7

Sete dias se passaram, e William, Much e João Pequeno continuavam no castelo de Barnsdale, com o risonho solar em festa para celebrar os casamentos de Winifred e de Bárbara. Sob a orientação de Will Escarlate, o parque e os jardins do castelo foram transformados em arenas e espaço de dança, pois o gentil rapaz estava sempre atento ao bem-estar geral e à felicidade de cada um em particular. Incansável, participava e cuidava de tudo, e enchia a casa com sua alegria e bom humor.

Sem parar de trabalhar, ele conversava, ria, perguntava coisas a Robin e brincava fazendo provocações a Much. De repente, uma ideia mais louca atravessou o seu espírito e ele começou a rir alto.

— O que houve, William? — perguntou Robin.

— Meu amigo, duvido que adivinhe. Aposto que não consegue.

— Deve ser engraçadíssimo, já que o faz rir sozinho.

— Engraçadíssimo mesmo. Você conhece meus seis irmãos, não é? Todos seguem mais ou menos o mesmo padrão: são louros como o trigo, afetuosos, sossegados, valentes e honestos.

— Onde está querendo chegar, William?

— No seguinte: esses bons rapazes não conhecem o amor.

— E o que tem isso? — perguntou Robin sorrindo.

— Pois tive uma ideia que pode nos dar muita alegria — começou Will Escarlate.

— Qual ideia?

— Você sabe que tenho muita influência sobre eles e vou convencê-los hoje mesmo de que devem se casar. — Robin começou a rir. — Vou chamá-los a um canto do pátio e enfiar nas suas cabeças a ideia maluca de se casarem no mesmo dia que Much e João Pequeno.

— Acho impossível. Seus irmãos são calmos e ponderados demais para que embarquem assim nesse plano. Aliás, que eu saiba, não estão interessados em ninguém em particular.

— Tanto melhor. Serão obrigados a cortejar as amigas das minhas irmãs e será ainda mais divertido. Imagine só o jeitão de Gregório, que é tão ajuizado e pesadão, o típico bom sujeito, tentando agradar a uma moça. Venha comigo, Robin, não temos tempo a perder, são só três dias para que façam suas escolhas. Vou reuni-los e ter uma conversa num tom grave e paternal.

— O casamento é uma decisão séria, Will, e não devemos brincar com isso. Digamos que consiga, com a eloquência que tem, convencê-los, mas imagine que depois se sintam infelizes por terem se apressado na escolha; não vai se arrepender um bocado por criar tal situação para a vida inteira?

— Fique tranquilo quanto a isso, Robin. Vou cuidar de encontrar moças dignas do mais delicado amor, tanto no presente quanto no futuro. Aliás, sei de uma bonita mocinha que é apaixonada por meu irmão Herbert.

— Isso não basta, Will. Essa criaturinha é digna de chamar Winifred e Bárbara de irmãs?

— Totalmente e, além disso, tenho certeza de que será ótima esposa.

— Herbert conhece a moça?

— Bastante, mas é ingênuo demais para imaginar que pode ser objeto de uma preferência desse tipo. Várias vezes tentei mostrar o quanto é bem-vindo na casa de miss Anna Maydow. Em vão. Nunca consegui que entendesse. É um menino, mesmo tendo vinte e nove anos! Com o caso dele resolvido, passemos a outro. Tenho muita simpatia por outra linda mocinha que, sob todos os aspectos, conviria perfeitamente a Egbert. Além disso, Maude ontem mesmo falou de uma jovem da vizinhança que acha Harold um belo rapaz. Como vê, Robin, já temos uma parte do que é preciso para a realização do meu projeto.

— Infelizmente não basta, Will, pois são seis a casar.

— Não se preocupe, vou procurar e encontrar mais três moças.

— Tudo bem. Mas acha que vão querer se casar com os seus irmãos?

— Tenho certeza. Meus irmãos são rapazes fortes, jovens e de boa aparência. Parecidos comigo fisicamente — acrescentou Will com uma ponta de vaidade. — Mesmo que não sejam sedutores como você, Robin, nem tão simpáticos e comunicativos, têm, por outro lado, tudo para causar boa impressão a qualquer jovenzinha ajuizada que procure um bom marido. Ah! Herbert está passando por ali — notou Will, voltando-se para um rapaz que atravessava uma alameda do jardim. — Vou chamá-lo. Herbert! Chegue até aqui!

— O que há, Will? — perguntou o rapaz, se aproximando.

— Estava querendo falar com você, meu amigo.

— Estou ouvindo.

— O que quero dizer tem a ver com nossos irmãos também. Pode chamá-los?

— Agora mesmo.

Nos poucos minutos que durou a ausência de Herbert, Will ficou pensativo. Todos chegaram enfim, sorridentes e alegres.

— Cá estamos, William — disse o mais velho deles, bem-humorado. — Por que quis nos ver a todos ao mesmo tempo?

— Um motivo grave, meus queridos irmãos, mas posso, antes, fazer uma pergunta?

Todos, com o mesmo gesto, concordaram.

— Gostam muito do nosso pai, não é?

— Quem teria dúvida quanto a isso? — respondeu Gregório.

— Ninguém. A pergunta é apenas um ponto de partida. Só confirmando, têm todo carinho por nosso velho e muito digno pai, que sempre se comportou honradamente, como verdadeiro saxão?

— Claro que sim! — estranhou Egbert. — Em nome de Deus, Will, o que quer dizer com isso? Alguém difamou nosso pai? Diga quem foi o miserável e me encarrego de vingar a honra dos Gamwell.

— A honra dos Gamwell continua intacta, irmãos queridos. Houvesse sido maculada pela mentira, já teria sido lavada com o sangue do caluniador. Quero falar-lhes de algo menos grave e, mesmo assim, muito sério. Peço somente que não me interrompam, se quiserem saber ainda hoje e antes do final do dia tudo o que quero dizer. Apenas movam a cabeça, para concordar ou não. Bom, recomeço. A conduta de nosso pai é a de um homem honesto, e deve nos servir de guia e modelo.

As seis cabeças louras fizeram o mesmo gesto afirmativo e Will continuou:

— Nossa mãe seguiu o mesmo caminho. Em sua existência buscou o cumprimento de todos os deveres, é o exemplo de todas as virtudes.

— Concordamos todos.

— Nossos queridos pais se amaram e viveram juntos, construindo mútua felicidade. Caso nosso pai não tivesse se casado, não existiríamos e, consequentemente, desconheceríamos a felicidade de viver. Não é claro?

— Claríssimo.

— O que quero dizer, meninos, é que devemos ser gratos a nossos pais por terem se casado, nos trazido ao mundo e serem a causa da nossa existência.

— Perfeitamente.

— E por que continuam cegos a esse quadro de tanta felicidade? Por que se mantêm ingratos diante da Providência? Como se negam a prestar a nossos pais a demonstração de respeito, carinho e gratidão?

Os rapazes arregalaram os olhos espantados, sem nada entender das palavras do irmão.

— O que significa tudo isso, William? — Gregório tomou a iniciativa.

— Significa, meus irmãos, que assim como nosso pai vocês devem se casar e, com isso, mostrar que admiram o seu exemplo.

— Santo Deus! — exclamaram todos juntos, nada satisfeitos.

— O casamento é a felicidade — completou Will. — Imaginem o quanto vão estar contentes tendo uma querida criatura em seus braços, como a flor que se agarra ao forte arbusto, uma querida criatura que os amará, pensará em vocês, que serão para elas fonte de toda a alegria. Olhem em volta, seus mandriões, e verão os doces frutos do casamento. Maude e eu, para começar, a quem tenho certeza que invejam quando brincamos juntos com nosso querido filhinho. Em seguida, Robin e Marian. Vejam João Pequeno, que é um digno exemplo. Querem mais provas da felicidade que o céu distribui aos jovens casais? Façam uma visita a Halbert Lindsay e a bonita Graça. Desçam o vale de Mansfield e encontrarão Allan Clare e lady Christabel. Parecem-me uns grandessíssimos egoístas que nunca pensaram que podem tornar uma mulher feliz. Não balancem a cabeça, nunca haverão de convencer ninguém de que são bons e generosos rapazes. Tenho vergonha por vocês de tanta secura na alma e me incomoda ouvir por todo lugar: “Os filhos do velho baronete têm corações de pedra.” Resolvi dar um basta a esse estado de coisas e quero, considerem isso um aviso, que se casem.

— Era só o que faltava! — reagiu Rupert revoltado. — No que me concerne, não quero mulher. O casamento pode ser ótimo, mas isso me interessa muito pouco, no momento.

— Não quer uma esposa? — respondeu Will. — Que seja, mas terá uma mesmo assim, pois conheço alguém que o fará mudar de ideia. — Rupert balançou a cabeça. — Entre nós, já que estamos em família, tem interesse por alguém em particular?

— Tenho — respondeu o rapaz com gravidade.

— Muito bem! — exclamou Will, surpreso com a confidência inesperada, pois Rupert era bastante arredio às jovens senhoritas. — Quem é? Diga como se chama.

— É minha mãe — disse o ingênuo rapaz.

— Sua mãe! — repetiu Will, com uma ponta de zombaria. — Não é novidade. Há muito tempo sei que ama, venera e respeita nossa mãe. Não me refiro a esse tipo de amor filial com que envolvemos nossos pais, falo de outra coisa, falo de amor… O amor é um sentimento… um carinho… enfim, uma sensação que faz o coração dar saltos na direção de determinada pessoa. Nada impede que adore a sua mãe e, ao mesmo tempo, goste de uma moça encantadora.

— Também não quero me casar — declarou Gregório.

— Acha que tem vontade própria, irmãozinho? — respondeu Will. — Vai descobrir daqui a pouco que está errado. Por exemplo, pode dizer por qual motivo rejeita o casamento?

— Não — respondeu timidamente Gregório.

— Quer viver sozinho? — Gregório se manteve em silêncio. — Atreve-se a defender a opinião dos patifes que fazem pouco da companhia de uma mulher? — perguntou Will fingindo-se indignado.

— Não é o que digo e menos ainda o que penso, mas…

— Não há mas que se sustente diante de motivos peremptórios como os que apresentei. Preparem-se então para constituir família, irmãos, pois vão se casar ao mesmo tempo que Winifred e Bárbara.

— Como? — assustou-se Egbert. — Em três dias? Está louco, Will. Nem temos tempo para encontrar com quem.

— Deixem que cuido disso, encarrego-me de conseguir mais do que se atreve esperar a natural modéstia de vocês.

— No que me toca, decididamente não quero perder minha liberdade — disse Gregório.

— Nunca esperei encontrar tanto egoísmo num dos filhos de minha mãe — disse William com um tom magoado.

O pobre Gregório ficou todo vermelho.

— Veja, Gregório — disse Rupert —, deixe Will fazer o que quer, pois age pensando em nossa felicidade. Se de fato encontrar mulher para mim, aceitarei. De qualquer forma, irmão, sabemos que é bobagem resistir, William sempre conseguiu tudo que queria de nós.

— Já que quer tanto nos casar — acrescentou Stéphen —, prefiro ter logo uma esposa em três dias do que em seis meses.

— Concordo com Stéphen — disse o tímido Harold.

— Aceito, então, mas forçado — concordou Gregório enfim —, pois Will é um verdadeiro demônio e mais cedo ou mais tarde vai conseguir me enredar na sua teia.

— Logo vai me agradecer por ter derrubado seus falsos argumentos e sua felicidade será a minha recompensa.

— Caso-me então, mas só para agradá-lo, Will. Só espero que também procure me agradar e me consiga uma bela moça.

— Todos serão apresentados a jovens e encantadoras senhoritas. Se não as acharem adoráveis, vão poder dizer por aí que Will Escarlate não sabe o que é um rosto bonito.

— Vou poupá-lo do trabalho de me ajudar — disse Herbert. — A minha já foi escolhida.

— Ah! — exclamou Will com uma risada. — Você vai ver, Robin, que meus rapazes de bobos não têm nada e que a aparente relutância com relação ao casamento era de brincadeira. Como se chama a bem-amada, Herbert?

— Anna Maydow. Combinamos que nosso casamento seria junto ao de minhas irmãs.

— Mas como é sonso! — disse Will, dando no irmão um tapinha no ombro. — Falei anteontem dessa moça com você, que ficou calado.

— Somente hoje de manhã tive uma resposta positiva da querida Anna.

— Tudo bem, mas quando fiz alusão ao interesse dela por você, não comentou nada.

— Não tinha o que comentar. Você dizia: “Miss Anna é bonita, tem bom temperamento e pode ser excelente esposa.” Como sei de tudo isso há muito tempo, suas observações não eram novidade para mim. Depois você acrescentou: “Ela gosta de você.” Sendo também a minha opinião, nada vi que pudesse comentar.

— É uma boa resposta, discreto Herbert. Pelo silêncio dos nossos irmãos, porém, acho que é o único a merecer minha estima.

— Também já estava decidido a me casar — disse Harold. — Por influência de Maude.

— Ela escolheu alguém para você? — perguntou Will rindo.

— Escolheu, meu irmão. Maude me convenceu do quanto é agradável viver ao lado de uma boa mulher e acabei aceitando a ideia.

— Ótimo! — entusiasmou-se Will felicíssimo. — Caros irmãos, aceitam por vontade própria e com a mão no coração se casarem no mesmo dia que Winifred e Bárbara?

— Aceitamos — responderam duas vozes energicamente seguras.

— Aceitamos — murmuraram os que não tinham perspectiva de candidatas.

— Viva o casamento! — gritou Will, tirando o gorro da cabeça e jogando-o para o alto.

— Viva! — repetiram em uníssono as seis vozes.

— Will — lembrou Egbert —, é melhor pensar em nossas futuras esposas. Precisa se apressar, pois provavelmente vão querer conversar um pouco antes de se casarem.

— É provável mesmo, venham comigo. Tenho em vista uma gentil mocinha para Egbert e acho que conheço três outras que vão perfeitamente combinar com Gregório, Rupert e Stéphen.

— Will — adiantou-se Rupert —, tenho preferência por louras e miúdas, não gostaria de uma esposa corpulenta demais.

— Conheço suas inclinações românticas e levei isso em consideração. Sua noiva tem a fragilidade de uma flor e é bonita como um anjo. Venham, rapazes, vou apresentá-los às suas respectivas para que façam a corte. Caso não saibam muito como agradá-las, posso dar conselhos. Melhor ainda, posso substituí-los na tarefa.

— É pena que não possa também se casar com nossas futuras mulheres, tudo se encaminharia bem mais rapidamente.

William fez um gesto fanfarrão, pegou Gregório pelo braço e saiu de Barnsdale, acompanhado por seu cortejo de candidatos.

Os sete irmãos logo chegaram ao vilarejo. Herbert tomou a direção da casa de sua escolhida. Harold desapareceu pouco depois e Will se encaminhou com os irmãos à residência da jovem que ele havia pensado para Egbert.

Miss Lucy abriu pessoalmente a porta. Era uma jovem encantadora, de rosto bem rosado e olhos negros com brilhos de malícia. Seu sorriso exprimia bondade, e ela sorria muito.

William apresentou o irmão e falou das boas qualidades de Egbert. Foi tão persuasivo e eloquente que a gentil senhorita, obtido o consentimento da mãe, deixou Will otimista quanto à realização dos seus desejos.

Satisfeito com a boa acolhida de miss Lucy, ele deixou Egbert para que continuasse por conta própria a corte tão bem iniciada e se afastou com os irmãos.

Mal os rapazes se viram de volta à rua, Stéphen disse a Will:

— Gostaria de ser capaz de falar como você, com tanto brilho, desenvoltura e graça.

— Nada mais fácil do que ser agradável a uma mulher, meu amigo. As palavras, em si, não têm tanta importância; não são indispensáveis os floreios e nem que elas sejam belas, basta apenas dizer com bondade coisas sinceras.

— É bonita a moça que escolheu para mim?

— Diga suas preferências e gosto.

— Ah! — respondeu Stéphen. — Não sou tão difícil, alguém como Maude seria perfeito para mim!

— Alguém como Maude! Só isso? — repetiu Will extremamente surpreso. — Na verdade, meu caro, está sendo exigente, e deixe-me acrescentar que nada modesto em suas expectativas. Por são Paulo! Stéphen, alguém como Maude é muito raro, para não dizer impossível de encontrar. Saiba, seu ambicioso, que não existe na Terra quem se compare a minha querida mulher!

— Acha mesmo, Will?

— Tenho certeza — afirmou ele, peremptório.

— Não pensei nisso. Desculpe minha ignorância, Will. Não sou alguém viajado — respondeu ele com ingenuidade. — Mas se puder encontrar para mim uma mulher com beleza comparável à de Maude…

— Não há no mundo quem tenha uma só das perfeições de Maude — respondeu William com uma ponta de irritação pelos anseios do irmão.

— Sendo assim, Will, consiga para mim alguém que lhe agrade — consentiu Stéphen mais desanimado.

— Não terá do que reclamar. Vou dizer como se chama: Minny Meadoros.

— Sei quem é — disse Stéphen com um sorriso. — Tem olhos negros, cabelos cacheados. Minny costumava rir de mim, dizendo que eu era bobo e aparvalhado. Mas eu gostava dela, apesar disso. Um dia, estávamos sozinhos, e ela me perguntou rindo se eu alguma vez havia beijado uma garota.

— E o que respondeu?

— Respondi que evidentemente havia beijado minhas irmãs. Minny desatou a rir e continuou perguntando: “Não beijou então nenhuma outra mulher além das suas irmãs?” “Desculpe-me, miss”, respondi, “já beijei também a minha mãe.”

— Mas que tonto! Muito bem. E o que aconteceu depois dessa bela resposta?

— Ela riu ainda mais. E perguntou se eu não tinha vontade de beijar outras mulheres, que não fossem minhas irmãs e mãe. Respondi que não.

— Foi uma estupidez. Devia ter beijado Minny: seria a resposta certa para as perguntas.

— Isso nem me passou pela cabeça — disse tranquilamente Stéphen.

— E como se despediram depois dessa amável troca de palavras?

— Minny me tratou de tolo e foi embora rindo.

— Concordo plenamente com sua futura esposa. Ela o agrada, então?

— Muito. E o que digo a ela, quando estivermos sozinhos?

— Todo tipo de coisas bonitas.

— Entendo. Mais uma coisa, Will, como se deve começar uma boa frase? É sempre a primeira palavra o que acho difícil encontrar.

— Quando estiver sozinho com Minny, diga que gostaria de ter algumas aulas da arte de beijar moças e, dizendo isso, beije-a. Dado o primeiro passo, não terá dificuldade para continuar.

— Nunca vou conseguir ser tão atrevido — assustou-se Stéphen.

— Nunca vou conseguir! — arremedou Will. — Pela minha alma, Stéphen! Se não tivesse certeza de que é um bravo e corajoso mateiro, poderia achar que é uma moça vestida de homem.

Stéphen ficou vermelho.

— E se ela ficar ofendida com minha maneira de agir? — disse ele hesitante.

— Beije-a novamente e diga: “Linda senhorita, adorável miss Minny, será preciso que me perdoe para que pare de beijá-la.” Aliás, guarde isso na memória e trate de se lembrar no momento certo: uma jovem nunca recusa de verdade um beijo de quem ela ama. É verdade que, se não for o caso, as coisas mudam: ela se defende e tão bem que você não vai poder ir adiante. Mas não corre risco algum de ser realmente recusado. Sei por fonte segura que a linda mocinha o vê com bons olhos.

Stéphen se armou de coragem e prometeu a William superar a timidez.

A jovem estava sozinha em casa.

— Bom dia, adorável Minny — disse Will, tomando a mão estendida da jovem, que corou ao cumprimentá-lo. — Trouxe comigo meu irmão Stéphen, que tem algo importante a lhe dizer.

— Stéphen? — estranhou a moça. — O que pode ter de tão importante a me dizer?

— Que gostaria — começou precipitadamente o rapaz, empalidecendo de dar medo — de ter umas aulas…

Will o interrompeu com um puxão no braço, para que não fosse tão rápido, e disse:

— Querida Minny, Stéphen explicará daqui a pouco o que espera da sua bondade. Mas desde já permita-me comunicar o próximo casamento de minhas irmãs.

— Ouvi falar das belas festas que estão sendo preparadas no castelo.

— Pois espero, querida Minny, que venha participar de nossa alegria.

— Com prazer, Will. As jovens do povoado andam todas preocupadas com as roupas que usarão, e para mim é uma alegria imensa dançar em festas de núpcias.

— Irá com o seu namorado, não é, Minny?

— Não — interrompeu Stéphen. — Está esquecendo, Will…

— Não estou esquecendo nada — cortou o irmão. — Por favor, apenas ouça por alguns segundos. Irá com o seu namorado, não é, Minny? — repetiu Will a pergunta.

— Não tenho namorado.

— Verdade, Minny? — perguntou Will.

— É a pura verdade, ninguém que eu possa considerar como tal.

— Se quiser, Minny, gostaria de ser seu namorado — intrometeu-se Stéphen, tomando trêmulo as mãos da moça.

— Muito bem, Stéphen! — concordou Will.

Ganhando coragem com a aprovação do irmão, ele continuou:

— Isso mesmo, Minny; gostaria muito. Virei buscá-la no dia da festa e nos casamos ao mesmo tempo que minhas irmãs.

Assustada com o imprevisto da declaração, a moça não soube o que responder.

— Ouça, querida Minny — disse Will. — Meu irmão gosta de você há muito tempo e o silêncio que sempre manteve vem não do coração, mas de uma extrema timidez. Por minha honra, juro que Stéphen está falando com a sinceridade do amor. Você não está comprometida com ninguém, Stéphen é um belo rapaz e, detalhe mais importante ainda, é um ótimo, um excelente rapaz. Será um bom e digno marido. Com o seu consentimento e o da sua família, o casamento poderá ser celebrado junto com o de minhas irmãs.

— Na verdade, Will — respondeu a jovem baixando os olhos, confusa —, estava tão despreparada para o pedido, feito de forma tão forte e inesperada, que não sei o que responder.

— Diga simplesmente: aceito Stéphen como marido — sugeriu o próprio interessado, mais tranquilo ao constatar a suavidade dos olhares da bonita mocinha. — Gosto muito de você, Minny — ele continuou —, e serei o mais feliz dos homens caso me conceda a sua mão.

— Não tenho como responder hoje mesmo à sua proposta que muito me lisonjeia — disse a jovem, fazendo uma pequena reverência simpática e levemente irônica ao tímido pretendente.

— Vou deixar que conversem um pouco, meus amigos — atalhou William. — Minha presença nesse momento atrapalha e tenho certeza de que Minny, gostando um pouco de Winifred e Bárbara, ficará contente de considerá-las irmãs.

— Gosto profundamente de Winifred e Bárbara — respondeu a jovem, parecendo comovida.

— Então — disse Stéphen —, posso esperar que, em consideração à amizade por minhas irmãs, me tratará com generosidade.

— Veremos — ela respondeu com graça.

— Até logo, encantadora Minny — despediu-se William com um sorriso. — Por favor, seja indulgente e boa com esse gentil rapaz que carinhosamente a ama, mesmo que não saiba muito bem expressar seus sentimentos.

— Está sendo severo demais, Will — respondeu seriamente a moça. — Pessoalmente acho que Stéphen se exprimiu perfeitamente bem.

— Bom — concluiu Will. — Vejo que é excelente pessoa, amável Minny. Permita-me beijar suas mãos e dizer uma vez mais: até breve, irmã.

— Devo realmente responder a William: até breve, irmão? — perguntou a moça, voltando-se para Stéphen.

— Por favor — exclamou Stéphen com voz alegre. — Diga: até breve, irmão, para que ele vá logo embora.

— Fez progressos rápidos, garoto — observou rindo Will. — Minhas aulas foram boas, tenho a impressão.

Ele se despediu de Minny com um beijo e se afastou, com Gregório e Rupert.

— Agora é a nossa vez, não é? — impacientou-se o primeiro. — Estou louco para saber com quem vou casar.

— Eu também — disse Rupert.

— Onde ela mora? — perguntou Gregório.

— Vou estar com minha noiva ainda hoje? — emendou Rupert.

— Tanta curiosidade é natural e logo será satisfeita — respondeu Will. — Suas futuras esposas são primas e se chamam Mabel e Editha Harowfeld.

— Conheço as duas — disse Gregório.

— Eu também — acrescentou Rupert.

— São belas moças — afirmou William — e não me surpreende que os tenham atraído. Estou em Barnsdale há apenas dezoito meses e, mesmo assim, não há no condado moça alguma, loura ou morena, em que eu não tenha reparado. Assim como a vocês, Mabel e Editha chamaram minha atenção.

— Nunca vi um sujeito como você, Will. Anda de cima a baixo por todo lugar e conhece todas as mulheres. Nenhum de nós é assim — admitiu Gregório.

— E é pena, rapazes. Pois se minimamente se parecessem comigo eu não seria obrigado a procurar mulheres para vocês e a ensinar a fazer a corte às que lhes agradarem.

— Saiba que não teremos dificuldade para fazer a corte a Mabel e Editha — respondeu Gregório decidido. — Rupert tem uma inclinação por Mabel e estou pessoalmente convencido de que Editha é boa pessoa. Vou então simplesmente perguntar se ela não quer se casar com Gregório de Gamwell.

— Não faça o pedido de forma tão brusca, meu amigo. Corre o risco de ser rejeitado.

— Diga então o que devo fazer para explicar minhas intenções. Não domino as manhas e tudo que quero é tê-la como esposa. Acho então normal chegar e apenas dizer: Editha, gostaria de me casar com você.

— Vai deixá-la muito pouco à vontade, declarando-se assim de supetão.

— E o que devo fazer? — perguntou Gregório assustado.

— Levar a conversa para a direção que o interessa, mas suavemente. Fale primeiro do baile que vai haver no castelo dentro de três dias, da felicidade de João Pequeno, da alegria de Much. Faça uma alusão à sua vontade de também se casar e só então pergunte a Editha, como fiz com Minny, se também pensa em se casar e se irá à festa de Barnsdale com algum namorado.

— E se Editha responder que sim, que irá à festa com um namorado?

— Nesse caso, diga: “Senhorita, então serei eu esse namorado.”

— E se ela recusar?

— Nesse caso, você tenta o mesmo com Mabel.

— E eu? — espantou-se Rupert.

— Editha não vai recusar. Fiquem tranquilos, cada um poderá se casar com a moça de sua preferência.

Os três atravessaram a praça do vilarejo em direção a uma bonita casa, diante da qual duas moças estavam de pé.

— Bom dia, morena Editha, e bom dia, loura Mabel — disse Will cumprimentando as duas primas. — Meus irmãos e eu viemos convidá-las para um baile de núpcias.

— Sejam então muito bem-vindos — disse Mabel com a suavidade de um passarinho a cantar. — Entrem um pouco, por favor, e aceitem algo a beber.

— Mil agradecimentos, encantadora Mabel — respondeu William. — Nunca se recusa convite tão graciosamente formulado. Vamos brindar à saúde e felicidade de vocês.

Editha e Mabel, que eram inteligentes e agradáveis moças, aceitaram bem-humoradas os galanteios dos três irmãos, e depois de uma hora de alegre conversa, Gregório juntou toda coragem e timidamente perguntou a Editha se um namorado a acompanharia ao castelo.

— Estarei acompanhada não por um namorado, mas por meia dúzia de simpáticos rapazes — respondeu a moça com um riso provocativo.

A resposta inesperada deixou o pobre Gregório totalmente confuso. Ele deixou escapar um suspiro e disse a meia voz ao irmão:

— É um caso perdido, não acha? Não posso disputar com meia dúzia de pretendentes. Que pena, vou ter que continuar solteiro.

— Para você que não queria se casar, é uma boa notícia — disse Will, em tom de zombaria.

— Enquanto não tinha ninguém em mente, mas desde que a ideia chegou ao coração, me apavora achar que não vou encontrar uma esposa.

— Vai ter Editha, deixe comigo. Miss Editha — disse William —, nossa visita tinha uma dupla finalidade. Primeiro convidá-las à nossa festa de família, e, além disso, gostaria de lhe apresentar não um acompanhante para o baile, ou alguém que a adore por vinte e quatro horas apenas, pois já tem seis à sua disposição e um a mais nem teria graça. Minha intenção é a de propor um bom partido, jovem, ajuizado e rico, detalhe que nunca atrapalha, e que se sentiria muito feliz de lhe oferecer o coração, a mão e o nome.

Miss Editha ficou bem pensativa.

— Está falando sério, Will?

— Não podia estar sendo mais sério. Gregório ama-a do fundo do coração. Aqui está presente e, mesmo que a senhorita não se sensibilize com a eloquência dos seus olhares, ouça pelo menos a sinceridade das suas palavras. Deixo-o defender pessoalmente a sua causa, que considero bem encaminhada — acrescentou William, interpretando como favorável o satisfeito sorriso que brotou nos lábios de Editha.

Só então Gregório se aproximou mais da jovem e William procurou Rupert, para uma eventual ajuda, que não foi necessária, pois o rapaz já conversava em voz baixa com Mabel. Segurava as mãos da moça e, quase ajoelhado à sua frente, parecia muito satisfeito.

— Bom — pensou Will —, está se virando bem. Posso deixar que continue por conta própria.

Considerou por um tempo os dois casais enamorados e deixou a sala sem chamar atenção, voltando apressado ao castelo.

Ao chegar ao saguão de Barnsdale, encontrou Robin, Marian e Maude. Contou-lhes o que tinha acabado de acontecer, falou da timidez dos futuros maridos, mas acabou reconhecendo que os quatro haviam corajosamente superado a difícil posição inicial.

Já no final da tarde, os recentes noivos voltaram ao castelo. Estavam radiantes de alegria, pois o sucesso fora total: todos podiam se gabar do consentimento das suas belas.

Os pais das jovens noivas acharam loucura casá-las tão precipitadamente, mas a insigne oportunidade de fazer parte da nobre família Gamwell dissipou qualquer receio.

Sir Guy, a quem Robin habilmente preparara para a escolha de seus filhos, recebeu com perfeita generosidade as seis lindas noivas. Os oito casamentos foram celebrados na data marcada e com grande pompa, ficando todos igualmente satisfeitos com a própria felicidade.