Katie observava da janela do táxi enquanto se dirigia ao centro da ilha junto com Finn. Exuberantes plantações de arroz ondulavam pelos platôs das encostas divididos por cabos de fluxos de irrigação que brilhavam prateados à luz do sol. Flores tropicais ladeavam as margens, e isso a fez pensar que se abaixasse o vidro da janela o ar inteiro estaria perfumado.
– Posso nos levar em quinze minutos até o consulado britânico – ele comentou, voltando-se para ela. Estava com uma camisa de manga curta e com os braços levemente bronzeados. Já fazia uma semana que estava em Bali, e a companhia dele era como um farol que brilha na escuridão.
– Isso é tudo de que precisamos – ela disse.
O táxi parou em frente a um edifício caiado e ornado por flores de buganvílias. Ela saiu e alisou a saia contra as coxas de tanto calor que fazia.
Foram recebidos por uma balinesa, com um vestido longo vermelho que combinava com o tom do hibisco que tinha atrás da orelha.
– Bem-vindos. Sr. Hastings sugeriu o jardim para a reunião. Por favor, venham por aqui.
Foram conduzidos por um jardim ensolarado e repleto de plantas coloridas, com borboletas mergulhando e flutuando por cima das cabeças. Acomodaram-se na mesa à sombra de uma figueira retorcida e se serviram de copos de água gelada que suavam em cima de uma bandeja de bambu.
Alguns minutos depois chegou um homem franzino que usava um terno bege elegante e sapatos marrons polidos.
– Boa tarde. Sou Richard Hastings. – Ele pôs um caderno de anotações e um arquivo verde na mesa, e depois apertou a mão de Katie e disse: – Senhorita, minhas sinceras condolências pelas circunstâncias que lhe trazem a Bali.
– Muito obrigada.
Ele apertou a mão de Finn e ajeitou a calça do terno antes de se abaixar para sentar.
– Sei que você já falou com meu colega, sr. Spire, do Serviço de Estrangeiros em Londres. Fico feliz pela oportunidade de também conhecê-la. – Ele tocou na armação de ouro fino dos óculos e a atmosfera nos olhos desmentia as maneiras formais que mostrava. – Suponho que traga agora outras questões, não é?
– Sim. – Ela limpou a garganta. – E não sei ao certo se o senhor será capaz de me ajudar com a primeira. Quando cheguei a Bali, três semanas atrás, tive meus pertences roubados no albergue em que estava hospedada. Nyang Palace.
– Lamento muito – disse Hastings, balançando a cabeça levemente, como se fosse pessoalmente responsável.
– Apresentei queixa na polícia, mas eles não me disseram nada. Eu gostaria de saber se o senhor poderia descobrir se houve algum progresso.
– Será um prazer fazer algumas perguntas em seu nome. – Ele tirou uma caneta do bolso e escreveu alguma coisa no caderno. E depois passou a caneta pela página, sublinhando duas vezes o que estava escrito. – Estamos cientes de uma gangue de malaios que posa de turistas e opera por aqui. Os albergues são os alvos porque o trânsito de gente é alto, e a segurança, fraca. A polícia está de olho nessa organização. Fique tranquila porque se houver progresso lhe transmitirei a notícia pessoalmente.
Isso a fez pensar sobre os itens da mochila que poderiam ser encontrados. Apenas o anel de noivado e o celular tinham valor monetário. Teriam sido vendidos no mercado negro do lugar ou embarcados para outro lugar? Os relatos não lidos de Mia tomaram os pensamentos de Katie outra vez.
Ela curvou-se para frente com uma ideia repentina.
– O diário de viagem da minha irmã... Segundo a polícia, tornou-se parte da investigação.
– Sim, é verdade.
– Fizeram alguma cópia dele?
– Receio que não. Suponho que não acharam nada que pudesse ser usado como evidência, e por isso mesmo o devolveram para você.
A esperança se extinguiu com a mesma rapidez de um fósforo aceso. Ela pôs as mãos no colo.
– Alguma outra questão que eu possa ajudá-la?
Ela não respondeu, e Finn então interveio.
– Nós gostaríamos de saber qual foi o local exato onde Mia morreu.
– É claro. – O sr. Hastings abriu um arquivo verde e folheou uma série de documentos. Localizou um mapa e o colocou na mesa entre Katie e Finn. – Este mapa apresenta uma série de penhascos marinhos na região de Umanuk. Segundo a polícia, esta é a rota que Mia pegou para chegar ao topo do penhasco. – Arrastou o dedo ao longo de uma linha cortada por hifens. – Esta parte inicial da trilha bem marcada conduz a um mirante, aqui. Este é o lugar onde Mia cruzou com as testemunhas. O topo do penhasco fica a duzentos metros de altura acima. Há um caminho abandonado há anos que leva ao topo e a um denso matagal. Isto aqui. – Mostrou um círculo desenhado a lápis no mapa. – É o ponto de onde se supõe que Mia tenha saltado.
Katie mordeu o lábio.
– Receio dizer que ela não foi a primeira a ser encontrada neste lugar. Foram registrados seis suicídios nos últimos oito anos neste mesmo lugar.
– Por que isso? – perguntou Finn.
– Imaginamos que o escolheram porque de lá... é certeiro.
O estômago de Katie embrulhou: Mia não queria sobreviver.
– Se servir de ajuda, posso providenciar transporte para levá-los até Umanuk.
– Não! – ela disse abruptamente.
– Muito obrigado pela oferta – acrescentou Finn –, mas provavelmente não iremos lá por agora.
– Claro. Por favor, em todo caso, fiquem com este mapa.
– Existe a possibilidade de algum outro detalhe do caso de Mia vir à luz? Alguma coisa? – perguntou Katie.
– Acredito que você já tenha recebido os detalhes dos depoimentos das testemunhas e da autópsia, não recebeu?
Ela tamborilou os dedos nas coxas.
– Sim, mas ainda estou lutando para acreditar. Suicídio? – Ela balançou a cabeça em negativa. – A polícia está absolutamente certa disso?
– Dediquei uma atenção especial a este caso porque a morte de jovens é extremamente perturbadora. Mas a polícia está convencida de que foi suicídio.
– Mas ela não deixou um bilhete!
Ele balançou a cabeça.
– Entendo que é extremamente difícil conviver com a morte de uma pessoa que não deixou explicação alguma para tal, mas isso não é incomum. – Ele pôs as mãos na mesa e curvou-se, como se estivesse prestes a quebrar algum protocolo. – Talvez lhe ajude saber que em casos de suicídio, apenas uma em cada seis pessoas deixa um bilhete.
– Por quê?
– Na maioria das vezes a decisão é tomada por impulso. Embora o suicídio seja algo considerado de antemão, o indivíduo sempre age com senso de urgência. E nesse caso, as explicações são esquecidas, e isso, claro, é muito perturbador para os que ficam para trás.
A seriedade com que Hastings se expressou fez Katie se perguntar se ele tinha alguma experiência pessoal do assunto.
– Tudo o que posso lhes dizer é que, embora ela não tenha deixado um bilhete, dispomos de várias informações importantes. Em primeiro lugar, os depoimentos de duas testemunhas que a viram minutos antes da morte. E também a garantia da autópsia de que não havia nenhuma outra pista sinistra na cena. E também é bom lembrar, Katie, que Mia tinha álcool no organismo, não é?
– Sim.
– Portanto, é possível que sua irmã não estivesse plenamente consciente das consequências do ato que praticou no penhasco. O álcool é conhecido por inibir a sensação de perigo.
– Sim. – Ela não confiou em si mesma para dizer outras palavras.
– O que finalmente eu gostaria de ressaltar é que Mia não carregava nada consigo, exceto uma coisa: o passaporte. – Ele fez uma pausa, incentivando-os a chegar a uma conclusão sobre o que pensava.
– Uma identificação – disse Finn.
– Precisamente.
– Essa é a informação que levou a polícia local a tirar a conclusão que tirou. Receio que caiba a vocês tirarem suas próprias conclusões.
Katie engoliu em seco, sabendo quão difícil isso seria.
O bar do Hotel Heights Khama era um ambiente elegante e iluminado por discretas luzes cor de âmbar. Além das altas pilastras de pedra, o jardim também iluminado se estendia até o mar.
Finn bateu as cartas sobre a mesa, recostou-se de braços cruzados e sorriu.
– Estou disponível para aulas.
– É bom saber disso – disse Katie, espalhando as cartas dela ao lado das dele.
Ele se remexeu no assento.
– Um flush? Você tem um flush?
– Ora. Tenho? – ela disse sorrindo.
Ele a olhou de boca aberta.
– Você me limpou?
Ela puxou a pilha de dinheiro sobre a mesa e a transferiu para a bolsa.
– Sim, acredito que sim.
Ele soltou uma risada alta e gutural que a deixou satisfeita.
– Em que diabo de lugar aprendeu a jogar pôquer desse jeito?
– Nas minhas viagens.
– Não consigo acreditar. Você me deixou vencer por... – ele olhou para o relógio – uma hora e meia, e depois sacou as armas na cartada final. Katie Greene, você mudou.
Ela sorriu.
– E agora só tenho quatro noites para recuperar a dignidade.
Ela recolheu as cartas, torcendo para não ser lembrada que faltava pouco tempo para ele partir.
– Acho que a próxima rodada fica por conta do perdedor. – Ele apontou para o copo vazio. – Vodca com suco de laranja?
– Por favor.
Katie observou que Finn andava com o short caído nos quadris, com o desapego de um estudante. Os outros convidados usavam camisas e calças leves, mas ela preferia a descontração dele; qualquer outra coisa nele cairia errado. Ele falou alguma coisa para o barman, que sorriu e pôs a mão no ombro dele. Ela se lembrou de quando ele chegava à casa que ela dividia com Jess e duas outras garotas em Londres; antes de chegar ao quarto dela, as amigas sempre caíam na risada de alguma coisa engraçada que ele fazia. A capacidade de fazer os outros rirem, e de também fazê-la rir, era uma das muitas coisas que amava nele.
Ele voltou com as bebidas, serviu-as e disse:
– Muito bem. Tenho sido gentil em evitar tocar no assunto desde o nosso encontro com Richard Hastings, mas já passou uma semana depois disso. E agora eu realmente gostaria de saber: quando é que você pretende ir aos penhascos de Umanuk?
Ela tomou um longo gole da bebida.
– Logo.
– Essa resposta não é suficiente. Eu quero uma data. Um horário. Um modo de transporte.
– Ainda não estou pronta. Sinceramente. Ainda não posso ir lá.
– É uma coisa grande – ele disse suavemente. – Eu entendo. Mas você precisa fazer isso, Katie.
Ela pôs o drinque na mesa e apertou os lábios. Estavam frios por causa do gelo.
– Depois que eu for ao penhasco, essa coisa toda... seguir o diário de Mia... termina. Sempre achei que iria até lá com respostas. Mas não tenho nenhuma.
– Talvez nunca encontre respostas.
– Mas tem que haver respostas. Senão, o que farei depois? Simplesmente voar para casa? Seguir em frente com minha vida?
– Será que isso assusta você?
O casal na mesa ao lado se levantou e levou as bebidas para o restaurante, onde se sentaram para jantar.
– Em Londres não há nada mais para mim. Nem família. Nem noivo. Nem trabalho.
– Sei que será difícil, mas você vai superar. Você é forte, Katie. Batalhadora. E tem seus amigos e também a mim.
Ele estava se colocando à parte da categoria dos amigos? Ela notou que ele assumiu uma expressão impassível e difícil de ser lida.
– Por que não voltamos juntos? – ele perguntou. – Se ainda não estiver pronta para Londres, você pode ficar com meus pais por um tempo. E pode me ensinar suas jogadas de pôquer.
Ela sorriu.
– Cedo ou tarde terá que voltar. Prefiro que seja comigo.
– O que você faz quando está em casa? – ela perguntou, tentando mudar de assunto. – Você vai ficar na Cornualha?
– Depende do trabalho... se eu voltar para o rádio.
– Será que a estação o aceitará de volta?
– Duvido. Eles não ficaram muito impressionados quando saí.
– Você se esforçou tanto para conseguir esse emprego. Pensei que adorasse esse trabalho.
– E adorava mesmo.
– E por que se demitiu?
Ele deu de ombros.
– Nunca fui capaz de dizer não para ela.
O caso entre Finn e Mia dominou a mente de Katie. Era um dos poucos assuntos sobre os quais ainda não tinham conversado e que agora pendia entre eles. Ela olhou fixamente para ele.
– Você estava apaixonado por Mia?
Ele suspirou.
– Sim.
Foi como uma facada nas vísceras, uma dor aguda que saiu de dentro para fora e a fez querer esconder as mãos. Mas ela preferiu pegar a bebida para ocupá-las.
– Desde quando?
Finn passou a junta do dedo para frente e para trás sob o queixo.
– Quando tínhamos 16 anos nós estávamos em um show e ela me beijou. Foi só um beijinho nos lábios, só isso. Não havia intenção alguma naquilo. Mas para mim foi a primeira vez que pensei nela como mais do que uma amiga.
Katie arregalou os olhos.
– Durante todo esse tempo você...
– Não. Não, acho que não. É difícil desembaraçar isso porque Mia sempre significou muito para mim.
– Mas quando vocês viajaram juntos...
– Percebi que estava apaixonado por ela.
Katie sentiu a garganta apertada e tomou o drinque de um só gole.
– Deve ter sido difícil vê-la com Noah.
– Foi um inferno.
– Como ele era?
– Um surfista incrível. Completamente focado no surfe. Acho que Mia foi atraída por essa intensidade.
Katie balançou a cabeça.
– Mas também me pareceu distante, na verdade realmente solitário. Fugia das pessoas. Sempre me pareceu perturbado. Não estou querendo dizer que isso seja uma opinião objetiva. É apenas a minha opinião.
– Mia escreveu a mesma coisa. Disse que a tristeza dele a fazia se lembrar de si mesma.
Finn engasgou.
– Você sabe. Talvez a minha opinião fosse diferente se eu tivesse achado que ele a amava.
– Por quê?
– Teria sido mais fácil deixá-la partir.
Ficaram calados por um tempo.
Finn se mexeu e ela notou que ele balançava o pé com nervosismo.
– Eu tenho perguntas, Katie. Sobre o diário de Mia... Sobre algumas outras coisas que ela pode ter escrito.
Só então ela se deu conta de que Finn tinha mesmo perguntas a fazer.
– Pergunte-me o que quer saber.
– Por acaso Mia escreveu... – Ele abaixou os olhos até o chão. – Ela escreveu por que tinha dormido comigo?
Katie pensou em retomar o relato do diário que descrevia as estrelas caindo do céu e a quentura do rum na garganta de Mia.
– Ela queria sentir o que você sentia.
– Só que ela não sentiu.
– Você sempre foi o melhor amigo dela. Ela escreveu que seria um salto muito grande pensar em você de outra forma.
– Ela se arrependeu?
– Só se arrependeu pela forma com que isso mudou as coisas.
– Desculpe, sei que deve ser estranho falar sobre isso. Depois de nós.
Ela o olhou com intensidade.
– Você já estava... apaixonado por ela quando estávamos juntos?
Ele respirou fundo.
– Foi difícil porque na época não estávamos nos falando. Muito difícil mesmo. Mas quando eu estava com você, nunca me passou pela cabeça que desejava estar com Mia.
Foi um alívio ouvir isso, pelo menos.
– Sinto muito pela forma como as coisas terminaram entre nós – ela disse de supetão.
– Isso é passado.
Não, não é. Isso está aqui no presente, ela pensou.
– Lembra do que lhe disse quando terminamos? Fomos até aquele bar em Clapham.
– Claro que lembro. Você disse que tinha sido divertido, mas que não via futuro em nosso romance.
O coração dela bateu como um tambor.
– Isso não era verdade.
– O que quer dizer?
– Eu estava preocupada com Mia. Ela estava sofrendo muito porque nós estávamos...
– Srta. Katie! – Ketut saiu correndo em direção à mesa deles. – Tenho uma mensagem para a senhorita!
Ela piscou.
– Uma mensagem?
– Sim, um fax. Olhe só. – Ele entregou uma folha branca de papel.
Ela pôs a folha para a luz e leu:
Katie,
Após sua visita, tive o prazer de receber algumas notícias sobre sua mochila roubada. Parece que você está com sorte: ontem a polícia prendeu parte da gangue malaia sobre a qual me referi. Segundo os policiais, a mochila foi recuperada, embora não saiba ao certo se com alguma coisa de valor dentro.
Não cabe a mim a responsabilidade de fazê-la retornar às suas mãos. A polícia já estava agendada para entregá-la desde a semana passada, e minha pergunta simplesmente apressou um pouco a entrega. Espero que o retorno da mochila possa confortá-la; sem dúvida, você merece.
Com respeito,
Richard Hastings
Katie olhou para Ketut.
Ele sorriu.
– Sua mochila já está no seu quarto.
Ela saiu correndo do bar, as sandálias batendo no piso de azulejos. Passou às pressas por uma família vestida para o jantar e saiu correndo novamente ao longo do amplo corredor em direção ao quarto, com Finn atrás. Enfiou a chave na fechadura e entrou no quarto.
A mochila de Mia estava encostada ao pé da cama. Parecia mais aos frangalhos do que se lembrava. Com um rasgo ao longo do bolso da frente e uma mancha escura que se estendia de cima a baixo, como se tivesse tomado um banho de óleo. Ela atravessou o quarto, puxou a mochila da cama e não se importou quando a sentiu mais leve. Abriu a fivela e o cordão e enfiou a mão na barriga da mochila.
Por favor, disse para si mesma, por favor, esteja aqui. Começou a retirar os itens – roupas, sapatos e produtos de higiene pessoal estavam empacotados juntos e ela jogou o pacote sobre a cama. Ficou com os dedos úmidos e pegajosos porque um frasco de xampu tinha vazado lá dentro. Retirou um item de cada vez: um vestido verde, uma brochura, um par de fones de ouvido, uma lanterna. E depois levou a mão ao fundo da mochila. Nada. Nada mais.
– Não! – Pôs a mochila de cabeça para baixo e sacudiu com força. – Vamos!
Empurrou a bolsa de lado e apalpou os itens que estavam espalhados em cima da cama: sandálias de dedo, escova de cabelo, casaco de lã, filtro solar, um par de shorts. Já tinha se esquecido deles. Revirou todo o resto; sacudiu a roupa e jogou os sapatos de lado. Examinou a pilha novamente, duas vezes.
– O diário não está aqui! O diário dela não está aqui!
Katie girou o corpo e Finn se agachou ao lado da mochila. Passou as mãos ao longo da superfície e abriu o zíper de um bolso lateral do qual ela se esquecera em meio a tanta pressa. Uma nódoa azul-marinho irrompeu como um vislumbre quando ele puxou o diário, como um mágico executando o seu melhor truque.
– Graças a Deus! – Ela caiu em prantos enquanto pegava o diário e passava os dedos sobre a capa cujo tecido pareceu mais fino. A lombada estava avariada e rachada. Folheou as páginas com o dedo polegar: estava tudo lá!
– Finn – disse, girando o corpo.
E logo congelou.
Ele estava com uma cara séria e tinha nas mãos um vestido de cor de grama molhada que pertencia a Mia. Era um dos poucos itens da roupa da irmã que Katie guardara na mochila. Ela notou o jeito com que ele tocava nas leves alças de algodão que um dia se dependuraram nos ombros de Mia. O que aquele vestido lhe trazia à memória a ponto de fazê-lo fechar os olhos por alguns instantes? Ele ergueu o vestido, como se para encontrar peso ou substância naquele objeto vazio, e depois o levou ao rosto e respirou o cheiro de Mia.
Mesmo com você morta, sempre será você e Finn, não é?
Ele abriu os olhos e olhou nos olhos de Katie. Ficaram calados. Como se de repente o ar do quarto estivesse comprimido pelo imenso brilho da presença de Mia. Ambos tinham partes de Mia nas mãos.
Finn soltou o vestido abruptamente e pigarreou.
– Já está com seu diário de volta.
– Pois é.
– Deve estar louca para lê-lo – ele disse, levantando-se. – É melhor deixá-la sozinha.
Ela balançou a cabeça. Pulou em cima da cama antes mesmo da porta se fechar atrás dele, puxou o diário para o colo e abriu as íntimas páginas cor de creme.