CAPÍTULO 14
Jason deixou-se cair na cadeira do escritório, soltando um suspiro suficientemente sonoro para chamar a atenção da sua «babysitter». Já estava à espera há cinco minutos. Cinco minutos! Ia chegar atrasado à aula de karaté.
Roland ergueu os olhos dos seus documentos; os óculos deslizaram até à ponta do comprido nariz.
— Oh, Jason. Ainda aqui estás? Pensei que já tinhas ido para o ginásio.
— Sabes que não posso — respondeu Jason, destacando cada sílaba.
— Porquê?
Jason revirou os olhos.
— O doutor Blakely disse que não posso deixar nenhum dos edifícios sem o raio de uma babysitter. — Fez uma careta e imitou a voz nasalada de Blakely. — É para a minha própria proteção.
— Bem, isso é uma parvoíce. O ginásio fica logo aqui ao lado. Sê um bom rapazinho e põe-te a andar para lá. Ainda tenho uma pilha enorme de relatórios para registar e arquivar.
O rosto de Jason iluminou-se. Boa! Empurrou a cadeira para trás com um arrastar sonoro e saiu disparado. Correu pelo corredor e saiu porta fora, o saco de desporto a bater contra a perna. Acelerou pelos nove metros que o separavam do edifício vizinho. Provavelmente o tenente Brusserman já estava à espera. Uma vez passada a porta, Jason foi assaltado pelos cheiros familiares de um ginásio. Camisolas de algodão suadas, o verniz do campo de basquetebol e o cheiro penetrante do desinfetante.
Procurou o tenente Brusserman na área da ginástica aeróbica, mas não viu sinal dele. Jason atravessou o ginásio, dirigindo-se ao balneário. Parou para assistir a um jogo de um contra um que estava a ser disputado no campo de basquetebol. Jason reconheceu o major Chan, com quem saíra para pescar no dia anterior.
Fazendo o sinal de pausa, o major Chan aproximou-se do local onde Jason se encontrava. Estava sem fôlego e falava de modo entrecortado.
— Olá, miúdo. Ouve, o tenente ligou. Não vai conseguir vir hoje, mas pede desculpa. Ficam combinados para amanhã. — O major fingiu um murro brincalhão e depois regressou ao jogo.
O coração de Jason afundou-se no seu peito.
— Mas o que devo… — O major já estava de novo a jogar, a defender um ataque ao cesto.
Maldição! Então e agora? Não queria voltar para o gabinete de Roland. Ficaria preso a folhear aquelas aborrecidas revistas sobre a vida na Marinha.
Abriu uma frincha da porta e esgueirou-se para o exterior. Um grupo de investigadores vestidos de branco passou calmamente por ele, dirigindo-se aos dormitórios, trocando piadas e rindo.
Jason sentou-se nos degraus e procurou no saco de desporto algo para fazer. O gameboy da Nintendo? Torceu o nariz. Não, aborrecido. A sua mão fechou-se à volta de uma revista de banda desenhada do Homem-Aranha, mas já a tinha lido.
Suspirando, agitou o conteúdo do saco. Ouviu o tilintar de algumas moedas e um pacote de pastilhas elásticas caiu dele. Franzindo o sobrolho, pegou no pacote de Juicy Fruit e enfiou-o no compartimento lateral do saco. Enquanto o fazia, a mão tocou num objeto duro e redondo.
Retirou-o da mala. Oh, boa! Deslizou o dedo pela velha bombinha vermelha. Uma cereja explosiva. Sorriu, lembrando-se de a ter trocado com Billy Sanderson por uma revista de banda desenhada dos X-Men. Já quase se tinha esquecido dela. Olhando à sua volta com um brilho matreiro nos olhos, considerou a hipótese de se afastar e de a experimentar.
Precisamente nessa altura um cientista de casaco branco dobrou uma esquina próxima e avançou na sua direção. Guardou rapidamente a bombinha no seu esconderijo. Talvez devesse esperar até regressar aos Estados Unidos. Se a mãe descobrisse aquele seu pequeno tesouro… não, era melhor ir com calma.
Fechou o saco, ainda sem saber o que fazer com o seu tempo livre.
Levantando-se, afastou-se dos degraus, passando o saco de desporto para a outra mão. Nesse preciso momento, contornando a esquina do barracão, um grupo de oficiais passou por Jason, um deles tinha o peito coberto de medalhas suficientes para engasgar um elefante.
O homem condecorado tirou o boné e limpou o sobrolho.
— Está sempre assim tão diabolicamente quente cá em baixo?
Um dos companheiros falou.
— Não é o calor, é a humidade.
— É o calor, tenente — disse o homem com autoridade.
— Sim, senhor, sim, almirante.
Jason, impressionado com o receio que aquele homem conseguia gerar, ficou enfeitiçado.
— Agora, onde está esse Blakely? — perguntou o almirante, voltando a colocar o boné.
— Por aqui, senhor. — O tenente virou desajeitadamente a esquina seguinte.
Uau! Devia estar a acontecer alguma coisa importante. Jason espreitou pela esquina. Os homens desapareceram num dos edifícios de betão.
Jason conhecia aquele edifício. Era o centro de comunicações. Já lá tinha estado três vezes quando lhe era permitido conversar dois minutos com a mãe, logo pela manhã. Normalmente a conversa consistia na mãe a perguntar-lhe se estava a obedecer às «babysitters». Ainda assim, suspirou, fora bom ouvir a voz da mãe sobre a estática.
Coçando atrás de uma orelha, Jason perguntou-se o que quereria o tipo com o doutor Blakely. Cerrou os lábios. Talvez pudesse descobrir. Sabia que a mãe odiava quando se punha a ouvir as conversas dos outros, mas não conseguia resistir a um bom furo. Além disso, podia obter informações acerca da mãe.
Deslizou pela esquina e entrou sorrateiro pela porta. Não havia ninguém por perto. A secretária, Sandy, não estava na sua mesa. Que sorte! Deslizou para o interior. Quando levou a mão à porta do corredor principal, a maçaneta girou e a porta abriu-se.
Sandy estava à sua frente com uma cafeteira meio vazia na mão.
— Oh, Jason! — disse ela com um grande sorriso, afastando uma madeixa de cabelo louro para trás da orelha. — Não sabia que ias passar por aqui.
Jason mordeu o lábio e recuou um passo, pronto para sair a correr. Limpou a garganta.
— Eu… eu só queria dizer uma coisa ao doutor Blakely.
Ela pousou a cafeteira e tirou um novo filtro.
— Desculpa, querido, mas o doutor Blakely está ocupado. Porque não me dizes o que queres e depois transmito-lhe?
— Não!… Sabe — gaguejou de olhos muito abertos —, é algo pessoal… privado.
Ela cerrou os lábios, depois sorriu.
— Estou a ver. Bem, então porque não te sentas e esperamos até o doutor Blakely ficar livre?
Jason acenou com a cabeça. Aquilo não o estava a levar a lado nenhum. Talvez devesse ir-se embora e dizer que falaria mais tarde com Blakely. Essa seria a coisa mais inteligente a fazer. A sua boca teve outras ideias.
— Tenho de ir à casa de banho.
— Está bem, querido. É logo depois daquela porta, à esquerda.
Claro que ele já o sabia. Mais importante, também ficava ao lado da sala de comunicações. Avançou até à porta.
— Obrigado.
Sandy sorriu, erguendo os olhos do teclado, e piscou-lhe o olho.
Sustendo a respiração, Jason avançou para o corredor. Os ténis gemiam no chão de linóleo encerado. Não havia ninguém no corredor, mas conseguia ouvir o zumbido das vozes nos diversos gabinetes. Erguendo-se em bicos dos pés, avançou pelo corredor, tentando avançar tão silenciosamente quanto possível. Chegou à porta que dava acesso à principal sala de comunicações.
Estacando a meio de um passo, ficou à escuta. A voz de Blakely era clara e seca.
— Por que raio acha que queríamos esta rede de comunicações? Sabe muito bem, graças aos meus relatórios, que está lá em baixo algo perigoso que desconhecemos. Precisamos de…
A voz do almirante interrompeu-o.
— Seja como for, o relatório da sua equipa só está uma hora atrasado. Acho que declarar um alerta vermelho foi prematuro.
— Se pudesse, o Michaelson não se atrasaria um segundo que fosse com os seus relatórios.
— O major tem demasiados interesses nesta missão. É demasiado pessoal. Nunca deveria ter permitido que ele participasse.
— Já tivemos esta discussão antes. Está feito. Agora quero saber o que vai fazer em relação a isto.
— Nada.
Um grande estrondo.
— Ouça lá, tenho os sensores de movimento a enlouquecer. Ainda ontem perdemos mais um homem no Sector Quatro. E agora a minha equipa está atrasada no seu relatório. E vai fazer o quê? Ficar sentado à espera que desapareçam mais dos meus homens?
As palavras seguintes foram tão geladas que Jason estremeceu.
— Não. Washington enviou-me para fazer apenas uma coisa. De acordo com o meu bom senso, decidir se está apto a manter o comando. Tornou a minha decisão fácil. A partir deste momento, considere-se exonerado do cargo.
Silêncio, as palavras seguintes cuspidas com veemência:
— Vocês planearam isto desde o início, não foi? Nunca tiveram qualquer intenção de manter este projeto civil. Quando é que os chefes decidiram arrancar-me as instalações? Foi quando se perdeu a equipa anterior? Ou logo no início?
Seguiu-se um silêncio de morte.
Antes que Jason pudesse reagir, a porta escancarou-se. Blakely, de olhos arregalados, chocou contra o rapaz, atirando-o ao chão.
— Jason!
— Eu… eu… eu…
— Que estás a fazer aqui?
— Eu ia… quer dizer…
— Esquece. — Blakely curvou-se, ajudando Jason a levantar-se. — Anda.
Empurrado em direção à porta, Jason avançou aos tropeções.
— Que se passa? A minha mãe está bem?
O velho ignorou-o.
— Preciso de te levar para um lugar seguro. Nunca devia ter permitido que viesses cá para baixo.
O almirante saiu para o corredor.
— Se esse é o Jason Carter, deixe-o ficar. Agora é responsabilidade minha.
— Vá para o inferno! — gritou Blakely, empurrando Jason pela porta do corredor.
Meio empurrado, Jason tropeçou para a área da receção. Demasiado assustado para pensar, tentando apenas manter-se um passo à frente do médico furioso, chocou contra a porta.
Sandy, com a boca aberta de surpresa, ergueu-se, parando de escrever.
— Que se passa?
Sem responder, Jason passou pela porta, com o braço de Blakely em redor do ombro. Por aquela altura, as lágrimas começavam já a correr pelo rosto de Jason, que apertava o saco de desporto contra o peito.
No exterior, Blakely pareceu acalmar-se.
— Desculpa, Jason. Não queria assustar-te. Mas devias saber…
Uma sirene ecoou pela câmara. O som foi de tal forma penetrante que Jason estremeceu, cobrindo os ouvidos.
— Que foi? — gritou.
— Os sensores periféricos. A base está a ser atacada. Depressa. — Blakely puxou o braço de Jason.