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Era novamente maio, exatos três anos desde o mês em que eles pisaram no México pela primeira vez, mas pouca gente falava nisso. O trabalho prosseguia silenciosa e simplesmente, como em um mosteiro onde se houvesse feito voto de silêncio. Após diversas greves e rebeliões, os fazendeiros e os imigrantes aprenderam a obter o que desejavam uns dos outros sem precisar recorrer a ameaças mais sérias. Os fazendeiros aceitaram que os coreanos eram diferentes dos maias. Do Rio Grande ao cabo Horn, eles eram os únicos coreanos em toda a América Latina, portanto não havia como não ser forte a solidariedade entre eles. Além disso, eram basicamente compostos de soldados, intelectuais e gente da cidade, portanto possuíam um nível relativamente elevado de letramento e conhecimento formal. Chicote não funcionava com eles. Por sua vez, os imigrantes não mais se opunham aos dirigentes das fazendas — não apenas porque entenderam o que significava a reunião desordenada de centenas de fazendas pequenas e de médio porte, mas porque sabiam que não havia mais o que obter dos fazendeiros. Além do que, haviam chegado à conclusão dolorosa, depois de uma série de tentativas de processos judiciais, de que todas as instituições e leis em Yucatán estavam nas mãos dos fazendeiros. Por esse motivo, os imigrantes trabalhavam como soldados calejados prestes a serem dispensados. Contavam cada dia, mas cumpriam obedientemente tudo o que era exigido deles, sonhando com o mundo lá fora.

Alguns dos trabalhadores mais incansáveis já haviam pagado aos fazendeiros seus oitenta a cem pesos e ido embora. A maioria foi para Mérida ou a Cidade do México encontrar algum trabalho manual, mas alguns poucos estavam determinados a voltarem para a Coreia. Gwon Yongjun era um deles. Cada vez mais gente estava aprendendo espanhol, o que desvalorizava a sua posição de intérprete, e, uma vez que ele já ganhara dinheiro suficiente, permanecer no sufocante Yucatán não era bem o que mais desejava.

— Escute uma coisa, preciso voltar — disse Gwon Yongjun enquanto comia uma tortilla recheada de kimchi de repolho. Uma garota que ninava um bebê suavemente em uma rede virou­-se para olhar para ele como se tivesse acabado de ser queimada.

— Como pode fazer uma coisa dessas?

A expressão de Gwon Yongjun demonstrou que ele havia esperado justamente essa reação de Yi Yeonsu.

— Como assim, como? Até uma raposa morre com a cabeça virada na direção do lugar onde ela nasceu, portanto o que existe de tão estranho em dizer que vou voltar para minha terra natal? Venha comigo, se quiser — Gwon Yongjun enfiou a tortilla na boca.

— Ijeong vai voltar. Vai voltar e ser um pai decente — disse Gwon Yongjun depois, com maldade. A mulher maia entrou e dobrou a roupa que havia tirado do varal. Caiu um breve silêncio. Yeonsu sabia que esse dia chegaria, mas não sabia se seria assim tão depressa. Ela tirou a criança da rede. A trama deixara marcas axadrezadas no seu bumbum nu. Ele olhou para Yeonsu e seus lábios se mexeram de leve. “Omma.” Yeonsu segurou­-o contra o peito. Gwon Yongjun deitou a cabeça na coxa da mulher maia e disse:

— Você não tem motivo para me desprezar. Não fui eu quem lhe fez mal, fui? Ele voltará no ano que vem. Isto é, se conseguir escapar da polícia, dos bandidos e dos fazendeiros — ele estalou os lábios. — Ah, tem tanta coisa que quero comer que mal posso esperar! Vou voltar.

— Eu não posso ir — Yeonsu abraçou o filho com força.

Gwon Yongjun sorriu:

— Você precisa ir. Está pensando em morrer de fome aqui? Quem vai lhe trazer comida? Seus pais? Seu irmão?

Yeonsu levou a criança para fora. Não conseguia pensar. Depois de ter relações com Gwon Yongjun, nada mais a surpreendia ou envergonhava em demasia, porém aquilo era diferente. Parecia que ela envelhecera anos e anos de uma só vez. O Gwon Yongjun que ela conhecera até então não podia ser chamado de mau, mas também não podia ser considerado bom. No começo ele gostara dela e a tratara com mais luxo do que o necessário pelo privilégio de abraçar a jovem filha da família real. Quando a barriga dela cresceu, ele até mesmo contou uma mentira por ela que ninguém acreditaria. Mas ninguém o contradisse abertamente.

“Ele está dormindo com duas mulheres”, murmuravam as pessoas pelas costas de Gwon Yongjun. As mulheres no cenote expressavam seu desprezo pela garota que passara de filha única de um homem de letras a concubina de um intérprete. Se ela apanhava uma peça de roupa caída da cesta de uma mulher e a devolvia, a mulher voltava a lavá­-la. Seu filho não se dava bem com as outras crianças. Era seu primeiro filho, portanto seu leite não veio com facilidade, mas quando ela procurou uma ama de leite, todas viraram a cabeça. Apenas a mulher maia com quem ela morava, Maria, ofereceu o seio. Uma amizade estranha cresceu entre essas duas mulheres que viviam com um único homem. As glândulas mamárias de Maria incharam no dia em que Yeonsu deu à luz. Antes de o primeiro leite de Yeonsu chegar, Maria alimentou o recém­-nascido de bom grado, que tinha uma mancha mongólica bem distinta nas nádegas. Talvez ela estivesse pensando em seus dois filhos, que morreram bem novos. Eles também nasceram com manchas nas nádegas, o que prova que os maias eram descendentes do povo que cruzou o estreito de Bering congelado tanto tempo atrás. Maria entregava o menino para Yeonsu sempre que ela o queria, mesmo que o estivesse amamentando. Se Yeonsu segurava a criança sem jeito, ela o tomava das suas mãos bruscamente para cuidá­-la.

Yeonsu levou o bebê para a casa dos pais. A porta estava aberta. A senhora Yun, metida em uma saia com cauda, estava se abanando na frente da casa.

— Mãe — disse Yeonsu.

Sem responder, a senhora Yun virou­-se, entrou e fechou a porta. Lá de dentro veio o som de Yi Jongdo lendo em voz alta e depois se interrompendo, aparentemente sem saber por que a porta havia sido fechada. Talvez em seguida ele tivesse percebido o motivo, pois recomeçou a leitura. Mãe, pai, pode ser que eu volte. Seus lábios se mexeram de leve, mas ela foi incapaz de pronunciar as palavras.

Sua família não tinha nenhuma intenção de aceitá­-la. Um ano depois de eles terem chegado à fazenda, a fluência do seu irmão mais novo em espanhol foi reconhecida e ele foi vendido para uma fazenda que não contava com um intérprete. A depressão da senhora Yun piorou e ela tentava se suicidar com frequência, mas sempre falhava. Yi Jongdo abandonara todas as esperanças de ser resgatado dali. Havia dois anos os administradores da fazenda começaram a visitar Mérida uma vez por mês e a trazer maços de cartas da Coreia, mas não houve nem uma palavra do primo nobre de Yi Jongdo sentado ao trono. Porém, ele recebeu a notícia de que Yi Jun, o encarregado secreto de assuntos diplomáticos do imperador, havia se candidatado a uma cadeira na Conferência Internacional de Paz em Haia, mas fora rejeitado e cometera harakiri. Soube que o primeiro­-ministro, Yi Wanyong, agindo em favor do Japão, obrigara Gojong a abdicar do trono, e que sua gente ateou fogo na casa de Yi Wanyong. Descobriu que o exército do império coreano teve sua última cerimônia de dissolução no centro de treinamento marcial. Soube que Gojong cedeu o trono para o filho. Diante de todas essas notícias, Yi Jongdo vestiu­-se com roupas limpas, fez uma reverência na direção oeste e chorou de tristeza. Culpou­-se por ter se ressentido de modo tão irrefletido do imperador impotente. A filha, que engravidara fora do casamento e agora era concubina de um intérprete, jamais lhe passou pela cabeça. Lamentou a situação da terra natal que ele deixara do outro lado do mundo e se confinou em casa, sofrendo pelo desejo de encontrar um modo de expulsar o Japão e construir uma nação forte e próspera. Então começou a escrever os resultados dessa agonia no papel. Claro que não passavam de argumentos idealistas que tinham pouca relação com a realidade. Não havia ninguém que não o ridicularizasse quando ele fazia reverência para o oeste pela manhã e se trancava à noite a fim de estabelecer uma estrutura para a nova nação. Os imigrantes que haviam guardado uma réstia de esperança na carta que ele escrevera a Gojong, e que agora se lamentavam por terem sido tão estúpidos, contavam os dias e só pensavam em viver uma semana após a outra.

Sem dizer mais nada para sua família, Yeonsu voltou para a casa de Gwon Yongjun. Anunciou:

— Vou com você.

Gwon Yongjun assentiu, como se já soubesse que ela cederia.

— Você tomou a decisão certa. Não há outra opção. — Ele já estava arrumando as malas.

— Mas vou deixar a criança aqui — acrescentou ela.

Gwon Yongjun estava enfiando algo em um fardo e arregalou os olhos.

— Quê? Deixar a criança? Por quê?

Ela falou com ousadia:

— Quero um recomeço. Quando voltarmos para a Coreia, mande­-me para a escola. Temos dinheiro para isso, não temos? Esse menino é um incômodo.

Gwon Yongjun não pareceu fazer objeções à ideia.

— Então o que faremos com ele?

Ela respondeu, como se estivesse esperando pela pergunta:

— Vamos deixá­-lo com Maria. Ela gosta de Seobi.

Gwon Yongjun sorriu.

— Bem, podemos fazer isso, se você quiser.

Ele chamou Maria, que estava pendurando a roupa lá fora. Disse que estavam deixando a criança com ela e lhe deu dinheiro. Maria olhou sem expressão para Yeonsu e simplesmente assentiu. Não pareceu triste, mas também não pareceu particularmente feliz. Yeonsu segurou a mão grande de Maria e expressou sua gratidão, depois acariciou a testa de seu filho Seobi, que estava começando a andar, e chorou.

— Então agora só preciso pagar pelo seu contrato. — Como se para estabelecer mais uma vez a posse dela, Gwon Yongjun segurou a cintura de Yeonsu enquanto ela chorava. Ela deu as costas para ele e ele pressionou a parte inferior do corpo contra o dela. Maria se levantou e levou Seobi para fora. Yeonsu segurou a mesa de carvalho com as duas mãos e o recebeu enquanto ele entrava devagar na carne dela. Embora fosse a primeira cópula dos dois em muito tempo, o corpo dela se abriu com facilidade surpreendente. Ele olhou distraído para sua própria genitália entrando e saindo por entre as dobras da saia dela, e continuou seu movimento mecânico e repetitivo. Pouco depois, Seobi entrou na sala e olhou sem entender para o rosto do padrasto. Maria entrou atrás dele, abraçou o menino e olhou para o homem e a mulher inclinados sobre a mesa. Yeonsu sorriu para Maria; Maria sorriu de volta, depois saiu de novo. Gwon Yongjun fez uma expressão serena e ejaculou. No momento em que seu pênis deslizou para fora, enquanto o sêmen escorria de dentro do seu corpo, Yeonsu teve a sensação de que tudo o que acontecera nos últimos anos estava saindo dela. Tal devaneio fez com que ela relaxasse e, sem perceber, Yeonsu soltou um peido bem alto. Os dois ficaram assustados com aquele barulho inesperado. Gwon Yongjun deu risada e caiu na cama, e Yeonsu caiu em cima dele e cobriu o rosto. Gwon Yongjun deu um tapa nas nádegas dela; com isso, ela peidou de novo. Aquilo a deixou estranhamente à vontade. Seu relacionamento tedioso e cansativo com ele mais parecia uma farsa. Algo que antes estivera tão retesado, que parecia prestes a estourar agora relaxou. Pela primeira vez ela riu e realmente desfrutou da comédia da sua própria carne. Gwon Yongjun chamou Maria, que se deitou entre os dois e acariciou o pênis flácido de Gwon Yongjun. Os três pareciam uma família afetuosa.