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Sumário: 14.1. Teoria geral das provas: 14.1.1. Conceito de prova; 14.1.2. Espécies de prova; 14.1.3. A verdade possível e a verossimilhança; 14.1.4. A caducidade das expressões ”verdade formal” e “verdade real”; 14.1.5. Direito à prova no processo civil; 14.1.6. Objeto da prova; 14.1.7. Ônus da prova; 14.1.8. Os poderes instrutórios do juiz; 14.1.9. Preclusões para o juiz na atividade probatória; 14.1.10. Valoração da prova; 14.1.11. Prova emprestada; 14.1.12. Prova ilícita; 14.1.13. Provas atípicas – 14.2. Provas em espécie: 14.2.1. Depoimento pessoal; 14.2.2. Da confissão; 14.2.3. Da exibição de documento ou coisa; 14.2.4. Da prova documental; 14.2.5. Da prova testemunhal; 14.2.6. Da prova pericial; 14.2.7. Da inspeção judicial.
Não se trata de tema pacífico na doutrina a conceituação de prova, dificuldade acentuada pela diversidade de sentidos que pode ter o termo “prova”. O termo é utilizado no direito e fora dele, não sendo estranho aos leigos (por exemplo, a tradicional exigência de uma namorada decepcionada: “então prove que me ame!”; ou ainda a sugestão de um garçom: “por que você não prova essa nova cerveja?” etc.). E, mesmo dentro do campo do direito, encontra-se muita divergência no tratamento conceitual do tema, até porque são diversas as áreas afeitas à questão da “prova”. Costuma-se dizer, com inegável acerto, que o termo “prova” é plurissignificante1, dentro e fora do mundo do direito em geral, e do processo em particular.
Uma análise etimológica do termo, derivado do latim probatio, que significa prova, ensaio, verificação, inspeção, exame, argumento, razão, aprovação, confirmação, e que se deriva do verbo – probare (probo, as, are) – significando provar, ensaiar, verificar, examinar, reconhecer por experiência, aprovar, estar satisfeito de alguma coisa, persuadir alguém de alguma coisa, demonstrar; é um ponto de início da análise do conceito do instituto, mas certamente não o ponto de chegada2.
Do próprio significado do termo “prova” já se percebe a possibilidade de sua utilização em diversos sentidos. No campo processual o termo é empregado em diferentes acepções, fator complicador de sua exata conceituação:
(a) pode significar a produção de atos tendentes ao convencimento do juiz, confundindo-se nesse caso com o próprio procedimento probatório (por exemplo, o autor tem o ônus de provar, ou seja, de praticar os atos atinentes à formação do convencimento do juiz);
(b) pode significar o próprio meio pelo qual a prova será produzida (prova documental, prova testemunhal etc.);
(c) pode significar a coisa ou pessoa da qual se extrai informação capaz de comprovar a veracidade de uma alegação, ou seja, a fonte de prova (documento, testemunha);
(d) pode significar o resultado de convencimento do juiz (por exemplo, “esse fato está devidamente provado nos autos”).
Há doutrinadores que preferem conceituar a prova como sendo os meios ou elementos que contribuem para a formação da convicção do juiz a respeito da existência de determinados fatos3. Outros entendem a prova como a própria convicção sobre os fatos alegados em juízo4. Há ainda os que preferem conceituar a prova como um conjunto de atividades de verificação e demonstração, que tem como objetivo chegar à verdade relativa às alegações de fatos que sejam relevantes para o julgamento5.
É tradicional na doutrina a classificação da prova quanto ao fato (diretas e indiretas); quanto ao sujeito (pessoais e reais); quanto ao objeto (testemunhais, documentais e materiais); e quanto à preparação (causais ou pré-constituídas)6.
A prova direta é aquela destina a comprovar justamente a alegação de fato que se procura demonstrar como verdadeira. Já a prova indireta é aquela destinada a demonstrar as alegações de fatos secundários ou circunstanciais, das quais o juiz, por um raciocínio dedutivo, presume como verdadeiro o fato principal. As provas indiretas são conhecidas como indícios.
A prova pessoal decorre de uma consciente declaração feita por uma pessoa, enquanto a prova real é aquela constituída por meio de objetos e coisas, que representam fatos sem na verdade declararem conscientemente sua veracidade.
A prova testemunhal é toda prova produzida sob a forma oral, devendo ser entendida de forma lato sensu, ou seja, além da prova testemunhal propriamente dita, também incluem-se nesse critério o depoimento pessoal, o interrogatório e o depoimento do perito em audiência de instrução. Prova documental é toda afirmação de um fato escrita ou gravada, como um contrato ou uma fotografia. Prova material é qualquer outra forma material, que, não sendo testemunhal nem documental, comprove um fato, como a perícia e a inspeção judicial.
Por prova causal entende-se aquela produzida dentro do próprio processo, como ocorre com o depoimento pessoal e a perícia. Já a prova pré-constituída é aquela formada fora do processo, geralmente antes mesmo da instauração da demanda, como ocorre com a prova documental.
Atualmente considera-se a verdade como algo meramente utópico e ideal, jamais alcançada, seja qual for a ciência que estiver analisando o conhecimento humano dos fatos7. Miguel Reale, ciente de ser a verdade algo inatingível e imprestável, chegou a formular o conceito da quase verdade8. No processo, resta evidenciada a impossibilidade de obtenção da verdade absoluta, em especial em razão dos sujeitos que dele participam. Isso inclui tanto aqueles que levam as provas ao processo – partes –, quase sempre objetivando seu próprio favorecimento, como terceiros que auxiliam o juiz na reconstituição dos fatos – o que nem sempre fazem da forma exata –, e pelo juiz, que receberá as provas e, sem ter acompanhado os fatos, apenas poderá confiar naquilo que foi levado à sua consideração9. Nessa participação de diversos sujeitos diferentes é de esperar que o resultado probatório não traduza exatamente como os fatos efetivamente ocorreram. Além disso, existem as limitações à obtenção e valoração das provas, analisadas a seu devido tempo.
Essa primeira constatação, que aponta a obtenção da verdade como algo inalcançável, meramente utópico, constitui o primeiro obstáculo material intransponível à obtenção da verdade absoluta, ou integral, no processo civil. Mas essa realidade não deve servir de desestímulo à continuação das presentes considerações, ainda mais porque essa intangibilidade da verdade absoluta é realidade comum a todas as áreas do conhecimento humano, e não privativa da área jurídica, tampouco da processual.
Mas a questão permanece: se a verdade não pode ser alcançada no processo, o que então deve ser o suficiente para uma decisão correta e preocupada com a indispensável distribuição da justiça por meio da prestação de uma tutela jurisdicional de qualidade? Parcela considerável da doutrina afirma que ao processo basta a verossimilhança10, com o que não se concorda, porque não é correta a conclusão de que a verossimilhança signifique verdade possível. A primeira é a aparência da verdade pela mera alegação de um fato que costuma ordinariamente ocorrer, enquanto a segunda continua a ser uma mera aparência da verdade (dado que esta é impossível de ser alcançada), é derivada justamente da prova produzida no caso concreto, e não da mera frequência com que o fato ocorre em situações similares. Enquanto a verossimilhança parte de uma análise genérica e abstrata, a verdade obtida pelo processo diz respeito ao caso particular, às provas que nele foram colhidas11.
O que se deve buscar é a melhor verdade possível dentro do processo, levando-se em conta as limitações existentes e com a consciência de que a busca da verdade não é um fim em si mesmo, apenas funcionando como um dos fatores para a efetiva realização da justiça, por meio de uma prestação jurisdicional de boa qualidade. Ainda que se respeitem os limites impostos à busca da verdade, justificáveis à luz de valores e garantias previstos na Constituição Federal, o que se procurará no processo é a obtenção da verdade possível12. Por verdade possível entende-se a verdade alcançável no processo, que coloque o juiz o mais próximo possível do que efetivamente ocorreu no mundo dos fatos, o que se dará pela ampla produção de provas, com respeito às limitações legais.
Essa impossibilidade concreta de obter a verdade absoluta no processo – como em qualquer outro ramo da ciência humana – serve para desmistificar a ideia comumente lembrada de que no processo civil seria suficiente a obtenção da verdade formal, que seria uma verdade processual, enquanto no processo penal dever-se-ia buscar a verdade real, ou seja, a efetiva verdade, ou verdade material.
Falar diante dessa nova definição da relação da prova com a verdade de duas espécies diversas de verdade é algo absolutamente inadmissível. A verdade é uma só, sempre inalcançável, tanto no campo civil como no campo penal. É evidente que, apesar de a verdade ser algo inalcançável, não deve deixar de ser perseguida, sendo essa busca fator de legitimação da própria decisão judicial. Diferentes tratamentos da intensidade de tal busca, que poderia ser diferente no campo penal e civil – com o que desde já discordo –, nada têm a ver com o instituto da verdade; daí a caducidade de termos como “verdade formal” e “verdade material”13.
E ainda que a verdadeira significação das expressões “verdade formal” e “verdade material” seja referente à satisfação decorrente do esgotamento dos meios de busca da verdade, não concordo com tal diferenciação feita tradicionalmente pela doutrina mais antiga, tanto penal como cível. A justificativa encontrava-se, invariavelmente, nos valores protegidos em um e em outro processo, sendo mais valiosos aqueles tratados na esfera penal do que os tratados na esfera cível. Essa diferença, entretanto, não é regra absoluta, jamais podendo ser utilizada para a diferenciação pretendida.
Para tanto, basta imaginar que nem sempre os valores tutelados no processo penal serão mais valiosos ou nobres do que aqueles tutelados no processo civil. Muitas vezes a pena suportada pelo réu em um processo penal tem cunho meramente patrimonial, como ocorre, por exemplo, no pagamento de uma multa ou mesmo de cestas básicas. Outras vezes, alguma espécie de restrição de direitos como, por exemplo, ser proibido de acompanhar os jogos de seu time, ou ainda a prestação de serviços comunitários. Registre-se, ainda, que essas circunstâncias devem crescer em sua intensidade em virtude do sentido moderno a que ruma o direito penal (despenalização de condutas).
Já no processo civil é possível se ter uma demanda que tenha como objeto um direito indisponível como, por exemplo, aquela que resulta na perda de pátrio poder, ou ainda que altera a guarda de um menor que estaria sofrendo abusos físicos pelo cônjuge que anteriormente detinha a guarda. Nesses casos, evidencia-se que os valores tutelados – e também as consequências geradas pelo processo civil – são muito mais relevantes e significativos do que aqueles tratados em diversos processos penais, nos quais o resultado é meramente patrimonial14.
O melhor resultado possível do processo – que se entende mais apto a ocorrer com a ampla produção de prova – diz respeito a qualquer processo, seja ele penal ou cível, considerando-se que a qualidade da prestação jurisdicional será sempre o valor supremo a ser buscado em todo o processo judicial, independentemente do direito substancial que se está debatendo em juízo. A verdade alcançável no processo será sempre uma só, nem material nem formal, mas processual, ou seja, aquela que decorrer da mais ampla instrução probatória possível, o que deve ocorrer independentemente da natureza do processo ou ainda da espécie de direito substancial debatido15.
Mas ainda assim poder-se-á alegar que as regras procedimentais no processo civil, com suas preclusões, presunções e restrições probatórias a alguns meios de provas, geram como consequência um tratamento diferenciado daquele existente no processo penal. Apesar das inegáveis diferenças procedimentais, há nitidamente uma tendência para que também no processo civil a verdade possível não fique em segundo plano16.
Seja como for, e ainda que se admita que as restrições no processo civil sejam em maior número e com maior intensidade do que aquelas vistas no campo penal, em ambos só será possível uma única verdade, que aquela é processualmente alcançável, sendo absolutamente incorreto o diferente tratamento dado tradicionalmente a essas duas áreas do Direito, falando-se em verdade real para o processo penal e verdade formal para o processo civil.
Encontra-se na doutrina uma forte tendência na defesa da natureza constitucional do direito à prova, que, embora não esteja expressamente previsto no Texto Maior, seria decorrência da moderna visão do princípio da inafastabilidade da tutela jurisdicional, previsto no art. 5.º, XXXV, da CF (“a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário, lesão ou ameaça a direito”), atualmente analisado à luz do acesso à ordem jurídica justa, desenvolvida no Capítulo 1, item 1.5.5.
Dentro dessa nova visão do princípio constitucional, visivelmente preocupada com a qualidade da prestação jurisdicional, encontra-se o direito à prova, que garantirá o efetivo exercício do devido processo legal, em especial o respeito ao contraditório. A garantia do devido processo legal e do contraditório, ambos garantidos de forma expressa por nossa Constituição Federal, alçam o direito à prova no processo civil ao patamar constitucional17.
Esse direito à prova, entretanto, apesar de alçado ao patamar constitucional, naturalmente não é absoluto, aliás, como qualquer outro direito, encontrando limitações tanto no plano constitucional como no infraconstitucional. A exclusão de uma prova no processo judicial sempre será prejudicial, causando, portanto, um mal, que somente encontrará justificativa quando esse mal for considerado um mal menor se comparado com os outros valores e garantias que seriam maculados para a aceitação da prova. Reconhece-se que a limitação à busca da verdade seja algo maléfico, mas que em diversas hipóteses pior seria a permissão no caso concreto de sua utilização.
Além da constatação de que nenhum direito é absoluto, e dessa forma também não poderia sê-lo o direito à prova, há outro importante fator a afastar qualquer pensamento que rume em sentido contrário. A obtenção da verdade não é um fim em si mesmo, que deva ser perseguida sem qualquer outra valoração ou ponderações sobre os outros escopos buscados pelo processo.
Por mais importante que seja a busca e obtenção da verdade alcançável, jamais poderá ser considerado que a busca da verdade seja o único objetivo no processo. Tal pensamento, além de indevidamente restringir-se a tão somente um dos diferentes escopos do processo, faria com que a busca da verdade fosse algo absoluto, sem limite, admitindo-se qualquer espécie de prova, produzida de qualquer forma, e em qualquer momento do processo, o que inclusive nos levaria de volta à época da barbárie, com a admissão, por exemplo, da prova obtida mediante ameaça ou tortura. A busca da verdade é o que legitima a atividade jurisdicional, mas não pode e não deve ser considerada um fim em si mesmo.
A obtenção da verdade – ou da quase verdade – faz parte de uma série de escopos do processo, e com eles deverá conviver da melhor forma possível. A função cumprida pela prova no processo, portanto, não deve ser alçada a algo absoluto ou que não deva sofrer restrições, sob pena de complicadas e inaceitáveis distorções. Nem sempre a verdade será a grande preocupação do operador no caso concreto, e nem por isso poder-se-á indicar que a atuação jurisdicional tenha sido irregular ou viciada. A mera busca da verdade já será o suficiente para legitimar a decisão judicial18.
Há controvérsia a respeito do que seja exatamente o objeto de prova, entendendo parcela da doutrina que são os fatos19, enquanto outra parcela entende que são as alegações de fato. Para a segunda corrente doutrinária, o fato ocorreu ou não, existe ou não, enquanto a veracidade atinge exclusivamente as alegações de fato, que podem ser falsas ou verdadeiras20. Para a primeira corrente doutrinária o objeto são os fatos, porque nem sempre o objeto de prova é constituído de alegações, bastando para tanto lembrar os fatos que podem ser considerados de ofício pelo juiz, ainda que as partes não os tenham alegado no processo. O art. 130 do CPC corroboraria esse segundo entendimento ao prever que o juiz apreciará livremente a prova quanto aos fatos, ainda que não alegados nos autos21.
A melhor doutrina ensina que o ônus da alegação dos fatos pelas partes limita-se aos fatos jurídicos (principais), que vinculam a atividade jurisdicional. O mesmo, entretanto, não ocorre com o fato simples (secundário) que poderá ser levado em consideração pelo juiz ainda que não tenha sido alegado pelas partes22. Esses fatos, que o juiz pode conhecer de ofício, podem não ser objeto de alegação das partes, e ainda assim influenciarão o julgamento. O melhor, portanto, é afirmar que o objeto de prova não são os fatos nem as alegações de fato, mas os pontos e/ou as questões de fato levadas ao processo pelas partes ou de ofício pelo próprio juiz.
Nem todos os pontos ou as questões de fato, entretanto, são objeto de prova, excluindo-se dessa exigência:
(a) as referentes a fatos impertinentes ou irrelevantes à solução da demanda;
(b) as referentes a fatos notórios;
(c) alegações de fato não controvertidas;
(d) questões de fato em cujo favor milite presunção legal de existência ou veracidade (art. 334 do CPC).
A produção de provas de alegações de fatos impertinentes, ou seja, que não se relacionam à causa posta à apreciação do juiz, é medida inútil, e por isso deve ser evitada em prol do princípio da economia processual. O mesmo ocorre com os fatos irrelevantes, que, mesmo dizendo respeito à causa, em nada influenciam o convencimento do juiz. Fatos irrelevantes e impertinentes não modificam o conteúdo da decisão judicial, o que dispensa a produção de prova a seu respeito. Também são considerados irrelevantes os fatos impossíveis e os de prova impossível, por disposição da lei (p. ex., prova contra presunção absoluta) ou pela natureza do fato (p. ex., art. 401 do CPC)23. É justamente por isso que o juiz, destinatário da prova, deve no saneamento do processo fixar os pontos controvertidos que serão objeto de prova, para evitar o desenvolvimento de atividade probatória inútil.
Confirmando a exclusão da alegação de fatos irrelevantes e impertinentes do objeto da prova, o art. 377, parágrafo único, do PLNCPC prevê que o juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias, regra atualmente prevista no art. 130 do CPC. O indeferimento previsto no dispositivo legal impede que determinadas alegações de fato, que não interessem ao juiz na formação de seu convencimento, sejam incluídas no objeto da prova.
Quando se excluem do objeto da prova os fatos notórios, não se deve exigir a notoriedade absoluta, sob pena de inutilização do dispositivo legal. Fatos notórios são aqueles de conhecimento geral, tomando-se por base o homem médio, pertencente a uma coletividade ou a um círculo social, no momento em que o juiz deva decidir24. Trata-se da notoriedade relativa, o bastante para contemplar a previsão legal. Com relação aos fatos notórios, são importantes as seguintes características:
(a) o fato não precisa ser de conhecimento do juiz;
(b) o fato não precisa ter sido testemunhado;
(c) no tocante a fatos jurídicos notórios, existe o ônus de alegação da parte, não podendo o juiz conhecê-los de ofício;
(d) a notoriedade pode ser objeto de prova, sempre que existir dúvida do juiz a respeito dessa característica do fato.
Importante notar que os fatos notórios não se confundem com as máximas de experiência, que são diferentes espécies do gênero “saber privado do juiz”. Enquanto os fatos notórios se referem a fatos determinados que ocorreram, a cuja existência têm acesso, de maneira geral, as pessoas que vivem em determinado ambiente sociocultural, as máximas de experiência são juízos generalizados e abstratos, fundados naquilo que costuma ocorrer, que autorizam o juiz a concluir, por meio de um raciocínio intuitivo, que em identidade de circunstâncias, também assim ocorram no futuro25.
Também a alegação de fato não controvertida não será objeto de prova, já que a produção da prova se dá justamente para convencer o juiz da veracidade de determinada alegação de fato, e, não havendo controvérsia, o juiz já considerará verdadeira tal alegação, gerando a desnecessidade de produção de prova. Assim, havendo aceitação expressa ou tácita da parte quanto às alegações de fato da parte contrária, a alegação de fato não será controvertida, não formará a questão (ponto controvertido) e escapará da fase probatória, por ser considerado como verdadeira pelo juiz.
Segundo o art. 334, II, do CPC, são excluídos do objeto de prova os fatos afirmados por uma parte e confessados pela parte contrária, enquanto o art. 334, III, faz o mesmo relativamente aos fatos admitidos no processo como incontroversos, o que se verifica quando não ocorre a impugnação específica dos fatos narrados pelo autor exigida no art. 302, caput, do CPC, circunstância analisada no Capítulo 11, item 11.5.326.
Por fim, também não será exigida a prova de alegações de fatos em cujo favor milite a presunção legal de existência ou veracidade. A presunção representa o resultado de um processo mental que, partindo de um fato demonstrado como ocorrido, permite a conclusão de que outro fato, ainda que não provado, seja também considerado como existente ou ocorrido. Há uma relação entre fato indiciário (provado) e fato presumido (não provado), decorrente da constatação lógica de que, se o primeiro ocorreu, muito provavelmente o segundo também terá ocorrido. A melhor doutrina afirma corretamente que a presunção não se confunde com a prova, sendo a primeira um ponto de chegada (correspondente ao conhecimento adquirido pelo juiz) e a segunda, um ponto de partida (algo que permite ao juiz adquirir o conhecimento de algum fato). O indício, por sua vez, é ao mesmo tempo um ponto de partida (algo que permite ao juiz o conhecimento) e um ponto de chegada (fato provado)27.
A presunção pode ser relativa (iuris tantum) ou absoluta (iuris et de iure), legal (praesumtiones legis) ou judicial (praesumtiones hominis).
Na presunção relativa é admitida a prova em sentido contrário, de forma que o fato presumido será considerado ocorrido pelo juiz desde que a parte contrária não produza prova que afaste tal presunção. Como se pode notar, na presunção relativa a questão fática não é efetivamente excluída do objeto da prova, somente dispensado-se a parte que faz a alegação de produzir prova no sentido de convencer o juiz de sua alegação. Dessa realidade é correta a conclusão de que na hipótese de presunção relativa não há exclusão do objeto da prova, mas meramente uma inversão do ônus probatório, cabendo à parte que não alegou o fato convencer o juiz de sua não existência ou ocorrência28.
Exemplo clássico de preclusão relativa vem consagrado na Súmula 301 do Superior Tribunal de Justiça, que determina a presunção de paternidade na hipótese de o réu se negar injustificadamente a realizar o exame pericial de DNA. Para esse tribunal, não basta a mera recusa em realizar o exame, cabendo ao autor a produção de prova mínima que ao menos traga ao processo algum indício da paternidade29. Registre-se que o Superior Tribunal de Justiça limita essa presunção à pessoa do pretenso genitor, e não ao descendente, por ser um direito personalíssimo e indisponível30.
Costuma-se afirmar que a presunção absoluta impede a produção de prova em sentido contrário, o que é somente parcialmente exato. A presunção absoluta retira um elemento componente do ato de sua estrutura original, de forma que o ato será considerado mesmo se ausente tal elemento. Conforme ensina a melhor doutrina, exigindo a lei os elementos A, B e C para a existência ou validade de um ato, pode o legislador dispensar um deles, de forma que o ato será considerado existente ou válido somente com a presença de dois desses elementos (A e B, A e C ou B e C), falando-se nesse caso em presunção absoluta. Trata-se de opção legislativa, fundada na probabilidade de que as coisas tenham ocorrido de determinada maneira ou na dificuldade de demonstrar o fato, que incide no plano do direito objetivo, e não no campo probatório31. Dessa forma, a afirmação de que não cabe a produção de prova significa dizer que a produção de prova nesse caso é inútil, e por isso não é admitida32.
Ainda que doutrina respeitável aponte para a similaridade de presunção absoluta e ficção jurídica33, prefiro a corrente doutrinária que defende uma diferenciação entre os dois fenômenos jurídicos, ainda que a consequência prática em sua utilização no processo seja a mesma. A presunção absoluta é fundada numa grande probabilidade de o fato presumido ter realmente ocorrido, enquanto a ficção jurídica é fundada em fato que provavelmente não tenha ocorrido, mas que por opção legislativa consideram-se produzidos os mesmos efeitos do fato efetivamente tivesse ocorrido. Na ficção jurídica há uma consciente opção legislativa de, mesmo diante de evidências de não ocorrência do fato, permitir a produção dos efeitos jurídicos programados por lei34.
Presunção legal é aquela estabelecida expressamente em lei, sendo tarefa do legislador a indicação de correspondência entre o fato indiciário e o fato presumido, podendo ser a presunção relativa ou absoluta. Presunção judicial é aquela realizada pelo juiz no caso concreto, com a utilização das máximas de experiência, permitindo-se a conclusão de ocorrência ou existência de um fato não provado em razão da prova do fato indiciário, fundado naquilo que costuma logicamente ocorrer35.
Embora a regra no tocante ao objeto da prova seja direcionada às alegações de fato, em algumas situações excepcionais pode ser exigida da parte a prova de alegações de direito. Dá-se tal possibilidade – não é de antemão obrigatório, devendo o juiz no caso concreto determinar a produção da prova – nas alegações de direito municipal, estadual, estrangeiro e consuetudinário. Exigir da parte a prova do direito na realidade é exigir a prova da existência e vigência da norma legal conforme invocada pela parte (art. 14 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – antes denominada LICC), sendo essa exigência dispensável caso o juiz conheça o direito. É importante registrar que, no caso de direito municipal e estadual, é exigido do juiz o conhecimento da lei local, em que exerce seu ofício, somente podendo exigir a prova de local onde não esteja exercendo sua função jurisdicional36.
Os meios de prova nessa atípica situação do direito como objeto da prova são os mais diversos possíveis, devendo o juiz no caso concreto analisar sua idoneidade. Assim, o direito estrangeiro pode ser provado por compêndios de legislação atualizada, certidão diplomática ou até mesmo por meio de livros de doutrina atualizados. O direito estadual e municipal pode ser provado por meio de publicação da lei no Diário Oficial ou certidão obtida junto ao órgão legislativo competente. O direito consuetudinário pode ser provado por qualquer forma lícita, inclusive por testemunhas.
A doutrina comumente divide o estudo do instituto do ônus da prova em duas partes; a primeira chamada de ônus subjetivo da prova e a segunda chamada de ônus objetivo37. No tocante ao ônus subjetivo da prova, analisa-se o instituto sob a perspectiva de quem é o responsável pela produção de determinada prova (“quem deve provar o que”), enquanto no ônus objetivo da prova, o instituto é visto como uma regra de julgamento a ser aplicada pelo juiz no momento de proferir a sentença no caso de a prova se mostrar inexistente ou insuficiente. No aspecto objetivo o ônus da prova afasta a possibilidade de o juiz declarar o non liquet diante de dúvidas a respeito das alegações de fato em razão da insuficiência ou inexistência de provas. Sendo obrigado a julgar e não estando convencido das alegações de fato, aplica a regra do ônus da prova.
O ônus da prova é, portanto, regra de julgamento, aplicando-se para as situações em que, ao final demanda, persistem fatos controvertidos não devidamente comprovados durante a instrução probatória. Trata-se de ônus imperfeito porque nem sempre a parte que tinha o ônus de prova e não produziu a prova será colocada num estado de desvantagem processual, bastando imaginar a hipótese de produção de prova de ofício ou ainda de a prova ser produzida pela parte contrária. Mas também é regra de conduta das partes, porque indica a elas quem potencialmente será prejudicado diante da ausência ou insuficiência da prova.
Como já afirmado, o ônus da prova, em seu aspecto objetivo, é uma regra de julgamento, aplicando-se somente no momento final da demanda, quando o juiz estiver pronto para proferir sentença. É regra que se aplica apenas no caso de inexistência ou insuficiência da prova, uma vez que, tendo sido a prova produzida, não interessando por quem, o princípio não se aplicará. Trata-se do princípio da comunhão da prova (ou aquisição da prova), que determina que, uma vez tendo sido a prova produzida, ela passa a ser do processo, e não de quem a produziu38. Dessa forma, o aspecto subjetivo só passa a ter relevância para a decisão do juiz se ele for obrigado a aplicar o ônus da prova em seu aspecto objetivo: diante de ausência ou insuficiência de provas, deve indicar qual das partes tinha o ônus de provar e colocá-la numa situação de desvantagem processual.
Segundo a regra geral estabelecida pelo art. 333 do CPC, cabe ao autor o ônus de provar os fatos constitutivos de seu direito, ou seja, deve provar a matéria fática que traz em sua petição inicial e que serve como origem da relação jurídica deduzida em juízo. Em relação ao réu, também o ordenamento processual dispõe sobre ônus probatórios, mas não concernentes aos fatos constitutivos do direito do autor. Naturalmente, se desejar, poderá tentar demonstrar a inverdade das alegações de fato feitas pelo autor por meio de produção probatória, mas, caso não o faça, não será colocado em situação de desvantagem, a não ser que o autor comprove a veracidade de tais fatos. Nesse caso, entretanto, a situação prejudicial não se dará em consequência da ausência de produção de prova pelo réu, mas sim pela produção de prova pelo autor.
Caso o réu alegue por meio de defesa de mérito indireta um fato novo, impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, terá o ônus de comprová-lo. Por fato impeditivo entende-se aquele de conteúdo negativo, demonstrativo da ausência de algum dos requisitos genéricos de validade do ato jurídico como, por exemplo, a alegação de que o contratante era absolutamente incapaz quando celebrou o contrato. Fato modificativo é aquele que altera apenas parcialmente o fato constitutivo, podendo ser tal alteração subjetiva, ou seja, referente aos sujeitos da relação jurídica (como ocorre, por exemplo, na cessão de crédito) ou objetiva, ou seja, referente ao conteúdo da relação jurídica (como ocorre, por exemplo, na compensação parcial). Fato extintivo é o que faz cessar a relação jurídica original, como a compensação numa ação de cobrança. A simples negação do fato alegado pelo autor não acarreta ao réu o ônus da prova.
O ônus da prova carreado ao réu pelo art. 333, II, do CPC só passa a ser exigido no caso concreto na hipótese de o autor ter se desincumbido de seu ônus probatório, porque só passa a ter interesse na decisão do juiz a existência ou não de um fato impeditivo, modificativo ou extintivo do autor, após se convencer da existência do fato constitutivo do autor. Significa dizer que, se nenhuma das partes se desincumbir de seus ônus no caso concreto e o juiz tiver que decidir com fundamento na regra do ônus da prova, o pedido do autor será julgado improcedente.
Registre-se que parcela da doutrina defende a não aplicação do art. 333 do CPC, preferindo a aplicação do entendimento de que a regra de distribuição do ônus da prova entre as partes não deve ser fixada a priori, dependendo do caso concreto. Fala-se em distribuição dinâmica do ônus da prova para determinar a regra que concede ao juiz a distribuição no caso concreto, dependendo de qual parte tenha maior facilidade na produção da prova39. O Superior Tribunal de Justiça vem aplicando a regra da inversão do ônus da prova em ações civis por danos ambientais40.
O sistema de distribuição do ônus da prova entre autor e réu é regulado no CPC/1973 pelo art. 333. Trata-se de uma distribuição estática, abstratamente criada pelo legislador, sem qualquer liberdade ao juiz em sua aplicação, com exceção das regras pontuais que admitem sua inversão. O PLNCPC inova quanto ao sistema de distribuição dos ônus probatórios, atendendo corrente doutrinária que já vinha defendendo a chamada “distribuição dinâmica do ônus da prova”.
O PLNCPC adota essa forma dinâmica de distribuição do ônus da prova. Apesar de o art. 380 em seus dois incisos repetir as regras contidas no art. 333 do CPC/1973, o § 1.º permite que o juiz, nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa, relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, atribua, em decisão fundamentada e com respeito ao princípio do contraditório, o ônus da prova de forma diversa.
Consagra-se legislativamente a ideia de que deve ter o ônus da prova a parte que tenha maior facilidade em produzir a prova e se livrar do encargo. Como essa maior facilidade dependerá do caso concreto, cabe ao juiz fazer a análise e determinar qual o ônus de cada parte no processo. Registre-se que diante da omissão do juiz as regras continuaram a ser aplicadas como sempre foram sob a égide do CPC/1973.
Interessante a vedação a essa inversão contida no § 2.º do dispositivo ora comentado, proibindo-a sempre que possa gerar situação em que a desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil. A norma é elogiável porque a técnica de distribuição dinâmica da prova não se presta a tornar uma das partes vitoriosa por onerar a parte contrária com encargo do qual ela não terá como se desincumbir. A nova sistemática de distribuição do ônus da prova serve para facilitar a produção da prova, e não para fixar a priori vencedores e vencidos. Nesse sentido, interessante decisão do Superior Tribunal de Justiça quanto à inversão prevista no art. 6.º, VIII, do CDC41.
Existem três espécies de inversão do ônus da prova:
(a) convencional;
(b) legal;
(c) judicial.
A inversão decorre de um acordo de vontades entre as partes, que poderá ocorrer antes ou durante o processo. Essa forma de inversão tem duas limitações previstas pelo art. 333 do CPC, que prevê a nulidade dessa espécie de inversão quando:
(i) recair sobre direito indisponível da parte;
(ii) tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.
Essa segunda limitação legal é aplicável nas hipóteses de inversão do ônus probatório diante da alegação de fato negativo indeterminado, cuja prova é chamada pela doutrina de “prova diabólica”42.
Note-se que não é difícil a prova de um fato negativo determinado, bastando para tanto a produção de prova de um fato positivo determinado incompatível logicamente com o fato negativo. O problema é o fato negativo indeterminado (fatos absolutamente negativos), porque nesse caso é até possível a prova de que a alegação desse fato é falsa, mas é impossível a produção de prova de que ela seja verdadeira43.
Marina alega que não estava em determinado bar, num determinado dia e horário, sendo fácil produzir prova nesse sentido; basta provar que estava em outro lugar naquele dia e horário. A alegação, entretanto, de que nunca esteve naquele bar é impossível de ser provada, ainda que a parte contrária possa provar que a alegação é falsa, bastando comprovar que ao menos uma vez Marina esteve no bar. É prova diabólica que Marina não conseguirá produzir o fato negativo indeterminado, não se admitindo a inversão convencional nesse caso.
A inversão legal vem prevista expressamente em lei, não exigindo o preenchimento de requisitos legais no caso concreto. Os exemplos dessa espécie de inversão do ônus probatório são encontrados no Código de Defesa do Consumidor:
(a) é ônus do fornecedor provar que não colocou o produto no mercado, que ele não é defeituoso ou que houve culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros pelos danos gerados (art. 12, § 3.º, do CDC);
(b) é ônus do fornecedor provar que o serviço não é defeituoso ou que há culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro nos danos gerados (art. 14, § 3.º, do CDC);
(c) é ônus do fornecedor provar a veracidade e correção da informação ou comunicação publicitária que patrocina (art. 38 do CDC).
Na inversão judicial, caberá ao juiz analisar no caso concreto o preenchimento dos requisitos legais, como ocorre no art. 6.º, VIII, do CDC, que prevê a possibilidade de o juiz inverter o ônus da prova em favor do consumidor sempre que este for hipossuficiente ou suas alegações forem verossímeis, sendo aplicável, inclusive, nas ações coletivas consumeristas44. Trata-se, portanto, de inversão ope iudicis e não ope legis45. É evidente que não basta nesse caso a relação consumerista, cabendo ao juiz analisar no caso concreto o preenchimento dos requisitos exigidos por lei. A doutrina majoritária entende que o dispositivo legal deve ser interpretado literalmente, de forma que a hipossuficiência e a verossimilhança sejam considerados elementos alternativos, bastando a presença de um deles para que se legitime a inversão do ônus probatório46.
Registre-se decisão do Superior Tribunal de Justiça que, ao interpretar o art. 6.º, VIII, da Lei 8.078/1990 c/c o art. 21 da Lei 7.347/1985, conjugado com o princípio da precaução, determinou a inversão do ônus da prova em demanda em que se pretende a reparação de dano ambiental. Nesse julgamento o Tribunal entendeu que não é a hipossuficiência do autor que permite a inversão do ônus, mas o caráter público e coletivo do bem jurídico tutelado47. Também é tranquilo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de inversão do ônus da prova quando há indícios de agiotagem, nos termos da MP 2.172-32/2001, imputando-se ao credor a responsabilidade pela comprovação da regularidade jurídica da cobrança48.
Na inversão convencional e legal não surge problema quanto ao momento de inversão do ônus da prova; na primeira estará invertido o ônus a partir do acordo entre as partes, e na segunda a inversão ocorre desde o início da demanda. Na hipótese judicial, entretanto, a inversão dependerá de uma decisão judicial fundada no preenchimento dos requisitos legais, e o momento da prolação dessa decisão não é tema pacífico na doutrina.
Apesar de ser regra de julgamento, só se aplicando ao final do processo, e isso somente no caso de inexistência ou insuficiência de prova, existem casos nos quais, em respeito ao princípio do contraditório, o juiz deve já no saneamento do processo se manifestar sobre eventual inversão da regra geral contida no art. 333 do CPC49. Perceba-se que o juiz não estaria nesse momento invertendo o ônus da prova, regra que até mesmo pode nem ser utilizada caso a instrução probatória convença amplamente o juiz. O que o juiz fará é apenas sinalizar às partes que, no caso de necessidade de aplicação da regra, o fará de forma invertida, e não conforme previsto como regra geral em nosso estatuto processual.
Para que o réu não seja surpreendido com a inversão quando já finalizada a instrução probatória, entendo que, em respeito ao princípio do contraditório, a sinalização de possível inversão – se necessário for – deve ser feita expressamente já na decisão saneadora50. Parece não considerar tal circunstância a parcela doutrinária e jurisprudencial que, firme na ideia de que o ônus da prova é uma regra de julgamento, entende que somente no momento da sentença o juiz deve se manifestar a respeito do tema51. Não parece correto o entendimento porque desconsidera a realidade de que o ônus da prova também funciona como uma regra de conduta, desprezando-se a realidade forense de que a parte que não tem o ônus probatório não realizará a prova, porque corre o risco de que ela seja contrária ao seu interesse. E nem se fale que a parte deve produzir a prova independentemente de ter o ônus probatório porque a preocupação em descobrir a verdade possível nem sempre é das partes, mas sim do juiz. O juiz busca a justiça no processo, as partes buscam a vitória, obviamente, dentro da boa-fé e lealdade processual.
Apesar de o art. 380, § 1.º, do PLNCPC prever a possibilidade de o juiz atribuir o ônus da prova “de modo diverso”, naturalmente a regra trata da inversão do ônus da prova, até porque, sendo tais regras distribuídas entre autor e réu, o modo diverso só pode significar a inversão da regra legal. Tanto assim que o dispositivo expressamente se refere aos casos previstos em lei como umas das hipóteses de fixação “de modo diverso”, e esses casos são justamente os de inversão do ônus da prova.
A hipótese mais importante e frequente na praxe forense de inversão do ônus da prova não está prevista no CPC/1973, mas no art. 6.º, VIII, do CDC. E sua aplicação sempre gerou muita polêmica quanto ao momento adequado de o juiz se manifestar a respeito da aplicação dessa regra de ônus probatório. Para parcela doutrinária, o momento certo para o juiz inverter a regra do ônus da prova é o de sua aplicação, qual seja o julgamento do processo52, enquanto para outra corrente doutrinária o momento apropriado para tanto é o saneamento do processo, sob pena de violação do princípio do contraditório53.
O segundo entendimento, que sempre me pareceu mais adequado, prevaleceu no PLNCPC, mais precisamente no art. 380, § 1.º, que exige do juiz, sempre que inverter o ônus da prova, que dê oportunidade à parte para se desincumbir do ônus que lhe tenha sido atribuído. Significa que, em respeito ao contraditório, a parte terá amplo direito à produção da prova, de forma que não parece interessante que essa inversão ocorra somente no momento de prolação de sentença, sob pena de ofensa ao princípio da economia processual. Parece ser mais vantajoso que no momento de saneamento do processo o juiz já sinalizar a forma de aplicação da regra do ônus da prova caso essa aplicação realmente se faça necessária no caso concreto.
A inversão do ônus da prova traz outra interessante questão: a inversão do adiantamento do pagamento das despesas necessárias para a produção probatória, em especial a pericial. Nesse ponto há séria divergência tanto na doutrina quanto na jurisprudência, entendendo parcela dos operadores e estudiosos que a inversão da prova acarreta inexoravelmente a inversão do pagamento das despesas que derivam da produção de tal prova54, enquanto outros entendem que a antecipação de pagamento de despesas relacionadas com a produção de prova encontra-se regida pelo art. 33 do CPC, não sofrendo qualquer influência decorrente de eventual inversão do ônus da prova, sendo esse o entendimento do Superior Tribunal de Justiça55.
A razão está com a segunda corrente, considerando-se principalmente a natureza do ônus da prova e o que a sua inversão significa. Sendo o ônus da prova uma regra de julgamento, estando ligado à necessidade de o juiz decidir, ainda que ausente as provas para convencê-lo das alegações de fato narradas no processo, não guarda o instituto qualquer relação com a antecipação de despesas. É natural, entretanto, que no caso de inversão do ônus da prova, a parte que não requereu a produção da prova passe a ter interesse em sua produção, considerando que se aquele que requereu sua produção não adiantar as despesas, a prova não será produzida, com consequências danosas à parte contrária. Nesse caso, ainda que a prova tenha sido requerida pelo consumidor, o fornecedor, em razão da inversão do ônus da prova, terá interesse em realizá-la, podendo assim assumir o adiantamento dos valores nesse sentido.
Infelizmente, o PLNCPC aprovado no Senado adotava o entendimento consagrado pelo Superior Tribunal de Justiça, ao prever em seu art. 358, § 2.º, que a inversão do ônus da prova não implica a alteração das regras referentes aos encargos da respectiva produção. Manifestei-me a esse respeito no sentido de que, mesmo com a aprovação da regra legal ora comentada, a consequência da ausência desse adiantamento continuaria a ser a preclusão da prova, circunstância que prejudicaria a parte que tem o ônus probatório e que, para evitar essa situação de desvantagem, teria interesse em garantir a produção da prova mediante o adiantamento de seus custos. O PLNCPC aprovado na Câmara não contém qualquer previsão a respeito do tema.
Durante muito tempo pensava-se no juiz como figura, além de imparcial, absolutamente desinteressado com o resultado do processo. Dizia-se que o bom juiz era aquele que interferia o mínimo possível no processo, deixando às partes as iniciativas postulatórias e probatórias, tudo em respeito ao princípio dispositivo. Confundia-se imparcialidade com omissão e neutralidade, preferindo-se o juiz distante ao juiz participativo. Era a época do chamado “juiz-Olimpo”.
Essa visão está intimamente ligada à ideia do processo como coisa das partes, em nítida associação do processo com o direito privado. A doutrina moderna repele tal entendimento, parecendo não haver grande dúvida entre os doutrinadores que defendem a natureza pública do processo. A partir dessa mudança de entendimento, passou-se também a encarar a missão do juiz no processo de uma nova forma, sob um novo ângulo de visão. A figura do juiz distante e desinteressado, que tudo deixava às partes, em especial no que tange ao conjunto probatório, não mais responde aos anseios de uma prestação jurisdicional de qualidade.
As justificativas que impediam a atuação oficiosa do juiz no campo probatório foram corretamente afastadas pela melhor doutrina.
Afirmava-se que, sendo o direito material disponível, a parte poderia dispor das provas, o que impediria a atuação do juiz em razão do princípio dispositivo. Para parcela da doutrina o princípio dispositivo deve expressar somente as limitações impostas ao juiz referentes aos atos processuais das partes voltados diretamente ao direito disponível, e não à sua atuação probatória56. Por outro lado, ainda que o direito seja disponível, o juiz não é obrigado a compactuar com o desleixo probatório da parte, o que naturalmente prejudica a qualidade da tutela jurisdicional prestada. Deve homologar os atos dispositivos do direito, o que não significa sacrificar a qualidade de sentença genuína de mérito em razão da ausência de prova.
O princípio da igualdade das partes não pode servir de argumento válido à proibição da produção de prova de ofício, considerando-se que a isonomia real exige um tratamento diferenciado dos sujeitos desiguais, nos limites de sua desigualdade, conforme analisado no Capítulo 2, item 2.4.5. A igualdade de partes desiguais em termos econômicos ou técnicos só poderá ser efetivada no processo com a permissão da atividade instrutória de ofício, o que evitará que a vitória ocorra em razão de superioridade econômica ou técnica de uma delas. A paridade de armas, exigência fundamental do contraditório efetivo, muitas vezes exige do juiz uma posição mais ativa na instrução probatória, como forma de igualar concretamente as chances de ambas as partes se sagrarem vitoriosas na demanda57.
Por fim, a atividade instrutória do juiz não contamina sua indispensável imparcialidade, até mesmo porque o juiz não tem condições de determinar a priori o resultado da prova, sendo incorreto imaginar que a determinação da produção de prova possa beneficiar autor ou réu. Na realidade, se a prova efetivamente convencer o juiz, seu resultado beneficiará o titular do direito material, sendo esse o objetivo precípuo da atividade jurisdicional. Por outro lado, não seria parcial o juiz que deixa de produzir prova quando possível, beneficiando a parte que não tinha o ônus de provar58? Juiz imparcial não é juiz neutro e tampouco juiz desinteressado na qualidade da prestação jurisdicional. A imparcialidade do juiz não se garante ao impedi-lo de produzir prova de ofício, mas ao exigir o respeito ao contraditório em sua produção e a motivação de suas opções no tocante ao aspecto fático da demanda59.
No sentido de confirmar os poderes instrutórios do juiz, o art. 130 do CPC admite que o juiz determine de ofício a produção de provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias. O artigo legal divide-se em duas partes, uma respeitante à possibilidade do juiz em determinar provas sem nenhum requerimento das partes e a segunda dizendo respeito à possibilidade de o juiz indeferir provas requeridas pelas partes, desde que tais provas sejam efetivamente inúteis ou protelatórias, o que afasta o perigo de cerceamento do direito de defesa.
Na primeira parte do artigo legal abre-se ao juiz a possibilidade de, mesmo diante da inércia das partes no tocante à produção probatória, a determinação de tal produção de ofício. Tal postura, permitida pela lei, deve, até mesmo pela própria lógica do sistema, somente ser adotada após as partes terem esgotado as provas que pretendiam produzir. Após a realização da prova pelas partes, e ainda havendo questão não clara ao juiz, nenhum problema haverá se o juiz determinar a sua produção de ofício.
Observe-se que, mesmo quando o juiz se lança à instrução probatória de ofício, estará adstrito aos fatos jurídicos que compõem a causa de pedir do autor e eventualmente aos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos alegados pelo réu em sua contestação. O que o art. 130 do CPC permite é simplesmente uma atuação oficiosa no que se refere à produção da prova, jamais um alargamento dos fatos que, narrados pelas partes, sempre limitarão a atividade do juiz, em respeito ao princípio dispositivo, que se bem verdade atualmente é visto com alguma ponderação, ainda é a regra geral no tocante ao interesse das partes em juízo. No tocante aos fatos secundários (simples), a atividade oficiosa é ainda maior, sendo permitido ao juiz não só a produção da prova, mas também fundamentar sua decisão em fato não alegado pelas partes, aplicando-se no caso o princípio da cooperação ao exigir a prévia oitiva das partes em contraditório.
É importante consignar que a existência da regra do ônus da prova em nada interfere nos poderes instrutórios do juiz. Pelo aspecto subjetivo já foi afirmado que a atuação oficiosa do juiz não favorece quem tinha o ônus da prova e dele não se desincumbiu, mas a parte que efetivamente tem o direito material. E também quando o ônus da prova é analisado sob o seu aspecto objetivo, ou seja, como regra de julgamento diante da ausência ou insuficiência de prova, o encargo não desaparecerá necessariamente pelo fato de o juiz ter produzido prova de ofício. Basta imaginar que, apesar de ter sido produzida por iniciativa do juiz, tal prova não tenha gerado elementos suficientes para a formação de seu convencimento. O que é preciso ficar claro é que mesmo tendo sido produzida a prova de ofício pelo juiz, tal postura ativa não o impedirá de aplicar a regra do ônus da prova sempre que a prova produzida tenha se mostrado inconclusiva.
O art. 377 do PLNCPC repete a regra constante no art. 130 do CPC/1973, consagrando o cabimento de provas determinadas de ofício pelo juiz. Poderia ter o dispositivo esclarecido que a produção de provas de ofício não é um dever do juiz, mas sim uma faculdade, não sendo nula a sentença que aplica o ônus da prova mesmo quando o juiz poderia ter produzido prova de ofício. Seria uma ótima forma de reconhecer que os chamados “poderes instrutórios” do juiz na realidade são faculdades instrutórias.
No que tange ao controle do juiz sobre a produção da prova, o art. 130 do CPC prevê que caberá ao magistrado no caso concreto indeferir as provas que entenda inúteis ou meramente protelatórias. No caso de indeferimento da prova e da não interposição de recurso, não se pode falar que tal produção tenha restado preclusa ao juiz, em ocorrência do fenômeno que a doutrina nacional indevidamente chama de preclusão pro iudicato. Permite-se que o juiz, ainda que já tenha indeferido prova por decisão irrecorrida, volte atrás em seu entendimento desde que posteriormente passe a entender ser a prova importante, hipótese na qual determinará a sua produção.
A liberdade do juiz no tocante à produção da prova, entretanto, não é ilimitada, em especial no caso de deferimento de sua produção. Uma vez deferida a produção da prova e não havendo recurso contra tal decisão, ocorrerá a preclusão pro iudicato, exigindo-se do juiz a produção de referida prova, ainda que se convença de esta não ser mais necessária. Ocorrerá, no caso, o surgimento de uma espécie de direito adquirido da parte à produção da prova, que não pode ser afrontado com a simples mudança de opinião do juiz diante do conjunto probatório. A prova só deixará legitimamente de ser produzida após o deferimento pelo juiz se ambas as partes concordarem, em razão do princípio da comunhão das provas, que torna do processo, e não de quem a requereu, até mesmo o direito concreto à prova60.
Atualmente não se fala mais em ordálias (ou juízos de Deus), sistema probatório no qual a valoração de provas era fundada em desafios físicos – como atravessar uma fileira de brasa ou se despejar óleo quente – e em consultas aos deuses. De fato, tais “meios de prova” nada provam, demonstrando tão somente uma ainda incipiente técnica processual, se é possível qualificar tal sistema de técnico. O desenvolvimento do processo, e da própria humanidade, com a desvinculação do direito da religião, demonstrou de forma clara o absurdo de tais atividades, sendo que o sistema das ordálias tem importância histórica.
No sistema da prova legal, ou prova tarifada, a carga probatória já vem preestabelecida em norma escrita, tornando o juiz um simples matemático, que somava as provas produzidas para verificar a ocorrência dos fatos alegados. Nesse sistema, valendo a prova testemunhal 1 ponto, a documental, 2 pontos e a confissão, 3 pontos, basta ao juiz somar a prova produzida e declarar vitorioso aquele que somar um maior número de pontos. Obviamente que tal sistema não é adequado, privilegiando a quantidade da prova, e não sua qualidade. Como se verá, entretanto, tal sistema não foi totalmente abandonado por nosso ordenamento, ainda que atualmente exista apenas de forma excepcional.
O sistema da prova tarifada tinha como ponto central a total ausência de liberdade ao juiz na valoração da prova, pouco importando seu convencimento no caso concreto, já que era obrigado a seguir o estabelecido em lei no tocante à carga de convencimento das provas. O sistema diametralmente oposto, chamado de livre convencimento ou persuasão íntima, no qual a liberdade do juiz é plena, também peca pelo excesso. Nesse sistema vale tão somente o convencimento íntimo do juiz, que não se vê obrigado a justificar suas escolhas, podendo até mesmo julgar contra a prova produzida caso assim lhe pareça correto. Como se nota, os extremos de nenhuma liberdade e de liberdade plena ao juiz na valoração da prova criam sistemas de valoração viciados.
Atualmente o sistema de valoração adotado pelo sistema processual brasileiro é o da persuasão racional, também conhecido pelo princípio do livre convencimento motivado, no qual o juiz é livre para formar seu convencimento, dando às provas produzidas o peso que entender cabível em cada processo, não havendo uma hierarquia entre os meios de prova. Isso, claramente, não significa que o juiz possa decidir fora dos fatos alegados no processo, mas sim que dará aos fatos alegados a devida consideração diante das provas produzidas.
Em tese, portanto, não há uma hierarquia preestabelecida da carga probatória dos meios de prova61. Diante dessa regra, não seria possível afirmar que um meio de prova é mais importante do que outro, ou que seja insuficiente para demonstrar a ocorrência de determinado fato. É possível, por exemplo, que num determinado processo a prova testemunhal desbancasse a prova pericial, ou até mesmo a confissão. E também é em razão do sistema admitido que as conclusões do laudo pericial não vinculam obrigatoriamente o juiz62. A ausência de hierarquia entre os meios de prova, entretanto, não é regra absoluta em nosso ordenamento. Tome-se como exemplo o art. 401 do CPC, praticamente repetido pelo art. 227, caput, do CC, e as hipóteses de presunção legal absoluta, resquícios do sistema da prova tarifada.
Também os arts. 215 e 225 do CC, com a indicação da prova plena no caso de escritura pública e das reproduções mecânicas. A ideia de prova plena agride frontalmente o princípio do livre convencimento motivado, não devendo ser entendida como regra absoluta, mas como simples parâmetro para a decisão judicial. Admitir que a veracidade que decorre da fé pública do oficial público é absoluta é incorrer em grave equívoco, tratando-se de presunção relativa, podendo obviamente ser afastada por meio de outras provas produzidas. Dessa forma, apesar da previsão expressa do Código Civil, é mantido, sem alterações, o sistema de apreciação da força probatória dos instrumentos públicos e das reproduções mecânicas (arts. 364 e 383 do CPC).
Note-se que o sistema do livre convencimento motivado deixa o juiz parcialmente livre na apreciação da prova. Se o peso probatório deve ser dado pelo juiz no caso concreto, não pode livremente decidir sobre tal carga probatória, devendo obrigatoriamente motivar sua decisão. Nesse sentido o disposto no art. 436 do CPC, que afirma não estar o juiz adstrito ao laudo pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos63. Até mesmo a confissão deve receber a carga devida no caso concreto, podendo perfeitamente ser enfrentada por outras provas produzidas nos autos. Dará, portanto, a carga probatória que entender cabível, mas deverá motivar sua decisão, exteriorizando as razões pelas quais deu maior força probatória a uma prova produzida em detrimento de outra.
O princípio de valoração de provas do livre convencimento motivado, previsto no art. 131 do CPC/1973, é mantido no art. 378 do PLNCPC, e nesse caso em especial o legislador perdeu excelente oportunidade de criar mecanismos mais efetivos de controle à valoração da prova pelo juiz, sendo insuficiente para esse fim a fundamentação quanto às opções valorativas. É preciso reconhecer que a exigência de fundamentação da valoração probatória não é o suficiente para evitar arbítrios judiciais, e que é preciso melhores meios de controle da atividade jurisdicional nesse âmbito.
Uma excelente forma de controle, que poderia ter sido acrescida ao princípio do livre convencimento motivado pelo PLNCPC, é o que Malatesta chamou de sociabilidade do convencimento: “O convencimento não deve ser, por outros termos, fundado em apreciações subjetivas do juiz; deve ser tal, que os fatos e as provas submetidas a seu juízo, se fossem submetidas à apreciação desinteressada de qualquer outra pessoa racional, deveriam produzir, também nesta, a mesma convicção que produziriam no juiz”64. No mesmo sentido as lições de Carlos Alberto Alvaro de Oliveira: “(...) não sendo meramente subjetiva a apreciação da prova, a exemplo do julgamento exclusivamente de direito, deve ainda respeitar as expectativas do ambiente a que se dirige e no qual a decisão há de se mostrar convincente ou pelo menos aceitável. Constituirá assim aspiração da atividade judicial, também no plano dos fatos, obter consenso o mais generalizado possível da sociedade em que inserida, no horizonte de uma decisão razoável na medida em que conformada às expectativas sociais”65.
A regra concernente à produção da prova é que esta se realize dentro do processo em que será utilizada como meio de convencimento do juiz. Em determinados casos, entretanto, em respeito ao princípio da economia processual, é possível aplicar no processo prova já produzida em outro processo, em fenômeno conhecido por “prova emprestada”. A utilização de prova já produzida em outro processo responde aos anseios de economia processual, dispensando a produção de prova já existente, e também da busca da verdade possível, em especial quando é impossível produzir novamente a prova66.
Apesar da inegável importância da possibilidade aberta às partes de se aproveitarem de prova já produzida em outro processo, há corrente doutrinária que afirma ser imprescindível que a prova tenha sido produzida entre as mesmas partes, sob pena de infração ao princípio do contraditório67. A lição deve ser admitida com reservas.
Parece correto entender que o contraditório é o limite da utilização da prova emprestada, mas esse limite deve ser analisado no caso concreto, sendo admissível que a parte que não participou da produção da prova pretenda utilizá-la contra a parte que o fez. O contraditório é justamente a conjugação da informação + possibilidade de reação + poder de influência, e caso a parte abra mão dessa reação nada haverá de irregular ou viciado. Imagine-se uma ação civil pública movida pelo Ministério Público contra uma empresa de petróleo em razão de poluição ambiental em alguma região litorânea. A perícia realizada é francamente favorável ao Ministério Público, indicando a poluição e a responsabilidade da empresa. Caso os pescadores da localidade tenham ações individuais contra a empresa poluidora cobrando seus prejuízos em razão do mesmo fato, é inegável que poderão emprestar a prova pericial produzida em processo do qual não participaram68.
Outra situação-limite interessante é aquela na qual a prova produzida em outro processo simplesmente não pode mais ser produzida, como no caso do falecimento de uma testemunha ou do perecimento do bem que serviria de objeto da perícia. Nesse caso, o juiz se verá diante de um choque inevitável de princípios: qualidade da prestação jurisdicional (com a utilização da prova em seu convencimento) e o contraditório (com a impossibilidade da parte que não participou da produção da prova de realmente reagir contra a sua formação). A solução nesse caso se dá por meio da aplicação da regra da proporcionalidade, pesando o juiz os interesses envolvidos e buscando a melhor solução com o fito de gerar o menor prejuízo possível às partes.
Na hipótese de direitos transindividuais (difusos, coletivos e individuais homogêneos), é possível que o Ministério Público instaure inquérito civil anteriormente à propositura de demanda judicial. Trata-se de procedimento administrativo facultativo de legitimidade exclusiva do Ministério Público, com o objetivo de colher elementos de convicção para embasar eventual propositura da ação coletiva, celebração de compromissos de ajustamento de conduta ou até mesmo para evitar ações sem fundamento sério. No inquérito civil, invariavelmente o contraditório não é respeitado, de forma a serem repetidas em juízo todas as provas já produzidas em tal procedimento. De qualquer forma, no caso de a prova ser de impossível produção no momento do processo, ou ainda ser muito onerosa a produção probatória, o juiz, sempre à luz do princípio do livre convencimento motivado, poderá utilizar as provas produzidas no inquérito civil para formar o seu convencimento.
É importante lembrar que a prova emprestada, respeite-se ou não o contraditório, receberá do juiz julgador a carga valorativa que entender adequada à situação concreta, aplicando-se ao caso o disposto no art. 131 do CPC. Entendo que, quanto mais o contraditório for respeitado, maior será a carga probatória das provas produzidas, em razão de sua maior confiabilidade69.
O art. 379 do PLNCPC inova ao prever a prova emprestada que, apesar de aceita na doutrina e jurisprudência, não estava prevista no CPC/1973. Segundo o dispositivo legal, o juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório. O legislador acertou ao expressamente determinar que a valoração da prova emprestada é livre ao juiz que a recebe em seu processo70, mas não foi muito claro ao condicionar o empréstimo ao contraditório.
O primeiro deriva da redação do dispositivo legal. Da forma como está redigido, é legítima a pergunta: a observação do contraditório deve ocorrer no processo de origem da prova, no de destino ou em ambos?
Como ingressa no processo com forma documental (prova documentada), o contraditório nesse processo se bastaria com a intimação das partes para se manifestarem sobre as provas. O respeito ao contraditório no processo de origem da prova cria divergência na doutrina: para alguns as partes devem necessariamente ser as mesmas no processo de origem e no processo de destino71, enquanto outros entendem que as partes podem ser diferentes, desde que o sujeito que não participou do processo de origem aceite o empréstimo da prova72.
Imagino que o respeito ao contraditório exigido pelo art. 379 do PLNCPC se refira tanto ao processo de origem como ao processo de destino, sendo exigido na produção da prova oral ou pericial e na sua utilização como prova documentada.
E nesse sentido parece que o contraditório passa a ser condição de admissibilidade da prova emprestada. Concordo que, sendo possível a repetição da prova, a economia processual que seria obtida com o empréstimo da prova não seja suficiente para o afastamento do contraditório. Entretanto, e no caso em que a repetição da prova é impossível e ela é indispensável à formação do convencimento do juiz? Nesse sentido, haverá um choque inevitável de princípios: qualidade da prestação jurisdicional (com a utilização da prova em seu convencimento) e o contraditório (com a impossibilidade da parte que não participou da produção da prova de realmente reagir contra a sua formação).
Entendo que, nesse caso, a solução do impasse se dá por meio da aplicação da regra da proporcionalidade, pesando o juiz os interesses envolvidos e buscando a melhor solução com o fito de gerar o menor prejuízo possível às partes. E, quanto maior tiver sido o contraditório no processo de origem, ainda que sem a participação do sujeito que é parte no processo de destino, maior a carga de convencimento da prova. Acredito que mesmo diante da redação do dispositivo ora comentado é possível a adoção de tal entendimento.
Para tradicional corrente doutrinária, prova ilegal é toda prova produzida com ofensa à norma legal, podendo ser dividida em:
(a) prova ilegítima, quando violar norma de direito processual, verificável no momento da produção da prova no processo;
(b) prova ilícita, quando violar norma de direito substancial, verificável no momento da colheita da prova.
Nesse entendimento, a distinção se justifica em decorrência das consequências advindas dessas duas espécies de prova ilegal:
(i) provas ilegítimas se referem à admissibilidade dos meios de prova;
(ii) provas ilícitas são capazes de gerar a ampla responsabilidade pela lesão do direito material violado.
A ilegitimidade, assim, diz respeito ao modo pelo qual a prova foi obtida, em situação na qual o meio de prova em si é jurídico e permitido pela lei, mas a forma de produção da prova é viciada, como a colheita de prova testemunhal mediante a ameaça de morte ou qualquer outra espécie de coação, bem como a assinatura de contrato sob tortura. A ilicitude se daria quando o próprio meio de produção da prova é injurídico ou imoral, como as gravações clandestinas de conversas telefônicas ou filmagens também clandestinas sem a devida autorização judicial.
A distinção entre provas ilícitas e ilegítimas pode ser mantida desde que se tenha claro que as consequências da ilegalidade da prova não dependem da natureza da norma violada. Doutrina autorizada ensina corretamente que mais importante que a distinção entre prova ilícita ou ilegítima, tomando-se a tradicional classificação, é determinar a gravidade da violação. Trata-se da noção de provas inconstitucionais, produzidas com ofensa a normas materiais ou processuais, sempre que violarem direito fundamental garantido na Constituição Federal. Uma ofensa à norma de direito processual (publicidade) pode ser tão inconstitucional quanto a ofensa a uma norma de direito material (preservação do direito de intimidade-privacidade)73.
O art. 5.º, LVI, da CF prevê que “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”. O dispositivo constitucional não prevê a proibição da produção de prova ilícita, até porque seria uma proibição inócua, limitando-se a proibir que o juiz as utilize como elemento na formação de seu convencimento.
Apesar da expressa vedação constitucional à utilização de prova ilícita pelo juiz na formação de seu convencimento, é possível a identificação de três correntes a respeito do tema: restritiva, liberal e intermediária.
A corrente restritiva é bastante rígida no trato da prova ilícita, não admitindo em nenhuma hipótese sua utilização no processo civil. Fundando-se no art. 5.º, LVI, da CF e no art. 332 do CPC, os defensores dessa corrente afirmam que a ausência de ressalva nos textos legais impede qualquer consideração valorativa no caso concreto para que se permita a utilização das provas ilícitas. Num conflito entre a possível verdade que seria atingida pela utilização da prova e a sua ilicitude, a corrente restritiva prefere privilegiar a segunda, entendendo legítimo o sacrifício da verdade para se preservar direitos que seriam violados com a produção da prova ilícita.
Advém dessa corrente a teoria dos frutos podres da árvore envenenada (fruits of the poisonous tree), não se admitindo provas sem nenhuma ilicitude que tenham sido produzidas como desdobramento de uma prova obtida de forma ilícita. Os adeptos dessa tese defendem, por exemplo, que eventual testemunho de sujeito que tenha sido mencionado em fita gravada clandestinamente deverá ser desconsiderado, ainda que a prova seja lícita em seu meio e na forma de sua obtenção, já que derivada da prova obtida ilicitamente.
Importante notar que essa teoria, importada do direito norte-americano, encontra certas limitações em seu próprio país de origem. Para que a chamada prova ilícita por derivação não seja admitida, deve-se observar:
(a) nexo de causalidade, ou seja, a contaminação só atinge as provas que tenham efetivamente derivadas da prova ilícita (hipothetical independet source rule ou independent source limitation);
(b) descoberta inevitável (inevitable discovery), ou seja, a prova deve ser admitida sempre que se demonstre que seria possível obtê-la por meios lícitos74;
(c) limitação da descontaminação (purged taint limitation), quando o vício pode ser convalidado mediante acontecimento posterior, como ocorre na confissão espontânea da parte75.
O Supremo Tribunal Federal, em decisão que aplica a teoria da ilicitude por derivação, aponta para a admissão de prova na hipótese de a prova não ter nenhuma relação de dependência nem decorrer da prova originariamente ilícita, com esta não mantendo vinculação causal (an independent source)76.
Em sentido diametralmente oposto da corrente restritiva (obstativa) encontra-se a corrente liberal (permissiva), amparada no irrestrito direito de o juiz conhecer a verdade a respeito dos fatos. Para essa corrente, o direito constitucional à prova é superior a qualquer outro que se busque resguardar com a vedação de sua utilização no convencimento do juiz. A parte que produz uma prova ilícita deve responder pela ilicitude de seu ato, mas tal circunstância não pode sacrificar a boa qualidade da prestação jurisdicional. Essa corrente, que atualmente não encontra defensores de relevo no Brasil, além de contrariar o texto constitucional expresso, considera a prova um fim em si mesmo, o que é de todo desaconselhável.
Entre as duas correntes surge uma intermediária, em meu sentir a mais adequada dentre as três no trato da matéria. Negando ser o princípio constitucional da prova ilícita absoluto – como no mais nenhum princípio jamais será –, essa corrente doutrinária defende que, dependendo das circunstâncias, em aplicação do princípio da proporcionalidade, é possível a utilização da prova ilícita, o que não impedirá a geração de efeitos civis, penais e administrativos em razão da ilicitude do ato77. Trata-se de corrente majoritária na doutrina brasileira78.
Para a majoritária corrente doutrinária que permite o afastamento do óbice da vedação constitucional pela aplicação do princípio da proporcionalidade, algumas condições são exigidas para a utilização da prova ilícita na formação do convencimento do juiz79:
(a) gravidade do caso;
(b) espécie da relação jurídica controvertida;
(c) dificuldade de demonstrar a veracidade de forma lícita;
(d) prevalência do direito protegido com a utilização da prova ilícita comparado com o direito violado;
(e) imprescindibilidade da prova na formação do convencimento judicial.
Há interessante decisão do Supremo Tribunal Federal, no qual se admitiu interceptação telefônica determinada por juízo cível com o fundamento de que, apesar de expedida em processo de natureza civil, a medida seria importante para a verificação de possível crime. Apesar da engenhosidade da fundamentação, fica claro que a decisão adota a teoria proporcionalista ao afirmar que os interesses do menor envolvido poderiam superar o direito ao sigilo80.
A teoria proporcionalista, amplamente majoritária, teve seu entendimento consagrado pelo art. 257, parágrafo único, do PLNCPC originário, ao prever que a inadmissibilidade das provas obtidas por meio ilícito será apreciada pelo juiz à luz da ponderação dos princípios e direitos fundamentais envolvidos. Fiquei curioso em saber como o Supremo Tribunal Federal entenderia tal dispositivo legal infraconstitucional quando o texto constitucional é claro ao prever uma inadmissibilidade absoluta na área cível. Minha curiosidade, entretanto, não será saneada, porque no PLNCPC aprovado pela Câmara a regra foi suprimida.
Vigora no direito brasileiro a regra de que não existe em lei rol restritivo dos meios de prova, sendo essa conclusão fundamentada no expresso texto do art. 332 do CPC. Os meios de prova previstos no diploma processual são meramente exemplificativos, admitindo-se que outros meios não previstos também sejam considerados, desde que não contrariem a norma legal. Trata-se da chamada “prova atípica”, sendo indicados como exemplos:
(a) prova emprestada;
(b) constatações realizadas pelo oficial de justiça;
(c) inquirição de testemunhas técnicas (expert witness);
(d) declaração escrita de terceiro;
(e) ata notarial.
Entende-se que não se deve admitir a prova atípica quando ofensiva ao contraditório, bastando para o respeito ao princípio constitucional a viabilidade de reação à prova já produzida, não sendo exigida a participação das partes em sua formação. Também não se devem aceitar como prova atípica as provas típicas consideradas nulas ou inadmissíveis por não respeitarem as regras que disciplinam sua formação ou expressamente excluídas por normas de direito material ou processual81.
O art. 376 do PLNCPC repete a regra prevista no art. 332 do CPC/1973 quanto à admissibilidade das chamadas provas atípicas, que não estão especificadas no Código, desde que produzidas por meios moralmente legítimos. O legislador poderia ter aproveitado a oportunidade para regulamentar de maneira mais adequada a admissibilidade da prova atípica, até porque o termo legal “moralmente legítima” mistura indevidamente a moral com o Direito.
A ata notarial passa a ser prevista expressamente no PLNCPC, tornando-se, portanto, prova típica. Existe apenas um dispositivo regulamentando a ata notarial, o que deve ser elogiado, considerando que a produção dessa prova também deverá atender às regras cartoriais. Segundo o art. 391, caput, do PLNCPC, a existência e o modo de existir de algum fato podem ser atestados ou documentados pelo tabelião desde que requerido pelo interessado. O legislador foi bem ao prever interessado e não parte, considerando que a ata notarial só se justifica como prova pré-constituída, até porque o tabelião pode fazer a certificação antes mesmo do oficial de justiça, durante o processo judicial.
O parágrafo único prevê ser possível que imagens e sons gravados em arquivos eletrônicos possam constar da ata notarial, em medida saudável considerando que imagens e sons podem corroborar a alegação do tabelião, já dotada de fé pública. Quem sabe se o dispositivo já existisse teria eu conseguido fazer uma ata notarial que diversos Cartórios de Notas de São Paulo se recusaram a produzir tempos atrás.
Eu, como morador do bairro de Perdizes, domiciliado em prédio próximo à PUC, não tenho sossego em razão de festas absurdas que varam a madrugada quando a faculdade está supostamente fechada82. Para dar ingresso em pedido para instauração de inquérito civil, tentei fazer uma ata notarial para atestar as festas e o barulho infernal. Não sei bem se por medo, por preguiça ou por ignorância, em todos os Cartórios que liguei me foi recusado o serviço. Bastaria ao tabelião – na realidade a um funcionário do cartório – comparecer às cercanias da PUC, olhar as pessoas em festa, atestar o barulho e gravar tudo em som e/ou imagem, exatamente como prevê o dispositivo legal ora comentado. Mas sem a norma legal não foi possível conseguir a ata notarial, ainda que não exista nas Normas da Corregedoria-Geral da Justiça de São Paulo qualquer impedimento para tanto.
O depoimento pessoal é espécie de prova oral, sendo conceituado como o testemunho das partes em juízo sempre que requerido expressamente pela parte contrária. É importante colocar as partes diretamente diante do juiz, sem o filtro criado pelos advogados quando elaboram suas razões. Muitas vezes, inclusive, o depoimento pessoal pode mostrar que as coisas não se deram exatamente como narrado pelo advogado na petição inicial ou contestação.
Apesar de constituir-se em testemunho da parte, o depoimento pessoal não se confunde com a prova testemunhal, em razão dos sujeitos que prestam as declarações em juízo. Somente poderão prestar depoimento pessoal os sujeitos que figurem na relação jurídica processual como partes na demanda. Dessa forma, tanto o autor quanto o réu poderão prestar depoimento pessoal, assim como os terceiros intervenientes que assumem a posição de parte na demanda. O assistente simples, por não ser parte na demanda, mas mera parte no processo, não presta depoimento pessoal, sendo ouvido como testemunha83.
Também não se confunde o depoimento pessoal com a prova pericial, ainda que as partes tenham amplo conhecimento técnico sobre a matéria fática debatida no processo. Enquanto a prova pericial deve ser conduzida por um terceiro desinteressado na solução do processo (até mesmo porque se for interessado deverá ser afastado do encargo), o depoimento pessoal será sempre prestado por sujeito diretamente interessado no resultado do processo. Aponte-se, ainda, para a possibilidade de o perito ser chamado para prestar esclarecimentos em audiência, o que poderá fazer oralmente. Ainda assim, em razão do sujeito que produz a prova, não se confundirá com o depoimento pessoal prestado por uma das partes.
Tradicionalmente, o depoimento pessoal era visto pela doutrina como meio de prova que tinha como único e exclusivo objetivo a confissão. Tal ponto de vista se justifica na circunstância de que os sujeitos que produziam essa espécie de prova eram sempre os maiores interessados na solução da demanda, não havendo assim a imparcialidade e o compromisso com a verdade que dão credibilidade à prova oral. Dessa forma, o depoimento pessoal não poderia servir para favorecer a parte que o prestava; pelo contrário, quando a parte afirmasse fatos que lhe favorecessem, deveria o depoimento ser encarado com reservas, diante do nítido interesse da parte envolvida no litígio.
Ocorre, entretanto, que o contato pessoal do juiz com as partes pode, em razão da aplicação do livre convencimento motivado do juiz, esclarecer alguns fatos que não tenham chegado ao seu conhecimento somente após o filtro do patrono que subscreve as peças processuais. Não seria absurdo, portanto, imaginar uma situação em que o depoimento pessoal favoreça a parte que o prestou, devendo o juiz, entretanto, sempre levar em consideração o interesse direto da parte em se sagrar vitoriosa na demanda.
O depoimento pessoal não pode ser determinado de ofício pelo juiz, considerando-se que sempre que isso ocorrer haverá o interrogatório da parte, instituto diverso do depoimento pessoal. Se não pode ser determinado de ofício pelo juiz, deve ser requerido expressamente pela parte contrária, não se admitindo o pedido de depoimento pessoal pela própria parte. Tanto pode o autor requerer o depoimento pessoal do réu quanto pode o réu requerer o depoimento pessoal do autor. Mas também os terceiros intervenientes podem requerer o depoimento pessoal dos sujeitos processuais que se encontrem em posição processual contrária àquela que assumem no processo.
O Ministério Público tem atuação no processo civil como parte ou como fiscal da lei. Nas situações em que funciona como parte, não surgem maiores questionamentos, seguindo-se a regra geral que permite o requerimento para o depoimento pessoal da parte contrária. Quando atua como fiscal da lei, não é possível falar em parte contrária, mas ainda assim o Ministério Público pode requerer o depoimento pessoal de ambas as partes.
No tocante ao sujeito responsável pelo depoimento pessoal, será sempre pessoa física, inclusive no caso de ser parte no processo pessoa jurídica, quando o depoimento pessoal será tomado de seu representante legal ou de preposto devidamente constituído com poderes para confessar. No depoimento pessoal vigora o princípio da pessoalidade e indelegabilidade, tratando-se de ato personalíssimo84. Registre-se a existência de parcela doutrinária que, mesmo sendo a parte uma pessoa física, entende ser possível o depoimento pessoal por meio de procurador com poderes específicos para confessar85.
A possibilidade de procuradores deporem pessoalmente em juízo no lugar da parte abriria a possibilidade de sujeitos imbuídos de má-fé indicarem para seu lugar pessoas com maior poder de persuasão, não para dizer necessariamente a verdade, mas sim na tentativa de ludibriar o juiz a respeito da matéria fática da demanda. Apesar de o juiz ser considerado um “detector de mentiras humano”, em razão das sucessivas audiências de que participa, essa é uma situação que não pode ser descartada, sendo o melhor entendimento aquele que aponta para a pessoalidade (ato personalíssimo) do depoimento pessoal. Tal regra, entretanto, não se aplica às situações em que a pessoa física for incapaz, sendo nesse caso o depoimento pessoal colhido por meio de seu representante legal86.
Conforme já afirmado, tratando-se de pessoa jurídica, o depoimento pessoal deveria em tese ser realizado por meio de seu representante legal87. Ciente da enorme dificuldade que tal exigência ocasionaria a grandes empresas, frequentemente clientes do Poder Judiciário, no sentido de que se tivessem que enviar seus representantes legais para todas as audiências em que fosse requerido seu depoimento pessoal, jamais teria número suficiente de representantes para todos os processos, abre-se a possibilidade da representação por meio de preposto com poderes especiais para confessar e com conhecimento da matéria fática do processo88. O preposto não precisa manter vínculo empregatício com a pessoa jurídica, conforme expressamente previsto no art. 9.º, § 4.º, da Lei 9.099/1995 (Lei 12.137/2009).
O depoimento pessoal pode gerar diferentes efeitos, dependendo da presença da parte na audiência de instrução – momento propício para a produção desse meio de prova –, de sua postura em tal audiência e de seus conhecimentos efetivos acerca dos fatos discutidos na demanda judicial.
Sempre que for requerido o depoimento pessoal da parte, deverá ela ser intimada pessoalmente do ato processual a ser praticado, não bastando a mera intimação de seu patrono que, afinal, não será o responsável pelo depoimento pessoal. Além da intimação pessoal, deverá constar do mandado que se presumirão confessados os fatos contra ela alegados no caso de não comparecimento ou de recusa injustificável em depor (art. 343, § 1.º, do CPC), devendo a intimação ser realizada sempre ao menos 24 horas antes da realização da audiência.
A presença da parte em audiência não é um dever processual, sendo inadmissível a aplicação de qualquer espécie de sanção pelo seu não comparecimento. O depoimento pessoal é um ônus da parte, que, não se desincumbindo dele, se colocará numa situação processual de desvantagem. Assim, diferentemente da testemunha devidamente intimada, não deverá ser conduzida coercitivamente à presença do juiz, sendo também inconcebível a tipificação de crime de desobediência. Há, entretanto, importante efeito processual derivado da ausência da parte devidamente intimada para depor pessoalmente em juízo: a confissão tácita, dando-se por verdadeiros os fatos alegados pela outra parte e contrários ao interesse da parte ausente.
Não basta, entretanto, que a parte simplesmente compareça em juízo, devendo responder as perguntas que lhe são feitas pelo juiz e pelo advogado da parte contrária. O silêncio da parte, negando-se a responder as perguntas, ou o fazendo evasivamente, gera a mesma consequência de sua ausência na audiência, dando o juiz os fatos alegados pela parte contrária como confessados. O silêncio não gerará tal consequência nos casos previstos pelo art. 347 do CPC, combinados com o art. 229 do CC, situações em que o depoente poderá silenciar sem que os fatos perguntados sejam tidos por confessados. A parte estará dispensada de depor nos casos de fatos criminosos ou torpes que lhe forem imputados e fatos a cujo respeito, por estado ou profissão, deva guardar sigilo. O silêncio, ainda que nesses casos, não será admitido no caso de tratar-se de ações de filiação, divórcio ou anulação de casamento.
Teoricamente, o silêncio gerado pela ignorância quanto ao fato alegado em juízo não deveria ser considerado como recusa em responder. Não tendo a parte conhecimento do fato alegado pela parte contrária, não haverá, em tese, confissão, já que nesse caso o silêncio não é fruto de má-fé, mas sim de desconhecimento sobre a matéria fática, sendo impossível forçar alguém a responder sobre o que não sabe. Essa regra, entretanto, só deve ser aplicada para os casos em que o desconhecimento seja justificável, o que deve ser apurado no caso concreto. No caso de prepostos indicados pela pessoa jurídica, parcela da doutrina e até mesmo algumas decisões judiciais apontam para a confissão de preposto que, embora regularmente esteja representando a pessoa jurídica, desconhece por completo os fatos alegados89.
Tal entendimento, entretanto, deve ser visto com todo o cuidado necessário para evitar injustiças com a pessoa jurídica, em especial nos casos envolvendo fatos passados muito remotos. Tome-se como exemplo uma ocorrência em uma determinada agência bancária, envolvendo problemas de ingresso do cliente pela porta giratória. No caso de o evento ter ocorrido há poucos meses e a instituição financeira indicar como preposto gerente de outra agência, que nada sabe do ocorrido, é justificável a confissão. Outra situação bem diferente se dá quando o fato ocorreu há muitos anos e todos os funcionários da agência à época já não compõem mais o quadro de funcionários da instituição financeira. Decretar a confissão nesse segundo caso não é o mais adequado porque a pessoa jurídica tomou todas as diligências possíveis para levar à audiência um patrono que tivesse conhecimento dos fatos. Cobra-se do juiz, portanto, a análise do caso concreto, verificando se seria possível à pessoa jurídica enviar preposto qualificado a responder as perguntas.
A confissão expressa também poderá ocorrer em audiência, bastando que a parte, em seu depoimento pessoal, responda afirmativamente a perguntas que tenham como objeto fatos contrários a seu interesse.
Como todo meio de prova, o depoimento pessoal se desenvolve em quatro fases procedimentais: propositura; admissibilidade, produção e valoração.
O momento adequado para a propositura é a petição inicial para o autor e a contestação para o réu90. Admitido na praxe forense a mera indicação genérica dos meios de prova previstos em lei nesse momento de primeira manifestação postulatória das partes, ao menos no procedimento ordinário, a propositura específica do depoimento pessoal se dá invariavelmente ao final da fase postulatória, quando o juiz determina às partes a especificação dos meios de prova que pretendem produzir.
A admissibilidade da prova será matéria do saneamento do processo que, segundo o disposto no art. 331 do CPC, ocorrerá de forma oral (audiência preliminar) ou por escrito por meio da decisão saneadora. Seja como for, trata-se de decisão interlocutória, recorrível por agravo.
A produção da prova divide-se em duas fases: preparação e realização. A preparação da prova antecede a audiência de instrução, constituindo-se na intimação da parte para que compareça em juízo sob pena de confesso. Tal intimação, obrigatoriamente pessoal, pode se realizar tanto por correio como por oficial de justiça, preferindo-se, sempre que possível, a primeira forma, por ser mais rápida, simples e barata. A realização se dá na audiência de instrução e julgamento, seguindo basicamente a forma prescrita para a oitiva das testemunhas, com a diferença de que no depoimento pessoal o patrono da parte que depõe não pode lhe fazer perguntas91. Primeiro as perguntas do juiz, depois as perguntas do advogado da parte contrária e, por fim, as perguntas do Ministério Público, quando funcionar no processo como fiscal da lei.
Quando ambas as partes forem intimadas para depor pessoalmente e comparecerem à audiência, o autor será ouvido antes, devendo o réu se ausentar da sala de audiência para não ter conhecimento desse depoimento quando for depor. Após o depoimento do autor, será realizado o depoimento do réu, não havendo necessidade de o autor se retirar da sala de audiências92. Caso somente uma das partes seja submetida ao depoimento pessoal, a outra não será retirada da sala de audiências. A tomada de depoimento pessoal das partes é a primeira atividade instrutória da audiência, com exceção dos casos em que o perito é chamado para prestar esclarecimentos, quando será o primeiro a ser ouvido. Essa ordem será invertida quando o réu advogar em causa própria, caso em que será ouvido antes do autor. Se ambas as partes estiverem advogando em causa própria, o juiz indicará um advogado dativo para o réu com a única tarefa de acompanhar o depoimento pessoal do autor.
Como ocorre na prova testemunhal, a parte não poderá trazer por escrito suas explicações, devendo responder sem o auxílio de escritos às perguntas que lhe forem feitas. Poderá, entretanto, consultar breves notas com a finalidade de completar os esclarecimentos, bem como manusear os autos caso necessite de alguma informação mais precisa lá constante, como um endereço exato ou ainda um nome completo.
Apesar de o momento adequado para a produção do meio de prova ora analisado ser a audiência de instrução e julgamento, admite-se excepcionalmente que o depoimento pessoal seja prestado em outro momento processual. No caso de a parte residir em outra comarca, será realizada a prova por meio de carta precatória, e a exemplo da prova testemunhal, caso não possa comparecer à sede do juízo, por enfermidade, idade avançada, ou qualquer outro obstáculo material instransponível, a prova será produzida fora da audiência. O mesmo se diga da parte considerada autoridade de elevado nível (art. 411 do CPC), que será ouvida em lugar e horário por ela escolhidos.
Quanto à valoração, como todo meio de prova, o depoimento pessoal será valorado no momento em que o juiz proferir sua sentença, quando deverá na fundamentação de sua decisão exteriorizar as cargas de convencimento dadas no caso concreto para cada meio de prova produzido.
O art. 342 do CPC confunde de forma indevida o interrogatório com o depoimento pessoal, tomando ambos os meios de prova como idênticos, quando a doutrina reconhece sua semelhança, mas também aponta suas diversidades. Segue quadro comparativo:
DEPOIMENTO PESSOAL | INTERROGATÓRIO |
Requerimento da parte contrária. | Determinação de ofício. |
Objetivo: é a confissão (expressa ou tácita). Como objetivo secundário está o esclarecimento dos fatos. | Objetivo: é o esclarecimento dos fatos. Não há confissão tácita (no caso de ausência gera-se presunção de veracidade). É possível a confissão expressa. |
Realização em audiência de instrução. | Realização a qualquer momento do processo. |
Geralmente colhido apenas uma vez. | Podem existir tantos interrogatórios quantos o juiz entender necessário. |
Advogado da parte contrária pode fazer perguntas. | As perguntas são privativas do juiz. |
O CPC/1973 é criticado por não distinguir com exatidão dois meios de provas diferentes: o depoimento pessoal e o interrogatório. No PLNCPC não existe o interrogatório, que deixou de ser meio de prova, transformando-se em produção do depoimento pessoal. Acredito que a medida tenha sido salutar, considerando ser prática quase inexistente a realização de interrogatório no processo civil.
Segundo o art. 392, caput, do PLNCPC, cabe à parte requerer o depoimento pessoal da outra ou o juiz determiná-lo de ofício. Ainda que omissa a lei, também pode ser pedido o depoimento pessoal das partes pelo Ministério Público quando funcionar como fiscal da ordem jurídica. Assim já era diante da omissão do CPC/197393 e continuará sendo no PLNCPC. O momento adequado para a oitiva (o dispositivo prefere o termo interrogatório) é a audiência de instrução.
A parte continua a ser intimada pessoalmente e informada de que sua ausência na audiência ou recusa em responder às perguntas gerará a confissão. Triste notar que o art. 392, § 1.º, do PLNCPC, a exemplo do que fazia o art. 343, § 2.º, do CPC, mantém a confissão tácita gerada pela postura de ausência ou silêncio do depoente à ideia de pena, como se um meio de prova pudesse ter natureza de sanção processual. Mais uma ótima oportunidade perdida de melhorar a redação do Código de Processo Civil.
De novidade tem-se o art. 392, § 3.º, que admite expressamente que o depoimento pessoal seja realizado por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens quando o depoente residir em foro diverso daquele que tramita o processo. Realmente não compreendo por que o legislador não utiliza o gênero foro, preferindo exaurir as espécies – comarca, seção e subseção judiciária, mas confesso que na prática em nada importa a exótica opção. Pelo menos o legislador deixou de associar como sinônimos “foro” e “comarca”, lembrando que o CPC também regulamenta o processo na Justiça Federal.
Os dois incisos já existentes no art. 347 do CPC/1973 quanto à dispensa do dever de responder as perguntas são repetidos nos dois primeiros incisos do art. 395 do PLNCPC, que ainda traz mais dois incisos: (III) fatos a que o depoente não possa responder sem desonra própria, de seu cônjuge, de seu companheiro ou de parente em grau sucessível e (IV) fatos que coloquem em perigo a vida do depoente ou das pessoas referidas no inciso anterior. O que parece uma novidade, entretanto, e apenas a inclusão adaptada dos incisos II e III do art. 229 do CC.
Por fim, o parágrafo único do art. 395 do PLNCPC adéqua generalizando as hipóteses do parágrafo único do art. 347 do CPC/1973 em que a recusa a depor não será admitida. Saem em boa hora as “ações de filiação, de desquite e de anulação de casamento” e entram em seu lugar as “ações de estado e de família”.
Segundo o art. 348 do CPC, há confissão quando a parte admite a verdade de um fato contrário ao seu interesse e favorável ao adversário. Como se nota do conceito legal, a confissão envolve três elementos:
(a) reconhecimento de um fato alegado pela parte contrária;
(b) voluntariedade da parte que reconhece o fato;
(c) prejuízo ao confitente decorrente de seu ato.
Apesar de o Código de Processo Civil prever que a confissão é um meio de prova, em opção adotada por parcela da doutrina94, entendo mais adequado o entendimento de que a confissão é na realidade o resultado de outros meios de prova, tais como o depoimento pessoal e a prova documental95. Dessa forma, não se constituindo em técnica para extrair de fontes de prova a veracidade das alegações de fato, a confissão, como declaração de conhecimento de fatos desfavoráveis, é quando muito objeto de um meio de prova, mas nunca meio de prova96.
A doutrina corretamente aponta a distinção entre a confissão e atos de disposição de direito material, tais como a renúncia e o reconhecimento jurídico do pedido, fenômenos processuais que levam o juiz à homologação por sentença de mérito do ato de disposição de vontade praticado unilateralmente pela parte. A confissão limita-se aos fatos, de maneira que, mesmo havendo confissão, o prejuízo a ser suportado pelo confitente fica limitado ao plano fático, de modo que o confitente pode perfeitamente se sagrar vitorioso na demanda, desde que o direito legitime seu interesse97.
Para que a confissão seja considerada eficaz devem ser preenchidos três requisitos:
(a) o confitente deve ter capacidade plena (art. 213, caput, do CC), não podendo confessar os incapazes ou seus representantes legais98;
(b) inexigibilidade de forma especial para a validade do ato jurídico99 como, por exemplo, ocorre no casamento ou falecimento, que exigem para sua demonstração as respectivas certidões;
(c) disponibilidade do direito relacionado ao fato confessado, não se admitindo a confissão de fatos que fundamentam direitos indisponíveis (art. 351 do CPC).
No tocante à incapacidade da parte, cumpre observar que o art. 213 do CC aponta corretamente o vício da confissão realizada por quem não é capaz de dispor do direito a que se referem os fatos confessados: ineficácia. Dessa forma, a declaração de admissibilidade de um fato não gera o efeito de confissão se a parte não pode dispor dos direitos que foram o objeto da confissão. Ainda que não se trate de confissão, a declaração da parte continua a ser valorada pelo juiz, como prova atípica. Será ineficaz como confissão, mas não inválida como prova, sendo por esse motivo permitido ao juiz levar em conta o ato praticado pela parte na formação de seu convencimento.
Aduz o art. 348 do CPC que a confissão pode ser judicial ou extrajudicial. A confissão judicial é feita nos autos, mediante atos do processo, tais como a contestação, a réplica e o depoimento pessoal.
A confissão judicial pode ser espontânea ou provocada, realizada pela própria parte ou por representante com poderes específicos para confessar (art. 349, parágrafo único, do CPC). Como ensina a melhor doutrina, a confissão promovida por representante sem poderes é ineficaz como ato jurídico, podendo, entretanto, ser ratificada posteriormente pelo titular do direito, em consonância com a combinação dos arts. 172 e 185 do CC100, e ser considerada como prova atípica pelo juiz.
A confissão provocada resulta do depoimento pessoal, podendo ser real, quando a parte efetivamente responde as perguntas que lhe são dirigidas confessando determinados fatos, e ficta, quando a parte deixa de comparecer à audiência de instrução ou se nega injustificadamente a responder objetivamente as perguntas que lhe são feitas.
A confissão espontânea é realizada fora do depoimento pessoal, podendo ser tanto oral, hipótese em que o juiz documentará a confissão nos autos mediante a elaboração de termo (art. 349, caput, do CPC), como escrita (mais frequente na praxe forense).
A confissão extrajudicial é realizada fora do processo, de forma escrita ou oral, mas nesse caso só terá eficácia se a lei não exigir a forma escrita (art. 353, parágrafo único, do CPC). Segundo o art. 353, caput, do CPC, a confissão extrajudicial escrita feita à parte ou a quem a represente tem a mesma eficácia probatória da judicial, e, sendo feita a terceiro, ou contida em testamento, será livremente apreciada pelo juiz. O dispositivo despreza o princípio do livre convencimento motivado do juiz, porque, independentemente de como a confissão extrajudicial é realizada, caberá ao juiz no caso concreto a valoração de sua carga de convencimento101.
Independentemente da espécie de confissão, e ainda que se admita que algumas delas tenham em regra uma força probatória maior do que outras (é natural que na confissão extrajudicial a escrita tenha em tese maior força que a oral; que a confissão real tenha, em tese, maior força que a confissão ficta102), é importante ressaltar que, qualquer que seja a espécie de confissão, nenhuma delas é prova plena, sendo meramente histórico o tratamento da confissão como a “rainha das provas”. Apesar de sua inegável importância, dentro do sistema da persuasão racional, o juiz não está adstrito à confissão na formação de seu convencimento, podendo se valer de outros meios de prova para afastar a carga de convencimento da confissão103.
Prevê o art. 354 do CPC o princípio da indivisibilidade da confissão, por meio do qual não pode a parte, se quiser invocar a confissão como prova, aceitá-la no tópico que a beneficiar e rejeitá-la no que lhe for desfavorável. Partindo-se do pressuposto de que a confissão só existe relativamente a fatos prejudiciais à parte confitente, o dispositivo legal parece incompreensível, o que inclusive levou parcela da doutrina a entender que a indivisibilidade não é da confissão, mas do depoimento ou declaração da parte que a contenha104.
Na compreensão do dispositivo legal é importante distinguir confissão simples da confissão complexa. Enquanto na primeira hipótese o confitente se limita a tratar de fatos contrários ao seu interesse, na segunda, além de fatos contrários ao seu interesse, também haverá a alegação de fatos novos favoráveis ao confitente. Para parcela da doutrina, a aplicabilidade do princípio da indivisibilidade se limita à confissão complexa105, mas em meu entendimento mesmo nessa forma de confissão o princípio continua a ser incompreensível, porque continuo a entender que fatos favoráveis à parte nunca serão objeto de confissão. A não ser na extravagante hipótese de uma declaração de fato ser ao mesmo tempo favorável e desfavorável à parte, a indivisibilidade realmente não é da confissão, mas da declaração que contém como um de seus elementos a confissão.
Ocorre, entretanto, que o próprio art. 354 do CPC abre uma exceção ao princípio da indivisibilidade da declaração de fatos (e não da confissão), sempre que o confitente, além dos fatos desfavoráveis a seu interesse, aduzir fatos novos, suscetíveis de constituírem fundamento de defesa de direito material (defesa de mérito indireta) e de reconvenção. Como se nota do próprio dispositivo legal, ainda que o réu concorde com os fatos constitutivos do direito do autor (confissão), alegando outros fatos constitutivos, impeditivos ou extintivos desse direito, o fato constitutivo será objeto de confissão, mas o ônus da prova dos fatos novos pelo réu continua a existir106.
O art. 352 do CPC menciona a possibilidade de revogação da confissão, no que desde sempre foi criticado pela melhor doutrina que enfrentou o tema. É unânime a doutrina a apontar para a irrevogabilidade da confissão; eventuais vícios da confissão levam à sua invalidação, e nunca à sua revogação107.
Diante da crítica, elogiável o art. 214 do CC, ao corretamente indicar que o erro e a coação são vícios que permitem a invalidação da confissão, e não sua revogação. Aliás, nesse tocante mais uma modificação correta; a exclusão do dolo como vício capaz de invalidar a confissão. A melhor doutrina há muito tempo já afirmava a impropriedade do diploma processual ao apontar essa espécie de vício como apto a ensejar a invalidação da confissão. O dolo, resultado da astúcia de alguém – geralmente da parte contrária – para um sujeito confessar, somente passa a ter relevância para fins de invalidação do ato se tiver gerado um erro na confissão, mas nesse caso a repetição dos vícios se mostrava desnecessária.
O dolo, no máximo, poderá dizer respeito aos motivos pelos quais a parte confessou, não atingindo, entretanto, o objeto da confissão. Dessa forma, ainda que a confissão tenha ocorrido em virtude de indução e malícia da parte contrária, o ato jurídico da confissão, em seu conteúdo, não conterá vício nenhum, de modo a ser impossível defender a possibilidade de invalidação do ato jurídico108. A exceção, como já afirmado, fica por conta da hipótese de o dolo induzir a parte em erro, mas nesse caso a invalidação decorre justamente do erro, e não do dolo. Em boa hora, o art. 214 do CC excluiu o dolo como vício apto a gerar a invalidação da confissão.
Por fim, registre-se que o dispositivo legal ora comentado indica expressamente que somente o erro de fato é passível de gerar invalidação da confissão, excluído o erro de direito109.
A anulação não pode ser realizada incidentalmente no processo no qual foi formada a confissão, sendo que, ainda estando em trâmite esse processo, a forma processual adequada é a ação anulatória, e após o trânsito em julgado, a ação rescisória, desde que a confissão constitua o único fundamento da sentença (art. 352, I e II, do CPC)110. Segundo o art. 352, parágrafo único, do CPC, a legitimidade ativa para propor essas ações é exclusiva do confitente, mas, uma vez proposta a demanda e falecendo o confitente, os herdeiros e sucessores passam a ter legitimidade superveniente para assumir o polo ativo, por meio da sucessão processual.
O art. 397, caput, do PLNCPC continua a consagrar a regra do art. 349, caput, do CPC/1973 no sentido de a confissão judicial ser espontânea e provocada. Conforme ensinado pela melhor doutrina, a confissão provocada é a resultante do depoimento pessoal, e nesse sentido é interessante a novidade do § 2.º do art. 397 ao prever que a confissão provocada constará do termo de depoimento pessoal.
Deve ser lamentada a regra consagrada no art. 350, caput, do CPC/1973 e repetida no art. 398, caput, do PLNCPC: a confissão judicial faz prova contra o confitente, não prejudicando, todavia, os litisconsortes. A literalidade da norma leva o operador a acreditar que na hipótese de litisconsórcio um meio de prova específico – a confissão – somente geraria efeitos para um dos litisconsortes, no caso aquele que confessar. Seria, portanto, uma exceção ao princípio da comunhão das provas e da aplicação da regra da autonomia da atuação dos litisconsortes. A prova então vincula um dos litisconsortes e não os demais? E o princípio da comunhão das provas?
As críticas dirigidas ao antigo art. 350, caput, do CPC/1973 são mantidas: “O mais importante aspecto da confissão para a análise ora feita é a questão de sua eficácia. Há a regra de que a confissão vincula o confitente, o que significa que a confissão gera seus regulares efeitos para aquele que confessou, ou seja, havendo a confissão, a alegação de fato será considerada verdadeira. Esse efeito, entretanto, somente será gerado se a confissão, diante de outras provas produzidas, for suficiente para convencer o juiz, sendo possível concluir que, ao menos em relação ao confitente, haverá uma vinculação. Nesse ponto é preciso, desde já, fazer uma observação: partindo-se de uma análise sob a perspectiva dos resultados, a confissão não vincula somente o confitente, mas também, e naturalmente, a parte contrária, em razão da aplicação do princípio da comunhão das provas.
Especificamente no tocante ao disposto no dispositivo legal ora enfrentado, há a afirmação de que a confissão faz prova contra o confitente, mas não prejudica os litisconsortes. A afirmativa não se mostra aplicável diante da própria lógica exigida pelo sistema processual. Fazer prova só pode ser entendido como convencer o juiz da veracidade de uma alegação de fato, o que, conforme exaustivamente visto, não pode se configurar em fenômeno subjetivo parcial, dando-se a alegação de fato verdadeira para somente alguns dos sujeitos processuais, e não para outros. Esse verdadeiro absurdo lógico – antes mesmo de se tratar de absurdo jurídico – é exatamente o sugerido pela interpretação literal do art. 350, caput, do CPC, ao afirmar que para o confitente a alegação de fato seria dada como verdadeira, mas ao litisconsorte seria plenamente possível que fosse considerada falsa111. E tudo isso na mesma demanda...
Se a confissão gerar seus efeitos de convencer o juiz, todos os sujeitos sofrerão tais efeitos, considerando-se que a alegação de fato será considerada verdadeira para todos os sujeitos processuais, tenham esses participado ou não da confissão. É justamente em virtude desse entendimento que pouco interessa qual a espécie de litisconsórcio para que a confissão vincule ou não o litisconsorte não confitente. Sendo unitário ou simples, o fato será sempre um só, de forma que, sendo a confissão eficaz, vinculará a todos, sendo ineficaz, não vinculará ninguém112. A confissão pode ser plenamente eficaz ou plenamente ineficaz, independentemente da espécie de litisconsórcio, não existindo eficácia parcial justamente por não existir uma alegação de fato que possa ser ao mesmo tempo verdadeira para alguns e falsa para outros.
Apenas uma consideração deve ser feita à luz da espécie de litisconsórcio, a título de esclarecimento. Na hipótese de litisconsórcio simples, é plenamente possível que um fato diga respeito a apenas um dos litisconsortes, o que não ocorrerá no litisconsórcio unitário. Essa realidade poderia levar o leitor mais incauto a acreditar que nessa hipótese seria aplicável a regra da eficácia subjetivamente parcial da confissão, prevista pelo art. 350, caput, do CPC, visto que, apenas no tocante à parte confitente, única interessada no fato, a confissão geraria os seus efeitos. Essa, entretanto, é uma conclusão enganosa.
Ainda que o fato diga respeito somente a uma das partes, a confissão será plenamente eficaz se o juiz, no caso concreto, se convencer e considerar verdadeira alegação do fato. Essa circunstância valerá para todos os litigantes, inclusive para o litisconsorte que não confessou e que nada tem a ver com aquele fato. A ausência de relação entre o litisconsorte e o fato narrado, entretanto, não enseja a conclusão de que a confissão fez prova somente contra o confitente; fez prova “contra” todos os sujeitos processuais, mas, dependendo do caso concreto, no litisconsórcio simples tal veracidade não importará ao litisconsorte não confitente”113.
E para sacramentar o absurdo jurídico o PLNCPC mantém a regra do art. 350, parágrafo único, do CPC/1973 ao prever a invalidade da confissão de cônjuge em ações que versarem sobre bens imóveis ou direitos sobre imóveis alheios. A nova norma inclui o companheiro ao lado do cônjuge e estabelece a exclusão da regra se o regime de casamento for de separação absoluta de bens. Com requintes de crueldade, o legislador associa a validade da confissão com o regime de casamento?!?! Confunde um ato de disposição probatório com atos de disposição material, desconsiderando que o primeiro pode ou não influenciar o juiz em sua decisão, enquanto o segundo o vincula obrigatoriamente.
Prever que o cônjuge ou companheiro não pode praticar ato de disposição de direito – reconhecimento jurídico do pedido, transação, renúncia – sem a participação do outro, salvo quando o regime for de separação absoluta de bens é correto, mas tentar transportar essa regra para um meio de prova – confissão – é, no mínimo, de discutível correção técnica.
O art. 399, caput, do PLNCPC repete a regra do art. 351 do CPC/1973 que inadmite a confissão de fatos relativos a direitos indisponíveis. E os seus §§ 1.º e 2.º repetem literalmente a previsão do art. 213, caput e parágrafo único, do CC.
O vício na confissão, tratado no art. 352 do CPC/1973, vem disposto no art. 400 do PLNCPC, que traz inovação adequando o CPC ao CC, mais precisamente o art. 214 do diploma civil. No caput do dispositivo legal há previsão que confirma expressamente a irrevogabilidade da confissão, admitindo, entretanto, que seja tornada sem efeito por meio de ação anulatória, quando o ato emanar de erro de fato e coação, tendo sido suprimidos expressamente o “dolo” e tacitamente o “erro de direito”.
Registre-se a ausência de qualquer remição ao cabimento de ação rescisória após o trânsito em julgado da sentença, havendo previsão somente de ação anulatória. Entendo que o silêncio proposto pelo dispositivo não deve alterar a regra atualmente em vigência em razão das previsões constantes nos incisos do art. 352 do CPC. Uma vez transitada em julgado a sentença de mérito, ainda que fundada em confissão emanada de coação ou erro de fato, a única forma processual viável à sua impugnação continuará a ser a ação rescisória.
O art. 353, caput, do CPC/1973 criava uma distinção entre a confissão extrajudicial feita por escrito e oralmente, prevendo que a primeira teria a mesma carga de convencimento da confissão judicial e a segunda seria livremente apreciada pelo juiz. Conforme já tive oportunidade de afirmar, o dispositivo desprezava “o princípio do livre convencimento motivado do juiz, porque, independentemente de como a confissão extrajudicial é realizada, caberá ao juiz no caso concreto a valoração de sua carga de convencimento”114.
Por essa razão é elogiável a nova redação por acabar com a indevida distinção, mas ainda assim fica uma pergunta: se o disposto prevê que a livre apreciação do juiz será realizada somente na confissão extrajudicial, como será apreciada a confissão judicial? É óbvio que também a confissão judicial será apreciada livremente, e nesse caso o dispositivo teria sido parcialmente omisso. A verdade, entretanto, é um pouco pior: o dispositivo é inútil porque no sistema de livre valoração motivada das provas em vigência no processo civil brasileiro todas as provas são livremente apreciadas pelo juiz, salvo raríssimas exceções pelas quais o juiz está vinculado por imposição legal derivadas do sistema das provas tarifadas.
E o art. 401 do PLNCPC, apesar de prever norma correta, novamente peca pelo excesso, sendo mais uma norma inútil. Afinal, não é só a confissão extrajudicial feita oralmente que terá eficácia nos casos em que a lei exija prova literal (documental), mas qualquer prova oral. O testemunho em juízo, tendo como objeto os fatos da demanda ou a confissão de uma das partes, quando a lei exigir prova documental, já está vetado pelo art. 450, II, do PLNCPC.
Trata-se de meio de prova utilizado para a parte provar alegação de fato por meio de coisa ou documento que não esteja em seu poder. O conceito de parte é amplo – partes no processo, conforme analisado no Capítulo 3, item 3.3.2 –, abrangendo autor(es), réu(s), terceiros intervenientes, inclusive o assistente, e o Ministério Público quando atua como fiscal da lei. Exibir significa colocar a coisa ou documento em contato visual com o juiz, que, uma vez ciente do teor da coisa ou do documento, determinará a sua devolução à parte possuidora. Sempre que a parte alega um fato que só pode ser demonstrado por documento ou coisa que não esteja em seu poder, será possível o conhecimento de seu teor pelo juiz de duas formas: a requisição e a exibição de coisa ou documento.
O art. 399 do CPC regula a requisição, por meio da qual o juiz requisita às repartições públicas:
(i) as certidões necessárias à prova das alegações das partes;
(ii) os procedimentos administrativos nas causas em que forem interessados a União, Estado, Município ou as respectivas entidades da administração indireta.
O juiz terá nesse segundo caso um prazo de 30 dias para extração das cópias reprográficas das peças indicadas pelas partes ou de ofício, devolvendo os autos do procedimento administrativo à repartição de origem findo tal prazo. Havendo transmissão de documentos por meio eletrônico (art. 399, § 2.º do CPC), o procedimento legal será dispensado, já que não haverá devolução de autos à repartição de origem.
A exibição de documento ou coisa vem regulada pelos arts. 355 a 363 do CPC, havendo procedimentos diferentes para a exibição requerida contra a outra parte no processo e contra terceiro, alheio à relação jurídica processual. A exibição de coisa ou documento também pode se desenvolver por meio de uma ação cautelar nominada preparatória, quando no caso presente se verificar o periculum in mora, ou seja, quando houver risco de que, se a prova não for produzida imediatamente, não poderá mais ser produzida no momento adequado (fase probatória). Não havendo tal urgência, a prova será produzida normalmente durante a fase probatória, sendo esse o tema ora desenvolvido.
O juiz de ofício pode determinar a terceiros a exibição de documento ou coisa115. Quando dirigida à parte do processo, o poder do juiz se fundamenta nos poderes instrutórios, consagrado no art. 130 do CPC. Quando dirigida a terceiro, além dos poderes instrutórios, aplica-se o dever do terceiro de colaborar com a atividade judicial na busca da verdade, conforme previsto nos arts. 339 e 341, II, do CPC116. Não há ofensa ao princípio da inércia da jurisdição, porque o juiz não instaurará um processo incidental, apenas determinará incidentalmente a exibição de coisa ou documento117.
Apesar das diferenças procedimentais no pedido de exibição realizado contra terceiro e contra parte, existem alguns aspectos procedimentais comuns, como os requisitos do pedido, as justificativas legais da recusa e algumas situações de inadmissão da recusa pelo juiz.
O pedido formulado pela parte contém três requisitos previstos pelo art. 356 do CPC, não se deferindo a prova no caso de o pedido não preencher as exigências legais.
A individuação, tão completa quanto possível do documento ou da coisa, decorre de dois fatores principais: permitir ao réu do incidente saber de que coisa ou documento está tratando o autor e, no caso de busca e apreensão, para indicar o objeto de tal medida ao oficial de justiça. O Superior Tribunal de Justiça entende que a individuação exigida pela lei é aquela suficiente para não deixar dúvida a respeito do que se pretende ver exibido, não se exigindo uma perfeita individuação118.
A finalidade da prova, com a indicação dos fatos que se relacionam com o documento ou a coisa, se presta ao juiz analisar a pertinência da exibição à luz do objeto da demanda119. Além disso, na exibição contra a parte contrária, a não exibição acarreta a presunção de veracidade dos fatos que, por meio do documento ou coisa, a parte pretendia provar, conforme previsão do art. 359 do CPC.
Por fim, exige-se a narrativa das circunstâncias em que se funda o requerente para afirmar que o documento ou a coisa existe e se acha em poder da parte contrária ou de terceiro. Nem sempre é fácil ao requerente demonstrar liminarmente que a coisa ou documento está em poder da parte contrária, devendo o juiz atuar com a devida razoabilidade na análise do preenchimento desse requisito, levando em consideração as dificuldades porventura existentes no caso concreto.
A escusa em exibir a coisa ou documento em juízo pode se fundamentar em cinco hipóteses (art. 363 do CPC):
(I) se concernente a negócios da própria vida da família;
(II) se a sua apresentação puder violar dever de honra;
(III) se a publicidade do documento redundar em desonra à parte ou ao terceiro, bem como a seus parentes consanguíneos ou afins até o terceiro grau; ou lhes representar perigo de ação penal;
(IV) se a exibição acarretar a divulgação de fatos, a cujo respeito, por estado ou profissão, deva guardar segredo;
(V) se subsistirem outros motivos graves que, segundo o prudente arbítrio do juiz, justifiquem a recusa da exibição.
Segundo o art. 358 do CPC, o juiz não admitirá a recusa em três hipóteses:
(I) se o requerido tiver obrigação legal de exibir;
(II) se o requerido aludiu ao documento ou coisa no processo com intuito de constituir prova, hipótese somente aplicável no pedido de exibição contra parte do processo;
(III) se o documento, por seu conteúdo, for comum às partes, entendendo-se que as partes são as envolvidas no incidente processual ou na ação incidental de exibição.
Quando a pretensão de exibição é dirigida à parte contrária, não existem maiores formalidades no pedido de exibição, além do preenchimento dos requisitos previstos no art. 356 do CPC, até porque esse pedido cria tão somente um incidente processual120. Corretamente a doutrina permite, inclusive, que o pedido seja feito oralmente em audiência, ainda que na praxe forense o mais comum seja formulá-lo por petição escrita.
O requerido será intimado – considerando-se que já faz parte da relação jurídica processual – para que no prazo de cinco dias ofereça resposta. A doutrina majoritária entende que a intimação deve se realizar na pessoa do advogado da parte121, enquanto a doutrina minoritária entende que a intimação deve ocorrer tanto na pessoa da parte – titular do dever de exibir – como na pessoa do advogado – único que tem capacidade de praticar atos postulatórios122. Prefiro o primeiro entendimento, por dois motivos:
(a) a intimação pessoal é excepcional, demandando expressa previsão legal;
(b) intimação pessoal pode ser um tormento, prejudicando indevidamente o andamento do processo.
Após a intimação e a exibição da coisa ou do documento, a prova terá sido produzida. O requerido, entretanto, poderá, no prazo de cinco dias, apresentar defesa, afirmando que não possui o documento ou a coisa, hipótese na qual o ônus de provar que a afirmação não é verdadeira será do requerente. Por fim, recusando-se a exibir a coisa ou documento, o requerido pode alegar que não tem obrigação legal de exibir.
Criado o incidente, o juiz admitirá como verdadeiros os fatos que, por meio da exibição, a parte pretendia provar, em duas hipóteses (art. 359 do CPC):
(I) se o requerido não exibir o documento ou coisa no prazo de 5 dias e tampouco oferecer qualquer espécie de resposta;
(II) quando a sua recusa for havida por ilegítima.
Como se pode notar, existe sobre a parte contrária uma pressão psicológica significativa, considerando-se que a não exibição de documento ou coisa em juízo acarretará a ela sensíveis prejuízos.
Ainda que parcela da doutrina defenda a aplicação de multas sancionatórias e/ou a determinação de busca e apreensão na hipótese de não exibição injustificada, não concordo com nenhuma dessas medidas. A consequência prevista no art. 359, caput, do CPC já é consequência prejudicial suficiente para a parte que optou pela não exibição da coisa ou documento em juízo, sendo forma muito mais eficaz de atender à pretensão do requerente do que a realização de ato de pressão psicológica por meio das astreintes ou de constrição judicial por meio de busca à apreensão. Além do mais, não existe um dever da parte em exibir o documento, mas um ônus processual, não se podendo por isso aceitar a aplicação de medidas de coerção ou sanção processual123.
Note-se que a inaplicabilidade da multa no pedido incidental de exibição não guarda relação com a famigerada Súmula 372/STJ, que consagra o entendimento de que não cabe multa cominatória na ação de exibição. Lamenta-se o teor da súmula porque na ação de exibição não se opera a presunção de veracidade, circunstância estranha às ações probatórias, de forma que resta à parte somente a busca e apreensão, forma de execução por sub-rogação. É natural que não caiba multa no pedido incidental de exibição de coisa ou documento, em razão do disposto no art. 359, caput, do CPC, mas sendo inaplicável tal dispositivo às ações de exibição, o entendimento consagrado na súmula referida mostra-se incorreto. Melhor teria andado o Superior Tribunal de Justiça se tivesse sumulado que não cabe a aplicação de multa aos pedidos incidentais de exibição de coisa ou documento, conforme, inclusive, já teve oportunidade de decidir124.
O Superior Tribunal de Justiça entende tratar-se de presunção relativa de veracidade, podendo ser afastada com a apresentação de documento que aponte em sentido contrário125.
Sendo o detentor da coisa ou documento um terceiro, estranho à relação jurídica processual, a parte interessada na exibição deverá ingressar com uma petição inicial, que será autuada em apenso aos autos principais, porque nesse caso será necessária a instauração de uma ação incidental126.
O terceiro em relação ao processo principal se torna réu na ação incidental de exibição, sendo citado para responder ao pedido no prazo de dez dias. Negando a obrigação de exibir (pelos mesmos motivos já expostos anteriormente – art. 363 do CPC), afirmando que não está em poder da coisa ou documento ou expondo qualquer outro meio de defesa, será designada audiência especial, tomando-lhe o depoimento, bem como o das partes e, se necessário, das testemunhas. Apesar da omissão legal, além da prova testemunhal a ser produzida nessa audiência, serão admitidos outros meios de prova.
Após a devida instrução probatória será proferida decisão que, segundo a previsão do art. 361 do CPC, é uma sentença. O dispositivo está correto, considerando-se a instauração de uma ação incidental, que será decidida por sentença, recorrível por apelação127. Entendo que o recurso jamais será o agravo de instrumento, mesmo na hipótese de equívoco judicial de autuação do pedido de exibição contra terceiro nos mesmos autos128. Nesse caso, caberá ao cartório judicial corrigir seu erro, desentranhando as peças referentes ao pedido de exibição para que sigam com a apelação para o tribunal129.
Se o terceiro, sem justo motivo, se recusar a exibir a coisa ou o documento, o juiz lhe ordenará o depósito em cartório ou noutro lugar designado no prazo de 5 dias, impondo ao requerente que o embolse das despesas que tiver. Não havendo cumprimento da ordem do juiz, o art. 362 do CPC determina a expedição de mandado de busca e apreensão, e, se necessário, auxílio de força policial, sem prejuízo da responsabilidade por crime de desobediência.
Tratando-se de tutela mandamental (o dispositivo legal fala em “ordenará”), é aplicável o art. 14, parágrafo único, do CPC, com a aplicação de multa de até 20% do valor da causa em razão da prática de ato atentatório à dignidade da jurisdição130. Por outro lado, tratando-se de tutela de entrega de coisa – ainda que temporária –, aplica-se o art. 461-A do CPC, permitindo a fixação, por pedido da parte ou de ofício, de astreinte (multa periódica)131. A aplicação dessa multa, entretanto, não encontra respaldo no Superior Tribunal de Justiça132.
Note-se que todas as medidas executivas à disposição do juiz estão voltadas à efetiva exibição da coisa ou do documento, não sendo cabível na exibição contra terceiro a presunção de veracidade dos fatos que se pretendia provar com a coisa ou documento não exibidos. A razão é óbvia: considerando-se que a parte do processo que não pretende a exibição (parte contrária) não pode ser prejudicada por um ato praticado por terceiro (réu na ação incidental de exibição).
Esse meio de prova teve poucas alterações no PLNCPC, tendo sido basicamente mantidas as regras do CPC/1973.
No pedido de exibição contra a parte contrária, as únicas novidades são os parágrafos do art. 407. No § 2.º há a expressa previsão de cabimento de agravo de instrumento contra a decisão que resolver o incidente antes da sentença, o que se justifica a partir do momento em que o cabimento desse recurso passou a ter rol exauriente previsto em lei. Já a novidade do § 1.º é absolutamente incompreensível, porque, se a não exibição do documento ou coisa permite a conclusão de veracidade dos fatos que se pretendia provar com a exibição, qual exatamente a utilidade da adoção de medidas coercitivas ou sub-rogatórias?
Como já tive a oportunidade de afirmar, “ainda que parcela da doutrina defenda a aplicação de multas sancionatórias e/ou a determinação de busca e apreensão na hipótese de não exibição injustificada, não concordo com nenhuma dessas medidas. A consequência prevista no art. 359, caput, do CPC já é consequência prejudicial suficiente para a parte que optou pela não exibição da coisa ou documento em juízo, sendo forma muito mais eficaz de atender à pretensão do requerente do que a realização de ato de pressão psicológica por meio das astreintes ou de constrição judicial por meio de busca e apreensão. Além do mais, não existe um dever da parte em exibir o documento, mas um ônus processual, não se podendo por isso aceitar a aplicação de medidas de coerção ou sanção processual”133.
A realidade é que o sistema, da forma como está, não consegue tutelar de maneira satisfatória a exibição de coisa ou documento, tornando-se contraditório. Sendo exigência do pedido o apontamento dos fatos que se pretende provar com a exibição (art. 404, II) e tendo como consequência da não exibição a presunção de veracidade desses fatos (art. 407, caput), naturalmente não há qualquer necessidade de atos executivos (art. 407, § 1.º).
Apesar da aparente inutilidade da regra ora comentada diante da omissão da parte contrária em exibir o documento, é preciso atentar que a narração fática da parte que pede a exibição nem sempre tem a exatidão necessária para a geração do efeito da presunção de veracidade prevista em lei. Basta imaginar hipótese comum em muitas ações que envolvam planos econômicos, por meio das quais a parte pede a exibição de extratos bancários para demonstrar a existência de conta-corrente à época do plano e do valor depositado. Naturalmente, a parte não saberá precisar qual é esse valor, e a inércia da instituição financeira em apresentar os extratos em juízo poderá, quando muito, permitir a presunção de que o autor mantinha conta à época do plano, mas quanto ao valor existente não o que se presumir, até porque o próprio autor deixa claro no pedido que somente com os extratos terá acesso a essa informação.
Em hipóteses como essa não tenho dúvida da pertinência da regra consagrada no art. 407, § 1.º, do PLNCPC, mas nem por isso entendo elogiável a redação sugerida. Conclusivamente, não parece que seja a conveniência do juiz que determine a adoção de medidas coercitivas para pressionar a parte a exibir a coisa ou documento em juízo, mas a impossibilidade material de se presumirem verdadeiras as alegações de fato em razão da imprecisão de sua narrativa quando a omissão for da parte contrária.
Na exibição contra terceiros o prazo de resposta do terceiro, que era de dez dias (art. 360 do CPC/1973), passou a ser de quinze dias (art. 408 do PLNCPC). O art. 409 do PLNCPC mantém a “audiência especial” que vinha prevista no art. 361 do PLNCPC, que na realidade de especial não tem nada, tratando-se de audiência de instrução e julgamento quando for necessária a produção de prova oral.
A doutrina sempre entendeu que o pedido de exibição contra terceiro exige da parte uma petição inicial, que será autuada em apenso aos autos principais, porque nesse caso será necessária a instauração de uma ação incidental134. O entendimento deve continuar a prevalecer, até porque a lei não tem condições de transformar a natureza jurídica dos fenômenos processuais, e, justiça seja feita, tal postura não foi adotada pelo legislador nesse caso.
No art. 409 do PLNCPC está previsto que contra a decisão que julgar o pedido de exibição será recorrível por agravo de instrumento. O dispositivo não diz qual a natureza da decisão, apenas o recurso cabível, em opção diametralmente oposta à do art. 361 do CPC/1973 que previa a espécie de decisão – sentença – sem indicar o recurso cabível. Continuo acreditando que a decisão é uma sentença, mas por imposição legal será cabível o agravo de instrumento.
No procedimento de exibição de coisa e documento contra terceiro o PLNCPC tem duas novidades. No art. 408 o prazo de resposta do terceiro é aumentado para quinze dias, o que demonstra de maneira ainda mais clara a natureza de ação dessa exibição. O art. 410 do PLNCPC amplia, sempre em rol exemplificativo, as consequências da não exibição da coisa ou documento por terceiro: além da busca e apreensão e responsabilização por crime de desobediência, já dispostas no art. 362 do CPC/1973, estão também previstos o pagamento de multa e outras medidas coercitivas e sub-rogatórias.
O conceito amplo de documento o define como qualquer coisa capaz de representar um fato, não havendo nenhuma necessidade de a coisa ser materializada em papel e/ou conter informações escritas. Algum escrito em outra superfície que não seja papel, tal como o plástico, metal, madeira etc., desde que represente um fato, é considerado um documento dentro desse conceito amplo. Da mesma forma, uma fotografia, uma tabela, um gráfico, gravação sonora ou filme cinematográfico também será considerado um documento. Num conceito mais restrito, documento é o papel escrito135.
Apesar de o conceito restrito representar a ampla maioria das espécies de documentos na praxe forense, o direito brasileiro adotou o conceito amplo, sendo significativa a quantidade de diferentes espécies de coisas que são consideradas como documentos para fins probatórios no processo judicial. Até mesmo as representações obtidas por meio eletrônico são considerados documentos, tais como os dados inseridos na memória do computador ou transmitidos por via eletrônica136.
Documento não se confunde com instrumento, sendo o segundo espécie do primeiro. O instrumento é produzido com o objetivo de servir de prova, como ocorre na celebração de um contrato ou de uma escritura. Caso o documento seja produzido, já tendo o objetivo de provar determinado ato, será considerado um instrumento, mas, não tendo tal finalidade específica, embora em momento posterior até possa vir a ser considerado como prova num processo judicial, ter-se-á somente um documento, e não um instrumento, como ocorre numa carta ou e-mail tendo como conteúdo algum fato ou ato137.
Segundo o art. 364 do CPC, o documento público faz prova da sua formação e também dos fatos que o escrivão, tabelião ou funcionário declarar que ocorreram em sua presença. Como se nota desse dispositivo legal, em razão da fé pública que reveste os atos estatais, sempre que o documento for produzido por funcionário público lato sensu, haverá uma presunção de veracidade quanto à sua formação e quanto aos fatos que tenham ocorrido na presença do oficial público. Essa presunção é relativa, podendo ser afastada por meio de outras provas produzidas no processo.
É preciso esclarecer que a presunção mencionada atinge somente os fatos que tenham ocorrido na presença do oficial público, e não os fatos trazidos ao seu conhecimento pelas partes. Significa dizer que, afirmando o oficial público que determinado sujeito lhe informou ser absolutamente capaz, a única presunção possível é de que no momento da elaboração do documento público, um determinado sujeito informou ao oficial público que era absolutamente capaz, e o fato de ser ou não capaz não se presume verdadeiro, devendo ser provado durante o processo judicial138.
Na hipótese de a lei exigir, como da substância do ato, um determinado instrumento público, nenhuma outra prova poderá suprir a ausência desse documento (art. 366 do CPC). Não se trata de questão probatória, mas de requisito necessário para a validade do ato no plano do direito material, de modo que, sem o instrumento público no processo, o juiz não poderá considerar o ato provado porque antes disso deve considerá-lo como inválido139. O casamento se prova pela certidão de casamento, a propriedade de bem imóvel pela matrícula, o óbito pela certidão de óbito etc.
Aduz o art. 367 do CPC que o documento elaborado por oficial público incompetente ou em desrespeito às formalidades legais, desde que seja subscrito pelas partes, tem a mesma eficácia probatória do documento particular. Lembra a melhor doutrina que, apesar da exigência legal quanto à assinatura das partes, a eficácia probatória de documento particular pode existir mesmo sem elas, desde que no plano material seja dispensável esse elemento para a validade do documento140.
O documento é particular sempre que for elaborado sem a intervenção de um oficial público, podendo ser141:
(a) escrito e assinado pelas partes;
(b) escrito por terceiro e assinado pelo declarante;
(c) escrito pela parte e não assinado;
(d) nem escrito nem assinado pela parte.
Segundo o art. 368 do CPC, as declarações constantes do documento particular escrito e assinado ou somente assinado presumem-se verdadeiras em relação ao signatário. Apesar de se tratar de presunção relativa, a prova contrária é de difícil produção na praxe forense. O art. 368, parágrafo único, do CPC prevê que, contendo o documento uma declaração de ciência de um fato, a prova recai somente na declaração e nunca no objeto do fato declarado, competindo ao interessado prová-lo em juízo. Se alguém declara que viu o marido agredir a mulher e registra essa declaração num documento, a eficácia probatória se limita ao fato de o sujeito ter feito a declaração, e não ao fato de ter ocorrido a agressão.
Afirmar que um documento é autêntico significa dizer que o documento assinado teve a assinatura reconhecida pelo tabelião (art. 369 do CPC). A autenticação de que a assinatura aposta no documento confere com a original registrada no Cartório de Notas torna o documento autêntico, mas não verdadeiro quanto ao seu conteúdo. Apesar da confiabilidade nos trabalhos cartoriais, entende-se corretamente que existe uma presunção relativa de autenticidade, que pode ser afastada com a produção de prova em sentido contrário142.
A autoria do documento particular é regulamentada pelo art. 371 do CPC, sendo considerado o autor do documento:
(a) aquele que o fez e o assinou;
(b) aquele que por conta de quem foi feito, estando assinado;
(c) aquele que, mandado compô-lo, não o firmou, porque, conforme a experiência comum, não se costuma assinar, como livros comerciais e assentos domésticos.
Se o marido deixou um bilhete afirmando ter levado ao trabalho o celular do casal, não se pode esperar que assine tal bilhete para que tal documento tenha eficácia probatória.
Qualquer reprodução mecânica (fotográfica, cinematográfica, fonográfica etc.) faz prova se a parte contra quem foi produzida lhe admitir a conformidade; havendo impugnação, o juiz determinará a realização da prova pericial (art. 383 do CPC). As reproduções fotográficas ou obtidas em outros processos de repetição valem como certidões, sempre que o escrivão portar de fé a sua conformidade com o original (art. 384 do CPC). Não existe prova plena no direito brasileiro, de forma que o art. 225, caput, do CC não pode impedir que o juiz, mesmo sem a resistência da parte contrária, determine a produção de prova de ofício se duvidar da regularidade da reprodução de qualquer natureza.
Segundo o art. 385, caput, do CPC, a cópia do documento particular tem o mesmo valor probante que o original, sendo exigida apenas a conferência da cópia com o original na hipótese de a parte contrária impugnar a cópia ou o juiz tiver dúvida a respeito da idoneidade do documento. Tratando-se de fotografia, é exigida a juntada do negativo, e, tratando-se de fotografia publicada em jornal, exige-se a juntada do original e do negativo.
Havendo em ponto substancial do documento entrelinha, emenda, borrão ou cancelamento, sem nenhuma ressalva, o juiz apreciará livremente a fé que mereça o documento (art. 386 do CPC). A fé do documento particular cessa quando declarada judicialmente a sua falsidade (art. 387 do CPC), quando for contestada a assinatura e enquanto não se lhe comprovar a veracidade ou quando assinado em branco, for abusivamente preenchido (art. 388 do CPC).
A falsidade documental pode constituir o objeto de uma ação autônoma, em exceção à regra de que a ação meramente declaratória não pode ter como objeto meros fatos, ainda que jurídicos (art. 4.º, II, do CPC). Ocorre, entretanto, que a necessidade de arguir a falsidade de um documento pode surgir durante o processo no qual esse documento foi produzido, sendo nessa hipótese previsto pelos arts. 390 a 395 do CPC o chamado “incidente de arguição de falsidade documental”, que na realidade é uma espécie de ação declaratória incidental143, seguindo fundamentalmente suas regras procedimentais e sua principal característica de ampliar os limites objetivos da coisa julgada material.
Tratando-se de ação declaratória incidental, a ausência de ingresso do incidente processual ora analisado não impede que o juiz reconheça a falsidade de um documento se chegar a essa conclusão em razão das outras provas produzidas. Naturalmente a amplitude dos efeitos dessa decisão a respeito da falsidade documental será diferente com o julgamento do incidente processual e apenas incidentalmente no próprio processo; no primeiro caso, a decisão produz coisa julgada material (efeitos para fora do processo), enquanto no segundo a declaração de falsidade gera efeitos somente dentro do processo em que foi reconhecida144.
É tranquilo o entendimento de que tanto os documentos particulares quanto os públicos podem ser objeto do incidente ora analisado145, mas existe polêmica a respeito de qual espécie de falsidade documental pode ser objeto do incidente de falsidade documental. A falsidade ideológica é voltada ao conteúdo do documento, dizendo respeito aos vícios do consentimento ou sociais do ato jurídico, ou seja, representa a falsidade do que foi declarado no documento. A falsidade material, por sua vez, é vício do documento em si, referente à sua formação, com deteriorações que alterem seu conteúdo, a compreensão desse conteúdo ou que contenha afirmações que não foram feitas pelas partes ou não foram presenciadas pelo oficial público. Não resta nenhuma dúvida de que a falsidade material pode ser objeto do incidente ora analisado, até porque a parte que o arguiu pretende a declaração de que o documento em si é falso. Na falsidade ideológica, admite-se o incidente quando o documento tiver caráter declaratório e o seu reconhecimento não implicar desconstituição de situação jurídica146, ainda que exista doutrina a defender o cabimento do incidente em qualquer espécie de falsidade ideológica147.
Segundo o art. 390 do CPC, o incidente de falsidade pode ser arguido em qualquer tempo e grau de jurisdição, mas é preciso atentar que o mesmo dispositivo legal impõe um prazo preclusivo para tal arguição: sendo a petição inicial instruída pelo documento, cabe ao réu a alegação no prazo de contestação – na realidade no prazo de resposta, porque o réu pode arguir a falsidade sem contestar –, e nos demais casos no prazo de dez dias da intimação da juntada aos autos. São legitimados a parte que não produziu a prova documental e o Ministério Público quando figura no processo como fiscal da lei.
Prevê o art. 394 do CPC que a mera interposição do incidente de falsidade suspende o processo principal, mas a melhor interpretação desse dispositivo legal demonstra que a suspensão não atinge o processo principal como um todo. A melhor doutrina afirma corretamente que se trata de suspensão imprópria, ou seja, a suspensão atinge somente determinados atos processuais148. Na hipótese de incidente processual, a suspensão atinge tão somente a prolação da sentença, o que evita que o juiz se valha de documento falso na formação de seu convencimento; todos os outros atos processuais podem ser praticados normalmente.
Tratando-se de ação declaratória incidental, a arguição será realizada por meio de petição inicial, nos termos dos arts. 282 e 283 do CPC. A forma de autuação dependerá do momento de ingresso do incidente de falsidade: antes de encerrada a instrução será autuada nos próprios autos e depois de encerrada será autuada em autos em apenso (arts. 391 e 393 do CPC). Entendo que a única distinção entre os diferentes momentos de ingresso do incidente de falsidade é a forma de autuação, sendo irrelevante para fins de determinação da natureza da decisão que resolve o incidente, bem como do recurso cabível contra essa decisão149.
Em respeito ao princípio do contraditório, a parte que produziu a prova será intimada para responder no prazo de dez dias, e sendo necessária haverá produção de prova. Apesar de o art. 392, caput, do CPC prever somente a prova pericial, que é a espécie de prova mais comum nesses casos, também se admitem outros meios de prova. Aduz o art. 392, parágrafo único, do CPC que será dispensada a perícia se a parte que produziu a prova concordar em desentranhá-la e a parte que arguiu o incidente não se opor, hipótese na qual o incidente será extinto sem resolução de mérito. O ônus da prova é de quem alega a falsidade (art. 389, I, do CPC), mesmo tratando-se de falsidade de assinatura, aplicando-se o art. 389, II, do CPC, somente quando existente presunção de veracidade da assinatura porque presenciada por tabelião (art. 369 do CPC).
O art. 395 do CPC contém previsão consideravelmente polêmica: a decisão que resolve o incidente tem natureza de sentença. A previsão legal tem importante reflexo no âmbito recursal, porque segundo previsão do art. 513 do CPC, sendo o pronunciamento uma sentença, é cabível o recurso de apelação. Parece incontestável que, sendo julgadas ao mesmo tempo a ação declaratória incidental de falsidade documental e a ação principal, a decisão será uma sentença, recorrível por apelação. Não concordo com a parcela doutrinária que defende a obrigatoriedade de julgamento conjunto numa mesma sentença150, porque estando pronta para julgamento a ação incidental e não a ação principal, não há nenhum óbice legal ou lógico no julgamento imediato do incidente e posterior decisão da ação principal.
Quando decidido o incidente antes da ação principal, existe corrente doutrinária que entende depender a natureza da decisão do momento em que foi oferecido o incidente: antes de encerrada a instrução, a decisão é interlocutória recorrível por agravo e depois é sentença recorrível por apelação151. Essa corrente doutrinária parte da premissa de que, antes de encerrada a instrução, a arguição de falsidade documental é um incidente processual; depois disso, passa a ter natureza jurídica de ação incidental. Partindo dessa premissa, a conclusão de diferentes naturezas de decisão e de diferentes recursos cabíveis é uma consequência natural.
Por outro lado, existe corrente doutrinária que defende ser sempre uma decisão interlocutória recorrível por agravo152. Entendo que a arguição cria sempre uma ação incidental, independentemente do momento procedimental em que é realizada e, sendo de mérito o pronunciamento que a decide, terá natureza de sentença. Ocorre, entretanto, que, conforme amplamente analisado no Capítulo 16, item 16.1, a doutrina majoritária defende que o pronunciamento só será sentença de mérito se extinguir o processo. No julgamento isolado da ação declaratória incidental de falsidade documental não é isso o que acontece, porque a ação é extinta, mas o processo prossegue para o julgamento da ação principal, sendo cabível o recurso de agravo de instrumento. Frise-se ser típica hipótese de aplicação do princípio da fungibilidade, conforme analisado no Capítulo 21, item 21.6.
Segundo o art. 396 do CPC, a produção da prova documental deve se realizar pelo autor na petição inicial e pelo réu na contestação. O dispositivo legal tem nitidamente uma natureza preclusiva, prevendo que, após os momentos iniciais de manifestação das partes no processo, não mais seria cabível a produção de prova documental. O art. 397 do CPC, entretanto, expressamente prevê duas exceções à rigidez da regra consagrada no dispositivo anterior:
(a) fazer prova de fatos ocorridos depois dos articulados;
(b) fazer prova para contrapor prova documental produzida pela parte contrária.
Além das exceções contidas no art. 397 do CPC, a doutrina entende que também não se opera a preclusão da prova documental quando dispositivos legais específicos permitirem a produção dessa espécie de prova após a petição inicial e a contestação, como ocorre com as previsões dos arts. 326 e 327 do CPC153. Também se defende o afastamento da preclusão quando a prova se referir a fato velho de ciência nova, a documento novo e à impossibilidade de produção no momento adequado em razão de justa causa154.
O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento ainda mais ampliativo, permitindo a juntada de documentos a qualquer momento do processo desde que seja respeitado o contraditório com a oitiva da parte contrária no prazo de cinco dias (art. 398 do CPC) e não seja a juntada extemporânea fruto de má-fé e/ou deslealdade da parte com o objetivo de surpreender a parte contrária155. Já houve inclusive decisão ainda mais liberal, com a mera exigência do contraditório para admitir a juntada extemporânea de documentos156. Registre-se, entretanto, que também existe decisão que adotou entendimento preclusivo, limitando a admissibilidade de juntada de documentos depois da petição inicial e contestação somente aos casos expressamente previstos no art. 397 do CPC157. Triste retrocesso em prejuízo da qualidade da prestação jurisdicional.
Ressalto ainda que, além dos requisitos do contraditório e da ausência de má-fé, o estágio procedimental deve ser apto a receber a prova documental, sendo inviável a produção probatória, por exemplo, em processo que esteja em sede de recurso especial ou extraordinário. Nesses recursos, como analisado no Capítulo 31, item 31.3.1, não há revisão dos fatos, sendo inútil a produção de prova de qualquer espécie, inclusive a documental.
Uma vez produzida a prova documental, a parte contrária será sempre intimada para se manifestar no prazo de 5 dias. O Superior Tribunal de Justiça aplica à ausência de intimação o princípio de que sem prejuízo não há nulidade, de forma a ser nula a decisão proferida sem a oitiva da parte contrária somente quando o documento for essencial para sua fundamentação; não tendo influência no julgamento, não haverá nulidade apesar do descumprimento da regra prevista no art. 398 do CPC158.
As regras quanto à força probante dos documentos constantes no CPC/1973 foram substancialmente mantidas no PLNCPC. São poucas as efetivas novidades e algumas as adequações redacionais, como a substituição do termo “funcionário” por “servidor” no art. 412, do termo “comerciante” por “empresário” nos arts. 424 e 425, e de “comerciais” por “empresariais” no caput do art. 427. E também há algumas ampliações, como no art. 412, ao incluir o chefe de secretária entre os responsáveis pela elaboração de documento público e no art. 423, parágrafo único, com a inclusão de documento de terceiro. Alterações positivas, mas sem repercussão prática.
O art. 429 do PLNCPC inclui a fotografia digital e as extraídas da rede mundial de computadores, prevendo que, se forem impugnadas, a parte deverá apresentar a respectiva autenticação eletrônica ou, não sendo possível, será realizada perícia. O § 2.º trata de fotografia publicada em jornal ou revista, quando então será exigido um exemplar originário do periódico, mas somente se a veracidade for impugnada, diferente da exigência constante no art. 385, § 3.º, do CPC/1973.
É de lamentar a manutenção da regra consagrada no art. 365, IV, do CPC/1973 no art. 432, IV, do PLNCPC: ao prever que as cópias reprográficas de peças do próprio processo judicial devem ser declaradas autênticas pelo advogado, o PLNCPC apenas manteve um requisito formal e inútil. Afinal, se o advogado declarar autênticos os documentos falsificados, eles continuam a ser falsos, e, se o advogado deixa de declarar a autenticidade de documentos autênticos, eles não deixam de sê-lo.
O art. 441, caput, do PLNCPC mantém a regra do art. 396 do CPC/1973 de que a prova documental deve ser produzida pelo autor na instrução da petição inicial e pelo réu na instrução da contestação. O parágrafo único é novidade, prevendo que, no caso de provas que consistam em reprodução cinematográfica ou fonográfica, a parte deverá juntar a prova no momento indicado no caput, mas sua exposição só será realizada em audiência. A previsão de intimação das partes para tal audiência é desnecessária, considerando que para toda audiência as partes devem ser intimadas.
A preclusão temporal para a produção da prova documental pode ser afastada em determinadas hipóteses. O art. 442, caput, do PLNCPC mantém as duas hipóteses já previstas no art. 397 do CPC/1973: (i) para provar fatos supervenientes e (ii) para contrapor prova documental produzida nos autos. O parágrafo único do dispositivo inclui no sistema novas hipóteses de produção de prova documental em momento posterior à petição inicial e contestação.
Será admitida a juntada de documentos formados após a petição inicial e contestação, o que se justifica pela impossibilidade material de fazê-lo no momento previsto pelo art. 442, caput, do PLNCPC. Nesse sentido já era o entendimento da melhor doutrina mesmo diante da ausência de norma escrita no CPC/1973159. E o dispositivo consagra entendimento jurisprudencial e doutrinário consolidado no sentido de permitir a juntada extemporânea do documento desde que a parte justifique por que não produziu a prova na petição inicial ou contestação, de forma a demonstrar que não existe a má-fé e deslealdade em tal prática160. Consagra, assim, a inviabilidade da juntada extemporânea dos documentos decorrer de “guarda de trunfo” pela parte161.
O art. 443 do PLNCPC prevê as reações da parte quando intimada para se manifestar sobre documento constante dos autos: (I) impugnar a admissibilidade da prova documental; (II) impugnar a sua autenticidade; (III) suscitar a sua falsidade, com ou sem deflagração do incidente de arguição de falsidade; (IV) manifestar-se sobre o seu conteúdo. O parágrafo único do dispositivo legal veda a alegação genérica de falsidade, exigindo da parte argumentação específica quando se valer das matérias previstas nos incisos II e III.
Não vejo qualquer razão para a existência de tal dispositivo legal. De duas uma: ou exauriu todas as matérias possíveis de alegação, o que o torna desnecessário; ou indevidamente excluiu alguma matéria, o que viola o princípio do contraditório e da ampla defesa. Por outro lado, impugnar a autenticidade (II) não é o mesmo que suscitar a falsidade do documento (III)?
O art. 444 do PLNCPC regulamenta o prazo de manifestação das partes quanto à prova documental. Segundo o caput do dispositivo, sobre os documentos juntados à petição inicial cabe ao réu se manifestar em contestação, e sobre os documentos juntados à contestação cabe ao autor manifestar-se em réplica. Além desses momentos, o prazo será de quinze dias (§ 1.º), podendo ser prorrogado pelo juiz em razão da quantidade e complexidade da documentação (§ 2.º). Trata-se, portanto, de prazo dilatório, que pode ser dilatado tanto na hipótese prevista pelo caput como pelo § 1.º do dispositivo ora comentado.
O PLNCPC destina uma seção para regulamentar os documentos eletrônicos. O art. 446 prevê que a utilização de documento eletrônico no processo convencional dependerá de sua conversão à forma escrita e da verificação de sua autenticidade, nos termos da lei. O art. 447 trata da valoração na hipótese do artigo anterior, prevendo que o juiz apreciará o valor probante do documento eletrônico não convertido, assegurado às partes o acesso ao seu teor. Finalmente, o art. 448 prevê que os documentos eletrônicos serão admitidos desde que produzidos e conservados com a observância da legislação específica.
Prova testemunhal é meio de prova consubstanciado na declaração em juízo de um terceiro que de alguma forma tenha presenciado os fatos discutidos na demanda. Tradicionalmente, a testemunha é aquele sujeito que viu o fato, mas não se devem desprezar outros sentidos humanos, como o olfato, a audição, o tato ou o palaar162. Um forte odor que faria presumir um vazamento de gás pode ser comprovado em juízo por alguém que nada tenha visto, bem como o testemunho de um sujeito que afirma ter ouvido um disparo pode ser determinante para a formação do convencimento do juiz.
As testemunhas que presenciaram o fato são chamadas de testemunhas presenciais. Também existe a figura da testemunha de referência, que não presenciou o fato, mas tomou conhecimento dele por informações de alguém que supostamente o fez, valendo o testemunho nesse caso como mero indício163. Por fim existe a testemunha referida, da qual se tem conhecimento por meio do depoimento de outra testemunha164.
O terceiro dará a sua versão ao juiz de como percebeu o fato, o que naturalmente pode desvirtuar o conteúdo das declarações testemunhais, seja em virtude da natural perda de memória, pela falsa percepção de como os fatos se deram, pela incapacidade de reproduzir o fato, ou resultado de má-fé de testemunha preparada165. Essas circunstâncias levaram a prova testemunhal em remoto tempo a ser desacreditada, ainda que reconhecidamente trate-se do mais antigo meio de prova166. Na realidade, o preconceito com a prova testemunhal perdura até os dias atuais, mas, como em muitos processos a testemunha é a única fonte de prova disponível, ninguém duvida da importância desse meio de prova na praxe forense.
Segundo o art. 400, caput, do CPC, a prova testemunhal é em regra admissível, desde que não exista previsão legal dispondo de modo diverso. Apesar da adoção do sistema da persuasão racional na valoração das provas, existem dispositivos legais que expressamente vedam a produção da prova testemunhal, dando-a como imprestável à formação do convencimento do juiz.
É o que ocorre, ainda que com certos atenuantes, no art. 401 do CPC e art. 227 do CC, ao exigirem para a prova de negócios jurídicos de valor superior a dez salários mínimos outro meio de prova que não o exclusivamente testemunhal. Mesmo acima desse valor admite-se a prova exclusivamente testemunhal nos contratos simulados para provar a divergência entre a vontade real e a vontade declarada e nos contratos em geral para provar os vícios do consentimento (art. 404 do CPC).
O rigor do art. 401 do CPC é atenuado pelo art. 402 do CPC, que permite a prova meramente testemunhal:
(a) quando houver começo de prova por escrito emanado da parte contra quem se pretende utilizar o documento como prova, tais como anotações, cartas, recibos etc.;
(b) quando o credor não podia, moral ou materialmente, obter a prova escrita, como ocorre nos negócios jurídicos realizados entre familiares167 ou amigos próximos168, em situação de emergência ou em contratos que tradicionalmente não assumem a forma escrita, como negócios em bolsa ou de corretagem169.
Correto entendimento doutrinário170 e jurisprudencial171 considera que a vedação à prova exclusivamente testemunhal é limitada à prova da existência do contrato, não atingindo questões referentes ao seu cumprimento, inexecução, efeitos etc.
Outras restrições à produção da prova testemunhal vêm previstas nos incisos do art. 400 do CPC:
(a) fatos já provados por documentos ou confissão da parte. Cabendo ao juiz a valoração das provas, se entender que o fato já está devidamente provado por documentos ou confissão, indeferirá a prova testemunhal, que será nessa hipótese inútil;
(b) fatos que só podem ser provados por documentos – como aqueles que exigem instrumento público (casamento, óbito etc.) – e que demandem prova pericial, porque nesse caso é exigido um conhecimento técnico específico que não pode ser suprimido por testemunha.
Em regra, qualquer terceiro pode testemunhar, mas o art. 405 do CPC prevê hipóteses de incapacidade (§ 1.º), impedimento (§ 2.º) e suspeição (§ 3.º) que vedam determinados sujeitos em determinadas circunstâncias de prestarem depoimento como testemunhas. O tema também é tratado pelo art. 228 do CC, sem diferenças substanciais, sendo até mais amplo o dispositivo processual.
Segundo o Código de Processo Civil, são incapazes de prestar depoimento:
(a) o interdito por demência;
(b) o acometido de doença ou debilidade mental que o impossibilite de ter o discernimento necessário e/ou a devida percepção sobre os fatos;
(c) o menor de 16 anos;
(d) o cego e surdo, quando a ciência dos fatos depender dos sentidos que lhes faltam.
Segundo o art. 228, parágrafo único, do CC, os sujeitos incapazes poderão ser ouvidos como informantes. Para parcela da doutrina na hipótese do demente e do cego e surdo a norma é materialmente inaplicável, porque é impossível a um cego testemunhar sobre o que viu ou a um surdo sobre o que ouviu; se salvaria na norma legal a possibilidade de oitiva como informante do menor de 16 anos172. É preciso cuidado com essa afirmação, porque a limitação física pode comprometer um dos sentidos humanos, o que não inviabilizaria uma prova testemunhal fundada em outro sentido humano, tal como o cego que ouviu ou o surdo-mudo que presenciou os fatos.
São impedidos de depor como testemunhas o cônjuge, ascendente e descendente em qualquer grau, ou colateral até o terceiro grau de qualquer das partes, por consanguinidade ou afinidade. Entendo que o impedimento atinge somente o cônjuge e parentes de partes na demanda, de forma que não estão impedidos de depor o cônjuge e ascendentes do assistente. O impedimento cessa quando exigir o interesse público ou nas ações de estado da pessoa, quando a prova for decisiva e não puder ser produzida de outra forma.
Também são impedidos de depor as partes na causa e o sujeito que intervém em nome de uma parte, como o tutor na causa do menor, o representante legal da pessoa jurídica, o juiz, o advogado e outros que assistam ou tenham assistido as partes. Arrolado o próprio juiz da causa como testemunha, caberá a ele decidir se realmente tem ciência dos fatos que podem influir na decisão da causa. Uma vez convencido de sua condição de testemunha, se declara impedido e remete o processo ao seu substituto legal; caso contrário indefere o pedido por decisão interlocutória recorrível por agravo e continua a atuar no processo como juiz (art. 409 do CPC). Tendo o juiz aceitado ser testemunha, não poderá a parte que o arrolou desistir da oitiva, o que poderia servir para burlar o princípio do juiz natural.
São suspeitos para depor como testemunhas:
(a) o condenado definitivo por crime de falso testemunho;
(b) o que, por seus costumes, não for digno de fé;
(c) o inimigo capital ou amigo íntimo da parte, e não do juiz ou do advogado;
(d) o que tiver interesse no litígio, entendendo-se que o interesse deve ser jurídico173.
Sendo estritamente necessário, o que significa dizer que a prova não tem outra forma de ser produzida, o art. 405, § 4.º, do CPC permite ao juiz a oitiva dos sujeitos impedidos e suspeitos de depor, hipótese na qual estarão dispensados de prestar compromisso e seus depoimentos serão apreciados com o valor que possam merecer.
Todos têm o dever de colaborar com o Poder Judiciário na obtenção da verdade, inclusive os terceiros (art. 339 do CPC), e o primeiro dever da testemunha é comparecer em juízo para prestar depoimento. Ocorre, entretanto, que, tendo sido pedida a dispensa de sua intimação pela parte que a arrolou, sua ausência injustificada na audiência gera a preclusão da prova. Tendo sido devidamente intimada, será conduzida coercitivamente à sede do juízo, conforme analisado no Capítulo XX.
De nada adiantaria obrigar a testemunha a comparecer à audiência se fosse admissível o seu silêncio diante das perguntas que lhe são dirigidas. Dessa forma, o segundo dever da testemunha é depor, respondendo às perguntas que lhe sejam dirigidas, salvo quando os fatos acarretarem grave dano à própria testemunha, seu cônjuge ou parentes consanguíneos ou afins, em linha reta, ou na colateral em segundo grau (art. 406, I, CPC). Nesse caso, haverá a possibilidade de recusa da testemunha, mas sendo de sua vontade não existe nenhum impedimento em prestar o depoimento.
Também não há dever de depor a respeito de fatos a cujo respeito, por estado (p. ex., líder religioso) ou profissão (p. ex., advogado e médico), deva guardar sigilo. Nesse caso, há dever de não revelar os fatos e quem descumprir esse dever sem justa causa será responsabilizado criminalmente, além de eventuais consequências cíveis e sanções administrativas.
Além de comparecer e depor, a testemunha tem o dever de dizer a verdade, porque de nada valeria um depoimento fundado em mentiras. Em razão desse dever, a testemunha será advertida pelo juiz antes do início da audiência de que mentir constitui crime de falso testemunho, prestando compromisso de dizer a verdade (art. 415 do CPC), ainda que a ausência de advertência não seja o suficiente para afastar a prática do crime. Os informantes também têm o dever de dizer a verdade, mas a sua mentira não constitui crime.
A testemunha colabora com a obtenção da verdade gratuitamente, mas tem o direito de requerer ao juiz o pagamento da despesa que efetuou para comparecimento à audiência. Apesar de sua extrema raridade na praxe forense, havendo tal pedido a parte que arrolou a testemunha pagará logo que arbitrado o valor ou o depositará em cartório no prazo de três dias (art. 419, caput, do CPC). O valor pago integra o custo do processo e ao final será de responsabilidade da parte sucumbente174.
Ao exercer a função pública de auxiliar eventual da justiça na importante função de descobrir a verdade, não pode a testemunha suportar qualquer prejuízo em razão de ausência em seu trabalho. Segundo o art. 419, parágrafo único, do CPC, sendo a testemunha sujeita à legislação trabalhista, tem o direito a não sofrer perda de salário nem desconto no tempo de serviço, sendo tal norma, em regra, também aplicável aos funcionários públicos, apesar da omissão da lei175.
Prevendo o óbvio, o art. 416, § 1.º, do CPC assegura o direito das testemunhas serem tratadas com urbanidade e respeito, evitando-se as perguntas ou considerações impertinentes, capciosas ou vexatórias. Naturalmente, o controle da conduta dos advogados e serventuários será realizado pelo juiz, mas quando este portar-se com desrespeito ao dispositivo legal ora mencionado deve ser duramente repreendido – com educação, evidentemente – pelos advogados ou mesmo pela própria testemunha.
O Superior Tribunal de Justiça já decidiu ser direito da testemunha ser ouvida no foro de sua residência, o que exigirá a expedição de carta precatória sempre que a testemunha residir em foro (comarca/seção judiciária) diverso daquele no qual tramita o processo176.
As autoridades descritas pelo art. 411 do CPC têm o direito de ser ouvidas em dia, hora e local (residência ou onde exerçam suas funções) que preferirem, cabendo ao juiz solicitar à autoridade que faça tal designação, remetendo à autoridade cópia da petição inicial ou da defesa oferecida pela parte, que a arrolou como testemunha. A autoridade, entretanto, não está obrigada a seguir o procedimento previsto pelo art. 411, parágrafo único, do CPC, podendo se dispor a comparecer à audiência, o que deve ser objeto de informação expressa.
A prova testemunhal é realizada na audiência de instrução e julgamento, salvo nas hipóteses previstas pelo art. 410 do CPC:
(a) produção antecipada de provas;
(b) testemunhas que residam em outra comarca/seção judiciária serão ouvidas por carta precatória e que residam em outro país por carta rogatória;
(c) testemunhas que por doença ou outro motivo relevante estejam impossibilitadas de comparecer em juízo, cabendo ao juiz designar o dia, hora e lugar para inquiri-las (art. 336, parágrafo único, do CPC);
(d) as autoridades constantes do art. 411 do CPC.
Há uma fase preparatória na produção da prova testemunhal, cabendo às partes interessadas na produção desse meio de prova arrolar as testemunhas nos termos do art. 407 do CPC. Segundo o art. 407, parágrafo único, do CPC, cada parte pode oferecer no máximo dez testemunhas, e, quando oferecidas mais de três para provar o mesmo fato, poderá o juiz dispensar o testemunho. Há corrente doutrinária, influenciada pelo direito português, que entende que a limitação só atinge os depoimentos positivos, sendo excluídas da limitação legal as testemunhas que nada sabem dos fatos da causa177. O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o juiz poderá ouvir um número maior que o previsto em lei como testemunhas do juízo178.
A necessidade de arrolamento prévio do rol de testemunhas tem como principal função preservar o princípio do contraditório, permitindo que a parte contrária tenha conhecimento prévio de quais as testemunhas serão ouvidas na audiência. Apesar de parcela doutrinária afirmar que o arrolamento prévio tem dupla finalidade179 – permitir a intimação e preservar o contraditório –, o essencial é a preservação do contraditório, porque, mesmo quando a parte dispensa a intimação, continua a ser obrigatório o arrolamento prévio180.
Aduz o art. 407, caput, do CPC, que o juiz fixará um prazo no caso concreto, e somente no silêncio judicial aplica-se o prazo de dez dias antes da audiência181. Excepcionalmente o juiz poderá determinar um prazo inferior a dez dias, não existindo nenhuma vedação legal ou impedimento lógico para tal conduta182, desde que o juiz conceda tempo hábil para que a parte contrária tome conhecimento do rol de testemunhas, em respeito ao contraditório. Da petição de arrolamento devem constar o nome, a profissão, a residência e o local do trabalho da testemunha, mas a omissão de um ou mais desses dados gera nulidade relativa, significando que o ato só será considerado nulo se a parte contrária provar que a omissão lhe acarretou prejuízo.
Após a apresentação do rol, que deve ser realizado de uma vez só em razão da preclusão consumativa, que veda a sua complementação183, a parte só poderá substituir uma testemunha quando ela:
(a) falecer;
(b) não estiver em condições de depor em razão de enfermidade;
(c) tendo mudado de residência, não foi localizada pelo oficial de justiça ou correio.
É prática fundada em má-fé e deslealdade processual a invenção de testemunha a ser arrolada no prazo legal para que depois, evidentemente não se localizando a pessoa inventada, seja concedida ao advogado uma nova oportunidade de arrolar outra testemunha. Caso o juiz flagre o ato malicioso do advogado, além de proibir a substituição, deverá lhe aplicar a multa de litigância de má-fé e determinar à Ordem dos Advogados a instauração de processo administrativo.
O rol é restritivo, porque protocolada a petição arrolando as testemunhas, essa prova passa a ser do processo, saindo da disponibilidade das partes184. O princípio da comunhão das provas atinge a prova desde o início de seu procedimento, de forma que, uma vez arrolada a testemunha, a sua substituição fora das hipóteses legais depende de anuência da parte contrária. Entendo que, respeitado o contraditório, e não havendo resistência da parte contrária, o rol legal possa ser estendido.
Devidamente intimada nos termos do art. 412, caput, do CPC, ou tendo sido requisitado ao chefe de repartição ou ao comando do corpo em que servir, quando a testemunha for funcionário público ou militar (art. 412, § 2.º, do CPC), o terceiro deve comparecer à audiência de instrução e julgamento. Mesmo a testemunha não intimada, mas devidamente arrolada, poderá comparecer e prestar depoimento, nos termos do art. 412, § 1.º, do CPC, o mesmo ocorrendo na hipótese de a intimação não ter se concretizado, mas a testemunha tiver ciência da audiência.
Antes de depor, o art. 414, caput, do CPC determina que a testemunha seja qualificada, declarando o nome por inteiro, a profissão, a residência e o estado civil, bem como se tem relações de parentesco com a parte ou, ainda, se tem interesse na solução do processo. Nesse momento, o patrono da parte contrária poderá contraditar a testemunha quando entender que ela é incapaz, suspeita ou impedida de prestar depoimento como testemunha, nos termos do art. 405 do CPC.
Segundo o art. 414, § 1.º, do CPC, se a testemunha negar os fatos imputados a ela, a parte que a contraditou poderá – na realidade deverá, já que o ônus probatório é seu – provar a contradita por meio de documentos ou testemunhas, no máximo de três. Sendo necessária a produção da prova testemunhal, a audiência de instrução muito provavelmente será adiada. O juiz tem três possíveis decisões185:
(a) a que indefere e colhe o depoimento da testemunha;
(b) a que defere e não ouve a testemunha;
(c) a que acolhe, desqualifica a qualidade de testemunha do terceiro e colhe o seu depoimento como mero informante do juízo, nos termos do art. 405, § 4.º, do CPC.
Apesar de a previsão legal indicar o momento anterior ao início do depoimento para a contradita, não parece correto o entendimento que entende ser tal prazo preclusivo, impedindo-se o direito de contraditar a testemunha durante seu depoimento186. É possível que durante o depoimento a testemunha traga ao conhecimento da parte contrária informação que poderá fundamentar um pedido de contradita, não sendo legítimo imaginar que nesse caso teria perdido o prazo para tanto187.
As testemunhas arroladas pelo autor são ouvidas antes das arroladas pelo réu (art. 413 do CPC), havendo corrente doutrinária que entende ser invertida essa ordem sempre que houver inversão do ônus da prova188. Não entendo correta essa inversão porque nada no sistema corrobora tal entendimento, devendo-se lembrar que o ônus da prova é regra de julgamento e que, em razão do princípio da comunhão das provas, não será utilizado na hipótese de produção da prova, independentemente do responsável por sua produção. As perguntas serão feitas primeiro pelo juiz, depois pela parte que arrolou a testemunha e finalmente pela parte contrária (art. 416, caput, do CPC).
Aduz o art. 418, II, do CPC que, havendo divergência nos depoimentos de duas ou mais testemunhas sobre um mesmo fato, o juiz de ofício poderá determinar a acareação dessas testemunhas. Também cabe a acareação quando a divergência se estabelece entre depoimento de testemunha e depoimento pessoal da parte. Sem previsão procedimental, aplica-se por analogia o art. 229, parágrafo único, do CPP189. A tentativa de constranger a parte que supostamente mentiu não vem se mostrando eficaz na maioria dos casos, o que faz com que a acareação ocorra cada vez mais raramente.
Segundo o art. 401 do CPC/1973, não se admite a prova exclusivamente testemunhal para convencer o juiz da existência de contratos cujo valor supere o décuplo do maior salário mínimo vigente no País. A norma era de fato criticável, representando injustificado resquício do sistema de prova tarifada em nosso sistema. Tanto assim que doutrina190 e jurisprudência191 consideravam que a vedação à prova exclusivamente testemunhal é limitada à prova da existência do contrato, não atingindo questões referentes ao seu cumprimento, inexecução, efeitos etc.
Além da flexibilização dada pela doutrina e jurisprudência, a rigidez da norma era atenuada pelo art. 402 do CPC/1973, ao permitir a prova testemunhal quando houvesse início de prova escrita ou quando houvesse impedimento moral ou material à obtenção de prova documental. E também pelo art. 404 do CPC/1973, cujas regras são mantidas pelo art. 453 do PLNCPC.
A regra do art. 401 do CPC/1973 foi abolida, mas sua retirada não gerará qualquer efeito prático, considerando que continua em vigor o art. 227 do CC, que consagra regra até mais ampla que aquela existente no art. 401 do CPC/1973, porque exige prova além da testemunhal para qualquer negócio jurídico com valor superior a dez salários mínimos. A lembrança dessa circunstância deve ter sido o motivo de o legislador manter, nos arts. 451 e 452 do PLNCPC, as mesmas regras existentes nos dois incisos do art. 402 do CPC/1973.
A sugerida amplitude do dispositivo, ao admitir prova testemunhal quando a lei exigir prova escrita da obrigação, não alcança os atos jurídicos que só podem ser provados por determinado instrumento público. Não se pode, afinal, admitir que se prove um casamento sem a certidão de casamento só porque há início de prova escrita (um pacto antenupcial, por exemplo).
Há pessoas que não podem depor em razão de incapacidade, suspeição ou impedimento. O tema, que era tratado pelo art. 405 do CPC/1973, vem regulamentado no art. 454 do PLNCPC, com pequenas modificações que não devem alterar substancialmente o instituto processual.
O § 1.º, que trata dos incapazes, tem duas novidades: no inciso I é substituído o termo “demência” por “enfermidade ou deficiência intelectual” e no inciso II é substituída “debilidade mental” por “retardamento mental”. O § 2.º, que trata dos impedidos, inclui em seu inciso I o companheiro da parte. O § 3.º, que trata dos suspeitos, suprime dois incisos do art. 405, § 3.º, do CPC/1973, deixando de ser suspeitos a depor o condenado por crime de falso testemunho e aquele que, por seus costumes, não for digno de fé. No § 4.º são incluídos os menores ao lado dos suspeitos e impedidos que podem ser ouvidos se necessário – foi retirado o “estritamente” –, atribuindo o juiz o valor que possam merecer os testemunhos.
Um dos deveres da testemunha é responder às perguntas que lhe são feitas na audiência, mas, excepcionalmente, será admitida a recusa em responder. O tema era tratado pelo art. 406 do CPC/1973 e passou a ser regulado pelo art. 455 do PLNCPC. As novidades ficam por conta do inciso I: a testemunha passa a poder se recusar a responder se os fatos acarretarem grave dano ao companheiro e a parentes em linha colateral até o terceiro grau. No inciso I do art. 406 do CPC/1973 não havia previsão de companheiro e a linha colateral ia somente até segundo grau.
O art. 456 do PLNCPC está em local inadequado, considerando tratar de matéria referente à produção da prova testemunhal e não à sua admissibilidade ou valor. Mantém em seu caput a regra do art. 410, caput, do CPC/1973 ao prever que, em regra, a testemunha será ouvida na sede do juízo. E no parágrafo único repete a exceção já disposta no art. 410, III, ao admitir a oitiva em outro local em razão de enfermidade ou por outro motivo relevante. Curiosamente, o dispositivo ignora os demais incisos do art. 410 do CPC/1973, ainda que as testemunhas ouvidas por carta ou as autoridades indicadas no art. 461 do PLNCPC continuem a não ser ouvidas na sede do juízo. E paradoxalmente isso é reconhecido pelo art. 460 do PLNCPC.
O rol de testemunhas deve ser apresentado no prazo de quinze dias do saneamento e organização do processo, nos termos do art. 364, § 4.º, do PLNCPC. Excepcionalmente, quando a causa apresentar complexidade em matéria de fato ou de direito, caberá ao juiz designar audiência para que o saneamento seja feito em cooperação com as partes (§ 3.º), quando então deverão apresentar o rol de testemunhas.
Os requisitos formais do rol de testemunhas, antes previstos no art. 407, caput, do CPC/1973, agora estão no art. 457 do PLNCPC. O dispositivo inclui a expressão “sempre que possível” antes de descrever os requisitos, o que deve ser saudado em razão da dificuldade do autor em ter conhecimento, em todos os processos, de todos os dados do réu exigidos pela lei. Tanto assim que a omissão de determinados dados sob a égide do CPC/1973 vinha sendo tratada à luz do princípio da instrumentalidade das formas192. Além do nome, profissão e endereço de residência e do trabalho, o art. 457 do PLNCPC inclui a idade, o estado civil, o número do cadastro de pessoa física e do registro de identidade.
Nos termos do art. 364, § 6.º, o número de testemunhas arroladas não pode ser superior a dez, sendo três, no máximo, para a prova de cada fato, em regra já existente no art. 407, parágrafo único, do CPC/1973. Ainda segundo o dispositivo legal, o juiz poderá limitar o número de testemunhas levando em conta a complexidade da causa e dos fatos individualmente considerados. Não deve ser alterado o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de o juiz admitir um número maior de testemunhas do que aquele previsto em lei, ouvindo-as como testemunhas do juízo193.
Com a apresentação do rol de testemunhas opera-se a preclusão consumativa, o que, ao menos em regra, impede qualquer complementação ou substituição de testemunhas194. A substituição, entretanto, é admitida nas hipóteses previstas pelo art. 458 do PLNCPC. O dispositivo substancialmente repete as hipóteses estabelecidas no art. 408 do PLNCPC, apenas incluindo a possibilidade de substituição quando a testemunha não for encontrada em razão de mudança do local do trabalho.
Como permitido para o depoimento pessoal no art. 392, § 3.º, do PLNCPC, o art. 460, § 1.º, do PLNCPC permite que a oitiva de testemunha que residir em comarca, seção ou subseção judiciárias diversa daquela onde tramita o processo seja realizada por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, o que poderá ocorrer, inclusive, durante a realização da audiência de instrução e julgamento.
Determinadas autoridades têm a prerrogativa, em razão do cargo que exercem, de designar dia, hora e local para sua inquisição como testemunhas. O tema era tratado pelo art. 411 do CPC/1973 e passou a ser abordado pelo art. 461 do PLNCPC. Há interessantes modificações nos §§ 2.º e 3.º do dispositivo legal, ao prever a perda da prerrogativa no caso de autoridade não se manifestar no prazo de um mês (§ 2.º) ou faltar injustificadamente a sessão por ela mesma agendada (§ 3.º). Houve também a inclusão de autoridades: conselheiros do Conselho Nacional de Justiça (III); conselheiros do Conselho Nacional do Ministério Público (IV); advogado-geral da União, procurador-geral do Estado, procurador-geral do Município, defensor público-geral federal e defensor público-geral do Estado (V); prefeito (VIII).
A forma de intimação da testemunha para a audiência sofreu significativa alteração pelo art. 462 do PLNCPC. Segundo o caput do dispositivo, cabe à parte que arrola a testemunha realizar sua intimação, que será, nos termos do § 1.º, executada por meio de carta com aviso de recebimento, cabendo ao advogado juntar cópia da correspondência de intimação e do comprovante de recebimento com antecedência mínima de três dias da data da audiência. Caberá à parte, portanto, calcular a demora razoável dos correios na entrega da carta com aviso de recebimento para cumprir o prazo legal. Naturalmente não poderá arcar com eventual demora excessiva por parte dos correios, cabendo ao juiz analisar a razoabilidade da antecedência no envio da correspondência pela parte. Eventual inércia em realizar a intimação será considerada como desistência da oitiva da testemunha arrolada, nos termos do art. 462, § 3.º, do PLNCPC.
Essa nova forma de intimação, de responsabilidade da parte, não afasta por completo a intimação por via judicial, que continua a ocorrer nas hipóteses previstas pelo art. 462, § 4.º, do PLNCPC: (I) frustrada a intimação prevista no § 1.º deste artigo ou quando a sua necessidade for devidamente demonstrada pelo juiz; (II) quando figurar no rol de testemunhas servidor público ou militar, hipótese em que o juiz o requisitará ao chefe da repartição ou ao comando do corpo em que servir; (III) a testemunha houver sido arrolada pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública; (IV) a testemunha for uma daquelas autoridades previstas no art. 461.
Caso a testemunha devidamente intimada – pela parte ou pelo juízo – deixe de comparecer à audiência sem motivo justificado, será, nos termos do art. 462, § 5.º, do PLNCPC, conduzida coercitivamente, respondendo pelas despesas do adiamento, em regra já existente no art. 412 do CPC/1973.
Finalmente, nos termos do art. 462, § 2.º, do PLNCPC, que é cópia do art. 412, § 1.º, do CPC/1973, a parte pode comprometer-se a levar a testemunha à audiência independentemente de intimação, sendo que nesse caso a ausência injustificada permite a presunção de que a parte desistiu de sua inquisição.
Existe uma ordem na produção da prova testemunhal, consagrada no art. 413 do CPC/1973 e mantida no art. 463, caput, do PLNCPC: primeiro as testemunhas do autor e depois as do réu, no que é conservada a própria ordem do processo de ataque seguido de defesa. A inversão nessa ordem era admitida em situações excepcionais, quando não gerasse prejuízo para as partes, aplicando-se o princípio da instrumentalidade das formas. O parágrafo único do art. 463 do PLNCPC, entretanto, prevê que a ordem só pode ser alterada se as partes concordarem. Entendo que a concordância das partes vincula o juiz, que será obrigado a intervir na ordem legal, mas continua a ser possível, em situações excepcionais, a inversão por imposição do juiz.
Interessante novidade é encontrada no art. 466, caput, do PLNCPC, que determina que as perguntas sejam feitas diretamente pelo advogado das partes, e não mais pelo juiz, após ouvi-las dos advogados, como atualmente ocorre, pelo menos do ponto de vista legal. Caberá ao juiz apenas indeferir as perguntas que puderem induzir a resposta, não tiverem relação com as questões de fato objeto da atividade probatória ou importarem repetição de outra já respondida. Na realidade, atualmente muitos juízes já procedem dessa maneira, apenas controlando a conduta dos patronos para evitar que as perguntas possam induzir as respostas. Por outro lado, compatibiliza-se o processo civil com o processo penal.
É mantida no art. 468 do PLNCPC a acareação entre testemunhas e entre testemunha e parte prevista no art. 418 do CPC/1973. Como não havia previsão procedimental no CPC/1973, a doutrina entendia pela aplicação subsidiária do art. 229, parágrafo único, do CPP, norma atualmente transcrita no art. 468, § 1.º, do PLNCPC. Segundo o § 2.º do dispositivo ora comentado, a acareação pode ser realizada por videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real.
A prova pericial é meio de prova que tem como objetivo esclarecer fatos que exijam um conhecimento técnico específico para a sua exata compreensão. Como não se pode exigir conhecimento pleno do juiz a respeito de todas as ciências humanas e exatas, sempre que o esclarecimento dos fatos exigir tal espécie de conhecimento, o juízo se valerá de um auxiliar especialista, chamado de perito.
Segundo previsão do art. 420 do CPC, a perícia consiste em exame, vistoria ou avaliação. Exame é a perícia que tem como objeto bens móveis, pessoas, coisas e semoventes, como uma obra de arte, documentos, livros, exame de DNA etc. Vistoria é a perícia que tem por objeto bens imóveis. Avaliação é a perícia que tem por objeto a aferição de valor de determinado bem, direito ou obrigação. Apesar da omissão legal, a doutrina aponta uma quarta espécie de perícia: o arbitramento, que consiste numa estimativa do valor de um serviço ou indenização195. Também há corrente doutrinária que defenda serem sinônimos os termos avaliação e arbitramento196. A discussão é meramente acadêmica, sem nenhuma consequência prática.
É indiscutível que a prova pericial é o meio de prova mais complexo, demorado e caro de todo o sistema probatório, de forma que o seu deferimento deve ser reservado somente para as hipóteses em que se faça indispensável contar com o auxílio de um expert. Existem limitações legais e lógicas à produção da prova pericial.
Aduz o art. 420, parágrafo único, I, do CPC que a prova pericial não será produzida quando a prova do fato não depender de conhecimento especial de técnico197. O objetivo da norma é determinar a dispensa da prova pericial sempre que o esclarecimento e compreensão dos fatos exijam tão somente um conhecimento comum à pessoa de cultura média. Deve o juiz se valer das regras de experiência técnica (art. 335 do CPC), composta por noções básicas de outras ciências198, deixando de produzir a prova sempre que o conhecimento técnico exigido não seja complexo, como ocorre em simples cálculos aritméticos.
O dispositivo legal deve ser interpretado com extremo cuidado, porque, na verdade, mesmo quando a prova do fato não depender de conhecimento especial de técnico, a prova pericial poderá ser produzida. Mesmo que o juiz tenha o conhecimento técnico especializado a lhe permitir compreender a questão fática da demanda, ainda assim será exigida a presença do perito, considerando-se que as partes têm o direito ao procedimento da prova pericial em contraditório, o que não seria possível se o juiz atuasse como perito199. Como lembra a melhor doutrina, se não existe juiz-testemunha, também não pode existir juiz-perito200.
Também será dispensada a prova pericial sempre que esse meio se mostrar desnecessário em vista de outras provas produzidas (art. 420, parágrafo único, II, do CPC), como ocorre com a prova documental, que pode se mostrar no caso concreto suficiente para formar o convencimento do juiz201. Entendo que a dispensa nesse caso tem uma interessante particularidade; sendo a prova pericial necessária quando o conhecimento técnico específico é exigido, como poderiam outros meios de prova suprir tal exigência? De duas uma, ou a prova não demanda conhecimento técnico, podendo ser provada por outros meios de prova que não a perícia, ou existindo a necessidade de conhecimentos técnicos específicos o único meio de prova admissível será justamente a perícia. A única forma de compatibilizar o art. 420, parágrafo único, II, do CPC com tais premissas é limitar a sua aplicação à hipótese de fato confessado ou incontroverso ou na hipótese prevista no art. 427 do CPC202.
O art. 427 do CPC dispensa a prova pericial sempre que as partes, na inicial e na contestação, apresentarem pareceres técnicos ou documentos que o juiz considere elucidativos a respeito das questões de fato. Ainda que o espírito da lei seja evitar a produção de prova demorada, complexa e cara, como é a prova pericial, o direito à prova, garantido constitucionalmente, torna o dispositivo legal de pouca aplicação prática.
É natural que os pareceres técnicos sejam conflitantes, o que exigirá um trabalho isento de interesses, que só pode ser realizado pelo perito. Diante dessa óbvia constatação, a melhor doutrina limita a dispensa da prova pericial à luz do art. 427 do CPC a situações raras, nas quais não exista impugnação séria e fundamentada a respeito da autenticidade do parecer, da idoneidade do profissional que o elaborou, da metodologia empregada e dos fatos nele declarados203. A preocupação com o direito à prova leva parcela da doutrina a ser ainda mais restritiva, exigindo para a dispensa da perícia que ambas as partes estejam de acordo com os pareceres apresentados204.
Outra hipótese de dispensa da produção da prova pericial prevista pelo art. 420, parágrafo único, do CPC é a verificação impraticável do fato, hipótese na qual a produção de prova pericial mostra-se inútil. A verificação impraticável pode decorrer da impossibilidade de a ciência em seu atual estágio produzir a prova técnica ou ainda quando a fonte probatória não mais existir205.
O ordenamento processual brasileiro adotou o sistema de escolha do perito pelo próprio juiz, não tendo as partes nessa escolha nenhuma influência206, que quando muito poderão sugerir nomes ao juiz, que sempre dará decisão final e irrecorrível a respeito de quem funcionará como perito da demanda judicial. Nem mesmo se as partes em comum acordo indicarem um perito o juiz estará obrigado a aceitá-lo, ainda que nesse caso o bom senso indique que o mais adequado seja seguir a vontade das partes.
Tratando-se de perícia complexa (art. 431-B do CPC), a indicação de todos os peritos que atuam na demanda deve ser realizada pelo juiz. Já decidiu o Superior Tribunal de Justiça que não cabe ao perito indicado pelo juiz, percebendo a necessidade de outro conhecimento técnico específico, indicar outro perito para complementar o trabalho pericial207. Deve nesse caso informar o juízo acerca da impossibilidade de completar na totalidade o trabalho pericial, ficando a cargo do juiz a indicação de mais um perito para trabalhar conjuntamente com aquele originariamente indicado.
O art. 145, §§ 1.º e 2.º, do CPC limita a escolha do perito pelo juiz ao indicar requisitos objetivos que devem ser respeitados:
(a) o perito deve ser profissional de nível universitário, devidamente inscrito no órgão de classe competente208;
(b) os peritos devem comprovar sua especialidade na matéria mediante certidão do órgão profissional em que estiverem escritos.
Não havendo na localidade profissionais que atendam tais requisitos, o art. 145, § 3.º, do CPC permite ao juiz a livre escolha do perito.
O art. 434 do CPC prevê que na perícia referente à autenticidade ou falsidade documental, ou ainda de natureza médico-legal, o juiz de preferência indique técnico de estabelecimento oficial especializado. Na realidade, o juiz pode apenas indicar o estabelecimento sem indicar especificamente qual será entre os seus técnicos o responsável pela realização da perícia209. Como o dispositivo legal prevê ser a escolha apenas preferencial, continua o juiz com o poder de nomear qualquer perito de sua confiança210.
O encargo de perito representa a prestação de um serviço público eventual, e, segundo o art. 339 do CPC, ninguém está eximido de auxiliar o juízo na busca da verdade. Significa dizer que o perito tem um dever de prestar o serviço técnico, sendo naturalmente remunerado por isso. Existe, entretanto, uma possibilidade de o perito se livrar de seu dever, deixando de trabalhar no processo.
Segundo o art. 423 do CPC, o perito pode escusar-se da tarefa por motivo legítimo (art. 146, caput, do CPC). A escusa deve ser apresentada dentro de 5 dias da intimação ou do impedimento superveniente, prevendo o art. 146, parágrafo único, do CPC, que decorrido esse prazo reputar-se-á renunciado o direito de alegar a escusa. Na realidade, o prazo de 5 dias é preclusivo, de forma que decorrido o prazo sem a manifestação do perito não mais poderá este requerer sua dispensa em razão do fenômeno da preclusão temporal.
O art. 431-B do CPC, acrescentado pela Lei 10.358/2001, apenas confirma legislativamente prática tradicional na praxe forense mesmo antes da modificação legislativa211. A complexidade crescente das relações humanas é inegável, transportando ao processo matérias novas e cada vez mais complexas. E o que é ainda mais problemático, uma vez que algumas questões fáticas que compõem os processos na atualidade demandam mais de uma área de conhecimento, o que torna o trabalho de um só perito uma missão impossível de ser cumprida.
Com essas situações em mente, o art. 431-B do CPC permite ao juiz a nomeação de mais de um perito para a produção do trabalho pericial. Também prevê a norma em que casos tal possibilidade é concedida ao juiz, qual seja quando tratar-se de perícia complexa, que para o legislador é aquela que abranja mais de uma área de conhecimento especializado. A exigência de multiplicidade de peritos conforme a multiplicidade de conhecimentos técnicos exigidos é decorrência natural da própria razão de ser da prova pericial.
Entendo que o dispositivo legal ora comentado não se refere à situação representada pela exigência de diversas perícias sobre o mesmo objeto, matéria essa já devidamente disciplinada pelos arts. 437 a 439 do CPC212. E nem mesmo a possibilidade de o juiz determinar mais de um perito com os mesmos conhecimentos técnicos para a realização da mesma perícia, que embora seja medida que não se encontra vedada a priori pela lei213, deve ser reservada a casos excepcionais em razão de seu custo.
Cumpre registrar que, apesar da qualidade indiscutível do art. 431-B do CPC e da utilidade do que prevê, a multiplicidade de peritos deve ser excepcional, cabendo ao juiz reservá-la somente a situações em que realmente seja impossível concentrar em um só perito todo o trabalho pericial. Esse cuidado do juiz atende aos princípios da celeridade e da economia processual, sendo manifestamente mais simples, rápida e barata a perícia concentrada em apenas um perito214.
A substituição do perito é tema tratado pelo art. 424 do CPC, que a prevê em duas hipóteses:
(a) perito que não tem o conhecimento técnico ou científico necessário, a ponto de impedir que o trabalho pericial seja realizado a contento. Trata-se de hipótese de rara ocorrência em razão de ser o próprio juiz o responsável pela indicação do perito, presumindo-se ter ciência prévia de sua capacidade215;
(b) o descumprimento do prazo para a entrega do laudo pericial sem motivo legítimo, devendo-se a todo custo evitar essa hipótese de substituição considerando-se todo o tempo, energia e dinheiro já gastos.
Na situação extrema de o juiz determinar a substituição do perito por descumprimento do prazo para a entrega do laudo, comunicará a ocorrência à corporação profissional da qual o perito faça parte para as devidas sanções administrativas. Poderá, também, impor uma multa, tomando por base de cálculo o valor da causa e o possível prejuízo decorrente do atraso (art. 424, parágrafo único, do CPC).
Além das hipóteses previstas no art. 424 do CPC, o perito também será substituído se alegar ser suspeito ou impedido (art. 138, III, do CPC). Da mesma forma ocorrerá se a exceção de suspeição e impedimento oferecida por qualquer das partes for acolhida.
Segundo o art. 138, § 1.º, do CPC, caberá à parte no primeiro momento em que falar nos autos após a indicação do perito arguir a sua parcialidade em petição fundamentada e devidamente instruída. O Superior Tribunal de Justiça já entendeu que não cabe a alegação de suspeição do perito somente após a apresentação do laudo216. O juiz determinará que o incidente se processe em separado e sem suspensão do procedimento principal, ouvindo o perito em 5 dias, produzindo prova, quando necessário, e decidindo por meio de decisão interlocutória recorrível por agravo de instrumento217. Note-se que o próprio juiz da demanda é competente para o julgamento da exceção, porque, embora tenha sido o responsável pela indicação do perito, as suspeitas de parcialidade não recaem sobre o juiz, mas sobre o sujeito por ele indicado.
O juiz nomeará o perito já fixando o prazo para a entrega do laudo e o valor de seus honorários. Apesar de o art. 33, parágrafo único, do CPC, prever que o juiz poderá determinar que a parte responsável pelo adiantamento do pagamento deposite previamente em juízo o valor dos honorários, é essa a praxe forense, ao menos com a exigência de um depósito prévio parcial. Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o prazo determinado para o depósito dos honorários do perito não é peremptório, admitindo-se que, mesmo vencido o prazo, a parte realize o depósito quando não houver prejuízo ao processo218.
Com a nomeação do perito, as partes serão intimadas para apresentar no prazo comum de 5 dias seus quesitos e seus assistentes técnicos. Trata-se de ônus processual imperfeito, considerando-se que a ausência de tais indicações não irá necessariamente criar uma situação de desvantagem à parte. O Superior Tribunal de Justiça vem sistematicamente flexibilizando esse prazo, admitindo que as partes indiquem quesitos e/ou assistentes técnicos após o decurso do prazo de cinco dias, desde que ainda não iniciada a perícia219.
Caberá ainda a apresentação de quesitos suplementares durante a realização da perícia, independentemente de a parte ter indicado quesitos iniciais220, hipótese na qual a parte contrária será intimada em respeito ao princípio do contraditório (art. 425 do CPC). Apesar da admissão dos quesitos suplementares até o encerramento do trabalho pericial, cumpre ao juiz evitar que a permissão legal seja indevidamente utilizada para procrastinar o andamento procedimental221. Entendo que não seja necessário à parte demonstrar por que não formulou o quesito quando intimada do protocolo do laudo pericial222, sendo sempre interessante em termos de qualidade do trabalho pericial a existência de quesitos pertinentes e assistentes técnicos colaborativos.
Segundo o art. 426 do CPC, caberá ao juiz indeferir quesitos impertinentes e formular os que entender necessários para o esclarecimento dos fatos. Compreende-se que a atividade do juiz seja subsidiária, primeiro abrindo-se oportunidade às partes para a indicação de quesitos, o que muitas vezes se fará de forma completa, dispensando o juiz da determinação de quesitos do juízo.
Quando a prova pericial tiver que ser realizada em outro foro, caberá a expedição de carta precatória e em outro país, de carta rogatória. Nesse caso, não teria nenhum sentido o juízo deprecante nomear o perito, sendo tal tarefa transferida ao juízo deprecado, que, uma vez tenha indicado o perito, intimará as partes para o oferecimento de quesitos e/ou assistentes técnicos. Como se pode notar no art. 428 do CPC, ao juízo deprecante cabe somente o deferimento da prova pericial e ao final sua valoração, sendo toda a fase de produção da prova desenvolvida perante o juízo deprecado223. Admite-se, entretanto, que o juízo deprecante elabore quesitos a serem respondidos pelo perito indicado pelo juízo deprecado.
Em respeito ao princípio do contraditório, o art. 431-A do CPC prevê a intimação das partes – na pessoa de seus advogados – da data e local designados para o início dos trabalhos periciais, devendo também constar da intimação a hora em que os trabalhos se iniciaram. O dispositivo legal consagra o entendimento de que somente impugnar o laudo pericial não é o suficiente para atender ao princípio do contraditório, devendo-se facultar às partes uma ampla participação, inclusive com objetivos fiscalizadores, durante toda a fase de produção da prova pericial.
Limitar o contraditório na prova pericial à impugnação depois de laudo pronto e acabado seria o mesmo que impedir a presença das partes e seus patronos na audiência de instrução e julgamento, limitando-se sua participação na prova testemunhal a impugnar o depoimento das testemunhas. Apesar da evidente importância da intimação ora analisada, só haverá nulidade se a sua ausência gerar prejuízo às partes ou ao processo.
O perito deve protocolar em cartório o laudo pericial no prazo fixado pelo juiz, admitindo-se que em situações excepcionais, provando o perito um motivo justificado, o prazo seja prorrogado por no máximo uma vez (art. 432 do CPC). Caberá ao juiz atentar à exigência contida no art. 433, caput, do CPC, que exige um prazo mínimo de 20 dias entre a data do protocolo do laudo pericial e a data da audiência de instrução. O prazo se impõe para possibilitar às partes a apresentação de pareceres técnicos e a realização do pedido de comparecimento do perito em audiência para esclarecimentos (art. 435 do CPC).
Após o protocolo do laudo pericial, as partes serão intimadas para que no prazo comum de 10 dias se manifestem a respeito do trabalho pericial224. Quando a parte tem assistente técnico, é apresentado um parecer técnico; porém, mesmo a parte que não o tenha poderá se manifestar a respeito do laudo pericial por meio de mera petição.
A prova pericial em regra é produzida antes da audiência de instrução e julgamento, e até mesmo em processos nos quais não há tal audiência, em razão da desnecessidade de produção de prova oral. Excepcionalmente, entretanto, o perito poderá exercer alguma espécie de atividade durante a audiência de instrução de julgamento.
O art. 421, § 2.º, do CPC prevê a chamada perícia simples, a ser realizada na audiência de instrução e julgamento quando a natureza do fato permitir. Nessa perícia simples, o juiz inquire o perito e os assistentes técnicos em audiência a respeito das coisas que houverem informalmente examinado ou avaliado. Trata-se da única forma de perícia admitida nos Juizados Especiais Estaduais (art. 35, caput, da Lei 9.099/1995). Apesar da boa intenção da norma em simplificar o procedimento da prova pericial, é de extrema raridade a realização da perícia simples.
Além de impugnar por escrito o laudo pericial nos termos do art. 433, parágrafo único, do CPC, as partes podem requerer a intimação do perito e dos assistentes técnicos – naturalmente da parte contrária – para comparecer à audiência e prestar esclarecimentos. Caberá à parte interessada requerer a intimação do perito e/ou assistente técnico já formulando desde já suas perguntas, na forma de quesitos. Apesar de o art. 435, caput, do CPC não exigir uma fundamentação nesse pedido, a parte diligente deve indicar contradições e/ou inconsistências do laudo pericial, evitando assim que o juiz indefira o pedido entendendo que os esclarecimentos são impertinentes.
O prazo previsto para o protocolo da petição que requer a presença do perito ou do assistente técnico em audiência de instrução e julgamento é de 5 dias antes da audiência de instrução e julgamento. Como o perito e o assistente técnico a serem intimados já sabem quais as perguntas que deverão responder em audiência, admite-se que levem as respostas por escrito, o que não evitará terem de responder oralmente a outros questionamentos, caso as respostas escritas não se mostrem efetivamente esclarecedoras.
Não parecendo ao juiz que os fatos que foram objeto da perícia estejam devidamente esclarecidos, é admissível a designação de uma nova perícia, sem que a primeira seja inteiramente desconsiderada, ou seja, o juiz poderá em sua fundamentação valer-se de ambas as perícias na formação de seu convencimento (art. 439, parágrafo único, do CPC)225. Essa segunda perícia tem como objeto os mesmos fatos sobre que recaiu a primeira, sendo realizada justamente porque a primeira perícia mostrou-se defeituosa ou incompleta (art. 438 do CPC).
O juiz poderá determinar a segunda perícia de ofício ou a requerimento das partes, sempre por meio de decisão interlocutória recorrível por agravo de instrumento226, não se mostrando correto o entendimento de que deferida a segunda perícia o pronunciamento do juiz é irrecorrível227. O perito responsável pela segunda perícia é mais uma vez escolhido pelo juiz, podendo inclusive ser o mesmo que realizou o primeiro laudo228, embora não seja recomendável tal repetição, em especial na hipótese de laudo defeituoso. Determinada a segunda perícia, as partes têm o direito de formular novos quesitos229.
Como já analisado no Capítulo 14, item 14.1.10, o sistema de valoração das provas adotado pelo sistema processual brasileiro é o da persuasão racional, também chamado de livre convencimento motivado. Significa dizer que não existem cargas de convencimento preestabelecidas dos meios de prova, sendo incorreto afirmar abstratamente que determinado meio de prova é mais eficaz no convencimento do juiz do que outro. Com inspiração nesse sistema de valoração das provas, o art. 436 do CPC prevê que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo se convencer com outros elementos ou fatos provados no processo.
Apesar da relativa liberdade do juiz na valoração da prova, é inegável que, produzido um laudo pericial – o que em tese só deve ocorrer quando for necessário um conhecimento técnico específico –, a fundamentação do juiz que não considera suas conclusões se afasta do que se costuma esperar da conduta do juiz. Justamente em razão da relevância da prova pericial, cabe ao juiz na aplicação do art. 436 do CPC expressamente indicar na fundamentação os motivos pelos quais não adotou as conclusões periciais, com a indicação das outras provas que entendeu suficientes à formação de seu convencimento230.
A perícia é reconhecidamente o meio de prova mais complexo, demorado e caro do sistema processual, sendo compreensíveis as tentativas do legislador de evitar sua realização no caso concreto. Nesse sentido era o art. 421, § 2.º, do CPC/1973 ao prever a perícia informal, e o art. 427 do CPC/1973, que dispunha a dispensa da prova pericial quando as partes juntassem à inicial e à contestação pareceres técnicos. Essas tentativas, entretanto, não surtirão o efeito pretendido, considerando a baixa incidência prática de tais medidas.
De qualquer forma, o PLNCPC resolveu insistir nas técnicas já previstas no CPC/1973. A regra do art. 427 do CPC/1973 é repetida no art. 479. E no art. 471, §§ 2.º, 3.º e 4.º, há previsão da antiga perícia informal, agora chamada de prova técnica simplificada, destinada a ponto controvertido de menor complexidade e realizada por meio de oitiva do especialista em audiência, que poderá se valer de qualquer recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens com o fim de esclarecer os pontos controvertidos na causa. Nada indica que as novas regras, que na realidade especificam a espécie de prova, provoquem mudança no panorama forense.
Significativa novidade é a possibilidade de as partes escolherem o perito, consagrada no art. 478 do PLNCPC, desde que as partes sejam plenamente capazes e a causa possa ser resolvida por autocomposição. Nos termos do art. 478, § 1.º, no momento de escolha do perito pelas partes já devem indicar seus assistentes técnicos, bem como a data e local em que será realizada – ou iniciada – a perícia. As partes podem escolher o perito, que será imposto ao juiz independentemente de sua vontade, mas o prazo continuará a ser fixado pelo juiz, nos termos do § 2.º. E o § 3.º, para equiparar a atuação do perito indicado pelas partes ao do indicado pelo juiz, prevê que a perícia consensual substitui, para todos os efeitos, a que seria realizada por perito nomeado pelo juiz.
A escolha do perito pelas partes, como já admitida em outros países, por exemplo, a Inglaterra, quebra a regra milenar presente no processo civil brasileiro de que o perito deve ser alguém de confiança do juiz. Em um primeiro plano deve ser de confiança das partes, e somente se estas não chegarem a um acordo, prevalecerá a escolha de alguém de confiança do juiz. A mudança não deve gerar grandes consequências práticas em virtude do espírito beligerante das partes, que dificilmente chegarão a um acordo, algo mais factível de acontecer em uma arbitragem do que em um processo judicial.
Ainda assim, a mudança deve ser efusivamente saudada, porque afasta a lenda de que o processo, por ser de natureza pública, deve ser conduzido pelo juiz independentemente da vontade das partes. Ainda que a qualidade da prova pericial seja essencial à qualidade da prestação jurisdicional, e esse seja realmente um valor de ordem pública, proibir que as partes acordem a respeito do perito só porque o juiz tem alguém de sua confiança é realidade insuportável à luz do princípio dispositivo.
Só não concordei com o art. 478, § 3.º, do PLNCPC, que dá indevidamente a entender que a “pericia consensual” seria equiparada em todos os efeitos com a “perícia judicial”. Na realidade, não existe essa diferença sugerida pelo dispositivo legal, considerando-se que a perícia é sempre judicial, sendo consensual ou judicial apenas a escolha do perito. Diante dessa realidade, nada a ser equiparado ou substituído como prevê o criticável dispositivo legal.
As hipóteses de substituição do perito, consagradas no art. 424 do CPC/1973, são repetidas no art. 475 do PLNCPC. Há, entretanto, interessantes novidades quanto aos honorários já recebidos pelo perito substituído. Segundo o § 2.º do dispositivo, o perito substituído terá o prazo de quinze dias para devolver os valores recebidos pelo trabalho não apresentado, sob pena de ficar impedido de atuar como perito judicial pelo período de cinco anos. A par da sanção prevista no § 2.º, o § 3.º prevê a possibilidade de a parte executar o perito substituído na hipótese de não ocorrer a devolução voluntariamente.
A prova pericial foi o meio de prova que teve o seu procedimento mais modificado pelo PLNCPC.
O art. 472 do PLNCPC, repetindo o art. 421, caput, do CPC/1973, prevê que o juiz nomeará o perito e fixará de imediato o prazo para entrega do laudo. As novidades ficam por conta do § 2.º do dispositivo. Segundo o caput, ciente da nomeação, o perito terá um prazo de cinco dias para apresentar sua proposta de honorários, indicar seu currículo, a fim de comprovar sua especialização, e indicar seus contatos profissionais, em especial o endereço eletrônico que servirá para as intimações.
A tormentosa questão dos honorários periciais é tratada pelos §§ 3.º a 5.º do art. 472. Nos termos do § 3.º, as partes serão intimadas a respeito da proposta de honorários do perito e terão cinco dias para se manifestar, decidindo o juiz logo após, seguindo o adiantamento a regra do art. 95 do PLNCPC. Segundo o § 4.º do dispositivo ora analisado, o juiz poderá autorizar o pagamento de até cinquenta por cento dos honorários arbitrados pelo juiz, e o restante será pago somente quando o laudo for entregue e todos os esclarecimentos forem prestados. E o § 5.º prevê que, quando a perícia for inconclusiva ou deficiente, o juiz poderá reduzir a remuneração inicialmente arbitrada para o trabalho.
Em medida para reafirmar a necessidade de o contraditório ser respeitado durante a realização da perícia, o art. 473, parágrafo único, do PLNCPC prevê que o perito deve assegurar aos assistentes das partes o acesso e o acompanhamento das diligências e dos exames que realizar, com prévia comunicação, comprovada nos autos, com antecedência mínima de cinco dias.
A possibilidade de as partes apresentarem quesitos suplementares, já consagrada no art. 425 do CPC/1973, é mantida no art. 476 do PLNCPC. Há, entretanto, uma interessante inclusão: tais quesitos podem ser respondidos pelo perito durante a própria perícia ou na audiência de instrumento e julgamento. Diante do silêncio legal, parece que a escolha entre os momentos consagrados no dispositivo é do perito, que deverá levar em conta o estágio de sua perícia e da complexidade envolvida nos quesitos suplementares apresentados pelas partes.
Caso o perito não cumpra o prazo para entrega do laudo, sem motivo justificado, o juiz poderá lhe conceder, por apenas uma vez, a prorrogação de prazo. A regra do art. 438 do PLNCPC já existia no art. 432 do CPC/1973, mas há uma novidade: enquanto o artigo revogado deixava ao prudente arbítrio o prazo dessa prorrogação, o novo dispositivo prevê expressamente que a prorrogação se dará pela metade do prazo originariamente fixado.
Uma novidade significativa é trazida pelo art. 480 do PLNCPC, ainda que em algumas passagens o dispositivo se limite a consagrar entendimentos doutrinários consolidados. De qualquer modo, é a primeira vez que o legislador se preocupa em regulamentar a forma e conteúdo do laudo pericial. Nos quatro incisos são previstos os elementos do laudo pericial: (I) exposição do objeto da perícia; (II) análise técnica ou científica realizada pelo perito; (III) indicação do método utilizado, esclarecendo-o e demonstrando ser predominantemente aceito pelos especialistas da área do conhecimento da qual se originou; (IV) resposta conclusiva a todos os quesitos apresentados pelo juiz, pelas partes e pelo órgão do Ministério Público.
Seguindo a tendência de simplificação na linguagem utilizada no processo, o art. 480, § 1.º, exige do perito a utilização de linguagem simples e com coerência lógica, com a devida justificativa de suas conclusões. Só é preciso lembrar que, por se tratar de matéria que exige conhecimento técnico específico, a linguagem técnica é inevitável, não devendo o intérprete se esquecer dessa realidade.
Na tentativa de limitar o perito em seu laudo pericial a apenas uma conclusão descritiva dos fatos, o § 2.º do dispositivo analisado prevê ser vedado ao perito ultrapassar os limites da sua designação e, bem assim, emitir opiniões pessoais que excedam o exame técnico ou científico do objeto da perícia.
Segundo o art. 484, § 1.º, do PLNCPC, depois do protocolo do laudo pericial em cartório, as partes serão intimadas para se manifestarem no período de comum de quinze dias sobre o laudo, mesmo prazo que os assistentes terão para apresentar seus pareceres técnicos (no art. 433, parágrafo único, do CPC/1973 o prazo era de dez dias). Entendo irrazoável o dispositivo, considerando que o assistente técnico é o técnico da parte, não se justificando haver prazo para a parte e para ele, ainda que com termo inicial único. O prazo é da parte, que poderá se manifestar sozinha, com ou pelo parecer do assistente técnico.
Havendo a manifestação das partes, o art. 484, § 2.º, do PLNCPC prevê que cabe ao perito, no prazo de quinze dias, esclarecer ponto: (I) sobre o qual exista divergência ou dúvida de qualquer das partes, do juiz ou do órgão do Ministério Público; (II) divergente apresentado no parecer do assistente técnico da parte.
E somente após a explicação por escrito do perito, e se ainda restarem dúvidas a respeito de seu trabalho, as partes, nos termos do § 3.º do art. 484 do PLNCPC, haverá a intimação do perito e do assistente técnico para comparecimento em audiência. O prazo de antecedência no art. 435 do CPC/1973 era de cinco dias e passou a ser de dez dias no art. 484, § 4.º, sendo a intimação realizada por meio eletrônico.
Há novidades quanto ao exame que tenha por objeto a autenticidade ou a falsidade documental ou de natureza médico-legal realizado em estabelecimentos oficiais especializados. O caput e parágrafo único do art. 434 do CPC/1973 foram transferidos para o caput e § 3.º do art. 485 do PLNCPC. As novidades estão nos dois primeiros parágrafos: (a) no § 1.º há uma preferência no caso de existir no caso concreto a gratuidade de justiça; e (b) no § 2.º a previsão de que a prorrogação do prazo pode ser requerida motivadamente, o que significa que o prazo tem natureza dilatória.
O art. 486 do PLNCPC é inteiramente novo, regulando o exame psicológico ou biopsicossocial e se valendo de regras legais já existentes nos §§ 1.º e 2.º do art. 5.º da Lei 12.318/2010 (Lei de Alienação Parental). Nos termos do inciso I, o laudo pericial terá base em ampla avaliação psicológica ou biopsicossocial, conforme o caso, compreendendo, inclusive, entrevista pessoal com as partes, exame de documentos do processo, histórico do relacionamento familiar, cronologia de incidentes e avaliação da personalidade dos sujeitos envolvidos na controvérsia. Já o inciso II prevê que a perícia será realizada por profissional ou equipe multidisciplinar habilitado, exigida, em qualquer caso, aptidão comprovada por histórico profissional ou acadêmico.
As regras que regulamentavam a segunda perícia no CPC/1973 – arts. 437, 438 e 439 – foram repetidas nos arts. 488, 489 e 490 do PLNCPC. Perdeu-se uma ótima oportunidade de se resolver por imposição legal uma divergência doutrinária a respeito da possibilidade de poder ser o mesmo perito da primeira perícia designado para a segunda231.
A inspeção judicial consiste em prova produzida diretamente pelo juiz, quando inspeciona pessoas, coisas ou lugares, sem qualquer intermediário entre a fonte de prova e o juiz. Podem ser objeto de inspeção judicial bens móveis, imóveis e semoventes, além das partes e de terceiros, que se submetem ao exame realizado pelo juiz em decorrência de seu dever em colaborar com o Poder Judiciário para a obtenção da verdade232.
Costuma-se afirmar que a inspeção judicial é ao mesmo tempo o melhor e mais raro meio de prova. Melhor porque elimina intermediário que poderia influenciar negativamente na formação do convencimento judicial, constituindo a inspeção judicial o mais seguro e esclarecedor meio de prova. Mais raro porque seria meio de prova subsidiário, somente se procedendo à inspeção judicial na hipótese de o juiz considerar que os outros meios de prova não foram ou não serão suficientes para formar seu convencimento233. Concordo que seja o melhor meio de prova, e provavelmente o mais raro, mas essa raridade não decorre do caráter subsidiário da inspeção judicial, mas de uma mera opção dos juízes no caso concreto. A inspeção judicial, portanto, pode ser realizada independentemente do esgotamento dos outros meios de prova234.
O exame direto realizado pelo juiz na inspeção judicial lembra a prova pericial, que também é realizada por meio de um exame. A diferença, entretanto, além do sujeito que realiza o exame – juiz no primeiro caso e perito no segundo –, é a natureza do conhecimento exigido, porque na inspeção judicial não há necessidade de o juiz ser dotado de conhecimentos técnicos ou científicos235. Ainda que parcela da doutrina chame de inspeção indireta o exame realizado por perito sem as formalidades do procedimento pericial236, acredito que só existe inspeção judicial quando realizada diretamente pelo juiz237. Por essa razão, não é inspeção judicial, mas prova atípica, a inspeção em pessoas ou coisas realizadas por terceiro de confiança do juiz nos Juizados Especiais (art. 35, parágrafo único, da Lei 9.099/1995).
Como todo meio de prova, também a inspeção judicial pode ser determinada de ofício ou a requerimento das partes, sempre se levando em conta a imprescindível necessidade de sua realização.
O art. 442, parágrafo único, do CPC prevê que as partes têm o direito de assistir à inspeção, prestando esclarecimentos e fazendo observações pertinentes. Apesar de não existir na lei uma regra que discipline a intimação das partes para participarem da inspeção judicial, é inegável que o respeito ao princípio do contraditório exige que tal intimação seja realizada. Até porque, se há previsão expressa para assistirem à inspeção, naturalmente deverão ser previamente informadas sobre a sua realização. Inspeção realizada solitariamente pelo juiz, portanto, não é inspeção judicial, não devendo ser admitida como prova no processo, até mesmo porque as impressões colhidas desse ato constituem ciência privada do juiz238.
O juiz poderá se valer do auxílio de um ou mais peritos (art. 441 do CPC), mas essa intervenção pericial somente se justifica quando um conhecimento técnico específico seja exigido para a compreensão dos fatos que são objeto da prova. Ao final da inspeção, o juiz mandará lavrar auto circunstanciado com todas as informações úteis ao julgamento, podendo instruir o auto com desenhos, gráficos ou fotografias (art. 443 do CPC). No auto circunstanciado não devem constar conclusões a respeito dos fatos, limitando-se o juiz a um texto narrativo de tudo o que possa importar para a formação do convencimento judicial. Deve-se lembrar que a inspeção judicial é um meio de prova, que como qualquer outro primeiro deve ser produzido, e somente após esse momento procedimental, devidamente valorado239.
Em regra, a inspeção judicial ocorre na sede do juízo e na audiência de instrução e julgamento. Ainda que na sede do juízo, é plenamente admitida a inspeção judicial em audiência com esse fim específico. Excepcionalmente, a inspeção judicial ocorrerá fora da sede do juízo, prevendo o art. 442 do CPC as hipóteses nas quais o juiz deverá ir ao local onde se encontrem a pessoa ou a coisa.
A inspeção judicial fora da sede do juízo ocorre sempre que o juiz entender necessária tal medida para a melhor verificação ou interpretação dos fatos que deva observar. Caberá ao juiz no caso concreto fazer tal análise, ponderando que o deslocamento não só dele, mas de todo o seu staff, é prática que deve ser reservada apenas àquelas situações nas quais a realização da inspeção judicial em audiência na sede do juízo não tenha aptidão de formar seu convencimento. Também será realizada a inspeção judicial no local da coisa sempre que seu transporte à sede do juízo mostrar-se dispendioso ou extremamente difícil, como na hipótese de coisas de grande porte ou de alto valor (que demandariam grande aparato de segurança para sua locomoção). Apesar de o dispositivo se referir somente à coisa, é também aplicável a pessoas que tenham dificuldade em acessar a sede do juízo, como no caso de pessoas enfermas240. Por fim, e por razões óbvias, também será realizada a inspeção judicial fora da sede do juízo na reconstituição dos fatos, quando o juiz deverá se locomover até o local em que os fatos ocorreram.
As regras constantes nos arts. 440 a 443 do CPC/1973 são repetidas nos arts. 491 a 494 do PLNCPC, de forma que são mantidas todas as regras que regulamentam a inspeção judicial. Mais uma perda importante de oportunidade, já que o legislador poderia ter resolvido impasse a respeito da subsidiariedade desse meio de prova241. Na continuação de omissão da lei, continuo a entender que raridade da realização da inspeção judicial não decorre de uma suposta subsidiariedade, mas de mera opção dos juízes no caso concreto pela realização de outros meios de prova de produção mais cômoda para o juiz.
1 Cambi, Direito, 2001, p. 46; Garcia, Prova civil, 6.1, p. 28.
2 Amaral Santos, Prova, 1970, v. 1, p. 11.
3 Câmara, Lições, v. 1, 2003, p. 393; Greco Filho, Direito, v. 2, 2000, p. 180.
4 Amaral Santos, Prova, v. 1, p. 17.
5 Dinamarco, Instituições, v. 3, 2003, p. 43.
6 Amaral Santos, Primeiras, v. 2, p. 339-341. Baptista da Silva, Teoria, p. 295-296.
7 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 295; Baptista da Silva, Curso, v. 1, p. 339.
8 Reale, Verdade, 1983, p. 17-18.
9 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 297.
10 Arruda Alvim, Manual, v. 1, p. 379.
11 Cambi, Direito, p. 59. Zavaski, Antecipação, 1996, p. 152-153, e Bedaque, Tutela, 1988, p. 337.
12 Cambi, Direito, p. 70; Fux, Curso, 2004, p. 692.
13 Barros, A busca, p. 38; Torquato Avolio, Provas, p. 39-40. Incorretamente valendo-se do termo “verdade real”: Informativo 372/STJ, 4.a T., REsp 1.010.559-RN, rel. Aldir Passarinho Jr., j. 16.10.2008.
14 Barbosa Moreira, Processo, 2001, p. 208-209; Oliveira, Do formalismo, p. 148-149.
15 Barbosa Moreira, A Constituição, 1996, p. 118; Bedaque, Poderes, 2001, p. 145; Scarpinella Bueno, Curso, v. 2, p. 236.
16 Barbosa Moreira, Processo, p. 209; Oliveira, Do formalismo, 1997, p. 147-148.
17 Dinamarco, Instituições, v. 3, p. 46-49; Bedaque, Poderes, p. 20-23; Cambi, Direito, p. 135; Teixeira, O princípio, 2005, p. 40; Greco, A prova, 2004, p. 402-403.
18 Cambi, Direito, p. 57.
19 Santos, Primeiras, v. 2, p. 343; Theodoro Jr., Curso, n. 416, p. 473; Scarpinella Bueno, Curso, p. 245.
20 Dinamarco, Instituições, v. 3, n. 786, p. 58; Câmara, Lições, v. 2, p. 376.
21 Cambi, A prova, p. 297.
22 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 267-268.
23 Amaral Santos, Primeiras, v. 2, p. 346.
24 Theodoro Jr., Curso, v. 2, n. 416, p. 474.
25 Barbosa Moreira, Regras, p. 63.
26 Garcia, Prova civil, n. 6.1, p. 31.
27 Barbosa Moreira, As presunções, p. 58-59; Cambi, A prova, p. 363.
28 Dinamarco, Instituições, v. 3, n. 825, p. 119.
29 Informativo 427/STJ: 4.ª Turma, REsp 1.068.836/RJ, rel. MIn. Honildo Amaral de Mello Castro, j. 18.03.2010.
30 Informativo 425/STJ: 4.ª Turma, REsp 714.969-MS, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 04.03.2010.
31 Barbosa Moreira, As presunções, p. 62-64.
32 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 291.
33 Dinamarco, Instituições, v. 3, n. 824, p. 116-117.
34 Barbosa Moreira, As presunções, p. 64-65; Cambi, A prova, p. 369-370.
35 Dinamarco, Instituições, v. 3, n. 828, p. 121-124; Cambi, A prova, p. 376.
36 Câmara, Lições, v. 2, p. 377.
37 Gisele Góes, Teoria, p. 53-55.
38 Neves, Princípio, Revista, n. 31; Arruda Alvim, Manual, n. 175, p. 389.
39 Câmara, Lições, v. 2, p. 380-381.
40 Informativo 418/STJ: 2.ª Turma, REsp 1.060.753/SP, rel. Min. Eliana Calmon, j. 1.º.12.2009.
41 STJ, 4ª Turma, REsp 720.930/RS, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 20.10.2009, DJe 09.11.2009. No mesmo sentido, BARBOSA MOREIRA, Carlos Roberto. Notas sobre a inversão do ônus da prova em benefício do consumidor. Doutrina. Rio de Janeiro: ID, 1996. v. 1, p. 309, e THEODORO JR., Humberto. Direitos do consumidor. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 143.
42 Scarpinella Bueno, Curso, v. 2, p. 247.
43 Arruda Alvim, Manual, n. 187, p. 404. STJ, 3.ª Turma, REsp 422.778/SP, rel. Min. Castro Filho, rel. para acórdão rel. Min. Nancy Andrighi, j. 19.06.2007, DJ 27.08.2007.
44 Informativo 463/STJ: 4.ª Turma, REsp. 951.785/RS, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 15.02.2011.
45 Informativo 412/STJ: 4.a Turma, REsp 720.930-RS, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 20.10.2009.
46 Gisele Góes, Teoria, p. 52.
47 Informativo 404/STJ: 2.ª Turma, REsp 972.902-RS, rel. Min. Eliana Calmon, j. 25.08.2009.
48 Informativo 482/STJ: 3.ª Turma, REsp 1.132.741/MG, rel. Min. Massami Uyeda, j. 06.09.2011.
49 Cambi, A prova, p. 418, Dinamarco, Instituições, v. 3, n. 801, p. 84.
50 Informativo 469/STJ: 1.ª Seção, REsp 802.832/MG, rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 13.04.2011. STJ, 4.ª Turma, REsp 662.608/SP, rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, j. 12.12.2006, DJ 05.02.2007; STJ, 3.ª Turma, REsp 598.620/MG, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 07.12.2004, DJ 18.04.2005.
51 Bedaque, Direito; Nery e Nery, Código, p. 608; STJ, 3.ª Turma, REsp 422.778/SP, rel. Min. Castro Filho, rel. para acórdão rel. Min. Nancy Andrighi, j. 19.06.2007, DJ 27.08.2007.
52 Sérgio Cruz Arenhart, Ônus da prova e sua modificação no processo civil brasileiro. In: NEVES, Daniel Amorim Assumpção (Coord.). Aspectos atuais do direito probatório. São Paulo: Método, 2009. p. 350-351; WATANABE, Kazuo. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor – comentado pelos autores do anteprojeto. p. 11; Bedaque, Direito; Nery e Nery, Código, p. 608-609; CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de direito do consumidor. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 328. STJ, AgRg no Ag 1.028.085/SP, 4.ª Turma, rel. Min. Vasco Della Giustina, Des. Convocado, j. 04.02.2010, DJE 16.04.2010; STJ, REsp 422.778/SP, 3.ª Turma, Rel. Min. Castro Filho, Rel. p/ acórdão Min. Nancy Andrighi, j. 19.06.2007, DJ 27.08.2007.
53 ARRUDA ALVIM. Manual de direito processual civil. 8. ed. São Paulo: RT, 2003. v. I, p. 974; CÂMARA, Alexandre Freitas. Tutela jurisdicional dos consumidores. In: FARIAS, Cristiano Chaves de; DIDIER JUNIOR, Fredie (Coord.). Procedimentos especiais cíveis – legislação extravagante. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 1.093; RIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 126; BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 2, p. 247-248; . REsp 802.832/MG, 2.ª Seção, rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 13.04.2011, Informativo STJ 469; STJ, REsp 662.608/SP, 4.ª Turma, rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, j. 12.12.2006, DJ 05.02.2007; STJ, REsp 598.620/MG, 3.ª Turma, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 07.12.2004, DJ 18.04.2005.
54 Scarpinella Bueno, Curso, v. 2, p. 247; Dinamarco, Instituições, v. 3, n. 801, p. 84; Cambi, A prova, p. 427.
55 STJ, 4.ª Turma, REsp 845.601/SP, rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, j. 06.03.2007, DJ 02.04.2007; STJ, 3.ª Turma, REsp 435.155/MG, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 11.02.2003, DJ 10.03.2003.
56 Bedaque, Poderes, p. 93.
57 Bedaque, Poderes, p. 96-105; Dinamarco, Instituições, v. 3, n. 784, p. 53.
58 Barbosa Moreira, Os poderes, Temas, Quarta Série, p. 48; Bedaque, Poderes, p. 107-108.
59 Bedaque, Poderes, p. 109.
60 Neves, Preclusões, p. 265-273.
61 Garcia, Prova civil, n. 18, p. 78.
62 Informativo 519/STJ, 4.ª Turma, REsp 1.095.668-RJ, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 12.03.2013.
63 Garcia, Prova civil, n. 8, p. 45-46.
64 Apud Moacyr Amaral Santos, Prova judiciária no cível e comercial. 4. ed. São Paulo, Max Limonad, 1970. vol. I, p. 354.
65 Cfr. Do formalismo no processo civil, São Paulo, Saraiva, 1997, p. 163.
66 Neves, Ações, p. 91-98.
67 Grinover, Prova, p. 115; Nery Jr., Princípios, p. 152; Fux, Curso, p. 699.
68 Neves, Ações, p. 106-108; Dinamarco, Instituições, v. 3, p. 98; Talamini, Prova, p. 95.
69 Neves, Ações, p. 125-129. Garcia, Prova civil, n. 12, p. 57.
70 Neves, Manual de direito processual civil, n. 14.1.11, p. 431.
71 Grinover, Prova, p. 115; Nery Jr., Princípios, p. 152; Fux, Curso, p. 699.
72 Neves, Ações, p. 106-108; Dinamarco, Instituições, v. 3, p. 98; Talamini, Prova, p. 95.
73 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 387-389; Cambi, A prova, p. 66-70.
74 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 399-400.
75 Cambi, A prova, p. 117.
76 STF, 2.ª Turma, HC 93.050/RJ, rel. Min. Celso de Mello, j. 10.06.2008, DJ 1.º.08.2008.
77 Bedaque, Poderes, p. 141.
78 A favor, STJ, 5.ª Turma, RMS 17.732-MT, rel. Min. Gilson Dipp, j. 28.06.2005, DJ 1.º.08.2005. Contra, STF, 1.ª Turma, HC 80.949-RJ, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 30.10.2001, DJ 14.12.2001.
79 Barbosa Moreira, A Constituição, p. 109-110; Marinoni-Arenhart, Manual, p. 393-397; Didier-Sarno-Oliveira, Curso, p. 38-39.
80 Informativo 478/STJ: 3.ª Turma, HC 203.405/MS, rel. Min. Sidnei Beneti, j. 28.06.2011.
81 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 384; Cambi, A prova, p. 46.
82 Disponível em: <http://tv.estadao.com.br/videos,pancadao-na-puc,203404,25,0.htm>.
83 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 315.
84 STJ, 3.ª Turma, REsp 623.575-RO, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 18.11.2004; Theodoro Jr., Curso, n. 430, p. 488.
85 Nery-Nery, Código, p. 619.
86 Dinamarco, Instituições, n. 1191, p. 616-617. Contra: Marinoni-Arenhart, Manual, p. 316-317; Didier-Sarno-Oliveira, Curso, p. 104.
87 STJ, 3.ª Turma, REsp 191.078/MA, rel. Min. Ari Pargendler, j. 15.09.2000; Dinamarco, Instituições, n. 1.191, p. 616-617. Contra: Marinoni-Arenhart, Manual, p. 316-317.
88 STJ, 3.ª Turma, REsp 191.078-MA, rel. Min. Ari Pargendler, j. 15.09.2000, DJ 09.10.2000.
89 Dinamarco, Instituições, n. 1.192, p. 618; Greco Filho, Direito, n. 44, p. 219.
90 Dinamarco, Instituições, n. 1.193, p. 619; Greco Filho, Direito, n. 44, p. 219.
91 Dinamarco, Instituições, n. 1.194, p. 650; Nery-Nery, Código, p. 620.
92 Greco Filho, Direito, n. 44, p. 220; Dinamarco, Instituições, n. 1194, p. 620. Contra: Marinoni-Arenhart, Manual, p. 318.
93 Neves, Manual de direito processual civil, 14.2.1.2, p. 437.
94 Theodoro Jr., Curso, n. 433, p. 491; Nery-Nery, Código, p. 621.
95 Greco Filho, Direito, n. 45, p. 220; Batista Lopes, A prova, n. 22.1, p. 89.
96 Dinamarco, Instituições, n. 1.195, p. 622.
97 Nery-Nery, Código, p. 621; Fux, Curso, p. 727; Câmara, Lições, p. 393.
98 Theodoro Jr., Curso, n. 434, p. 491; Fux, Curso, p. 727; Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 124.
99 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 322.
100 Farias-Rosenvald, Direito, p. 624.
101 Nery-Nery, Código, p. 623.
102 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 325-326.
103 Dinamarco, Instituições, n. 1.197, p. 625; Marinoni-Arenhart, Manual, p. 328; Scarpinella Bueno, Curso, p. 261; STJ, 1.ª Turma, REsp 765.128/SC, rel. Min. Luiz Fux, j. 20.03.2007. Contra: Theodoro Jr, Curso, n. 436, p. 492-493; Greco Filho, Direito, n. 45, p. 222.
104 Dinamarco, Instituições, n. 1.200, p. 631; Baptista da Silva, Curso, p. 370.
105 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 329-330.
106 Scarpinella Bueno, Curso, p. 264.
107 Pontes de Miranda, Comentários, p. 323; Nery-Nery, Código, p. 623.
108 Theodoro Jr., Comentários, p. 428; Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 126. Contra: Câmara, Lições, p. 394.
109 Didier, Regras, p. 51.
110 Informativo 436/STJ, 1.ª Seção, AR 3.506-MG, rel. Min. Teori Albino Zavascki, j. 26.05.2010.
111 Câmara, Lições, p. 182; Fidélis dos Santos, Manual, p. 454.
112 Parece ser esse o entendimento de Dinamarco, Litisconsórcio, p. 147.
113 Marinoni-Arenhart, Comentários, p. 356.
114 Cf. Neves, Manual de direito processual civil, n. 14.2.2.2, 444.
115 Barbosa Moreira, O novo, p. 62-63; Fux, Curso, p. 715; Theodoro Jr., Curso, n. 441, p. 496.
116 Marinoni-Mitidiero, Código, p. 361; Costa Machado, Código, p. 731.
117 Tabosa, Código, p. 1.088.
118 STJ, 3.ª Turma, REsp 862.448/Al, rel. Min. Carlos Alberto Menezes de Direito, j. 15.05.2007, DJ 25.06.2007, p. 236.
119 Scarpinella Bueno, Curso, v. 2, p. 268; Tabosa, Código, p. 1.091.
120 Contra, isolado na doutrina: Greco Filho, Direito, n. 46, p. 222.
121 Theodoro Jr., Curso, n. 442, p. 497; Dinamarco, Instituições, n. 1.155, p. 572; Tabosa, Código, p. 1.093; Costa Machado, Código, p. 733.
122 Marinoni-Mitidiero, Código, p. 359.
123 Dinamarco, Instituições, n. 1.154, p. 571. Contra, entendendo tratar-se de dever processual: Fábio Tabosa, Código, p. 1.099.
124 Informativo 473/STJ: 4.ª Turma, EDcl no AgRg no REsp 1.092.289/MG, rel. Min. Maria Isabel Gallotti, j. 19.05.2011; Informativo 469/STJ: 4.ª Turma, AgRg no Ag 1.179.249/RJ, rel. Min. Maria Isabel Gallotti, j. 14.04.2011.
125 STJ, 1.ª Turma, REsp 989.616/TO, rel. Min. Luiz Fux, j. 20.05.2008, DJe 18.06.2008.
126 Barbosa Moreira, O novo, p. 64; Nery-Nery, Código, p. 625; Theodoro Jr., Curso, n. 443, p. 498.
127 Barbosa Moreira, O novo, p. 64; Fux, Curso, p. 716. Contra, pelo cabimento do agravo de instrumento: Scarpinella Bueno, Curso, v. 2, p. 273-274.
128 Equivocado o entendimento de Nery-Nery, Código, p. 625.
129 Tabosa, Código, p. 1.106.
130 Marinoni-Mitidiero, Código, p. 362.
131 Dinamarco, Instituições, n. 1.156, p. 574.
132 Súmula 372/STJ.
133 Cfr. Neves, Manual de direito processual civil, n. 14.2.3.3, p. 450. No mesmo sentido Dinamarco, Instituições, n. 1.154, p. 571.
134 Barbosa Moreira, O novo, p. 64; Nery-Nery, Código, p. 625; Theodoro Jr., Curso, n. 443, p. 498.
135 Dinamarco, Instituições, n. 1.144, p. 564.
136 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 341.
137 Nery-Nery, Código, p. 626; Theodoro Jr., Curso, n. 444, p. 503; Marinoni-Arenhart, Manual, p. 344.
138 Fux, Curso, p. 709; Theodoro Jr., Curso, n. 446, p. 504.
139 Câmara, Lições, v. 1, p. 396; Marinoni-Mitidiero, Código, p. 366.
140 Marinoni-Mitidiero, Código, p. 367.
141 Theodoro Jr., Curso, n. 447, p. 506.
142 Theodoro Jr., Curso, n. 447, p. 506.
143 Theodoro Jr., Curso, n. 457, p. 515.
144 Dinamarco, Instituições, n. 1.161, p. 579; Theodoro Jr., Curso, n. 458-a, p. 517; Fux, Curso, p. 711.
145 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 367.
146 STJ, 3.ª Turma, AgRg no REsp 1.024.640/DF, rel. Min. Massami Uyeda, j. 16.12.2008, DJe 10.02.2009.
147 Fux, Curso, p. 711.
148 Dinamarco, Instituições, n. 1.161, p. 580; Câmara, Lições, v. 1, p. 397; Scarpinella Bueno, Curso, v. 2, p. 289.
149 Dinamarco, Instituições, n. 1.161, p. 580-581; Scarpinella Bueno, Curso, v. 2, p. 289. Contra: Marinoni-Arenhart, Manual, p. 364-366.
150 Theodoro Jr., Curso, n. 458, p. 516; Nery-Nery, Código, p. 636; Câmara, Lições, v. 1, p. 397.
151 Nery-Nery, Código, p. 636; Marinoni-Arenhart, Manual, p. 370.
152 Dinamarco, Instituições, n. 1.161, p. 581; Bedaque, Código, p. 104; Scarpinella Bueno, Curso, v. 2, p. 290.
153 Barbosa Moreira, O novo, p. 62.
154 Marinoni-Mitidiero, Código, p. 386.
155 STJ, 4.ª Turma, REsp 795.862/PB, rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 17.10.2006; Theodoro Jr., Curso, n. 459, p. 518; Fux, Curso, p. 712.
156 STJ, 3.ª Turma, REsp 660.267/DF, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 28.05.2007.
157 STJ, 1.ª Turma, REsp 861.255/RJ, rel. Min. Denise Arruda, j. 16.10.2008; Marinoni-Arenhart, Manual, p. 363; Scarpinella Bueno, Curso, v. 2, p. 285.
158 STJ, 3.ª Turma, AgRg no REsp 729.281/SP, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 1.º.03.2007; REsp 438.188/MG, 5.ª Turma, rel. Min. Arnaldo Esteves, j. 20.11.2006; Nery-Nery, Código, p. 637.
159 Marinoni-Mitidiero, Código, p. 386.
160 STJ, 4.ª Turma, REsp 795.862/PB, rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 17.10.2006; Theodoro Jr., Curso, n. 459, p. 518; Fux, Curso, p. 712.
161 STJ, 3ª Turma, REsp 1.121.031/MG, rel. Min Nancy Andrighi, j. 09/11/2010, DJe 22.11.2010.
162 Dinamarco, Instituições, n. 1.178, p. 603; Baptista da Silva, Curso, p. 372.
163 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 371.
164 Theodoro Jr., Curso, n. 461, p. 522.
165 Dinamarco, Instituições, n. 1.177, p. 601.
166 Theodoro Jr., Curso, n. 462, p. 522.
167 Theodoro Jr., Curso, n. 462, p. 524.
168 Dinamarco, Instituições, n. 1.177, p. 601.
169 STJ, 4.ª Turma, REsp 713073/MT, rel. Min. Aldir Passarinho Junior, j. 23.03.2005; AgRg no REsp 323971/RJ, 4.ª Turma, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 11.12.2001.
170 Nery-Nery, Código, p. 640.
171 STJ, 3.ª Turma, REsp 470534/SP, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 02.09.2003; EREsp 263387/PE, 2.ª Seção, rel. Min. Castro Filho, j. 14.08.2002.
172 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 373; Câmara, Lições, v. 1, p. 400.
173 Costa Machado, Código, p. 773.
174 Dinamarco, Instituições, n. 1.181, p. 607.
175 Dinamarco, Instituições, n. 1.181, p. 607.
176 REsp 161.438/SP, 4.ª Turma, rel. Min. Barros Monteiro, j. 06.10.2005; Dinamarco, Instituições, n. 1.186, p. 611.
177 Nery-Nery, Código, p. 643; Tabosa, Código, p. 1.258.
178 Informativo 477/STJ: 3.ª Turma, REsp 1.028.315/BA, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 14.06.2011.
179 Marinoni-Mitidiero, Código, p. 394.
180 Theodoro Jr., Curso, n. 464, p. 527.
181 STJ, 3.ª Turma, REsp 828.373/SP, rel. Min. Castro Filho, j. 17.08.2006.
182 Dinamarco, Reforma, p. 113; Tabosa, Código, p. 1.257. Contra: Wambier-Wambier, Breves, p. 92; Scarpinella Bueno, Curso, v. 2, p. 295.
183 STJ, 5.ª Turma, REsp 700.400/PR, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 25.06.2007. Contra, admitindo a substituição até o vencimento do prazo legal: Costa Machado, Código, p. 776; Fábio Tabosa, Código, p. 1.261.
184 Ovídio Baptista, Curso, p. 377. Contra: Fux, Curso, p. 723.
185 Barbosa Moreira, O novo, p. 67; Fux, Curso, p. 724.
186 Nesse sentido: Nery-Nery, Código, p. 645; Costa Machado, Código, p. 783.
187 Tabosa, Código, p. 1.277.
188 Marinoni-Mitidiero, Código, p. 399.
189 Barbosa Moreira, O novo, p. 69.
190 Nery-Nery, Código, p. 640.
191 STJ, 3.ª Turma, REsp 470534/SP, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 02.09.2003; EREsp 263387/PE, 2.ª Seção, rel. Min. Castro Filho, j. 14.08.2002.
192 Neves, Manual de direito processual civil, n. 14.2.5.5, p. 466.
193 Informativo 477/STJ: 3.ª Turma, REsp 1.028.315/BA, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 14.06.2011.
194 STJ, 5.ª Turma, REsp 700.400/PR, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 25.06.2007.
195 Fux, Curso, p. 730.
196 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 378; Theodoro Jr., Curso, n. 465, p. 533; Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 212.
197 STJ, 1.ª Turma, REsp 666.889/SC, rel. Min. Teori Albino Zavascki, j. 25.11.2008.
198 Dinamarco, Instituições, n. 1.164, p. 586.
199 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 377; Nery-Nery, Código, p. 655.
200 Dinamarco, Instituições, n. 1.164, p. 585.
201 STJ, 1.ª Turma, REsp 665.320/PR, rel. Min. Teori Albino Zavascki, j. 19.02.2008.
202 Costa Machado, Código, p. 789.
203 Marinoni-Mitidiero, Código, p. 408; Theodoro Jr., Curso, n. 468, p. 538.
204 Tabosa, Código, p. 1.320.
205 Dinamarco, Instituições, n. 1.164, p. 587; Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 223.
206 Dinamarco, Instituições, n. 1.166, p. 590.
207 STJ, 2.ª Turma, REsp 866.240/RS, rel. Min. Castro Meira, j. 22.05.2007; Tabosa, Código, p. 1.327.
208 Greco Filho, Direito, n. 49.2, p. 243, afirma que basta diploma de nível médio.
209 STJ, 4.ª Turma, AgRg no Ag 38.839/SP, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 07.02.1995; Costa Machado, Código, p. 803.
210 STJ, 2.ª Turma, REsp 19.062/SP, rel. Min. José de Jesus Filho, j. 29.11.1993; Fábio Tabosa, Código, p. 1.333; Costa Machado, Código, p. 803; Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 216.
211 Dinamarco, Reforma, p. 117; Cruz e Tucci, Lineamentos, p. 40-41.
212 Greco Filho, Direito, n. 49.2, p. 245.
213 Contra: Nery-Nery, Código, p. 649.
214 Wambier-Wambier, Breves, p. 101.
215 Barbosa Moreira, O novo, p. 71.
216 Informativo 532/STJ, 3.ª Turma, AgRg na MC 21.336-RS, rel. Min. Sidnei Beneti, j. 17.09.2013.
217 Scarpinella Bueno, Curso, v. 2, p. 304.
218 Informativo 412/STJ: 3.ª Turma, REsp 1.109.357-RJ, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 20.10.2009.
219 STJ, 1.ª Turma, REsp 639.257/MT, rel. Min. Luiz Fux, j. 13.12.2005; REsp 193.178/SP, 2.ª Turma, rel. Min. Castro Meira, j. 04.10.2005. Contra: Costa Machado, Código, p. 792.
220 Marinoni-Arenhart, Manual, p. 381; Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 225. Contra: Costa Machado, Código, p. 796; Tabosa, Código, p. 1.317.
221 STJ, 4.ª Turma, REsp 697.446/Am, rel. Min. Cesar Asfor Rocha, j. 27.03.2007.
222 Contra: Scarpinella Bueno, Curso, v. 2, p. 307.
223 Fux, Curso, p. 732.
224 STJ, 2.ª Turma, EDcl no REsp 686.795/MG, rel. Min. Castro Meira, j. 17.08.2006.
225 Dinamarco, Instituições, n. 1.172, p. 595; Nery-Nery, Código, p. 656; Scarpinella Bueno, Curso, v. 2, p. 300.
226 Tabosa, Código, p. 1.341.
227 Marinoni-Mitidiero, Código, p. 412-413. Costa Machado, Código, p. 805, entende que a decisão é sempre irrecorrível.
228 Marinoni-Mitidiero, Código, p. 411; Fábio Tabosa, Código, p. 1.343. Contra: Theodoro Jr., Curso, n. 470, p. 541.
229 Barbosa Moreira, O novo, p. 72.
230 Theodoro Jr., Curso, n. 469, p. 540.
231 A favor: Marinoni-Mitidiero, Código, p. 411; Fábio Tabosa, Código, p. 1.343. Contra: Theodoro Jr., Curso, n. 470, p. 541.
232 Baptista da Silva, Curso, p. 392; Marinoni-Mitidiero, Código, p. 413. Contra: Barbosa Moreira, O novo, p. 73; Costa Machado, Código, p. 807; Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 239.
233 Nery-Nery, Código, p. 656.
234 Baptista da Silva, Curso, p. 392; Scarpinella Bueno, Curso, v. 2, p. 312-313; Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 237-238.
235 Dinamarco, Instituições, n. 1.174, p. 597; Marinoni-Arenhart, Manual, p. 382; Nery-Nery, Código, p. 658.
236 Marinoni-Arenhart, Comentários, p. 615.
237 Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 238.
238 Dinamarco, Instituições, n. 1.175, p. 599.
239 Baptista da Silva, Curso, p. 393; Theodoro Jr., Curso, n. 472, p. 544; Fux, Curso, p. 736; Tabosa, Código, p. 1.351.
240 Barbosa Moreira, O novo, p. 74; Costa Machado, Código, p. 808.
241 Pela subsidiariedade: Nery-Nery, Código, p. 656. Contra: Baptista da Silva, Curso, p. 392; Scarpinella Bueno, Curso, v. 2, p. 312-313; Didier-Braga-Oliveira, Curso, p. 237-238.