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CHEGADA A PRINCETON

Senhor Einstein, todas as pessoas o admiram porque não percebem nada do que diz.

CHARLES CHAPLIN

Lutava contra o sono no comboio para New Jersey enquanto a carta dirigida a Roosevelt ainda ecoava na minha cabeça. A carta, lida pela mulher da voz calma, tinha sido a segunda parte do espetáculo do Monkey Town; a primeira era a bomba lançada pelo Enola Gay em Hiroshima.

O documentário mostrava o resultado da proposta do prémio Nobel. A pergunta era quem montara aquela performance para a qual «o pai de Lieserl» nos tinha convidado, quer dizer, supostamente o próprio Einstein «enlatado».

Seria a mesma pessoa que nos tinha avisado para sairmos do local? Já sobre a pessoa que «não devia entrar», fazia uma ideia bastante aproximada de quem se tratava.

Teria lido a mensagem no Lost & Found? Ou simplesmente estava atenta a qualquer acontecimento na cidade que tivesse a ver com Einstein?

Antes de sairmos da discoteca, perguntáramos a um solitário empregado quem organizara aquele evento, mas só tínhamos conseguido obter respostas vagas:

– A programação é decidida pelos sócios do Monkey Town.

– E quem são? – perguntámos.

– Não faço ideia. São muitos. Pelo menos uma centena.

Ou seja, continuávamos sem a menor pista a respeito da mulher misteriosa. Era sem dúvida a mesma que me tinha ligado e dado voz à carta de Einstein. Fora isso, podia apenas supor que se tratava da sua neta, a filha de Lieserl.

O resto era apenas uma enorme nuvem de confusão.

Talvez «o espetáculo da bomba», como o tinha batizado Sarah, contivesse alguma pista para continuarmos a nossa demanda. O problema era identificá-la para poder segui-la. De momento, a única coisa que tinha conseguido era uma reunião em Princeton que talvez trouxesse alguma luz àquela confusão.

Deixara Sarah a dormir profundamente enquanto saía carregado com as páginas do manuscrito sobre a chegada do génio a Princeton. Pus-me a lê-las no metro apinhado de gente e depois no comboio igualmente cheio com destino ao Garden State.

Pelos vistos, Albert Einstein desembarcara discretamente em Nova Iorque em 1933, quando já contava cinquenta e quatro anos. As crónicas da época diziam que tinha conseguido enganar uma enorme comitiva de boas vindas. Fiel à sua fama de excêntrico, a primeira coisa que fez naquela terceira – e definitiva – viagem à América foi comprar um gelado de baunilha e chocolate. A empregada, que o tinha reconhecido, exclamou: «Vou escrever isto no meu diário!»

Quando, à sua chegada a Princeton, lhe perguntaram de que material precisava para trabalhar comodamente, a sua resposta foi: «Lápis, papel, borracha e um enorme cesto do lixo para deitar fora os meus erros.»

Fiz uma pausa na leitura quando as primeiras urbanizações de New Jersey já se viam da janela do comboio, ao mesmo tempo que me perguntava como se sentira Einstein naquela civilização depois de dar tantos tombos numa Europa em convulsão.

De tudo o que lera, deduzi que aquele retiro dourado – tinha pedido um salário anual de 3000 dólares, mas à sua chegada percebeu que lhe tinham atribuído 15 000 – tivera um sabor agridoce. Alguns vizinhos recordavam como o sábio tinha acompanhado com o seu violino um grupo de crianças que na véspera de Natal cantavam às portas das casas, recolhendo dinheiro para comprar prendas. Contudo, outras pessoas que o visitaram não tinham ficado com uma impressão tão idílica. Um amigo seu explicava, por exemplo, que «Alguma coisa tinha morrido nele. Sentava-se na sua cadeira, alisava os seus cabelos brancos entre os dedos e falava ensonado sobre qualquer coisa. Nunca mais voltou a sorrir.»

O campus de Princeton acabou por ser mais bucólico e plácido do que imaginara. Àquela hora da manhã, a relva estava cheia de grupos de estudantes, todos eles bem vestidos, que partilhavam o pequeno-almoço como se estivessem numa antiga universidade inglesa.

Num segundo e-mail tinha-me sido especificado que seria recebido no Instituto de Estudos Avançados, um encantador edifício de tijolos afastado da universidade.

Vi no campanário com uma cúpula verde que tinha chegado uns minutos antes das 10h15, mas uma cinquentona de uniforme já me esperava à porta. Apertou-me a mão com uma força inesperada e apresentou-se:

– Meret Wolkenweg, ao seu dispor. O diretor do centro não pôde vir pessoalmente, mas tenho instruções precisas para tornar a sua visita proveitosa. Parece-lhe bem que comecemos pelo auditório?

«Isto não começa bem», pensei. Se me tinham confundido com um simples turista do mundo académico, sairia dali com as mãos a abanar. Decidi agarrar o touro pelos cornos sem mais demoras.

– Vou-lhe ser sincero, para a minha investigação só me interessa o escritório de Einstein. Mais precisamente, procuro uma nova informação que o senhor diretor comunicou na Europa.

Meret abriu uma porta junto à entrada principal antes de dizer:

– Ah, claro. É engraçado como o descobrimos. Há objetos que parecem encontrar o seu próprio esconderijo até que decidem que chegou a hora de se deixarem ver. Ainda deve estar ali…

Ao ver o entusiasmo no meu rosto – eu pensava na possibilidade de «a carta» ter a última resposta –, a mulher franziu o sobrolho e acrescentou:

– Antes de mais, preciso de lhe contar uma coisa sobre este instituto que o vai surpreender.