho que entra na mercadoria parece ser a marca essencial do aumento da força produtiva do trabalho, sejam quais forem as condições sociais sob as quais essa redução se produz. Numa sociedade em que os produtores regulassem sua produção segundo um plano traçado de antemão, nele incluída até mesmo a produção simples de mercadorias, a produtividade do trabalho também seria medida incondicionalmente segundo esse padrão. Mas o que ocorre na produção capitalista?
Suponhamos que determinado ramo da produção capitalista produza uma peça normal de mercadoria sob as seguintes condições: o desgaste de capital fixo representa ½ xelim ou marco por peça; as matérias-primas e os materiais auxiliares, 17½ xelins; os salários, 2 xelins; e consideremos ainda que, com uma taxa de mais-valor de 100%, o mais-valor chegue a 2 xelins; o valor total será = 22 xelins ou marcos. Para simplificar, suponhamos que nesse ramo da produção o capital possua a composição média do capital social, isto é, que o preço de produção da mercadoria coincida com seu valor, e que o lucro do capitalista coincida com o mais-valor realizado. Desse modo, o preço de custo da mercadoria será = ½ + 17½ + 2 = 20 xelins, a taxa média de lucro será 2/20 = 10%, e o preço de produção de uma peça de mercadoria será igual a seu valor = 22 xelins ou marcos.
Suponhamos que se invente uma máquina que reduza à metade o trabalho vivo requerido para cada peça, mas que triplique a parcela de valor constituída pelo desgaste do capital fixo. A questão se apresenta, então, da seguinte maneira: desgaste = 1½ xelim; matérias-primas e materiais auxiliares, como antes, = 17½ xelins; salário = 1 xelim; mais-valor = 1 xelim; total = 21 xelins ou marcos. O valor da mercadoria foi, então, reduzido em 1 xelim; a nova máquina aumentou decisivamente a força produtiva do trabalho. Para o capitalista, no entanto, as coisas se apresentam assim: seu preço de custo é agora de 1½ xelim de desgaste, 17½ xelins de matérias-primas e materiais auxiliares e 1 xelim de salário, o que totaliza 20 xelins, como antes. Como a taxa de lucro não se modifica simplesmente por meio da nova máquina, ela terá de receber 10% acima do preço de custo, o que significa 2 xelins; o preço de produção ficou, portanto, inalterado = 22 xelins, porém 1 xelim acima do valor. Para uma sociedade que produz sob condições capitalistas, a mercadoria não barateou, isto é, a máquina nova não representou melhoria nenhuma. Por isso, o capitalista não tem interesse em introduzir a nova máquina. Como, ao introduzi-la, ele tornaria sem valor sua maquinaria atual ainda não desgastada, a converteria em sucata e, com isso, experimentaria uma perda positiva, ele evitará cometer essa estupidez, que para ele é utópica.
Para o capital, portanto, a lei do aumento da força produtiva do trabalho não vale incondicionalmente. Para ele, essa força produtiva aumenta não quando se economiza trabalho vivo em geral, mas somente quando a parte de trabalho pago que se economiza é maior que a parte de trabalho pretérito que se acrescenta, como indicamos brevemente no Livro I, capítulo 13, item 2, p. 409/398 [466]. O modo de produção capitalista cai aqui numa nova contradição. Sua missão histórica é o desenvolvimento implacável, em progressão geométrica, da produtividade do trabalho humano. Mas ele trai essa missão histórica quando, como ocorre nesse caso, opõe-se ao desenvolvimento da produtividade, freando-a. Com isso, ele só demonstra que esse modo de produção está decrépito e cada vez mais próximo de desaparecer.}[37]
* * *
Na concorrência, o mínimo crescente do capital que, com o aumento da força produtiva, se torna necessário para o funcionamento exitoso de uma empresa industrial autônoma apresenta-se da seguinte forma: assim que o equipamento novo e mais oneroso é introduzido na empresa de maneira generalizada, os pequenos capitais são futuramente excluídos da atividade. Os pequenos capitais só podem atuar de modo independente nos começos dos inventos mecânicos nas distintas esferas de produção. Por outro lado, as empresas muito grandes, com uma proporção extraordinariamente elevada de capital constante – como é o caso, por exemplo, das ferrovias –, não fornecem a taxa média de lucro, mas apenas parte dela, os juros. De outro modo, a taxa geral de lucro diminuiria ainda mais. Em contrapartida, uma grande concentração de capital encontra aqui, sob a forma de ações, um campo direto de ocupação.
O crescimento do capital, isto é, sua acumulação, só implica uma diminuição da taxa de lucro na medida em que com esse crescimento se verificam as modificações citadas na proporção entre os componentes orgânicos do capital. Apesar das constantes transformações diárias do modo de produção, ora essa parte do capital total, ora aquela, maior ou menor, continua a acumular-se durante certos períodos e sobre a base de determinada relação média de tais componentes, de modo que com seu crescimento não está dada uma variação orgânica, tampouco as causas da queda da taxa de lucro. Essa constante ampliação do capital, isto é, também a expansão da produção sobre a base do antigo método de produção, que prossegue tranquilamente, ao mesmo tempo que já são introduzidos os novos métodos, é, por sua vez, uma das causas pelas quais a taxa de lucro não decresce na mesma medida em que cresce o capital total da sociedade.
O aumento do número absoluto de trabalhadores, apesar da diminuição relativa do capital variável desembolsado em salários, não ocorre em todos os ramos da produção nem de maneira uniforme em todos eles. Na agricultura, a diminuição do elemento do trabalho vivo pode ser absoluta.
Além disso, o fato de que, não obstante sua diminuição relativa, o número de assalariados aumente de forma absoluta constitui apenas uma necessidade do modo de produção capitalista. Para esse modo de produção, as forças de trabalho se tornam supérfluas tão logo não seja mais necessário ocupá-las de 12 a 15 horas diárias. Um desenvolvimento das forças produtivas que reduzisse o número absoluto dos trabalhadores, isto é, que, de fato, capacitasse a nação inteira a efetuar sua produção total num intervalo de tempo menor, provocaria uma revolução, pois deixaria fora de atividade a maior parte da população. Nisso se manifesta, uma vez mais, a limitação específica da produção capitalista e o fato de que ela não é de modo nenhum uma forma absoluta para o desenvolvimento das forças produtivas e a geração de riqueza, mas uma forma que, ao contrário, tão logo atinge certo ponto, entra em colisão com esse desenvolvimento. Essa colisão se manifesta parcialmente em crises periódicas, que decorrem do fato de tornar-se supérflua, ora esta parte da população trabalhadora, ora aquela, em seu antigo modo de ocupação. A limitação da produção capitalista é o tempo excedente dos trabalhadores. O tempo excedente absoluto que a sociedade ganha não lhe importa de modo nenhum. O desenvolvimento da força produtiva só é importante para ela na medida em que aumenta o tempo de mais-trabalho da classe trabalhadora, e não na medida em que reduz em geral o tempo de trabalho para a produção material; a produção capitalista se move, assim, no interior de uma antítese.
Vimos que a crescente acumulação do capital implica uma crescente concentração deste último. Assim cresce o poder do capital, a autonomização das condições sociais da produção, personificadas no capitalista em face dos produtores reais. O capital se mostra cada vez mais como um poder social, cujo funcionário é o capitalista, e que já não guarda nenhuma relação com o que o trabalho de um indivíduo isolado possa criar – mas se apresenta como um poder social estranhado, autonomizado, que se opõe à sociedade como uma coisa, e como poder do capitalista através dessa coisa. A contradição entre o poder social geral em que se converte o capital e o poder privado dos capitalistas individuais sobre essas condições sociais de produção desenvolve-se de maneira cada vez mais gritante e implica a dissolução dessa relação, na medida em que implica ao mesmo tempo a transformação das condições de produção em gerais, coletivas, sociais. Essa transformação está dada pelo desenvolvimento das forças produtivas sob a produção capitalista e pela maneira como se opera esse desenvolvimento.
* * *
Nenhum capitalista emprega voluntariamente um novo método de produção, por mais produtivo que possa ser ou por mais que possa aumentar a taxa de mais-valor, quando esse novo método faz diminuir a taxa de lucro. Mas qualquer um desses novos métodos de produção barateia as mercadorias. Por isso, o capitalista as vende originalmente acima de seu preço de produção e, talvez, acima de seu valor. Ele embolsa a diferença existente entre os custos de produção e o preço de mercado das mercadorias restantes, produzidas com custos mais elevados. Ele pode fazer isso porque a média do tempo de trabalho socialmente requerido para a produção dessas mercadorias é maior que o tempo de trabalho requerido com o novo método de produção. Seu procedimento de produção se encontra acima da média do procedimento social, mas a concorrência o generaliza e o submete à lei geral. Tem-se, então, a queda da taxa de lucro – começando talvez por essa mesma esfera da produção e logo nivelando-se com as outras –, que é, portanto, total e absolutamente independente da vontade do capitalista.
Sobre esse ponto, cabe ainda observar que essa mesma lei também vigora naquelas esferas da produção cujo produto não entra direta nem indiretamente no consumo do trabalhador ou nas condições de produção de seus meios de subsistência; isto é, também naquelas esferas de produção em que nenhum barateamento das mercadorias pode aumentar o mais-valor relativo, baratear a força de trabalho. (No entanto, em todos esses ramos o barateamento do capital constante pode elevar a taxa de lucro, mantendo-se inalterada a exploração do trabalhador.) Assim que o novo método de produção começa a difundir-se – e, com isso, fica efetivamente fornecida a prova de que essas mercadorias podem ser produzidas mais baratas –, os capitalistas que trabalham sob as antigas condições de produção têm de vender seu produto abaixo do preço de produção pleno, pois o valor dessa mercadoria diminuiu e o tempo de trabalho requerido para a produção se encontra acima do tempo de trabalho social. Em outras palavras, e isso se apresenta como efeito da concorrência, precisam também introduzir o novo método de produção, que diminuiu a proporção entre o capital variável e o capital constante.
Todas as circunstâncias que fazem com que o emprego da maquinaria barateie o preço das mercadorias com ela produzidas limitam-se sempre a reduzir a quantidade de trabalho absorvido por uma mercadoria individual; num segundo momento, porém, limitam-se a reduzir a parte de desgaste da maquinaria, cujo valor entra na mercadoria individual. Quanto mais demorado é o desgaste da maquinaria, maior é o número de mercadorias entre as quais se distribui esse desgaste e maior é a quantidade de trabalho vivo que ela repõe até o fim de sua reprodução. Em ambos os casos, aumentam a quantidade e o valor do capital constante fixo em relação ao variável.
“All other things being equal, the power of a nation to save from its profits varies with the rate of profits, is great when they are high, less, when low; but as the rate of profit declines, all other things do not remain equal [...]. A low rate of profit is ordinarily accompanied by a rapid rate of accumulation, relatively to the numbers of the people, as in England […] a high rate of profit by a slower rate of accumulation, relatively to the numbers of the people.”[b] Exemplos: Polônia, Rússia, Índia etc. (Richard Jones, An Introductory Lecture on Pol.[itical] Econ.[omy], Londres, 1833, p. 50 e seg.)
Jones acentua, com razão, que, apesar da queda da taxa de lucro, aumentam as inducements and faculties to accumulate [ocasiões e capacidades de acumulação]. Em primeiro lugar, devido ao crescimento da superpopulação relativa. Em segundo lugar, porque com o aumento da produtividade do trabalho aumenta a massa dos valores de uso representados pelo mesmo valor de troca, isto é, dos elementos materiais do capital. Em terceiro lugar, porque os ramos da produção se multiplicam. Em quarto lugar, pelo desenvolvimento do sistema de crédito, das sociedades por ações etc. e pela conseguinte facilidade para converter o dinheiro em capital sem que seja preciso se tornar capitalista industrial. Em quinto lugar, pelo crescimento das necessidades e da ambição de enriquecer-se. Em sexto lugar, porque aumenta o investimento de grandes massas de capital fixo etc.
* * *
Três fatos fundamentais da produção capitalista:
Tanto no primeiro como no segundo aspecto, o modo de produção capitalista suprime a propriedade privada e o trabalho privado, ainda que o faça sob formas antagônicas.
A enorme força produtiva, em relação à população, que se desenvolve no interior do modo de produção capitalista e, ainda que não na mesma proporção, o crescimento dos valores de capital (não só de seu substrato material) num ritmo muito mais acelerado que o crescimento da população, contradizem a base cada vez mais reduzida – em relação à riqueza crescente – para a qual opera essa enorme força produtiva e as condições de valorização desse capital em expansão. Daí resultam as crises.
[a] Isto é, a Igreja anglicana. (N. T.)
[37] A passagem encontra-se entre chaves porque, embora redigida a partir de uma anotação do manuscrito original, transcende em alguns trechos o material que nos foi legado. (F. E.)
[b] “Mantendo-se inalteradas todas as demais circunstâncias, a capacidade de uma nação economizar parte de seus lucros varia com a taxa de lucro, sendo maior quando os lucros são elevados e menor quando são baixos; quando cai a taxa de lucro, nem tudo permanece igual [...]. Uma baixa taxa de lucro costuma vir acompanhada de uma rápida taxa de acumulação, em relação ao número de habitantes, como na Inglaterra [...], e uma alta taxa de lucro, por uma taxa de acumulação mais lenta em relação ao número de habitantes.” (N. T.)