É VERÃO DE 1943 E INAUGURA-SE O CAMPO DE CONCENTRAÇÃO DE KLOOGA, NO NORTE DA ESTÓNIA.

Este local, situado junto da pequena aldeia da qual adota o nome, é um subcampo, ou instalação satélite, do campo de Vaivara, núcleo principal do sistema concentracionário gerido pelas SS na Estónia. Vaivara, o maior município do condado de Ida-Virumaa, dista apenas 27 quilómetros de Narva, cidade fronteiriça com a União Soviética, onde o exército alemão do Leste, bastante diminuído, resiste com desespero crescente ao avanço das tropas de Estaline.

Durante o ano em que permanece em funcionamento, a população do campo de Klooga oscila entre as duas mil e as três mil pessoas. A maior parte dos prisioneiros são cidadãos judeus provenientes do gueto de Vilnius, capital da vizinha Lituânia, transportados para lá em comboios de mercadorias ao longo dos meses de agosto e de setembro de 1943. Mais tarde, juntam-se em Klooga outros dois contingentes consideráveis, embora menos numerosos, de judeus retirados, respetivamente, dos guetos de Kaunas, cidade da Lituânia central, e de Salaspils, na Letónia. O campo alberga também judeus e ciganos de outras procedências, originários da Roménia, da Rússia e da própria Estónia, assim como uma centena de prisioneiros de guerra soviéticos.

O Reichskommissariat Ostland, divisão administrativa civil alemã que governa os países bálticos e o Oeste da Bielorrússia, implanta cerca de vinte campos de trabalho na Estónia para explorar as matérias-primas do país. Alguns só funcionam durante uns meses, os necessários para que os ocupantes esgotem as riquezas naturais da zona onde se encontram. Outros, como o de Klooga, são permanentes, mas todos funcionam sob a autoridade do mesmo homem, o Hauptsturmführer das SS Hans Aumeier, comandante-chefe do sistema concentracionário estónio que chega no verão de 1943 para supervisionar a construção do campo de Vaiara e os inúmeros satélites, continuando no cargo até as tropas do Terceiro Reich se retirarem das margens do mar Báltico. Antes desta nomeação, Aumeier serve durante um ano e meio em Auschwitz-Birkenau, onde se estreia como chefe do Departamento III, atingindo posteriormente o cargo de Schutzhaftlagerführer, chefe do Corpo de Prisioneiros de Auschwitz I, no qual a sua eficiência criminosa faz dele uma figura lendária.

Os presos de Klooga trabalham nas fortificações destinadas a travar o avanço soviético e em fábricas criadas para apoiar o esforço de guerra alemão. As principais indústrias do campo são as serrações, onde se processa a madeira dos bosques circundantes, bem como várias unidades de produção de materiais de construção, sobretudo tijolos e cimento. Também funciona durante algum tempo uma pequena fábrica artesanal de tamancos de madeira.

As condições de vida dos reclusos assemelham-se, na sua brutalidade, às de outros campos de trabalho nazis. Têm de cumprir jornas extenuantes, recebem rações de comida exíguas e, quando adoecem, são obrigados a trabalhar as mesmas horas e nas mesmas condições que os companheiros saudáveis. Estas normas aumentam a mortalidade para números elevadíssimos. A curta esperança de vida dos prisioneiros e a frequência com que são designados para destacamentos nos bosques, onde dormem ao ar livre, fora do campo, impedem que uma pequena organização clandestina que chega a contar com umas 75 pessoas prospere e consiga liderar uma rebelião.

No mês de julho de 1944, o exército soviético começa a avançar através da Estónia ocupada. Em agosto, as SS preparam-se para evacuar o campo. Não é uma operação fácil porque as tropas alemãs retrocedem incessantemente, a frente desloca-se quase todos os dias, sendo que as possibilidades de transporte se reduzem na mesma proporção, mas uns quinhentos presos de Klooga são transferidos por mar para oeste e acabam noutros campos de concentração. Parte deles vão parar a Stutthof, perto de Danzig, e os restantes, a um campo situado numa cidade então alemã conhecida como Freiburg in Schlesien, atualmente a polaca Świebodzice.

A evacuação suspende-se em meados de setembro, com os soviéticos já muito perto de Narva. Nesse momento, Aumeier decide exterminar os prisioneiros, em vez de os libertar ou abandonar à sua sorte, como se faz noutros sítios. Na madrugada de 19 de setembro, todo o perímetro do campo de Klooga é rodeado por guardas armados. De seguida, os reclusos são levados em grupos para os bosques próximos e assassinados indiscriminadamente. A matança dura quatro dias. Nos primeiros, as tropas das SS obrigam os próprios presos a amontoar os cadáveres dos companheiros em piras que logo são incendiadas. No dia 23, têm tempo de fazer algumas, mas não de lhes deitar fogo. Mal acabam de matar os últimos, juntam-se a toda a pressa às forças alemãs que se retiram para oeste.

A 28 de setembro de 1944, o Exército Vermelho chega a Klooga e só lá encontra oitenta e cinco pessoas vivas, em vez das duas mil e quatrocentas com que contavam já que lhes tinha constado que era essa a população do campo após a última evacuação. Os sobreviventes, que haviam conseguido esconder-se nos barracões ou fugir durante a transferência, guiam as tropas soviéticas pelos cenários do massacre.

Num bosque, os recém-chegados encontram algumas piras preparadas para o fogo. Perfeitamente dispostas, as fileiras de cadáveres colocados de barriga para baixo alternam com troncos cortados à medida e distribuídos entre os corpos em camadas regulares, ora horizontais, ora verticais. As fotografias que os soldados russos tiram e que hoje podem encontrar-se facilmente na internet revelam a eficácia industrial a que as SS recorrem para produzir as montanhas de cinzas e de ossos carbonizados que enchem, como uma sementeira macabra, os bosques que circundam o campo de Klooga.

Após a retirada do Báltico, Hans Aumeier regressa à Alemanha. Em janeiro de 1945, é enviado como comandante para o campo de concentração de Mysen, na Noruega. A sua atuação nos últimos meses da guerra é completamente diferente da que o notabilizou na Polónia e na Estónia, a ponto de, a 7 de maio, dia da capitulação do Terceiro Reich, abrir as portas e libertar todos os prisioneiros.

A 11 de junho de 1945, prisioneiro no campo de Terningmoen, Aumeier é detido na sequência da passagem dos arquivos da Gestapo para os Serviços Secretos de Inteligência britânicos MI6. Extraditado para a Polónia em 1946, é julgado como criminoso de guerra, entre novembro e dezembro de 1947, pela sua atuação em Auschwitz. No julgamento, declara-se inocente, nega a existência de câmaras de gás no campo e afirma que se considera um bode expiatório da derrota da Alemanha. Condenado à morte a 22 de dezembro, é enforcado a 28 de janeiro de 1948 numa prisão de Cracóvia.

Os crimes que comete em Auschwitz impedem que Hans Aumeier seja julgado pela matança de Klooga.

No local do antigo campo, um monólito recorda que ali foram assassinadas, pelo simples facto de terem nascido, mais de duas mil pessoas inocentes.