Nota da Autora
NA PRIMAVERA DE 2018, a jornalista Catarina Carvalho — que assumira recentemente a direcção executiva do Diário de Notícias — mandou-me uma mensagem dizendo que gostaria de tomar um café comigo. Como me esqueço com frequência de que também sou escritora, presumi imediatamente que ela tivesse escrito um livro e procurasse editor. Contudo, esse café foi por ela adiado tantas vezes que acabei por desconfiar de que a razão para o encontro devia ser outra. E, quando enfim conseguimos sentar-nos uns minutos numa esplanada de Lisboa, o convite que me dirigiu para escrever uma crónica semanal no jornal — o mesmo que já antes de eu nascer se lia diariamente em minha casa — fez com que me sentisse honrada mas nervosa.
Para dizer a verdade, até então eu nunca escrevera nada com prazos impossíveis de falhar e caracteres contados, mas confiei em que a rotina do meu blogue e os espartilhos das letras de fado me ajudassem a cumprir essa parte. Era preciso, ainda assim, descobrir um leitmotiv — até porque, regra geral, os poetas só falam de si mesmos, e a crónica da minha vida não interessaria assim a tanta gente. Por sorte, tinha uma semana inteira de férias no horizonte e acreditava que, sem stress, alguma ideia acabaria por surgir. E foi num romance de estreia de um jovem autor — Gente Séria, de Hugo Mezena — que colhi a bendita inspiração, o que é paradoxal numa crónica cujo título anuncia o descrédito no futuro.
Diverti-me (e entristeci-me) muito a cronicar ao longo de ano e meio (a maior parte do tempo na maravilhosa companhia de Ruy Castro e António Araújo nas páginas de sábado do DN), assumindo, como diz Ferreira Fernandes no prefácio a este volume, o papel de «revolucionária conservadora» enquanto partilhava memórias do passado e factos do presente que me faziam (e fazem) temer pelo futuro — como aquela história do automobilista que liga para as televisões quando assiste a um acidente grave na auto-estrada, mas não chama o INEM.
Em Março de 2020, o aparecimento do Coronavírus afectou seriamente a situação financeira do Diário de Notícias, e Catarina Carvalho pediu-me que interrompesse a crónica por uns meses até as coisas estabilizarem. No entanto, quando pouco depois desse pedido a direcção que me convidara se demitiu, eu soube que chegara a hora de dizer adeus ao futuro… das crónicas. Agradeço, por isso, aos meus editores — Francisco José Viegas e Lúcia Pinho e Melo — o entusiasmo com que receberam a minha proposta de as reunir em livro.
Devo um agradecimento especial a Catarina Carvalho pelo convite; ao mestre-cronista Ferreira Fernandes pelo prefácio e por gostar das minhas crónicas; ao Hugo Mezena, por ter evocado tantas belas recordações da minha infância com o seu romance; e, claro, ao Manel, que, antes de existir a maldita COVID-19, ficou confinado muitíssimos fins-de-semana seguidos comigo, porque eu tinha sempre o raio de uma crónica para escrever.
MARIA DO ROSÁRIO PEDREIRA
Lisboa, 27 de Dezembro de 2020