EPÍLOGO
Monte Érebo, Antártida
Ben enfiou-se na cama com um suspiro. Mas que dia! Enroscou-se ao lado de Ashley. Esta gemeu enquanto dormia e virou-se de lado. Ele pousou a mão na barriga dela. Começava já a notar-se. Quatro meses. Em breve, teria de interromper o seu estudo cultural dos mimi’swee. Conhecendo-a, decerto esperaria até rebentar as águas para pousar a caneta e o papel. Ben tentara convencê-la a aliviar o horário, mas sem sucesso. Até Jason pairava à sua volta como um pai devoto, censurando a mãe quando esta tentava erguer algo demasiado pesado.
Ben sorriu na escuridão e deitou-se com um braço a apoiar a cabeça, fitando o teto. A Base Alfa já estava quase reconstruída. Os repelentes sónicos que Linda tinha desenvolvido revelaram um forte sucesso em manter os crak’an à distância. A sua equipa de biólogos tinha também feito outra descoberta: a erosão do anel de fungos protetores dos mimi’swee não se devera ao desequilíbrio do umbo e ohna, como Mo’amba alegara, mas devia-se antes à introdução e concorrência de um fungo moderno, para ali transportado pelos seres humanos. E, portanto, Sin’jari afinal sempre tinha razão — os seres humanos tinham a culpa. Pelo menos indiretamente.
Ben emitiu um suspiro ruidoso e espreguiçou-se, cansado até aos ossos. Enquanto heri’huti, as suas responsabilidades junto da tribo pareciam infindáveis. Não era de admirar que Mo’amba lhe quisesse passar o bastão. Ainda assim, em memória do velho, sentia-se na obrigação de ocupar a posição. Pelo menos até a cria de mimi’swee dotada com o sangue heri’huti atingir a maturidade. Ben tinha supervisionado o nascimento da criança, mais um dos seus deveres. A criança, a quem Mo’amba chamara Tu’shama antes da sua morte, era uma rapariga, a primeira heri’huti feminina da tribo. O seu género tinha chocado a comunidade, mas Ben não queria saber. Macho ou fêmea, era o seu substituto!
Ben enfiou-se ainda mais profundamente debaixo dos cobertores. A verdade é que não podia queixar-se. A posição tinha os seus privilégios. No tempo livre, podia explorar as vastas galerias. Os caçadores que viajavam pelos caminhos mais escuros tinham-lhe mostrado imagens de tal forma maravilhosas que, por vezes, pensava estar a sonhar.
Mesmo que fosse enquanto recolhiam fezes de crak’an.
Ben fechou os olhos. A manhã chegaria em breve. Virou-se de lado e envolveu a cintura de Ashley com um braço.
Enquanto deslizava para o sono, algo lhe tocou os sonhos. Fraco e hesitante. Alguém que o chamava.
Abriu-se, convidativo, mas o contacto desvaneceu-se. Apenas uma ligação de passagem, como uma brisa quente que desliza pelo rosto frio.
Depois nada.
Quem seria?
Sob a sua mão, sentiu o bebé mexer-se na barriga de Ashley. E Ben lembrou-se das palavras de Mo’amba: «O sangue corre verdadeiro.»