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Quem nasceu cego da vista...

Uma linda quadrinha recolhida no Ceará por Leonardo Mota:

Quem nasceu cego da vista

E dela não se lucrou,

Não sente tanto ser cego

Como quem viu e cegou!

E logo a variante portuguesa, na coleção de Agostinho de Campos e Alberto d’Oliveira:

O cego que nasceu cego

Não perdeu o que logrou;

Não pode ter tanta pena

Como quem viu e cegou.

Uma espanhola, das pesquisas de Rodrigues Marín, anteriores a 1883:

Er que bino siego ar mundo

Sin la esperansa de ber

No tiene tanta peniya

Como er qu’ha bisto y no be.

São versos galegos. Há uma variante da mesma região:

El hombre que nunca ha bisto

Y no sabe lo que es ber,

No tiene tanta peniya

Como er qu’ha bisto y no be.

Rodrigues Marín, indagador maravilhoso, divulga uma nota de D. Fernando Colón, anterior a 1534, com estes versos, possivelmente a mais antiga fixação do motivo poético que vive no sertão nordestino do Brasil:

El ciego que nunca vió,

Como no sabe qué es ver,

No vive tan sin placer

Como el que después cegó.