CAPÍTULO 34

Ashley tinha a certeza de que o filho estava bem. Tinha de estar. Pousou a caneta. Passara todo o dia a trabalhar na câmara do umbo, a tentar manter as mãos ocupadas e a mente distraída. Catalogando, medindo, registando notas no seu caderno.

Olhou de relance para o relógio. Já era tarde. Ben devia estar de regresso. E se não tivesse sabido nada acerca de Jason? Ou, pior, se não regressasse? Quanto tempo mais poderia ela esperar antes que a tensão a levasse à loucura?

Suspirando, recostou-se e fitou o outro lado da câmara e a figura adormecida de Mo’amba, sentado de olhos fechados. Ele era o seu único guarda. Os restantes tinham sido mandados embora. A sua ordem fora obedecida sem perguntas.

Fitou o wormhole negro por onde Ben desaparecera. Podia tentar fugir. Se Mo’amba estivesse realmente a dormir, então talvez… abanou a cabeça. Era um longo caminho. Decerto a conseguiriam alcançar. Além disso, não podia abandonar Michaelson. Ainda que por um qualquer milagre Ashley conseguisse escapar, ele seria morto no seu lugar.

De súbito, os olhos de Mo’amba abriram-se, e ele fitou-a. Lutou por se erguer, mas as horas que passara sentado dificultavam-lhe os movimentos. Ashley avançou para o ajudar a levantar-se.

Mo’amba fitava a abertura da câmara que conduzia à aldeia.

— Que se passa? — perguntou.

O ancião tapou-lhe a boca para obter silêncio, depois fez-lhe sinal para que o seguisse. Usando o bordão como uma bengala, avançou com passos incertos até à entrada e puxou-a para uma alcova mergulhada nas sombras, do outro lado do túnel.

Que se estaria a passar? Contudo, não precisou de esperar muito. Em breve ouviu o suave raspar do cabedal na pedra, que se aproximava pelo túnel. Vinha lá alguém. Mas quem?

Semicerrou os olhos fitando o túnel fracamente iluminado, até Mo’amba a puxar de novo para as sombras. Esperou, sustendo a respiração. Pelo som crescente dos passos, aproximava-se mais do que uma pessoa.

Encostando-se ainda mais ao fundo da alcova escura, ouviu o grupo passar pelo esconderijo dela e penetrar na câmara umbo. Refreou um assobio ao reconhecer a figura esquelética de um deles. Era Sin’jari.

Os outros dois eram o oposto de Sin’jari. Este era alto e magro, mas eles tinham as costas curvadas e eram musculosos. Mas não havia qualquer dúvida de quem mandava. Um mero franzir de sobrolho de Sin’jari seria suficiente para fazer estremecer os outros. E havia muito franzir de sobrolho. Tendo em conta os gestos e as ordens ríspidas, era claro que Sin’jari dava ordens que só com relutância eram obedecidas.

Por fim, com um vociferar do chefe, os dois brutos de pescoço largo baixaram as cabeças e enfiaram-se no wormhole que conduzia à Caverna Alfa.

Que se estaria a passar? Ashley não conseguia compreender uma palavra do que estava a ser dito, mas Mo’amba, aparentemente, conseguia. Ashley sentia-o ficar tenso ao seu lado, estremecendo para controlar as emoções. A tensão dele era contagiante. Deu por si a cerrar os punhos. Sin’jari estava a preparar algo funesto, algo destinado a prejudicar o grupo dela.

De súbito, Mo’amba emergiu da alcova, sobressaltando-a. Correu atrás do ancião que avançava com passos precários para a câmara do umbo. Sin’jari virou-se de boca aberta, chocado e de olhos muito abertos.

Mo’amba avançou até ficar frente a frente com Sin’jari. Bateu com o bordão com tamanha força que lançou lascas da sua ponta. Sin’jari deu um passo atrás, claramente estupefacto com o aparecimento da sua némesis.

Ashley permaneceu afastada enquanto palavras acaloradas fluíam de Mo’amba. Agora era a vez de Sin’jari estremecer. Pareceu encolher-se quando as palavras de Mo’amba o atingiam. Mas se o olhar dos lacaios de Sin’jari revelavam medo, as pupilas de Sin’jari eram uma fenda ameaçadora. Do local onde se encontrava, Ashley conseguiu ver a mão dele deslizar em direção à faca que trazia no cinto.

Abriu a boca para avisar Mo’amba, mas as palavras ficaram presas na sua garganta. Como podia avisá-lo? Não sabia dizer uma só palavra na língua deles. Observou enquanto os dedos de Sin’jari se fechavam sobre a faca. Mo’amba era um líder proeminente, decerto, Sin’jari não se atreveria…

Sem aviso, Sin’jari atacou, mergulhando o comprido punhal de diamante no peito de Mo’amba. A faca interrompeu o monólogo furioso de Mo’amba com se cortasse as palavras do ar. Mo’amba baixou os olhos para o cabo que se projetava do seu peito, como se analisasse um inseto intrigante. Tossiu uma vez, gotas de sangue assomaram-lhe aos lábios.

Ashley, imobilizada pelo choque, gritou por fim, quando Sin’jari puxou o punhal, mergulhando-o uma segunda vez no peito de Mo’amba. O ancião cambaleou para trás, afastando-se da lâmina.

Sin’jari ergueu de novo o punhal, determinado a cortar a garganta a Mo’amba, mas Ashley saltou para cima dele. Bateu com o calcanhar da bota nas costelas do atacante, atirando-o para o lado. Enquanto ele cambaleava para recuperar o equilíbrio, Ashley colocou-se à frente de Mo’amba. O velho tinha, por aquela altura, caído ao chão. O sangue deslizava por entre os dedos que agarravam o peito.

Sin’jari virou-se para Ashley.

— Põe-te a andar daqui, sacana! — gritou ela.

Sin’jari esfregou a costela ferida com uma mão, enquanto a outra brincava com o punhal. O seu sorriso mostrava todos os seus dentes e era frio. Ele tinha a faca, ela não.

Ashley fitou o bordão que Mo’amba largara.

Sin’jari não lhe deu tempo para formular um plano. Mergulhou na direção dela. Mas anos de treino de karaté e quatro irmãos mais velhos tinham apurado os seus reflexos. Girou para o lado, agarrando o pulso de Sin’jari quando o seu golpe falhou o alvo. Girando sobre um pé, usou a anca e o impulso de Sin’jari para o lançar ao chão. O estalar do osso trouxe-lhe um sorriso aos lábios. A faca dele deslizou inútil pelo chão rochoso.

Em dois passos, ela tinha o punhal na mão. Agora vamos ver o que acha o sacana de ver a situação invertida. Sin’jari já se afastara, segurando o braço esquerdo. Recuou para longe dela, até ao outro lado da câmara, claramente desistindo da luta.

Enquanto mantinha um olhar desconfiado sobre Sin’jari, ela avançou para Mo’amba que jazia caído de costas, o peito a subir e a descer, com a respiração gorgolejante. Parecia estar a olhar cegamente para o teto. Em choque.

Precisava de ajuda imediata. Mas como?

Ashley saltou quando Sin’jari se levantou de súbito. Ela apontou a faca para ele, mas ele não se aproximou. Pelo contrário, deslizou em direção ao wormhole. Com um último esgar na direção dela, enfiou-se na conduta e desapareceu.

Precisamente quando ele desaparecia, ouviu o som de muitos pés que se aproximavam pelo túnel. Graças a Deus, a ajuda vinha a caminho.

Virou-se precisamente quando o primeiro guerreiros entrou na câmara, a lança apontada em frente. Um lamento penetrante elevou-se dele, quando viram a figura ensanguentada de Mo’amba estendida no chão. Quase como um só, os olhos furiosos e acusadores dos caçadores viraram-se para ela.

Ashley baixou os olhos para o punhal ensanguentado na mão. Maldição.

— Calma — disse Ben, agarrando as mãos agitadas de Nob’cobi. Estivera a tentar dar algum sentido aos gestos frenéticos e às palavras guturais, mas não conseguia avançar. Os seus esforços não tinham servido senão para os enfurecer a ambos.

Ben olhou de relance para Sandy. Esta recuara para o canto oposto do gabinete de Blakely, encolhida. Ali não encontraria ajuda.

Ben largou as mãos de Nob’cobi. Se ao menos Harry regressasse… ele conhecia a linguagem.

De súbito, Nob’cobi estendeu o braço e tocou na testa de Ben com um dedo, depois na sua. Ben fitou-o sem compreender. O pequeno caçador repetiu o gesto, a irritação a começar a franzir-lhe os olhos.

De repente, Ben compreendeu. Nob’cobi queria que ele comunicasse recorrendo às suas capacidades heri’huti. O caçador não podia iniciar pessoalmente o contacto, dado que não era da linhagem certa, mas Ben podia. Como fizera no wormhole.

Ben acenou, mostrando-lhe que compreendia e fez um gesto a Nob’cobi para que se sentasse no sofá. Nob’cobi fitou o sofá de pele com desconfiança e, em vez disso, sentou-se de pernas cruzadas no chão. Ben encolheu os ombros e fez o mesmo, fitando o caçador mimi’swee.

Fechando os olhos, Ben obrigou a respiração a abrandar, procurando acalmar a mente agitada. Imaginou-se a relaxar no alpendre da quinta de criação de ovelhas do pai, com uma cerveja morna e um dia de ócio pela frente.

De súbito, Sandy gritou:

— Que estão a fazer?

Franzindo o sobrolho, Ben ergueu a mão, mas manteve os olhos fechados.

— Está tudo bem, Sandy. Preciso que mantenhas o silêncio por um minuto.

— Mas…

— Chiu. Relaxa. — As palavras de Ben, sonhadoras, eram dirigidas tanto a ela quanto a si mesmo. Relaxa.

Conseguia ouvi-la resmungar baixinho, mas ignorou-a e bebeu a sua Foster tépida de uma garrafa poeirenta, ao mesmo tempo que inclinava a cadeira para trás, contra a esquina do alpendre. Pensou em Nob’cobi, imaginando o rosto de nariz achatado e o pescoço fino da pequena criatura. De súbito, o caçador apareceu ao lado de Ben, sentado noutra cadeira.

Nob’cobi olhava de queixo caído à sua volta. Levantou-se e apoiou-se no parapeito do alpendre, fitando de boca aberta o céu vasto, sem uma nuvem de ponta a ponta. Pareceu encolher-se um pouco, depois virou as costas à paisagem para olhar para Ben.

— É… é tão grande. — Estremeceu.

Ben sentiu alguma pena por ter atirado o pobre homem para aquela paisagem estranha, mas Mo’amba tinha-lhe feito o mesmo. Além disso, sentia falta do rancho.

— Não te preocupes, Nob’cobi. O importante não é o tamanho.

— O quê?

— Esquece. É uma piada de mau gosto. — Ben bebeu mais um gole da sua cerveja. Raios, se não sabia mesmo como a verdadeira? — Agora, o que me estavas a tentar dizer?

Nob’cobi engoliu em seco, nervoso, um olho a viajar para trás de si.

— Ouvi um ruído estranho na gruta. Diferente de tudo o que alguma vez ouvi.

— Como era esse som?

Nob’cobi fez uma careta e repetiu o som que ouvira. Parecia uma canção ou algo assim. E parecia familiar.

— Faz outra vez? — Ben concentrou-se enquanto ouvia, de olhos fechados. Onde é que tinha ouvido aquilo…? Os olhos de Ben abriram-se de repente e ele endireitou-se. Credo, era a maldita música do jogo da Nintendo de Jason! Ouvira aquela coisa irritante um milhão de vezes no caminho até ali.

— Onde é que ouviste isso? — perguntou Ben de rompante.

— Fui ver. Para tentar saber o que estava a emitir o som. Mas quase dei de caras com aquele crak’an que nos tem estado a seguir. O esperto. Também estava a seguir o som.

— Raios! — Ben afastou-se do sonho, dissipando-o em estilhaços de cor, até estar de novo cara a cara com Nob’cobi no gabinete de Blakely. Ergueu-se. Nob’cobi seguiu-o. — Sandy, fique aqui — disse Ben, enquanto enfiava mais um carregador na sua arma. — Tranque a porta. Se nós batermos, abra depressa.

Ela acenou e seguiu-o ao longo do corredor.

— Que se passa?

— Não tenho tempo para explicar. — Avançou pela porta até à receção. — Tranque-a e fique em silêncio.

Ouviu a porta bater atrás de si e o correr do ferrolho. Virou-se para Nob’cobi.

— Agora mostra-me de onde vinha o som.

O caçador fitou-o, inexpressivo. Raios, aquela não era a altura para mais um fosso de comunicação. Ben imitou a música e fingiu olhar à volta, depois encolheu os ombros.

Nob’cobi acenou com a cabeça e apontou para a porta, assumindo a liderança.

Ben apertou a pistola até ficar com os nós dos dedos brancos e seguiu-o. Se fosse demasiado tarde…? Abanou a cabeça. Não seria.

Seguiu Nob’cobi até ao exterior. Precisamente quando dobravam a esquina, Harry apareceu à sua frente. Assustado, Ben ficou a milímetros de lhe dar um tiro.

— Conseguiram — disse Harry, sem fôlego e a suar através da farda esfarrapada. — Vamos buscar a estátua e pôr-nos a andar daqui. Os outros caçadores ainda estão a levar aquele bando de crak’an numa caça aos gambozinos, mas não o conseguirão fazer durante muito mais tempo. Temos de…

Ben ergueu uma mão.

— Já a tenho.

— Ótimo!

— Mas temos um novo problema. Precisamos de nos apressar. — Ben fez sinal a Nob’cobi para avançar, ao mesmo tempo que fazia a Harry um relato abreviado da situação.

Harry seguiu-o.

— Então achas que é o miúdo da Ashley?

Ben acenou com a cabeça.

— Merda. Que má hora para se dedicar ao jogo de vídeo.

Nob’cobi fez-lhes sinal para que se calassem e acenou a Harry para que se juntasse a ele. Sussurrou-lhe algo ao ouvido. Harry fez uma careta e recuou para junto de Ben. Numa voz sussurrada, traduziu. — Foi aqui que Nob’cobi viu o Tiny Tim. A música vinha do outro lado do edifício caído.

Ben acenou com a cabeça. Desta feita assegurou-se de que colocava cada pé sobre rocha sólida antes de prosseguir. Não queria repetir o deslize anterior que atraíra a atenção do bando. O grupo esgueirou-se em silêncio durante mais cinquenta metros, passando para lá de uma tenda da messe demolida, os seus tachos e panelas espalhados pelo chão de pedra.

Depois de um minuto a avançar sorrateiramente, era possível ouvir o agora familiar som das garras na rocha e o farejar de algo grande. Nob’cobi, que seguia alguns metros à frente de Ben e Harry, espreitou junto de uma pilha de madeira destruída para a clareira em frente. De súbito, voltou para trás, encostando-se por completo à esquina. Fez-lhes sinal para que não se mexessem.

Ben observou enquanto a grossa cauda da criatura se tornava visível mais à frente, varrendo alguns tachos perdidos. O seu tilintar foi dolorosamente ruidoso no silêncio do acampamento morto. Em seguida, a cauda desapareceu do seu campo visual.

Nob’cobi fez-lhes sinal para que avançassem lentamente. Ben aproximou-se primeiro e deixou o abrigo da esquina apenas o suficiente para perscrutar a clareira à sua frente.

Estava de costas viradas, a cauda a agitar-se para trás e para a frente. Conseguia ver a cabeça a inclinar-se para um lado e para o outro, ao mesmo tempo que examinava algo à sua frente, resfolegando ruidosamente. Depois deslizou para o lado, para examinar melhor a sua presa.

Ben suprimiu um arquejo. Quando a grande criatura se afastou, revelou o seu alvo. Jason estava amarrado a uma das colunas, os olhos do rapaz muito abertos de terror. Mas o crak’an limitou-se a contornar a coluna, resfolegando e farejando, claramente baralhado com o facto de a sua presa não estar a correr. Como um gato, pensou Ben, não estava habituado a que a refeição ficasse simplesmente quieta.

Bem, teria de lhe dar outra. Ben deslizou para trás e permitiu a Harry espreitar antes de falar. Sussurrou ao ouvido de Harry.

— Preciso que atraias o sacana para longe. Como fizeste com os outros. Dá-me uma oportunidade para libertar o Jason e para o levar para um lugar seguro. Voltamos a encontrar-nos lá atrás.

Harry acenou com a cabeça.

— Mas tem cuidado — avisou Ben. — Este sacana é manhoso.

Harry falou um instante com Nob’cobi. Depois os dois afastaram-se, traçando um círculo para leste, de modo a chamar a atenção da criatura para longe do esconderijo de Ben.

Este esperou enquanto eles se colocavam em posição, sustendo a respiração, rezando para que não ouvisse, de súbito, um grito de Jason. A criatura não podia esperar para sempre. Por fim, a novidade perder-se-ia e atacaria.

Tenso, os músculos a estremecer de ansiedade, Ben saltou perante a súbita explosão de tachos e panelas a bater logo a leste da sua posição. Harry e Nob’cobi. Já não era sem tempo. Arriscou-se a espreitar à esquina, para ver se a confusão tivera algum efeito sobre o crak’an.

Este mantinha-se imóvel, as orelhas para trás, à escuta, depois virou lentamente a cabeça na direção do ruído. Deu alguns passos na direção do som, depois parou e olhou de relance para Jason preso ao pilar. Não ia morder o isco. Ou pelo menos não antes de apanhar a presa fácil. Deu de novo um passo na direção de Jason.

Maldito! Ben ergueu a pistola. Antes que pudesse disparar, contudo, Harry saltou para a clareira com dois tachos amolgados na mão.

Harry gritou-lhe:

— Então, grandalhão, que tal um pouco de ação! — Para realçar a ideia, bateu com os tachos um no outro.

A voz e o barulho chamaram a atenção do animal. Com um rugido, voltou-se na direção de Harry. A rapidez do animal pareceu apanhar Harry desprevenido. Deu um passo cambaleante para trás, quase caindo. Ben cerrou os dentes. Mexe-te, soldado! Harry pareceu ouvir a sua ordem silenciosa e correu de novo para a viela.

O homem em fuga era uma tentação demasiado grande para o monstro. Correu atrás de Harry, desaparecendo na viela.

Ben não ficou à espera. Mal a ponta da cauda desapareceu, correu para a clareira. Em direção ao rapaz.

As lágrimas corriam pelas feições sujas de fuligem de Jason. O rapaz continuava a olhar na direção do animal que desaparecia. Graças a Deus, parecia não estar ferido.

Ben correu para ele. O som das botas de Ben contra a rocha chamou a atenção de Jason. Um fugaz olhar de terror perpassou-lhe pelas feições antes de ter, aparentemente, reconhecido Ben. Depois novas lágrimas começaram a cair.

Ben alcançou-o em segundos. Abraçou-o com força apesar das cordas, puxando a mordaça para o libertar, perguntando-se quem diabo poderia ter atado e amordaçado o rapaz. Mas aquele não era o momento para perguntas. Jason tremia com os soluços:

— Agora estás bem, filho. Estás em segurança.

Mas Jason não parava de soluçar, tentando pronunciar as palavras por entre os soluços que o sufocavam.

— Eu… tentei… tentei chamar-te… com o meu jogo. — Largou o brinquedo que ainda tinha nas mãos e este caiu sobre a rocha.

— Fizeste bem. — Ben agachou-se, puxou de uma faca e atacou as cordas.

— A minha… a minha mãe… Ela está bem?

— Está ótima. Está num lugar seguro.

De súbito, Jason libertou-se das cordas largas. Ben quase não conseguia soltar as mãos do rapaz, com tanto que ele estremecia. Por fim, conseguiu.

— Fica quieto por um segundo. Deixa-me tirar este último pedaço de corda.

— Preciso de ver! — Jason parecia frenético.

— O quê?

Jason ergueu a t-shirt solta. Pela primeira vez, Ben apercebeu-se do ecrã de LED brilhante no cinto de Jason. O número seis brilhava.

Jason baixou os olhos, depois gemeu.

— Que é isso?

— É uma bomba — disse com uma expressão desesperada nos olhos.

— De que raio estás tu a falar?

Jason apontou para os quadrados de plástico cinzento presos ao cinto.

— O Khalid pôs-me uma. Para controlar a Linda. Está programado para explodir dentro de seis minutos.

— Então vamos tirar-te isso. — Avançou para o rapaz com a faca.

Jason recuou.

— Se for removido, explode. Só o código secreto permite abri-lo.

— Quem sabe o código?

— Khalid… e anda por aí algures a colocar mais bombas.

O maldito sacana. Se lhe deito as mãos…

— Bem, tem de haver uma maneira de o desarmar. Talvez o Harry… ele é um especialista em demolições. — Ben cobriu o rosto com as mãos. Que diabo. Como é que ia conseguir trazê-lo até ali a tempo? Só deviam reencontrar-se no gabinete de Blakely daí a meia hora. Cerrou os punhos e encostou-os às fontes. Maldição, homem, pensa!

Ben olhava fixamente enquanto o número de LED se transformava num cinco.

Ashley deixou-se cair sobre a almofada na sua pequena câmara. Uma vez mais confinada a uma cela. Três guardas erguiam-se no limitar, as lâminas de diamante a cintilar sob o brilho dos fungos. Tinha tentado, recorrendo à pantomima e à repetição do nome de Sin’jari, comunicar a sua inocência no ataque a Mo’amba, mas era inútil. A sua única testemunha, Mo’amba, estava às portas da morte.

Uma confusão à entrada da cela chamou-lhe a atenção. Observou enquanto Michaelson era empurrado para lá dos guardas. Tropeçou, devido ao tornozelo fraco, mas recuperou o equilíbrio.

— Os filhos da mãe ficaram com as minhas armas — disse, enquanto avançava para junto dela. — Todas elas. Que se passa?

— Desculpa, a culpa foi minha — disse Ashley, levantando-se, os músculos ainda tensos de frustração. — Estava no sítio errado à hora errada. — Ashley contou-lhe a história do ataque de Sin’jari a Mo’amba e o resultado da sua interferência. — Fui apanhada com a boca na botija, por assim dizer. Mo’amba foi encontrado apunhalado no peito, comigo de pé ao seu lado, com a arma na minha mão. Podes culpá-los?

— Que vai acontecer?

Ashley encolheu os ombros.

— Não sei. Acho que neste momento estão todos mais preocupados com Mo’amba.

— Achas que o velhote tem alguma hipótese de sobreviver?

Ashley abanou a cabeça.

— Duvido. Perdeu muito sangue. E com as suas capacidades mentais, se disso fosse capaz, ele mesmo teria entregado Sin’jari: telepaticamente, por todos os comprimentos de onda. Para permanecer em tão grande silêncio, tem de estar praticamente em morte cerebral. E, se morrer, não creio que qualquer um de nós tenha alguma hipótese de sobreviver, independentemente de o Ben conseguir ou não cumprir o prazo.

Michaelson olhou de relance para o relógio.

— O Ben tem menos de oito horas.

— Agora, começo a desejar que não volte — disse Ashley, suspirando. — Furiosos como estão acho que, mesmo que regresse com a estátua, se limitarão a executá-lo connosco. Seria melhor se ficasse longe.

— Não ficará.

— Eu sei. — Ashley sentou-se na almofada e acenou a Michaelson para que fizesse o mesmo. — Se ao menos houvesse uma forma de o avisar. De dizer a Harry e Ben para não regressarem.

— Não temos como. Aconteça o que acontecer, Ben virá atrás de ti.

Ashley bateu com o punho no joelho.

— Então tenho de encontrar uma maneira de contar à aldeia o que aconteceu com Sin’jari. Encontrar uma forma de comunicar. Mas eles nem sequer tentam ouvir. O seu discernimento está demasiado toldado pela raiva.

— Talvez o Harry regresse com o Ben antes de o Mo’amba morrer. Podia traduzir a tua história.

— Mesmo que o fizesse, achas que acreditariam em nós? O Sin’jari é um dos anciãos. Seria a sua palavra contra a minha.

— Nesse caso, precisamos de provas. Que achas que o sacana estava a tramar?

— Nada de bom, isso é certo. Acho que pretende interferir com a missão de Ben. Prejudicá-la de alguma forma.

— Se o conseguíssemos provar, isso faria muito para apoiar a tua alegação.

— Mas como? — perguntou exasperada.

— Apanhando-o em flagrante quando regressar. O único caminho de regresso seguro a partir da Caverna Alfa é através daquele wormhole. Se saiu por aquele caminho, esgueirar-se-á também por ele.

— E como esperas conseguir apanhá-lo, estando preso nesta cela?

Michaelson encolheu os ombros.

— Ei, não tenho as respostas todas.

Ashley abanou a cabeça face à inutilidade dos seus sonhos.

— Ainda assim, tudo depende de Mo’amba sobreviver até ao regresso de Ben e Harry. Se ele…

Um uivo penetrante irrompeu dos guardas à porta. Um grito que ecoava também na aldeia à sua volta, penetrando as paredes de pedra como se fossem de papel, o timbre de tal forma agudo que arrepiou os pelos nos braços de Ashley.

Michaelson tapou os ouvidos, os olhos semicerrados perante o som.

Com a mesma brusquidão com que começara, o choro cessou. O silêncio súbito parecia enorme e vazio, como se algo vital tivesse sido retirado do ar.

Ashley viu um dos guardas olhar na sua direção. Sob o sobrolho saliente, tinha os olhos marejados de lágrimas e algo mais: ódio.

— Que foi aquilo? — perguntou Michaelson.

— Acabámos de ficar sem tempo. Mo’amba morreu.

Ben começava a erguer-se quando foi atingido. Como uma explosão entre os ouvidos. Voltou a deixar-se cair de joelhos. A princípio pensou que alguma bomba tinha explodido, como a que estava presa à cintura de Jason, mas, quando se obrigou a abrir os olhos, Jason fitava-o com uma expressão inquisitiva.

— Estás bem? — perguntou o rapaz, aparentemente sem saber o que acabara de acontecer.

Ben acenou com a cabeça.

— Acho que sim… — Depois o mundo ficou negro.

Mas que raio? Lutou, mas parecia estar a flutuar num espaço sem estrelas, nada a afastar, nada com que lutar. Ben não estava inconsciente, apenas rodeado por uma escuridão infindável. Depois surgiu uma brasa solitária que cintilava na escuridão à sua frente. Enquanto se concentrava naquele marco, como um farol distante, o brilho intensificou-se até se tornar uma chama forte. Falou, vibrando a cada palavra, com a voz do seu avô.

— Ben… Ben… tu tens… de te apressar.

Por aquela altura, Ben já reconhecia um dos chamamentos de Mo’amba. Mas aquele não era o melhor momento.

— Que foi? Que se passa? A Ashley está bem?

— … fraco… cansado… — A chama esmoreceu, não sendo mais do que um débil tremeluzir. — … Tens de te apressar… — Brilhou mais forte por um segundo. — Perigo… — Depois desvaneceu-se, primeiro não restando mais do que um brilho baço, depois nada. E, na escuridão, Ben sentiu-se vazio. De algum modo soube que Mo’amba não se tinha limitado a quebrar o contacto, mas que partira. Partira definitivamente. Enquanto o mundo reaparecia à sua volta, descobriu que as lágrimas lhe corriam pelo rosto.

— Ben, que se passa? — Jason abanava-lhe o ombro.

Ben ergueu-se do chão de pedra sobre o qual caíra. Mo’amba estava morto. Sabia-o com a mesma certeza com que sabia o nome do pai.

— Estou bem — disse, respondendo ao rapaz.

— Desmaiaste.

— Não te preocupes, estou bem. — Tocou ao de leve no joelho do rapaz, ao mesmo tempo que refletia sobre o significado da última e urgente mensagem de Mo’amba. Tinha desejado que Ben regressasse de imediato. Que não perdesse mais tempo. Mas qual era a pressa? Ben ainda tinha sete horas antes do final do prazo. Decerto se estava a passar alguma coisa. Um novo perigo.

Jason fitava-o com preocupação, mas não disse nada.

Ben olhou de relance para o cinto do rapaz. O número cinco ainda brilhava no painel. Depressa, incitara Mo’amba. Realmente. Precisava de um plano. E de uma maneira de contactar Harry. De o chamar de volta para desarmadilhar a bomba.

Depois ocorreu-lhe… raios, porque não pensara naquilo mais cedo?

Ele tinha uma maneira de contactar Harry. Bem, pelo menos, Nob’cobi, que podia dizer a Harry para se pôr a andar até ali. O chamamento de Mo’amba recordara-lho. Podia fazer o mesmo. Nunca tentara a tão grande distância… e era pouco provável que Nob’cobi estivesse num estado de transe relaxado, capaz de ouvir o seu chamamento, mas era possível. Mo’amba tinha-o feito antes. Tinha de tentar.

— Jason, sei que isto vai parecer de doidos, mas preciso de me concentrar, tens de ficar em silêncio.

— Está bem, mas o que…?

— Chiu. Depois. — Ben sentou-se no chão, de pernas cruzadas, fechando os olhos e respirando profundamente. Voltou a imaginar a sua casa de infância às portas de Perth. O pó cor de laranja. Os cangurus ao longe. A sua casa.

Estava sentado de novo no alpendre, numa cadeira que rangia, negligenciando a presença de uma cerveja, desta vez. Concentrou-se ferozmente na imagem de Nob’cobi, visualizando o caçador sentado ao seu lado. Imaginou as feições do caçador com todos os pormenores. A cicatriz no rosto, o cabelo que começava a encanecer no topo da sua cabeça. Enquanto se concentrava, a imagem tremeluziu ganhando consistência por um segundo. O rosto surpreendido de Nob’cobi fitou-o, depois desapareceu.

Maldição! Ben voltou a concentrar-se. Vamos, Nob’cobi, tu viste-me lá por um segundo. Sabes o que quero. Voltou a insistir. Vamos, escuta-me. Nada. Persistiu durante o que lhe pareceram vários minutos. Minutos que não tinha.

Precisamente quando estava prestes a gritar de frustração e a desistir, Nob’cobi apareceu. Parecia sem fôlego.

— Que queres? — rosnou a Ben. — Quase tropecei e caí com o teu primeiro chamamento. Tu devias…

— Basta! Preciso do Harry aqui. Já!

— Bem, nós já estamos de regresso. Aquele crak’an de merda deve estar apaixonado por ti. Porque desistiu de nos perseguir e voltou de novo para aí. Já conseguiram sair daí?

— Não. Temos um problema. Preciso que tu e o Harry esqueçam o Tiny Tim e se encontrem comigo no gabinete. Corram o mais depressa que puderem.

— É melhor que faças o mesmo, porque o sacana vai na tua direção e depressa.

— Rápido. — Mas Nob’cobi já tinha desaparecido.

Ben afastou-se daquele estado onírico e viu Jason a olhar para ele.

— Que estás a fazer?

— É uma longa história — disse, levantando-se. — Temos companhia a caminho. — Com um suspiro de alívio, reparou que o LED de Jason indicava quatro. O tempo movia-se de forma estranha no espaço dos sonhos. Parecera-lhe ter lá estado muito mais do que um minuto. — Consegues correr?

Jason saltou de um pé para o outro, claramente cheio de energia nervosa.

— Oh, sim.

— Então vamos. — Ben agarrou-lhe a mão e começou a correr, ao mesmo tempo que ouvia o som de Tiny Tim a aproximar-se deles, vindo da outra direção. Aumentou o passo para uma corrida vigorosa. O gabinete ficava a menos de cem metros. Alcançou-o, levando Jason a reboque, em menos de um minuto. O mostrador do cinto passou de quatro para três precisamente quando entrava na receção destruída. Agora corre, Harry.

Ben avançou até à porta que dava acesso aos gabinetes e bateu.

— Sou o Ben — chamou. Ouviu o ferrolho a ser corrido; a porta abriu-se por completo.

O rosto preocupado de Sandy espreitou para o exterior. Viu Jason e os seus olhos abriram-se.

— Encontrou o rapaz! — Saiu a correr e tomou-o num abraço como se fosse uma espécie de salva-vidas.

Depois ouviu uma voz atrás de si.

— Qual é a pressa? — Harry entrou de rompante na receção. Nob’cobi avançou cautelosamente atrás dele.

Ben apercebeu-se de que os olhos de Jason se abriram de surpresa quando teve o primeiro vislumbre do mimi’swee.

Ben agarrou no ombro de Harry e puxou-o para a frente.

— O Jason está armadilhado com explosivos. Só temos dois minutos antes de explodir. Preciso que os desarmadilhes.

— Mas que raio? — disse Harry avançando para Jason. — Deixa-me ver.

Ao ouvir as palavras de Ben, Sandy largou Jason, como se este tivesse peste, e recuou para o corredor.

Jason apontou para o cinto, mas não parou de olhar por cima do ombro de Harry, para Nob’cobi, enquanto Harry se ajoelhava ao seu lado. O número dois brilhava vermelho. De forma hesitante, Harry tocou no aparelho, fazendo Jason girar de modo a poder examinar todo o cinto.

— Hum — foi tudo o que disse.

— Então? — perguntou Ben.

— Já vi este trabalho antes. Tudo pré-preparado. O aparelho recetor está guardado nesta pequena caixa. Mesmo com tempo e ferramentas, não consigo chegar até ele sem um risco significativo. Sem o código, esta coisa vai explodir.

— Maldição! — exclamou Ben. — Então estamos lixados.

Harry encolheu os ombros e levou a mão ao fecho do cinto, desencadeando um «Não!» alarmado de Jason. Harry ignorou-o e puxou-o. O cinto abriu-se e caiu da cintura dele. Harry ergueu-se, segurando o cinto longe de si como se fosse uma cobra.

Jason caiu para trás.

— Devia explodir se fosse removido.

— Quem te disse isso? — perguntou Harry.

— O Khalid.

— Estava a mentir. Não há qualquer circuito em redor do cinto.

Jason estava a tremer.

— Então eu… eu podia tê-lo tirado… em qualquer altura. — Ben apercebeu-se de que o rapaz parecia mais perturbado com esse facto do que com o facto de ter estado prestes a ir pelos ares.

Harry acenou com a cabeça.

— Sim. Agora, se não se importam — apontou para o número um que brilhava no cinto — esta coisa vai explodir ainda assim.

Ben arrancou o cinto a Harry.

— Todos para a parte de trás do edifício. Vou lançar esta coisa para o mais longe que puder. Depois correr como um louco.

Harry conduziu toda a gente para o corredor, enquanto Ben avançava para a porta. Atrás de si, Harry gritou:

— Não atires como uma rapariga. Há uma carga do caraças de plástico presa a esse cinto.

— Limita-te a levá-los a todos para o lado oposto do edifício! — Ben saiu a correr pela porta. Correu alguns metros para longe do edifício até encontrar um espaço aberto para onde lançar o cinto. Ao mesmo tempo que erguia o braço, o animal saltou para a sua frente.

A uns meros três metros de distância, o crak’an ferido saltou para a sua frente, a cabeça baixa, silvando uma ameaça fria. Bloqueava todo o caminho em frente.

Ben tentou alcançar a pistola, mas a mão regressou vazia. Tinha deixado a arma no edifício. Ben recuou alguns passos.

Tiny Tim abriu as mandíbulas e uivou de triunfo.

— Vai à merda! — Ben lançou o cinto para a bocarra aberta, depois deu meia-volta e correu para a segurança do edifício. Arriscou um olhar de relance por cima do ombro e viu a criatura mexer na boca com a pata, tentando libertar-se do cinto.

Sacana, acabas de morder um pouco mais do que consegues comer.

Ben voou através da porta da frente demolida e mergulhou para o corredor. No preciso instante em que chegava à porta, a explosão dilacerou o mundo atrás dele. A força da explosão apanhou-o e lançou-o contra a parede.

Esforçou-se por se enrolar no momento do impacto, mas algo estalou quando colidiu com o chão do corredor. Os destroços caíram sobre ele, enquanto jazia, deitado, no corredor. O fumo sufocante seguiu-se rapidamente.

Jason apareceu ao seu lado.

— Ben, estás bem?

Em resposta, este limitou-se a gemer.

Harry ajoelhou-se.

— Deixem-me olhar para ele.

Ben pôs-se de joelhos e mãos no chão, tossindo, para expelir o fumo da garganta. Sentiu uma dor que começava na base do pescoço. Ombro. Deslocado. Mas sobreviveria.

Ben ergueu os olhos de relance para o rosto preocupado de Jason.

— Quando sairmos daqui, vou comprar-te um par de suspensórios. Acabaram-se os cintos.

Quando a explosão ocorreu, Khalid viu o espírito de Lisa morrer. Via-se nos seus olhos. Tinha estado a lutar com o último cronómetro, claramente a tentar não estar sempre a olhar para o relógio à medida que o tempo de Jason desaparecia. Na sua pressa, cruzara mal dois fios e, por engano, quase ativara o detonador. Khalid tinha acabado de corrigir o seu erro quando a explosão se fez sentir do outro lado da base.

Enquanto o eco residual se desvanecia à sua volta, Linda limitou-se a olhar para Khalid.

— Não houve tempo suficiente — disse Khalid, embora, a bem da verdade, nunca tivesse tencionado salvar o rapaz. Khalid estudou Linda, esperando que se revoltasse, chorasse e gritasse. Mas não. Limitou-se a fitá-lo com uma indiferença fria nos olhos. Uma mulher que desistira.

Ótimo, Khalid não precisava que ela se desmoronasse naquele momento. Linda estava a aprender. Conveniência. O sol do deserto queimava todos os que se moviam demasiado devagar. Abanou a cabeça.

— Vamos acabar isto.

Linda virou-se e olhou através da base para a nuvem de fumo da explosão.

— Não funcionou — disse com um tom de voz inexpressivo.

Ele pousou a pequena chave de fendas.

— O quê?

Linda apontou, sentindo o braço pesado.

— A coluna… à qual o Jason estava preso. Permanece intacta.

Khalid endireitou-se e observou. Linda tinha razão. Parecia absolutamente incólume. Como era possível?

Estudou o fumo que se erguia. Havia algo de errado. A explosão ocorrera ligeiramente a oeste da coluna.

— O rapaz deve ter-se libertado das cordas. Afastado da coluna.

As suas palavras pareceram dar esperança a Linda, mas depois deixou-se abater de novo, parecendo aperceber-se de que, livre da coluna ou não, a explosão ocorrera.

— Vamos embora — ordenou Khalid.

Ela não discutiu enquanto era conduzida para outro local.