Os portugueses encontraram na Índia uma pequena balsa denominada JANGA. Três a quatro paus amarrados com fibras vegetais ou seguros por madeira em forma de grade.
O nome era dravidiano, do tâmil, tâmul ou timul, popularizado pelos malaios. Os portugueses escreveram Janga (Gonçalves Viana) ou mais propriamente Jangá (monsenhor Sebastião Rodolfo Dalgado) e ainda Changgah e Xanga.
Jangada (Changadam) é a Janga de maior porte, com cinco e seis paus roliços. Os portugueses encontraram a jangada nas lutas pelo domínio nas Índias Orientais e divulgaram o vocábulo.
A jangada, leve, rápida, eficiente, trazia guerreiros que afrontavam as caravelas de Portugal.
Vendo a Piperi ou a Igapeba indígenas no Brasil, iguais à jangada oriental, passaram para elas o nome já familiar e registado nos clássicos quinhentistas.
Damião de Goes (1502-1574), na Crônica do rei dom Manoel, escrita de 1558 e 1567, menciona várias vezes a jangada dos mares da Índia em pleno teatro guerreiro:
“Chegada a frota que era cousa medonha de ver, as balsas de fogo guiadas pela corrente, e barcos de que as empuxavam com varas, foram cair sobelos mastros que estavam encadeados, e ancorados diante das caravelas, as quais pela distância não fez o fogo nenhum dano, mas antes em quando ardeu tiveram os nossos algum repouso, por que os inimigos com medo dela não ousavam de se chegar mas como cessou todolos paraos, e outros navios, se começaram de chegar para a nossa jangada, tirando com a artelharia as caravelas, ao que os nossos lhe respondiam, arrombando alguns dos seus navios, em que lhes mataram muita gente”: Damião de Goes, Crônica do rei don Manoel, parte I, capítulo 91.
“A multidão dos inimigos era tanta que se embaraçavam uns com os outros, com tudo a jangada dos vinte paraos, que vinham encadeados, se adiantou de toda a frota chegando-se pera nossa caravela, e bateis, tirando muitas bombardadas, com que davam assas de trabalho aos nossos”; Idem, parte I, capítulo 86.
“Mas avendo já bom pedaço, de uma e da outra parte servira a artelharia, de maneira que com o fumo, e fogo da pólvora se nam viam aos outros, mandou Duarte Pacheco tirar com um camelo que tinha nam descarregara, o que se fez em tam boa hora, que do segundo tiro desmanchou de todo a jangada, arrombando quatro paraos que logo se foram ao fundo”; idem.
“Uma bastida de paus, a modo de jangada”; idem, f. 70, col. 3.
Bastida foi um nome português da jangada, possivelmente anterior ao conhecimento da verdadeira nas Índias Orientais. Foi verbete corrente nos velhos Vocabulários e frei Joaquim de Santa Rosa de Viterbo recolheu-o no Elucidário das palavras, termos e frases que em Portugal antigamente se usaram e que hoje regularmente se ignoram na sua princeps de 1798-99: ...“mas também se deu o mesmo nome (“Bastida”) a uma balsa, ou jangada de muitos paus presos, e ligados entre si”. (vol. I, p. 128, Lisboa, 1865).
A Bastida terrestre era o torreão de paus entrançados, a estacada coroada por cimeira fechada e daí seu sinônimo francês de “Bastilha”. Na água caracterizava-a a tábua ou pau transversal, segurando os troncos. Uma ou mais destas travessas dariam ideia da grade e assim registam nos Dicionários de ontem e de agora.
A primeira acepção foi a construção improvisada na hora do naufrágio e assim Frei João dos Santos, Etiópia Oriental, 2o, 128, escrevia em 1586: – “Os terceiros se salvaram em uma jangada, que fizeram sobre os baixos da madeira da nau, e de tábuas de caixões”. Mas no Brasil, um ano depois, já Gabriel Soares de Souza empregava o vocábulo ligado às igarapebas e piperis que via no mar e nos rios.
Da origem não há mais disputa e João Ribeiro fixou o assunto em linhas definitivas:
“A jangada é de origem asiática. Na Índia os ingleses chamam-na jangar e o termo deriva da língua malaiala xangadam e mais remotamente do sânscrito sanghata, com o sentido de ligagem ou união de tábuas flutuantes ou de canoas ajougadas. Os portugueses que serviam na Índia e no Brasil para cá trouxeram o vocabulário, que correspondia perfeitamente à igarapeba dos tupis do norte, entre a Bahia e o Maranhão.” Curiosidades Verbais, 188.
Paulinho Nogueira (1842-1908) estudando o “Vocabulário Indígena em uso na Província do Ceará com explicações etimológicas, ortográficas, topográficas, históricas, terapêuticas, etc.” (Revista do Instituto do Ceará, ano I, 4o trimestre, 1887) sugeriu origem do nheegatu. Parte de uma forma convencional ñan-ig-ára, passando por yan-ig-ára e chegando a jan-ig-ára, dando, na prosódia portuguesa a jangada, valendo aquilo que corre n’água. Foi apenas tentativa nacionalista do erudito estudioso cearense sem possibilidade de repercussão lógica.
No primeiro registo por mão europeia Pero Vaz de Caminha denomina-a almadia em abril de 1500. Em 1557 Jean de Lery dava-lhe nome local de Piperi, boiando nas águas da Guanabara. Antes de 1570 Pero de Magalhães Gandavo indicava o título atual: – vão pescar pela costa em jangada...
E esta jangada ficou vencendo a nomenclatura tupi do litoral.
Além da piperi e da igarapeba ou igapeba, formas desaparecidas na linguagem usual, existe o candandu, jangada velha, verbetizado pelo tte. Alberto Vasconcelos no seu “Dicionário de Ictiologia e Pesca” (Recife, 1938).
Os nomes conhecidos são:
Jangada: jangada-de-vela, jangada do alto.
Paquete: jangada menor.
Ximbelo: jangada com dimensões inferiores ao Paquete. De madeira aproveitada.
Bote ou Catraia: jangadinha.
Burrinha: jangada pequena. “As jangadas pequenas, que usam de uma só vela, são chamadas burrinhas”, Almirante Alves Câmara. Ensino sobre as construções navais indígenas do Brasil. 1888, segunda edição em São Paulo, 1937, p. 29.
Candandu: jangada velha (Alberto Vasconcelos).
Igapeba: citada em Marcgrav, Joan Nieuhof, etc. Séc. XVII.
Piperis: citada em Jean de Lery (séc. XVI).
Catre: espécie de jangada (Alberto Vasconcelos).
Caçoeira: pequena jangada que leva a rede caçoeira em pesca noturna.