Questão que tem gerado controvérsias na praxe administrativa e na doutrina refere-se à admissão de cooperativas em licitações.
O texto constitucional menciona as cooperativas em três passagens distintas: a) art. 5.º, XVIII: a criação de cooperativas, na forma da lei, independe de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento; b) art. 146, III, “c”: a lei complementar, responsável pelas normas gerais em matéria tributária, deve dispor sobre o adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas; e c) art. 174, § 2.º: a lei deve apoiar e estimular o cooperativismo e outras formas de associativismo.
A Lei 5.764/1971 define a Política Nacional de Cooperativismo, a qual afirma que no contrato de sociedade cooperativa “as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro” (art. 3.º).
Em relação à participação de cooperativas nas licitações, existem três entendimentos doutrinários sobre a questão:
1.º entendimento: Alguns autores vedam a participação de cooperativas em licitações, pois essas entidades, em razão dos privilégios trabalhistas e tributários, sempre apresentariam melhores preços, sagrando-se vencedoras.
2.º entendimento: Outros autores admitem a participação, mas exigem que as propostas das cooperativas levem em consideração os encargos trabalhistas e tributários para igualar as condições com as demais empresas licitantes. O regime próprio da cooperativa aplica-se exclusivamente no relacionamento entre a cooperativa e seus associados, mas não em relação aos atos de mercado comum. Nesse sentido: Marçal Justen Filho, José dos Santos Carvalho Filho.1
3.º entendimento: Por fim, parte da doutrina admite a participação em licitações, uma vez que o próprio texto constitucional exigiu tratamento diferenciado às cooperativas (art. 5.º, XVIII; art. 146, III, “c”; e art. 174, § 2.º, da CRFB). Nesse sentido: Marcos Juruena Villela Souto e Jessé Torres Pereira Junior.2
A razão, a nosso ver, está com o terceiro entendimento, tendo em vista a previsão constitucional de tratamento diferenciado para cooperativas. Frise-se que o art. 86 da Lei 5.764/1971 admite que as cooperativas forneçam bens e serviços a não associados, desde que tal faculdade atenda aos objetivos sociais e estejam de conformidade com a presente lei. Nesse caso, os resultados positivos obtidos pelas cooperativas nessas operações serão considerados como renda tributável (art. 111 da Lei 5.764/1971).
Em determinados casos, é possível a vedação à participação de cooperativas em licitações para contratações de serviços submetidos à legislação trabalhista. Dessa forma, se a natureza do serviço pressupõe subordinação jurídica entre os empregados e o contratado, bem como pessoalidade e habitualidade, deve ser vedada a participação de sociedades cooperativas nas licitações, uma vez que tais entidades seriam “cooperativas fraudulentas” ou meras intermediadoras de mão de obra. Assim, por exemplo, os serviços de auxiliar administrativo e de secretariado não poderiam ser executados por cooperativas. A vedação, portanto, é justificada pela natureza do serviço que será prestado, incompatível com as características das cooperativas, conforme já decidiu o STJ.3 Essa é a orientação consagrada, inclusive, na Súmula 281 do TCU, que dispõe: “É vedada a participação de cooperativas em licitação quando, pela natureza do serviço ou pelo modo como é usualmente executado no mercado em geral, houver necessidade de subordinação jurídica entre o obreiro e o contratado, bem como de pessoalidade e habitualidade”.
Ressalte-se, ainda, que a sobredita vedação à participação de cooperativas em licitações tem o objetivo de evitar eventual responsabilidade subsidiária do Poder Público pelo inadimplemento dos encargos trabalhistas, na forma do Enunciado 331 do TST.4
É importante ressaltar que as normas diferenciadas de licitação previstas para as microempresas e empresas de pequeno porte (LC 123/2006) são aplicáveis às cooperativas que tenham receita bruta anual equivalente às da empresa de pequeno porte, conforme dispõe o art. 34 da Lei 11.488/2007. O tratamento diferenciado aplicável às microempresas e empresas de pequeno porte será objeto do próximo tópico.
O texto constitucional estabelece a necessidade de tratamento diferenciado às microempresas e às empresas de pequeno porte (arts. 146, III, “d”, 170, IX, e 179 da CRFB).
Em consequência, a LC 123/2006 instituiu normas gerais relativas ao tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte, sendo, posteriormente, regulamentada pelo Decreto 6.204/2007.5
De acordo com a legislação, consideram-se microempresas as sociedades empresárias, as sociedades simples, a empresa individual de responsabilidade limitada e os empresários, devidamente registrados, que aufiram, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$ 360.000,00. Ao revés, essas entidades serão consideradas empresas de pequeno porte se auferirem, em cada ano-calendário, receita bruta superior a R$ 360.000,00 e igual ou inferior a R$ 3.600.000,00 (art. 3º, I e II, da LC 123/2006, com redação dada pela LC 139/2011).6
O Estatuto das microempresas e das empresas de pequeno porte consagrou algumas novidades em relação às licitações e contratos administrativos.
A LC 123/2006 prevê a possibilidade de saneamento de falhas nos documentos de regularidade fiscal na fase de habilitação.
A regularidade fiscal é exigida apenas para efeitos de assinatura do contrato, e não para participação dessas entidades na licitação (art. 42).7
As microempresas e empresas de pequeno porte devem apresentar os documentos relacionados à regularidade fiscal na fase de habilitação, mesmo que esses documentos contenham vícios ou restrições (art. 43).
Em caso de restrições, o licitante tem o prazo de cinco dias úteis, contados da declaração do vencedor do certame, prorrogável por igual período, a critério da Administração Pública, para a regularização da documentação, pagamento ou parcelamento do débito e emissão de eventuais certidões negativas ou positivas com efeito de certidão negativa (art. 43, § 1.º, da LC 123/2006, alterado pela LC 147/2014).8
Na hipótese de ausência de regularização da documentação fiscal no prazo assinalado, ocorrerá a decadência do direito à contratação, sem prejuízo das sanções previstas no art. 81 da Lei 8.666/1993, abrindo-se a possibilidade de convocação dos licitantes remanescentes, na ordem de classificação, para a assinatura do contrato, ou a revogação da licitação (art. 43, § 2.º).
O art. 44 da LC 123/2006 presume o empate nas hipóteses em que as propostas apresentadas pelas microempresas e empresas de pequeno porte forem iguais ou até 10% superiores à melhor proposta (a diferença percentual será de 5% em caso de pregão).
O empate ficto pressupõe que a melhor proposta tenha sido apresentada por empresa de grande porte, dado que o objetivo é fomentar a contratação de empresas de microempresas e empresas de pequeno porte (art. 45, § 2.º).
Apesar do silêncio da Lei, entendemos que o empate ficto somente será possível se a licitação for pautada pelo critério “menor preço”, não sendo viável a presunção do empate nos tipos de licitação fundados na técnica (“melhor técnica” ou “técnica e preço)”, tendo em vista dois argumentos principais: a) ao tratar do empate ficto e do desempate, utilizou constantemente a expressão “preço” (art. 44, § 2.º; art. 45, I e III, da LC 123/2006); e b) o art. 5.º do Decreto 6.204/2007 foi categórico ao determinar a incidência da regra apenas nas licitações do tipo menor preço.9
Em caso de empate ficto, a microempresa ou empresa de pequeno porte com melhor classificação poderá apresentar proposta de preço inferior àquela considerada vencedora do certame, situação em que será adjudicado em seu favor o objeto licitado (art. 45, I). Caso não seja apresentada proposta mais vantajosa, a Administração convocará as microempresas ou empresas de pequeno porte remanescentes, que estiverem dentro dos limites percentuais do empate ficto, na ordem classificatória, para o exercício do mesmo direito (art. 45, II). Se houver duas ou mais entidades empatadas com valores iguais (empate real), a escolha da licitante que poderá oferecer, em primeiro lugar, nova proposta será definida mediante sorteio (art. 45, III).
No caso de pregão, a microempresa ou empresa de pequeno porte melhor classificada será convocada para apresentar nova proposta no prazo máximo de cinco minutos após o encerramento dos lances, sob pena de preclusão (art. 45, § 3.º).
Na hipótese em que as microempresas ou empresas de pequeno porte, devidamente convocadas para desempatarem a licitação, não apresentarem propostas mais vantajosas, o objeto licitado será adjudicado em favor da proposta originalmente vencedora do certame (art. 45, § 1.º).
Os arts. 47 a 49 da LC 123/2006 estabelecem, por fim, hipóteses especiais de licitações direcionadas, direta ou indiretamente, às microempresas e empresas de pequeno porte, a saber:
a) deverá realizar processo licitatório destinado exclusivamente à participação de microempresas e empresas de pequeno porte nos itens de contratação cujo valor seja de até R$ 80.000,00 (oitenta mil reais);10
b) poderá, em relação aos processos licitatórios destinados à aquisição de obras e serviços, exigir dos licitantes a subcontratação de microempresa ou empresa de pequeno porte (nesse caso, o art. 48, § 2.º, inova ao admitir que os empenhos e pagamentos sejam destinados diretamente às microempresas e empresas de pequeno porte subcontratadas);
c) deverá estabelecer, em certames para aquisição de bens de natureza divisível, cota de até 25% (vinte e cinco por cento) do objeto para a contratação de microempresas e empresas de pequeno porte.
De acordo com a autorização prevista no art. 48, § 3.º, da LC 123/2006, alterado pela LC 147/2014, a Administração, ao aplicar os benefícios indicados acima, poderá, justificadamente, estabelecer a prioridade de contratação para as microempresas e empresas de pequeno porte sediadas local ou regionalmente, até o limite de 10% (dez por cento) do melhor preço válido. O intuito é garantir a promoção do desenvolvimento econômico e social nos âmbitos municipal e regional, a ampliação da eficiência das políticas públicas e o incentivo à inovação tecnológica, diretrizes elencadas no art. 47 da LC 123/2006, com redação dada pela LC 147/2014.
Não obstante a aparente faculdade, prevista na redação originária dos arts. 47 e 48 da LC 123/2006, na instituição do tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte (o art. 47 da LC 123/2006 utilizava a expressão “poderá”), sempre sustentamos que a hipótese seria de obrigatoriedade/vinculação por parte da Administração, tendo em vista a necessidade de efetivação das normas constitucionais que impõem o referido tratamento diferenciado em favor daquelas entidades (arts. 146, III, “d”, 170, IX, e 179 da CRFB).11 A obrigatoriedade do tratamento diferenciado, defendida nas edições anteriores desta obra, foi prestigiada na alteração promovida pela LC 147/2014, que utilizou a expressão “deverá” nos arts. 47, caput, e 48, I e III, da LC 123/2006.
Cabe destacar, contudo, que, na forma do art. 49 da LC 123/2006, alterado pela LC 147/2014, as sobreditas licitações diferenciadas não se aplicam quando: a) não houver, no mínimo, três fornecedores competitivos enquadrados como microempresas ou empresas de pequeno porte sediados local ou regionalmente e capazes de cumprir as exigências estabelecidas no instrumento convocatório; b) o tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte não for vantajoso para a administração pública ou representar prejuízo ao conjunto ou complexo do objeto a ser contratado; c) a licitação for dispensável ou inexigível, nos termos dos arts. 24 e 25 da Lei 8.666/1993, excetuando-se as dispensas tratadas pelos incisos I e II do art. 24 da mesma Lei, nas quais a compra deverá ser feita preferencialmente de microempresas e empresas de pequeno porte, aplicando-se a exclusividade prevista para contratações de até R$ 80.000,00.
O tratamento diferenciado dispensado às microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP) não está vinculado ao tratamento tributário diferenciado. A LC 123/2006 não impõe a utilização do Simples Nacional por ME e EPP, nem condiciona o recebimento de benefícios nas licitações à questão tributária.12
Por outro lado, a ME e a EPP, que pretenderem usufruir do tratamento favorecido nas licitações, deverão apresentar declaração afirmando que cumprem os requisitos legais para a qualificação como ME ou EPP, na forma do art. 11 do Decreto 6.204/2007.13 A ausência da referida declaração não impede a participação na licitação, mas afasta o tratamento favorável.
É oportuno destacar, ainda, que o tratamento diferenciado deverá ser aplicado à ME e à EPP, inclusive, nas hipóteses em que a própria contratação pública acarretar a desqualificação da entidade como ME e EPP, em razão da majoração da receita bruta anual e descumprimento dos limites fixados no art. 3.º, I e II, da LC 123/2006. Vale dizer: a perda da qualificação de ME ou EPP no curso da execução do contrato não acarreta a rescisão do pacto, pois o ordenamento jurídico, ao estabelecer o regime diferenciado, teve por objetivo fomentar a contratação de ME e de EPP pelo Estado, abrindo caminho para sua consolidação e crescimento, inexistindo previsão legal e razoabilidade na “punição” (rescisão contratual) da entidade que aumenta a sua receita bruta após celebrar contrato com o Poder Público.14
Quanto à efetividade do tratamento diferenciado, a aplicação das duas primeiras novidades (saneamento de falhas e empate ficto) decorre diretamente da Lei, independentemente de regulamentação específica ou de previsão no edital de licitação.15
Em relação à terceira novidade (possibilidade de licitações diferenciadas), a sua efetivação dependia de regulamentação específica no âmbito de cada Ente federado, conforme exigência contida na redação originária do art. 47 da LC 123/2006 (“desde que previsto e regulamentado na legislação do respectivo ente”), bem como a previsão do tratamento diferenciado no edital de licitação (art. 49, I, da LC 123/2006).
Atualmente, as licitações diferenciadas decorrem diretamente da Lei e a sua implementação não está condicionada à regulamentação ou à previsão editalícia, na forma do art. 47, caput e parágrafo único, da LC 123/2006, com a alteração promovida pela LC 147/2014.16
Tem prevalecido o entendimento de que a regulamentação dos arts. 47 a 49 da LC 123/2006 deve ser feita por meio de lei ordinária, não sendo suficiente a simples edição de decreto regulamentar.17 Todavia, na esfera federal, as licitações diferenciadas foram regulamentadas pelo Decreto 6.204/2007.
Outra novidade no Estatuto das microempresas e empresas de pequeno porte é a denominada “cédula de crédito microempresarial” (art. 46 da LC 123/2006).
A microempresa e a empresa de pequeno porte titular de direitos creditórios decorrentes de empenhos liquidados por órgãos e entidades estatais não pagos em até trinta dias, contados da data de liquidação, poderão emitir a mencionada cédula.
Por fim, as normas diferenciadas de licitação previstas na LC 123/2006 para as microempresas e empresas de pequeno porte também serão aplicadas às cooperativas, que tenham receita bruta anual equivalente às da empresa de pequeno porte, na forma do art. 34 da Lei 11.488/2007.18
Os consórcios empresariais encontram-se regulados pelos arts. 278 e 279 da Lei 6.404/1976. As características básicas dos consórcios podem ser assim resumidas: a) trata-se de reunião de sociedades, por meio de contrato, para execução de determinado empreendimento; b) o consórcio não possui personalidade jurídica e as sociedades consorciadas preservam a sua autonomia; c) as empresas consorciadas assumem as obrigações previstas no contrato de consórcio, não havendo presunção de solidariedade; e d) o consórcio é transitório, com prazo de duração previsto no ajuste.
A participação de consórcios nas licitações é uma opção discricionária da Administração Pública, na forma do art. 33 da Lei 8.666/1993.
Em consequência, a viabilidade de consórcios em determinadas licitações dependerá de previsão expressa no instrumento convocatório, especialmente pelo risco de união entre empresas com o intuito de criação de cartel, inviabilizando a ampla competitividade que deve pautar os certames. Vale dizer: na hipótese de omissão do edital, a participação de consórcios empresariais na respectiva licitação deve ser considerada vedada.19
Ressalte-se, no entanto, que o consórcio de empresas não acarreta, necessariamente, prejuízo à competitividade nas licitações. Ao contrário, a formação de consórcios, em determinados casos, permite a participação de empresas menores que não teriam condições técnicas e/ou financeiras de concorrer isoladamente de licitações.20
Nesse sentido, o art. 90, parágrafo único, da Lei 12.529/2011 dispõe que a celebração de consórcio entre duas ou mais empresas com o objetivo de participação em licitações públicas não configura, em princípio, ato de concentração.
Por isso, a Administração, promotora da licitação, deve motivar a decisão sobre a participação ou a vedação de consórcios nas licitações.21
Da mesma forma, quando permitida a participação de consórcios, a Administração deve justificar a limitação excepcional do número de empresas a integrarem os respectivos consórcios.22
Ademais, caso admitida a sua participação no edital, a empresa integrante do consórcio não poderá concorrer isoladamente ou como parte integrante de outro consórcio na mesma licitação (art. 33, IV, da Lei 8.666/1993). Como condição de participação nas licitações, as empresas em consórcio deverão observar, ainda, as seguintes normas, na forma do art. 33 da Lei 8.666/1993: a) apresentação do compromisso público ou particular de constituição de consórcio, subscrito pelos consorciados, sendo certo que o licitante vencedor fica obrigado a promover, antes da celebração do contrato, a constituição e o registro do consórcio;23 b) indicação da empresa responsável pelo consórcio (empresa líder), de acordo com as condições fixadas no edital; c) comprovação dos requisitos de habilitação por cada consorciado, “admitindo-se, para efeito de qualificação técnica, o somatório dos quantitativos de cada consorciado, e, para efeito de qualificação econômico-financeira, o somatório dos valores de cada consorciado, na proporção de sua respectiva participação, podendo a Administração estabelecer, para o consórcio, um acréscimo de até 30% (trinta por cento) dos valores exigidos para licitante individual, inexigível este acréscimo para os consórcios compostos, em sua totalidade, por micro e pequenas empresas assim definidas em lei”;24 d) responsabilidade solidária dos integrantes pelos atos praticados em consórcio, tanto na fase de licitação quanto na de execução do contrato.
Por fim, no consórcio de empresas brasileiras e estrangeiras a liderança caberá, obrigatoriamente, à empresa brasileira (art. 33, § 1.º, da Lei 8.666/1993).
A regra constitucional da licitação é aplicável aos contratos celebrados pela Administração Pública, na forma do art. 37, XXI, da CRFB e do art. 2.º da Lei 8.666/1993.
Em consequência, a legislação não impõe, em princípio, a obrigatoriedade de realização de licitação para celebração de convênios administrativos.
Ao contrário, o art. 116 da Lei 8.666/1993 determina que as normas de licitações e de contratos administrativos aplicam-se aos convênios apenas “no que couber”. Ora, se a licitação fosse naturalmente imposta aos convênios, a ressalva em comento não faria qualquer sentido.
De acordo com a doutrina tradicional, os contratos administrativos e os convênios não se confundem, especialmente em razão dos interesses envolvidos nos dois tipos de ajustes.
De um lado, os contratos administrativos são caracterizados pela existência de interesses contrapostos das partes: o Poder Público pretende satisfazer o interesse público e o particular persegue o lucro. Por outro lado, os convênios administrativos são caracterizados pela comunhão de interesses dos conveniados: os partícipes possuem interesses comuns.25
A desnecessidade de realização de licitação para celebração de convênios tem sido afirmada na doutrina majoritária.
Nesse sentido, Maria Sylvia Zanella Di Pietro sustenta que a exigência de licitação não se aplica aos convênios,
[...] pois neles não há viabilidade de competição; esta não pode existir quando se trata de mútua colaboração, sob várias formas, como repasse de verbas, uso de equipamentos, recursos humanos, imóveis. Não se cogita de preço ou de remuneração que admita competição.26
Da mesma forma, Jessé Torres Pereira Junior sustenta que “a Lei 8.666/1993 não rege convênios e consórcios administrativos, que contratos não são. Tanto que, no art. 116, traça regime especial para celebração de convênios, excluída qualquer menção a procedimento licitatório”.27
Não obstante a desnecessidade de licitação para formalização de convênios, o interessado deve comprovar a regularidade em relação à seguridade social, na forma do art. 195, § 3.º, da CRFB e do art. 56 da Lei 8.212/1991.28
Verifica-se, portanto, que a licitação não é exigível, como regra geral, para os convênios. Essa conclusão, no entanto, merece duas reflexões importantes.
Em primeiro lugar, é preciso ter em mente que a nomenclatura conferida ao instrumento jurídico celebrado pelo Poder Público (“convênio”, “termo de parceria”, “termo de cooperação” etc.) não é suficiente para afastar a exigência de prévia licitação. É fundamental a análise do conteúdo do ajuste para se constatar se, realmente, existe mútua cooperação (interesses comuns) e, portanto, afastar a licitação.
Essa é a ressalva contida no art. 2.º, parágrafo único, da Lei 8.666/1993 que estabelece: “Para os fins desta Lei, considera-se contrato todo e qualquer ajuste entre órgãos ou entidades da Administração Pública e particulares, em que haja um acordo de vontades para a formação de vínculo e a estipulação de obrigações recíprocas, seja qual for a denominação utilizada”.
A segunda ressalva envolve a necessidade de respeito aos princípios constitucionais em toda e qualquer atuação administrativa.
O fato de não ser aplicável a regra da licitação aos convênios não significa dizer que a sua celebração não precise observar o princípio da impessoalidade.
Nas hipóteses em que houver dois ou mais possíveis interessados na celebração do convênio, a Administração Pública deverá instaurar procedimento administrativo, com critérios objetivos para seleção da entidade privada, sem fins lucrativos, que será signatária do ajuste, salvo situações excepcionais devidamente justificadas. Com isso, evita-se a escolha arbitrária, motivada por situações subjetivas, que favoreça determinada entidade em detrimento de outras possíveis interessadas.
Nesse sentido, posiciona-se Lucas Rocha Furtado:
Urge a criação em nosso sistema legislativo de mecanismos objetivos e impessoais que permitam ao poder público escolher a entidade privada com a qual são firmados convênios, termos de parceria ou outros acordos congêneres. A inexistência desses mecanismos legais constitui um dos maiores ralos de dinheiro público e constante de fonte de corrupção, fraudes, desvios etc.29
Da mesma forma, Flávio Amaral Garcia leciona:
Diz-se que não cabe licitação em regra para os convênios, mas nada obsta que em determinada hipótese concreta, por força do princípio da isonomia, seja necessária a realização de processo seletivo, a fim de evitar privilégios e favoritismos.30
Mencione-se, por oportuno, que a legislação tem estabelecido, de forma crescente, exigências de procedimento seletivo para escolha impessoal de conveniados, como ocorre, por exemplo, nas seguintes hipóteses: a) chamamento público para seleção de projetos ou entidades que tornem mais eficaz o objeto do convênio (arts. 4.º e 5.º do Decreto 6.170/2007, com redação dada pelo Decreto 7.568/2011, e arts. 7.º a 9.º da Portaria Interministerial MP/MF/CGU 507/2011); b) concurso de projetos para escolha da Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) que celebrará o termo de parceria com o Poder Público (arts. 23 a 31 do Decreto 3.100/1999, com redação dada pelo Decreto 7.568/2011, que regulamenta a Lei 9.790/1999) etc.
Por fim, o TCU, na linha aqui defendida, recomendou a edição de normas administrativas que exijam, como regra, a realização de processo de chamamento como condição pra celebração de convênios. Transcreva-se o trecho do acórdão:
[...] 9.2.2. orientar os órgãos e entidades da Administração Pública para que editem normativos próprios visando estabelecer a obrigatoriedade de instituir processo de chamamento e seleção públicos previamente à celebração de convênios com entidades privadas sem fins lucrativos, em todas as situações em que se apresentar viável e adequado à natureza dos programas a serem descentralizados.31
Destarte, a realização de processo seletivo objetivo para escolha de projetos e entidades que formalizarão convênios com o Poder Público está em consonância com os princípios que regem a Administração. Apenas em hipóteses excepcionais e justificadas, o Poder Público poderá celebrar convênios diretamente com terceiros, sendo recomendável a edição de norma jurídica que consagre a exigência do processo seletivo e as respectivas exceções, com o intuito de assegurar maior segurança jurídica aos agentes públicos e aos beneficiários destes ajustes.
As licitações para celebração dos contratos de concessão de serviços públicos, comuns (Lei 8.987/1995) e especiais (Lei 11.079/2004) possuem peculiaridades que serão destacadas neste momento.
A exigência de licitação para formalização da delegação de concessão de serviço público decorre da própria natureza contratual do ajuste (art. 37, XXI, da CRFB), mas, também, por conta da exigência específica contida no art. 175 da CRFB que exige “sempre” licitação para as concessões e permissões de serviços públicos.
No âmbito infraconstitucional, as licitações relativas às concessões e permissões de serviços públicos serão regidas, basicamente, pelos arts. 14 a 22 da Lei 8.987/1995 e legislação correlata, além da aplicação subsidiária da Lei 8.666/1993.
A modalidade de licitação adequada para as concessões e permissões de serviços públicos será, em regra, a concorrência, conforme dispõe o art. 2.º, II, III e IV, c/c o art. 40, parágrafo único, da Lei 8.987/1995.
Ressalte-se, contudo, a possibilidade de utilização de outras modalidades de licitação, quando autorizadas por legislações específicas, como ocorre nos seguintes casos: a) o art. 27, I, da Lei 9.074/1995, na hipótese de serviço público inicialmente prestado por pessoas controladas, direta ou indiretamente, pelo Poder Público, admite o leilão “para promover a privatização simultaneamente com a outorga de nova concessão ou com a prorrogação das concessões existentes”, exceto quanto aos serviços públicos de telecomunicações; b) o art. 24 da Lei 9.427/1996 estabelece que as licitações para exploração de potenciais hidráulicos serão processadas nas modalidades de concorrência ou de leilão; c) o art. 4.º, § 3.º, da Lei 9.491/1997, que trata do Programa Nacional de Desestatização (PND), admite a utilização do leilão para delegações de serviços públicos32 etc.
Em relação ao procedimento, o art. 18-A da Lei 8.987/1995 consagra a possibilidade de inversão da ordem das fases de habilitação e julgamento nas licitações. Com a inversão, após o julgamento das propostas, o Poder Público verificará os documentos de habilitação apenas do licitante vencedor, o que, por certo, afigura-se medida salutar e de acordo com a eficiência administrativa.
Em relação aos critérios objetivos que poderão ser utilizados para escolha da proposta mais vantajosa para o Poder Público, a legislação também consagra novidades em relação à legislação tradicional de licitações e contratos.
Consoante dispõe o art. 15 da Lei 8.987/1995, os tipos de licitação para concessão de serviços públicos são: a) o menor valor da tarifa do serviço público a ser prestado (inciso I); b) a maior oferta, nos casos de pagamento ao poder concedente pela outorga da concessão (inciso II); c) a combinação, dois a dois, dos critérios referidos nos incisos I, II e VII (inciso III); d) melhor proposta técnica, com preço fixado no edital (inciso IV); e) melhor proposta em razão da combinação dos critérios de menor valor da tarifa do serviço público a ser prestado com o de melhor técnica (inciso V); f) melhor proposta em razão da combinação dos critérios de maior oferta pela outorga da concessão com o de melhor técnica (inciso VI); ou g) melhor oferta de pagamento pela outorga após qualificação de propostas técnicas (inciso VII).
Os critérios técnicos, quando o tipo de licitação assim exigir (art. 15, IV, V, VI e VII), deverão ser definidos no edital de licitação, conforme exigência contida no art. 15, § 2.º, da Lei 8.987/1995.
As propostas manifestamente inexequíveis ou financeiramente incompatíveis com os objetivos da licitação serão recusadas pelo poder concedente (art. 15, § 3.º, da Lei 8.987/1995).
Por fim, em igualdade de condições, a legislação reconhece a preferência à proposta apresentada por empresa brasileira (art. 15, § 4.º, da Lei 8.987/1995).
A regra constitucional da licitação é colocada em termos peremptórios para delegação de serviços de serviços públicos. Nesse sentido, o art. 175 da CRFB dispõe que “incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”.
Não obstante a literalidade da norma supracitada, a possibilidade, excepcional, de delegação direta de serviços públicos, sem a realização prévia da licitação tem sido reconhecida pela doutrina.
Em primeiro lugar, a concessão direta será possível nas hipóteses de inviabilidade de competição, quando a licitação será declarada inexigível. Conforme já asseveramos em outro momento desta obra, a inexigibilidade relaciona-se com a impossibilidade de competição prévia e o rol de situações elencadas no art. 25 da Lei 8.666/1993 tem caráter meramente exemplificativo.
Em segundo lugar, é possível vislumbrar casos de concessão direta por meio de dispensa de licitação.
Todavia, não é possível aplicar todas as hipóteses de dispensa, previstas no art. 24 da Lei 8.666/1993, às concessões de serviços públicos. As hipóteses de dispensa, além de taxativas, relacionam-se, normalmente, às contratações de bens e serviços particulares pelo Poder Público, o que não ocorre nas concessões, quando o Poder Público transfere o serviço público de sua titularidade aos particulares para exploração por sua conta e risco.
Por esta razão, Maria Sylvia Zanella Di Pietro não admite a aplicação indiscriminada das hipóteses de dispensa da licitação do art. 24 da Lei 8.666/1993 às concessões, tendo em vista a incompatibilidade daquelas hipóteses com as peculiaridades dos contratos de concessão. No entanto, a autora admite a concessão de serviços públicos, sem licitação, nos casos de inexigibilidade de licitação, mesmo naquelas hipóteses em que tais casos estiverem previstos, de maneira equivocada no rol do art. 24 da Lei 8.666/1993 (casos de guerra, grave perturbação da ordem ou calamidade pública; nos casos de situação de emergência; e nos casos de licitação deserta, em que não acudirem interessados).33
Da mesma forma, Alexandre Santos de Aragão sustenta a viabilidade de concessões diretas, por meio de dispensa de licitação, em dois casos: contratações urgentes e de baixo valor do serviço concedido (art. 24, I e IV, da Lei 8.666/1993).34
Entendemos que a aplicação da dispensa de licitação às concessões de serviços públicos só será possível nas hipóteses de urgência ou necessidade da contratação direta (art. 24, III, IV e IX, da Lei 8.666/1993), quando a licitação seria um obstáculo à promoção célere do interesse público, bem como na hipótese de licitação deserta (art. 24, V, da Lei 8.666/1993), sempre com a devida motivação por parte do Poder Público.35
As Parcerias Público-Privadas (PPPs), modalidades especiais de delegação de serviços públicos reguladas pela Lei 11.079/2004, são divididas em duas espécies: a) PPP patrocinada: “é a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei n.o 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando envolver, adicionalmente à tarifa cobrada dos usuários contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado” (art. 2.º, § 1.º); e b) PPP administrativa: “é o contrato de prestação de serviços de que a Administração Pública seja a usuária direta ou indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens” (art. 2.º, § 2.º).
As licitações para contratação de Parcerias Público-Privadas (PPPs), reguladas pela Lei 11.079/2004, com aplicação subsidiária das Leis 8.987/1995 e 8.666/1993, apresentam peculiaridades em relação às licitações para concessão de serviços públicos comuns.
O primeiro ponto que merece destaque nas licitações para contratação de PPP refere-se à responsabilidade pela elaboração dos projetos básico e executivo.
Tradicionalmente, a realização de obras e a prestação de serviços pressupõem a elaboração do “projeto básico” (art. 6.º, IX, da Lei 8.666/1993) e do “projeto executivo” (art. 6.º, X, da Lei 8.666/1993), que devem estabelecer, de maneira clara e precisa, todos os aspectos técnicos e econômicos do objeto a ser contratado, tendo em vista o dever de planejamento estatal.
As licitações para contratação de obras e serviços dependem, dentre outras exigências, da elaboração do projeto básico que deve ser aprovado pela autoridade competente e disponibilizado para consulta dos interessados em participar do processo licitatório (art. 7.º, § 2.º, I, da Lei 8.666/1993). Ressalte-se, contudo, que a licitação pode ser iniciada sem a elaboração prévia do projeto executivo, desde que haja decisão motivada por parte da autoridade administrativa, hipótese em que o projeto deverá ser desenvolvido concomitantemente com a execução das obras e serviços (arts. 7.º, § 1.º, e 9.º, § 2.º, da Lei 8.666/1993).
Não podem participar da licitação para contratação de obras e serviços (art. 9.º, I e II, da Lei 8.666/1993): a) os autores do projeto básico ou executivo; e b) as empresas responsáveis pela elaboração do projeto básico ou executivo ou da qual o autor do projeto seja dirigente, gerente, acionista ou detentor de mais de 5% (cinco por cento) do capital com direito a voto ou controlador, responsável técnico ou subcontratado.
No tocante às licitações para celebração de PPPs administrativas, o art. 3.º da Lei 11.079/2004 determina a aplicação do art. 31 da Lei 9.074/1995, que admite a participação, direta ou indireta, dos autores ou responsáveis pelos projetos, básico ou executivo, nas licitações e execução das obras ou serviços.36 A norma em comento também é aplicável às PPPs patrocinadas, tendo em vista o disposto no art. 3.º, § 1.º, da Lei 11.079/2004, que prevê a aplicação subsidiária da Lei 8.987/1995 e legislação correlata, incluindo, portanto, a Lei 9.074/95, que dispõe sobre normas para outorga e prorrogações das concessões e permissões de serviços públicos.
É oportuno registrar que o inciso II do art. 11 da Lei 11.079/2004, que permitia atribuir ao contratado a responsabilidade pela elaboração dos projetos executivos das obras, foi vetado pelo Chefe do Executivo sob o argumento de que a referida atribuição deveria englobar também a elaboração dos projetos básicos.37
O intuito é permitir que o particular contribua com a sua expertise para elaboração do caminho que será utilizado para prestação do serviço, garantindo maior eficiência à parceria.
Vale ressaltar que, nas concessões tradicionais de serviços públicos e nas PPPs, quando o projeto envolver a execução de obras, a Administração Pública não está obrigada a elaborar o projeto básico, o que não afasta a obrigatoriedade de definir os “elementos do projeto básico que permitam sua plena caracterização” (art. 18, XV, da Lei 8.987/1995).38
Verifica-se, destarte, que o legislador admitiu que os projetos básico e executivo fossem elaborados pelos concessionários / parceiros privados, devendo ser afastadas das PPPs as vedações constantes do art. 9.º, I e II, da Lei 8.666/1993.39 Aliás, a elaboração dos projetos mencionados pelo particular interessado na contratação também foi admitida pelo denominado “Regime Diferenciado de Contratações Públicas” (RDC).
É possível, inclusive, que, na etapa do planejamento, os estudos preliminares, propostas e levantamentos para formatação de projetos de PPPs sejam apresentados por particulares.
Trata-se do Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI) ou Manifestação de Interesse da Iniciativa Privada (MIP), que tem por objeto a apresentação de propostas, estudos ou levantamentos de Parcerias Público-Privadas, por pessoas físicas ou jurídicas da iniciativa privada.
O PMI encontra fundamento legal no art. 21, da Lei 8.987/1995, aplicável às PPPs, na forma do art. 3.º, caput e § 1.º, da Lei 11.079/2004.40
Em âmbito federal, o PMI foi regulamentado pelo Decreto 5.977/2006, que, em síntese, apresenta as seguintes características:41 a) o PMI tem relação com as modelagens de PPPs já definidas como prioritárias no âmbito da Administração Pública federal (art. 1.º); b) após solicitação do Comitê Gestor de Parceria Público-Privada Federal (CGP), os interessados poderão apresentar projetos e demais estudos preliminares que podem ser aceitos ou não pelo Poder Público; c) a rejeição do projeto não gera qualquer direito ao ressarcimento dos valores desembolsados pelo seu autor (art. 5.º, IV); em caso de seleção e utilização do projeto na efetivação da PPP, o autor será ressarcido pelo vencedor da licitação, e não pelo Poder Público (art. 14); d) os autores ou responsáveis economicamente pelos estudos, projetos, levantamentos e investigações apresentados no PMI poderão participar, direta ou indiretamente, da eventual licitação ou da execução de obras ou serviços (art. 15); e e) a realização do PMI não obriga o Poder Público a realizar a licitação e não acarreta direito de preferência ao autor do projeto na outorga da concessão (art. 5.º, II e III).
O Estado pode realizar obras e prestar serviços públicos diretamente, por meio de seus agentes públicos, ou indiretamente, com a formatação de parcerias (em sentido amplo) com os particulares (ex.: contratos administrativos de obras e serviços – Lei 8.666/1993, concessões comuns de serviços públicos simples ou precedidas de obras públicas – Lei 8.987/1995, PPPs patrocinada ou administrativa – Lei 11.079/2004). A escolha do meio mais adequado para satisfação do interesse público depende da ponderação de uma série de fatores, tais como: risco do negócio, necessidade de financiamento público, capacidade de endividamento público, potencial interesse de investidores privados na execução do projeto etc.
No caso das PPPs, a sua utilização depende da elaboração de estudo técnico que demonstre a conveniência e a oportunidade da contratação, com a identificação das respectivas razões que justifiquem a utilização desse modelo (art. 10, I, “a”, da Lei 11.079/2004).42 A apresentação das razões que justifiquem a utilização da PPP, em detrimento de outras formas de parceria, especialmente a concessão comum, pode ser explicada pelo fato de que a parceria envolve contribuições pecuniárias por parte do Poder Público, o que não ocorre, em regra, no modelo tradicional de concessão.
A responsabilidade fiscal é uma diretriz para celebração e execução das PPPs, na forma do art. 4.º, IV, da Lei 11.079/2004.43 A necessidade de responsabilidade fiscal nas contratações públicas não representa novidade, pois se trata de exigência contida na LC 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF). No caso dos contratos de PPPs, todavia, o legislador consagrou exigências mais intensas no tocante à responsabilidade fiscal, notadamente pelo fato de essas contratações envolverem contraprestações orçamentárias vultosas por grande período de tempo, ultrapassando, inclusive, os limites temporais do Plano Plurianual.
Em síntese, as principais exigências de caráter fiscal que deverão ser adimplidas pelo Poder Público no momento de instaurar o procedimento licitatório para celebração de PPP são:
a) a realização da licitação depende da elaboração de estudo técnico que demonstre: a.1) que as despesas criadas ou aumentadas não afetarão as metas de resultados fiscais previstas no Anexo referido no art. 4.º, § 1.º, da LC 101/00 (LRF), devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa (art. 10, I, “b”, da Lei 11.079/2004); e a.2) quando for o caso, conforme as normas editadas na forma do art. 25 da Lei de PPP, a observância dos limites e condições decorrentes da aplicação dos arts. 29, 30 e 32 da LRF, pelas obrigações contraídas pela Administração Pública relativas ao objeto do contrato (art. 10, I, “c”, da Lei 11.079/2004).44 O estudo técnico deverá apontar as premissas e a metodologia de cálculo utilizadas, observadas as normas gerais para consolidação das contas públicas, sem prejuízo do exame de compatibilidade das despesas com as demais normas do Plano Plurianual e da Lei de Diretrizes Orçamentárias (art. 10, § 1.º, da Lei 11.079/2004);
b) elaboração de estimativa do impacto orçamentário-financeiro nos exercícios em que deva vigorar o contrato de parceria público-privada (art. 10, II, da Lei 11.079/2004);
c) declaração do ordenador da despesa de que as obrigações contraídas pela Administração Pública no decorrer do contrato são compatíveis com a Lei de Diretrizes Orçamentárias e estão previstas na Lei Orçamentária Anual, bem como que seu objeto encontra-se previsto no Plano Plurianual (PPA) em vigor (art. 167, § 1.º, da CRFB e art. 10, III e V, da Lei 11.079/2004); e
d) estimativa do fluxo de recursos públicos suficientes para o cumprimento, durante a vigência do contrato e por exercício financeiro, das obrigações contraídas pela Administração Pública.
A referida exigência é importante para o cumprimento dos limites fixados nos arts. 22 e 28 da Lei 11.079/2004.45 Os limites previstos no caput do art. 28 da Lei das PPPs aplicam-se à Administração Pública Direta (União, Estados, DF e Município) e Indireta (autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações estatais de direito público e de direito privado, bem como entidades controladas, direta ou indiretamente, pelo Poder Público), excluídas as empresas estatais não dependentes (art. 28, § 2.º, da Lei 11.079/2004).46 Ademais, as contraprestações estatais não pecuniárias, previstas no art. 6.º da Lei 11.079/2004 (ex.: outorga de direitos em face da Administração Pública, outorga de direitos sobre bens públicos dominicais), não estão incluídas no limite de 5% da receita corrente líquida previsto no art. 28 da mesma Lei.47
Por fim, quando o contrato de PPP for assinado em exercício diverso daquele em que for publicado o edital, a autoridade administrativa deverá atualizar os estudos e as demonstrações técnicas que comprovem o respeito às exigências fiscais (art. 10, § 2.º, da Lei 11.079/2004).
A primeira novidade nas licitações para contratação de PPPs refere-se à fase interna, uma vez que a legislação impõe a submissão das minutas do edital e do contrato de PPP à consulta pública prévia (art. 10, VI, da Lei 11.079/2004).
É importante destacar que a legislação tradicional já estabelecia a exigência de participação popular, por meio de audiências públicas, para as contratações de grande vulto, conforme previsão contida no art. 39 da Lei 8.666/1993.48
A realização de consultas e audiências públicas representa uma tendência do Direito Administrativo moderno, fortemente marcado pela democratização da administração pública por meio da participação do cidadão na formação da decisão do agente público e o consequente reforço de sua legitimidade.49
Apesar do avanço na previsão da consulta pública das minutas do edital e dos contratos de PPPs, a legislação foi tímida na fixação das regras que deverão ser observadas pelo poder concedente, sendo possível a aplicação subsidiária dos arts. 31 a 35 da Lei 9.784/1999.
Desta forma, a consulta pública na PPP deve observar, ao menos, as seguintes regras: a) ampla divulgação da consulta para possibilitar a participação do maior número de cidadãos, mediante publicação na imprensa oficial, em jornais de grande circulação e por meio eletrônico, que deverá informar a justificativa para a contratação, a identificação do objeto, o prazo de duração do contrato, seu valor estimado; b) fixação de prazo razoável para apresentação das manifestações (prazo mínimo de 30 dias para recebimento de sugestões, cujo termo dar-se-á pelo menos sete dias antes da data prevista para a publicação do edital); c) dever de apresentação, pelo poder concedente, de resposta fundamentada, que poderá ser comum a todas as alegações substancialmente iguais; d) publicação do resultado da consulta.
Em caso de ausência ou deficiência da consulta pública, a licitação será nula e, por consequência, o respectivo contrato de PPP. É possível, em casos extremos, quando o vício é constatado no curso do contrato, que a irregularidade no procedimento não acarrete necessariamente a declaração de nulidade do próprio contrato de PPP, garantindo-se a continuidade da prestação do serviço público, sem olvidar da possibilidade, em qualquer caso, de punição dos agentes públicos responsáveis pelo vício formal.
A preocupação com a sustentabilidade ambiental é uma das principais tendências nas contratações públicas naquilo que se convencionou chamar de “licitações verdes”.50 Nas licitações públicas para contratação de empreendimentos que exigem licenciamento ambiental, o projeto básico deve conter o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA).51
Em relação às licitações para contratação de PPPs, a legislação exige a licença ambiental prévia ou da expedição das diretrizes para o licenciamento ambiental do empreendimento, na forma do regulamento, sempre que o objeto do contrato exigir (art. 10, VII, da Lei 11.079/2004). De acordo com a referida norma, o Poder Público pode dispensar a apresentação inicial do licenciamento ambiental para execução do contrato de PPP, restringindo-se a apresentar diretrizes para o licenciamento ambiental que deverão ser observadas pelo futuro contrato. A hipótese é justificada pela possibilidade, já aventada anteriormente, de licitação para concessão de serviços públicos, sem a elaboração prévia do projeto básico, cuja responsabilidade pode ser transferida ao próprio interessado (art. 3.º, caput e § 1.º, da Lei 11.079/2004 e art. 31 da Lei 9.074/1995), limitando-se o Poder Público a fixar os “elementos do projeto básico”. Nesse caso, o parceiro privado poderia apresentar o licenciamento ambiental no momento da confecção do projeto básico necessário à execução das obras.52
Outra novidade que diz respeito à fase interna relaciona-se com a exigência de autorização legislativa prévia para realização de licitação e celebração de contrato de PPP patrocinada, quando mais de 70% da remuneração do parceiro privado for paga pela Administração Pública (art. 10, § 3.º, da Lei 11.079/2004).
Entendemos que, apesar do silêncio da Lei, a necessidade de autorização legislativa deve ser aplicada também às PPPs administrativas, uma vez que a remuneração, nessas concessões, será realizada integralmente pelo Estado.
A modalidade de licitação exigida para as PPPs é a concorrência, na forma do art. 10 da Lei 11.079/2004. Trata-se, no entanto, de concorrência com algumas peculiaridades em relação àquela versada na Lei 8.666/1993.
Em primeiro lugar, o poder concedente pode inverter as fases de habilitação e julgamento, hipótese em que o julgamento será realizado com a fixação da ordem de classificação e posterior análise dos documentos de habilitação do licitante vencedor (art. 13 da Lei 11.079/2004), prerrogativa também inserida nas concessões comuns (art. 18-A da Lei 8.987/1995, com redação dada pela Lei 11.196/2005).
A realização do julgamento antes da fase de habilitação acarreta maior celeridade ao certame, uma vez que a Administração Pública, após identificar o licitante vencedor, restringe a análise dos documentos relacionados à habilitação apresentados pelo primeiro colocado na ordem de classificação, sem a necessidade de verificação dos documentos dos demais licitantes que não serão contratados. Ademais, como a etapa de habilitação se circunscreve aos documentos do vencedor, não se abre a oportunidade para eventual interposição de recurso administrativo, com efeito suspensivo, contra inabilitação dos demais interessados.53
É recomendável que a Administração estabeleça a inversão de fases no edital de licitação para garantir maior eficiência à licitação, conforme explicado anteriormente.54 Nesse caso, encerrada a fase de classificação das propostas ou o oferecimento de lances, será aberto o envelope com os documentos de habilitação do licitante classificado em primeiro lugar, para verificação do atendimento das condições fixadas no edital e, uma vez habilitado, será declarado vencedor.
Na hipótese de inabilitação do primeiro colocado, a Administração analisará os documentos de habilitação do segundo colocado e assim sucessivamente, até que um licitante classificado atenda às condições fixadas no edital, na forma do art. 13, III, da Lei 11.079/2004. Com a proclamação do resultado final, o objeto será adjudicado ao vencedor nas condições técnicas e econômicas por ele ofertadas (art. 13, IV, da Lei 11.079/2004).
A segunda peculiaridade da concorrência nas PPPs refere-se à possibilidade de lances em viva voz, após a apresentação de propostas escritas (art. 12, III e § 1.º, da Lei 11.079/2004). Existe, aqui, discricionariedade por parte da Administração Pública, que deve definir no edital a melhor forma de apresentação das propostas: a) propostas escritas, apresentadas em envelopes lacrados, ou b) propostas escritas, seguidas de lances em viva voz. Admitida a apresentação de propostas verbais, os lances em viva voz serão sempre oferecidos na ordem inversa da classificação das propostas escritas, sendo vedado ao edital limitar a quantidade de lances. No entanto, o edital pode restringir a apresentação de lances em viva voz aos licitantes cuja proposta escrita for, no máximo, 20% maior que o valor da melhor proposta (art. 12, § 1.º, I e II, da Lei 11.079/2004).
As novidades acima foram inspiradas na legislação do pregão, que também estabelece a possibilidade de apresentação de lances verbais, complementares às propostas escritas, bem como a inversão das fases de habilitação e julgamento. Em razão dessa combinação, alguns autores denominam a concorrência na PPP de “concorrência-pregão”.55
A fase de julgamento, nas licitações para PPPs, poderá ser precedida de etapa de qualificação técnica das propostas, admitindo-se a desclassificação dos licitantes que não alcançarem a pontuação mínima estabelecida no edital (art. 12, I, da Lei 11.079/2004).
Em relação aos tipos de licitação, além dos critérios previstos nos incisos I e V do art. 15 da Lei 8.987/1995 (menor valor da tarifa do serviço público a ser prestado e combinação dos critérios de menor valor da tarifa do serviço público com o de melhor técnica), o art. 12, II, da Lei 11.079/2004 acrescenta duas outras possibilidades: a) menor valor da contraprestação a ser paga pela Administração Pública e b) melhor proposta em razão da combinação do critério da alínea “a” com o de melhor técnica, de acordo com os pesos estabelecidos no edital. Não se admite a utilização do critério da maior outorga (ou maior oferta) paga pelo licitante vencedor e prevista no art. 15, II, da Lei 8.987/1995, pois, além de não mencionado na legislação específica da PPP, tal critério é naturalmente incompatível com o perfil da parceria que pressupõe, ao contrário, contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado (art. 2.º, § 3.º, da Lei 11.079/2004).56
Os dois primeiros critérios de julgamento (menor valor da tarifa do serviço público a ser prestado e combinação dos critérios de menor valor da tarifa e melhor técnica) são utilizados, exclusivamente, nas licitações para celebração de PPPs patrocinadas, que admitem a cobrança de tarifa dos usuários, devendo ser consideradas incompatíveis com as PPPs administrativas que não envolvem o pagamento de tarifa (art. 2.º, §§ 1.º e 2.º, da Lei 11.079/2004).
As propostas manifestamente inexequíveis ou financeiramente incompatíveis com os objetivos da licitação serão recusadas pelo poder concedente (art. 11 da Lei 11.079/2004 e art. 15, § 3.º, da Lei 8.987/1995).
Em caso de empate, será dada preferência à proposta apresentada por empresa brasileira e, se for o caso, sorteio entre os empatados (art. 11 da Lei 11.079/2004, art. 15, § 4.º, da Lei 8.987/1995 e art. 45, § 2.º, da Lei 8.666/1993). O ideal, no entanto, seria a fixação de outro critério para desempate de propostas que levasse em consideração fatores de eficiência econômica, social ou ambiental, por exemplo.57
A licitação nas PPPs possui outra novidade importante. Trata-se da possibilidade ampla de saneamento de falhas de documentação no curso do procedimento nos prazos fixados no edital, na forma do art. 12, IV, da Lei 11.079/2004.
Trata-se de novidade que relativiza a vedação constante no § 3.º do art. 43 da Lei 8.666/1993, norma que permite apenas a apresentação de esclarecimentos sobre documentos constantes do procedimento e veda a inclusão de novos documentos.
O saneamento de falhas nas licitações para contratação de PPPs confirma que o formalismo deve ser moderado, de forma a não prejudicar a contratação de propostas mais vantajosas por equívocos formais que não contaminam substancialmente.
A correção de falhas pode ocorrer em relação a qualquer ato praticado no certame, mas deve ser utilizado com parcimônia, em estrita observância dos princípios da isonomia, da razoabilidade e da boa-fé, entre outros.
Os entes federados podem unir esforços para o atendimento de objetivos comuns por meio da celebração do contrato de consórcio público, na forma da Lei 11.107/2005.
Nesse caso, os entes consorciados deverão instituir pessoa jurídica de direito público (associação pública ou consórcio público de direito público) ou de direito privado (consórcio público de direito privado) para gestão e execução dos objetivos constantes do contrato de consórcios (art. 1.º, § 1.º, e art. 6.º da Lei 11.107/2005).
A pessoa jurídica, nesse caso, integrará a Administração indireta dos entes consorciados: a associação pública, como espécie de autarquia, e a pessoa jurídica de direito privado, como espécie de fundação estatal de direito privado ou como espécie de empresa pública prestadora de serviços públicos.58
Durante a vigência do contrato, a pessoa jurídica mencionada editará atos e celebrará contratos necessários à efetivação do contrato de consórcio. Em relação aos contratos, por óbvio, a regra será a necessidade de realização prévia do procedimento licitatório.
Vale destacar, no entanto, que as licitações promovidas pelos consórcios públicos possuem regras próprias, que serão destacadas a seguir, especialmente em razão das alterações promovidas na Lei 8.666/1993 pelo art. 17 da Lei 11.107/2005.
A primeira novidade que merece destaque é o acréscimo do § 8.º ao art. 23 da Lei 8.666/1993, que aumentou os limites dos valores necessários à escolha de modalidade licitatória (concorrência, tomada de preços e convite). Dispõe a referida norma: “no caso de consórcios públicos, aplicar-se-á o dobro dos valores mencionados no caput deste artigo quando formado por até 3 (três) entes da Federação, e o triplo, quando formado por maior número”.
Assim, por exemplo, se um ente federado, isoladamente, pretender contratar a prestação de serviços, que não sejam de engenharia, no montante de até R$ 80.000,00, poderá utilizar a modalidade convite, na forma do art. 23, II, “a”, da Lei 8.666/1993.59
No caso do consórcio público, formado por até três entes federados, o convite pode ser utilizado nas contratações com valor estimado de até R$ 160.000,00. Se formado por mais de três entes, o valor do convite será de R$ 240.000,00.
A segunda novidade refere-se à instituição de nova modalidade de dispensa de licitação no rol do art. 24 da Lei 8.666/1993 que, no inciso XXVI, prevê agora a possibilidade de celebração direta de contrato de programa entre o consórcio e o ente da Federação ou com entidade da Administração indireta.
O contrato de programa, regulado no art. 13 da Lei 11.107/2005, tem por objeto a definição das
[...] obrigações que um ente da Federação constituir para com outro ente da Federação ou para com consórcio público no âmbito de gestão associada em que haja a prestação de serviços públicos ou a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal ou de bens necessários à continuidade dos serviços transferidos.
É possível concluir, portanto, pela existência de dois contratos de programa: a) contrato celebrado pelo ente federado com o consórcio público (de direito público ou de direito privado); e b) contrato ajustado entre entes federados.
O art. 24, XXVI, da Lei 8.666/1993 parece não mencionar apenas o contrato de programa firmado entre entes federados, independentemente da formalização do contrato consórcio. Entendemos que, mesmo nesse caso, o referido contrato de programa não seria precedido de licitação, pois trata-se de espécie do gênero convênios.
A terceira novidade é a ampliação dos valores para dispensa da licitação nos contratos firmados pelos consórcios públicos. Isto porque o § 1.º do art. 24 da Lei 8.666/1993 determina que os consórcios públicos podem dispensar a licitação para as contratações com valor estimado de até 20% dos limites fixados nos incisos I e II do caput do art. 24 da Lei de Licitações.
Da mesma forma que ocorre com as agências executivas e as empresas estatais, os consórcios públicos podem celebrar, sem licitação, contratos com valores estimados maiores (dobrados) do que aqueles celebrados pela Administração em geral.
Isto não quer dizer, a nosso sentir, que os valores para fins de dispensa sejam exatamente os mesmos para essas entidades, uma vez que, no caso dos consórcios, o art. 24 deve ser interpretado em conjunto com o art. 23, I, “a”, II, “a” e § 8.º, da Lei de Licitações.
Os valores, que devem ser considerados pelas entidades administrativas em geral para definição da modalidade e para eventual dispensa de licitação, são aqueles constantes do art. 23, I e II, da Lei 8.666/1993.
Ocorre que tais valores nunca serão utilizados pelos consórcios, uma vez que o art. 23, § 8.º, da Lei 8.666/1993 impõe a duplicação ou a triplicação dos valores, dependendo do número de entes consorciados.
Os exemplos abaixo servem para facilitar a compreensão da tese aqui defendida:
a) caso 1: consórcio público, formado por até três entes, pretende contratar serviços, que não sejam de engenharia. Nesse caso, o valor para o convite é dobrado, ou seja, R$ 160.000,00 (cento e sessenta mil reais). A dispensa da licitação, nesse caso, é possível para contratações com valor estimado de até 20% sobre esse valor (art. 24, § 1.º, c/c art. 23, II, “a” e § 8.º, da Lei de Licitações), perfazendo o total de R$ 32.000,00 (trinta e dois mil reais);
b) caso 2: consórcio público, formado por mais três entes, instaura procedimento licitatório para contratar os mesmos serviços citados no caso acima. Nessa hipótese, o valor normalmente utilizado para o convite é triplicado, perfazendo o total de R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais). Em consequência, a dispensa da licitação é possível para contratações com valor estimado de até 20% sobre esse valor (art. 24, § 1.º, c/c art. 23, II, “a” e § 8.º, da Lei de Licitações), perfazendo o total de R$ 48.000,00 (quarenta e oito mil reais).
Por fim, vale mencionar que o art. 26 da Lei 8.666/1993 foi modificado tão somente para se amoldar às alterações implementadas por leis específicas a partir de 2004, inclusive a Lei 11.107/2005, já que, na redação anterior, esse artigo fazia menção aos incisos III a XXIV do art. 24, sendo certo que, agora, existem outros incisos que admitem a dispensa de licitação.60
A última novidade importante que merece destaque é a instituição da denominada “licitação compartilhada” no art. 112 da Lei 8.666/1993.
Os consórcios públicos estão autorizados a realizarem licitação da qual, nos termos do edital, decorram contratos administrativos celebrados por órgãos ou entidades dos entes da Federação consorciados, na forma do art. 112, § 1.º, da Lei 8.666/1993.
Em sentido semelhante, o art. 19 do Decreto 6.017/2007, que regulamenta a Lei 11.107/2005, dispõe:
Os consórcios públicos, se constituídos para tal fim, podem realizar licitação cujo edital preveja contratos a serem celebrados pela administração direta ou indireta dos entes da Federação consorciados, nos termos do § 1.º do art. 112 da Lei n.º 8.666, de 21 de junho de 1993.
O objetivo da legislação é permitir a realização de um único certame pelo consórcio do qual decorram contratos celebrados pelos entes consorciados. Ao concentrar em uma única licitação quantitativos maiores que serão contratados, a tendência, com esse ganho de escala, é a redução de preços pelos licitantes interessados, em consonância com o princípio da economicidade.
A expressão “Terceiro Setor” refere-se às entidades da sociedade civil sem fins lucrativos, que desempenham atividades de interesse social mediante vínculo formal de parceria com o Estado.
É possível afirmar que o “Primeiro Setor” é o Estado (Entes federados e entidades da Administração Pública Indireta); o “Segundo Setor” é o mercado (entidades privadas com fins lucrativos, tais como os concessionários e os permissionários de serviços públicos); e o “Terceiro Setor” é a sociedade civil (associações e fundações privadas que formalizam parcerias com o Poder Público).61
Na parceria com o Terceiro Setor, o Estado exerce a sua tradicional atividade de fomento, estabelecendo incentivos (recursos orçamentários, cessão de bens, entre outros previstos em lei) às entidades privadas, sem fins lucrativos, que desempenham atividades relevantes para a coletividade.
É possível mencionar, exemplificativamente, as seguintes entidades integrantes do Terceiro Setor:
a) “Serviços Sociais Autônomos” (Sistema “S”): criados por Confederações privadas (Confederação Nacional do Comércio – CNC – e da Indústria – CNI),62 após autorização legal,63 para exercerem atividade de amparo a determinadas categorias profissionais e destinatários de contribuições sociais, cobradas compulsoriamente da iniciativa privada, na forma do art. 240 da CRFB;
b) “Organizações Sociais” (“OS”): as entidades privadas, qualificadas como Organizações Sociais, na forma da Lei Federal 9.637/1998,64 celebram “contrato de gestão” com o Estado para cumprimento de metas de desempenho e recebimento de benefícios públicos (ex.: recursos orçamentários, permissão de uso de bens públicos, cessão especial de servidores públicos); e
c) “Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público” (“OSCIP”): as OSCIPs celebram termo de parceria com o Estado, na forma da Lei Federal 9.790/1999, para atendimento de metas e recebimento de benefícios públicos.
As entidades do Terceiro Setor possuem as seguintes características comuns: a) são criadas pela iniciativa privada; b) não possuem finalidade lucrativa; c) não integram a Administração Pública indireta; d) prestam atividades privadas de relevância social; e) possuem vínculo legal ou negocial com o Estado; f) recebem benefícios públicos.
As polêmicas em relação ao regime jurídico do Terceiro Setor são justificadas pelo caráter híbrido das respectivas entidades que são “públicas”, por executarem atividades sociais e receberem benefícios públicos, mas “não estatais”, pois não integram formalmente a Administração Pública.
A parceria com o Estado influencia no regime jurídico aplicável ao Terceiro Setor, tornando aplicáveis, quando expressamente previsto no ordenamento, normas de caráter público, o que tem gerado controvérsias no âmbito da doutrina e da jurisprudência.65
Quanto ao tema da aplicação das regras de licitação ao Terceiro Setor, a análise deve levar em consideração duas questões distintas: a) formalização da parceria (contrato de gestão e termo de parceria); e b) utilização de recursos públicos nas contratações realizadas pelas entidades do Terceiro Setor com terceiros.
A primeira questão polêmica envolve a eventual obrigatoriedade de licitação para escolha da “OS” e da “OSCIP”, que formalizarão, respectivamente, o contrato de gestão e o termo de parceria. Sobre o tema, é possível apontar dois entendimentos:
1.º entendimento: obrigatoriedade de licitação. Nesse sentido: Marçal Justen Filho.66
2.º entendimento: inaplicabilidade da licitação, uma vez que os contratos de gestão e os termos de parceria são verdadeiros convênios, caracterizados pela busca de interesses comuns dos partícipes, sendo certo que a regra da licitação é direcionada aos contratos administrativos. Nesse sentido: José dos Santos Carvalho Filho e TCU.67
Concordamos com a segunda posição. A licitação é aplicável aos contratos administrativos, e não aos convênios (art. 37, XXI, da CRFB e art. 2.º da Lei 8.666/1993). Nesse sentido, o art. 116 da Lei 8.666/1993 determina a aplicação das normas de licitação aos convênios apenas “no que couber”. Ora, se os convênios e os contratos fossem sinônimos, não faria sentido a ressalva feita pelo legislador, dado que o tratamento jurídico seria o mesmo.68
Todavia, a ausência de licitação formal não afasta a necessidade de obediência aos princípios constitucionais, notadamente a impessoalidade e a moralidade, na celebração de convênios com entidades privadas do Terceiro Setor.69
Em consequência, caso existam várias entidades potencialmente interessadas no contrato de gestão ou no termo de parceria, deve o Poder Público estabelecer procedimento administrativo prévio para a escolha da entidade beneficiária do convênio, sob pena de violar a igualdade.
A tese aqui defendida foi consagrada no art. 23 do Decreto 3.100/1999, com redação conferida pelo Decreto 7.568/2011, que regulamenta a Lei 9.790/1999, que prevê a obrigatoriedade do denominado “concurso de projetos” como forma de restringir a subjetividade na escolha da “OSCIP”, garantindo o cumprimento dos princípios da igualdade e da eficiência.70
Vale ressaltar que o art. 4.º do Decreto 6.170/2007 dispõe que a celebração de convênio ou contrato de repasse com entidades privadas, sem fins lucrativos, será precedida de chamamento público, a ser realizado pelo órgão ou entidade concedente, visando à seleção de projetos ou entidades que tornem mais eficaz o objeto do ajuste (art. 4.º do Decreto 6.170/2007, alterado pelo Decreto 7.568/2011).71
A obrigatoriedade do chamamento público, defendida nas edições anteriores desta obra, foi consagrada nos arts. 2.º, XII, 16, 17 e 23 a 32 da Lei 13.019/2014, que trata do regime jurídico das parcerias voluntárias entre a Administração Pública e as organizações da sociedade civil sem fins lucrativos (OSCs).
A segunda questão controvertida refere-se à necessidade de licitação para contratações realizadas por entidades do Terceiro Setor (Serviços Sociais Autônomos, Organizações Sociais e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público) com dinheiro público. Existem três entendimentos doutrinários sobre o assunto:
1.º entendimento: desnecessidade de licitação. Seria inconstitucional a inclusão das “entidades controladas direta ou indiretamente” pela Administração Direta e Indireta no rol dos destinatários da regra da licitação (arts. 1.º, parágrafo único, e 119 da Lei 8.666/1993), tendo em vista a impossibilidade de interferência estatal (art. 5.º, XVII, da CRFB), salvo nos casos expressamente autorizados pelo próprio texto constitucional, não sendo referida qualquer exceção no tocante à exigência de licitação. A Lei 8.666/1993 não poderia ampliar o rol de destinatários da regra constitucional da licitação, que menciona apenas as entidades da Administração Pública, não incluídas as entidades privadas do Terceiro Setor. Nesse sentido, Diogo de Figueiredo Moreira Neto.72
2.º entendimento: necessidade de licitação para as contratações realizadas pelo Terceiro Setor, inseridas na expressão “demais entidades controladas direta ou indiretamente” pela Administração Direta, contida no art. 1.º, parágrafo único, da Lei 8.666/1993. A Constituição menciona as entidades da Administração como destinatárias da licitação, mas não impede a menção legal a outras pessoas que possuem vínculos formais com o Poder Público. Essa orientação foi consagrada no art. 1.º, § 5.º, do Decreto 5.504/2005.73 Nesse sentido: José dos Santos Carvalho Filho.74
3.º entendimento: desnecessidade de licitação na forma da Lei 8.666/1993, mas obrigatoriedade de realização de procedimento simplificado, previsto pela própria entidade privada, que assegure o respeito aos princípios constitucionais (impessoalidade, moralidade etc.). Essa é a exigência contida nos arts. 17 da Lei 9.637/1998 e 14 da Lei 9.790/1999, que estabelecem a necessidade de edição de regulamentos próprios, respectivamente, pela “OS” e pela “OSCIP”, contendo os procedimentos que tais entidades devem adotar “para a contratação de obras e serviços, bem como para compras com emprego de recursos provenientes do Poder Público”. Nesse sentido: TCU.75
Conforme manifestação em estudo anterior sobre o tema, entendemos que a razão está com o terceiro entendimento.76 A interpretação moderada da questão evita o engessamento das entidades privadas, que seria causado pela aplicação da Lei 8.666/1993, mas garante a observância dos princípios constitucionais por meio da exigência de procedimento simplificado e objetivo para contratações realizadas com dinheiro público repassado.
Aliás, essa solução foi consagrada na legislação especial (arts. 17 da Lei 9.637/1998 e 14 da Lei 9.790/1999), devendo ser considerada ilegal a exigência de realização de pregão, preferencialmente na forma eletrônica, prevista no art. 1.º, § 5.º, do Decreto 5.504/2005, posto que a legislação remete às entidades, e não ao chefe do Executivo, a atribuição para a criação de procedimentos adequados na contratação de terceiros. O chefe do Executivo, portanto, ao editar o decreto em comento, exorbitou do seu poder regulamentar na parte em que exigiu a realização de licitação, na modalidade pregão, às Organizações Sociais e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público.
A tese aqui sustentada foi consagrada no art. 43 da Lei 13.019/2014, que exigiu a elaboração de regulamento para compras e contratações realizadas pelas entidades privadas parceiras com a utilização de recursos públicos, devendo ser observados os princípios da legalidade, da moralidade, da boa-fé, da probidade, da impessoalidade, da economicidade, da eficiência, da isonomia, da publicidade, da razoabilidade e do julgamento objetivo, e a busca permanente de qualidade e durabilidade.
O presente ensaio tem por escopo destacar uma não tão “nova” visão do instituto da licitação: a função regulatória da licitação. Atualmente, esse processo seletivo realizado pelo Poder Público, especialmente após as recentes alterações legislativas, prestar-se-á tanto a orientar as contratações administrativas quanto a viabilizar a implementação de valores constitucionais.
Tal tendência foi vislumbrada, há muito, por autores de vanguarda, que se encontravam à frente do seu tempo.78 No entanto, agora, essa “nova” função da licitação – considerada, por alguns, como atípica – se apresenta como uma das principais diretrizes da atual política de governo; visa-se, por meio do “Poder de Compra Estatal”, fomentar o crescimento econômico do País, notadamente pelo desenvolvimento da indústria nacional.
O exame se justifica na medida em que todas as entidades da Administração Pública Brasileira (União, Estados e Municípios) destinam um significativo volume de recursos públicos à aquisição de bens e serviços necessários ao desenvolvimento de suas atividades.
Daí a necessidade de destacar a legitimidade da utilização deste “Poder de Compra” do Estado no exercício das atividades de fomento e de regulação de mercados (espécies de intervenção indireta do Estado na Ordem Econômica, previstas no art. 174 da CRFB) em atendimento ao dever de garantir o desenvolvimento nacional, objetivo fundamental da República, previsto no art. 3.º, inciso II, da Carta Constitucional.
Para tal desiderato, discorrer-se-á, inicialmente, acerca da função regulatória da licitação, delineando as suas principais características, bem como trazendo exemplos da legislação pátria que já consagram este conceito; após, serão examinados os fundamentos axiológicos da atual tendência de contratações públicas, estabelecendo-se relação entre os fundamentos do pluralismo jurídico e o Direito Administrativo Pós-positivista com essa nova concepção da licitação; por fim, serão destacadas as principais inovações trazidas pela MP 495/2010, posteriormente convertida na Lei 12.349/2010, como uma das principais manifestações legislativas dessa tendência.
O procedimento administrativo licitatório visa a selecionar, dentro de um mercado no qual exista efetiva concorrência entre os licitantes, a proposta mais vantajosa para a Administração Pública.
Por se tratar de um procedimento administrativo, esse encadeamento de atos está adstrito à busca da verdade real;79 significa que, diferentemente do processo judicial, que deve se ater à verdade formal, constante nos autos, o referido procedimento não pode desconsiderar os acontecimentos ocorridos no mundo fenomênico.
Daí poder-se afirmar que, em mercados monopolizados (ou oligopolizados), dominados por poucos agentes econômicos, não há efetiva competição.80 Por consequência, sem competição, não há que falar na validade de procedimentos licitatórios,81 pois a inexistência de concorrência em um mercado no qual, a princípio, ela fosse possível indica haver alguma falha a ser corrigida.
Com base nesse fundamento e no princípio da economicidade (previsto no art. 70 da CFRB), é que o Estado intervém na economia,82 por meio da formatação de procedimentos licitatórios, de modo a evitar a dominação de mercados, dando pleno atendimento ao disposto no art. 173, § 4.º, da Constituição da República.
O objeto dessa intervenção é corrigir “falhas no seu mercado”83 de contratação, especialmente a existência de barreiras à entrada de novos competidores em mercados dominados. Com isso, o procedimento licitatório será palco da efetiva concorrência entre os licitantes, propiciando contratações mais econômicas para a Administração Pública.
Essa é a ótica pela qual o instituto da licitação deve ser analisado. Afinal, a licitação – tal como a concorrência84 – não é um fim em si, mas um instrumento85 para que a Administração selecione a melhor proposta dentro de um mercado livre de concentrações econômicas.
Entretanto, não é só. A licitação, atualmente, tem servido para outras finalidades.
Trata-se da denominada “função regulatória da licitação”.86 Por esta teoria, o instituto na licitação não se presta, tão somente, para que a Administração realize a contratação de bens e serviços a um menor custo; o referido instituto tem espectro mais abrangente, servindo como instrumento para o atendimento de finalidades públicas outras, consagradas constitucionalmente.
Vários são os exemplos de políticas setoriais que vêm se utilizando da licitação (do poder de compra do Estado) para concretizar outros valores, dentre os quais destacam-se a proteção do meio ambiente, o tratamento diferenciado conferido às microempresas e às empresas de pequeno porte e, de maior relevo para os fins do presente estudo, o fomento ao desenvolvimento tecnológico no País.
A sustentabilidade ambiental já se encontra incorporada às licitações públicas, em prol da efetivação dos arts. 170, VI, e 225, ambos da Constituição da República. Para tanto, ainda em 2009, foi editada a Lei 12.187, que pretende se valer do poder de compra do Estado como ferramenta útil à implementação da política de mudanças climáticas.87
As “licitações verdes” ou “contratos públicos ecológicos” (Green Public Procurement) representam tendência consagrada no Direito Comunitário Europeu que exige a utilização da contratação pública para implementação de políticas públicas ambientais.88
Após, e com fundamento neste diploma normativo, o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão editou, em 19.01.2010, a Instrução Normativa 01, que “dispõe sobre os critérios de sustentabilidade ambiental na aquisição de bens, contratação de serviços ou obras pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional”.89
Nessas hipóteses excepcionais, chega-se a admitir, inclusive, que o Estado pague preço maior na aquisição de bens e serviços, com o objetivo de fomentar o desenvolvimento sustentável.
No que tange ao tratamento diferenciado para as microempresas e as empresas de pequeno porte, cite-se a instituição Lei Complementar 123, de 14.12.2006, que, visando a implementar o princípio da isonomia, na sua vertente material, em atendimento ao disposto nos arts. 170, inciso IX, e 179 da Constituição, trouxe uma série de vantagens para estas sociedades nos procedimentos licitatórios.
Mencione-se, como exemplo desse regime diferenciado para essas sociedades, a possibilidade de as microempresas e empresas de pequeno porte participarem de licitações com débitos fiscais,90 além da criação de uma situação de empate ficto com as empresas de grande porte, mesmo quando estas apresentam propostas econômicas mais vantajosas.91
Existem, ainda, várias outras hipóteses que consagram a Teoria da Função Regulatória das Licitações, sendo lícito mencionar, como exemplos já previstos na Lei 8.666/1993, a possibilidade da contratação direta de cooperativas de catadores de lixo92 ou de associações de deficientes físicos.93
No âmbito do Estado do Rio de Janeiro, da mesma forma, o Decreto 33.925, de 18.02.2003, prevê a obrigatoriedade da contratação de deficientes.94
Todas essas hipóteses almejam resguardar, por meio do procedimento licitatório, valores consagrados na Constituição da República.
Mais recentemente, a Lei 8.666/1993 foi alterada pela Lei 12.349, de 15.12.2010, que, expressamente, atrela o conceito de melhor proposta para a Administração à promoção do desenvolvimento nacional sustentável (às peculiaridades desse regime voltar-se-á adiante).
Todas essas alterações, que são manifestações da função regulatória das licitações, decorrem da atual tendência pluralista do ordenamento jurídico, a seguir delineada.
A atuação administrativa, no âmbito do novo Direito Administrativo pós-positivista, marcado pela constitucionalização e centralidade dos direitos fundamentais, deve ser pautada pela promoção dos valores pluralísticos consagrados na Constituição.95
Os princípios constitucionais e os direitos fundamentais, nesse contexto, passam a ter posição de destaque na ordem constitucional,96 visto que as Constituições procuram valer-se, cada vez mais, dos princípios como forma de amoldar, nos seus textos, interesses conflitantes existentes em uma sociedade pluralista.
Um dos fatores determinantes para mudança de paradigma na atuação administrativa foi a consagração de interesses heterogêneos no texto constitucional que legitimam a atuação do denominado “Estado pluriclasse”.97
A homogeneidade dos interesses – característica típica do Estado Liberal burguês, que deveria atender às necessidades de uma classe dominante (a burguesia) e que estabelecia o voto censitário – cede espaço para a heterogeneidade dos interesses existentes na complexa sociedade atual. A consagração do sufrágio universal possibilita a participação política de grupos sociais até então excluídos e a defesa/promoção dos seus interesses.
Não existe, destarte, um único interesse público, mas, sim, diversos interesses públicos, eventualmente conflitantes, que devem ser protegidos no Estado Democrático de Direito, marcado pelo pluralismo. Na lição de Karl Loewentein:
Si existe un rasgo esencial que dé un cuño característico a la sociedad de masas de la época tecnológica es, sin duda, el de su fundamento y dinamismo pluralista. [...] De los detentadores oficiales del poder se espera que por medio de sus decisiones políticas armonicen los intereses contrapuestos de los grupos pluralistas en beneficio común de la sociedad.98
No âmbito das licitações e das contratações públicas, o Pluralismo demonstra que a atuação do Poder Público não pode ser pautada, exclusivamente, pela economicidade. Ao contrário, a legitimidade da atuação estatal dependerá da efetivação de outros princípios constitucionais.
É oportuno ressaltar que a própria ideia de eficiência não se confunde com a de economicidade, posto que a eficiência não pode ser analisada, exclusivamente, sob o prisma econômico, pois a Administração tem o dever de considerar outros aspectos igualmente fundamentais: qualidade do serviço ou do bem, durabilidade, confiabilidade, universalização do serviço para o maior número possível de pessoas etc.
Nem sempre a medida mais barata será a mais eficiente (“o barato pode custar caro”). Aliás, o art. 45 da Lei 8.666/1993, que dispõe sobre os tipos de licitação, prevê a possibilidade de utilização de critérios técnicos para definição da proposta mais vantajosa.
O princípio da eficiência, previsto no art. 37 da CRFB, relaciona-se com a concretização das finalidades estatais elencadas pelo texto constitucional e, por consequência, com a satisfação das necessidades da população.99
Desta forma, a medida administrativa será eficiente quando implementar, com maior intensidade e com os menores custos possíveis, os resultados consagrados nos textos normativos (“Administração de Resultados”).100
Nesse sentido, posiciona-se Humberto Ávila, ao afirmar que “a medida adotada pela administração pode ser a menos dispendiosa e, apesar disso, ser a menos eficiente.” Na lição do autor, a atuação administrativa é eficiente quando “promove de forma satisfatória os fins em termos quantitativos, qualitativos e probabilísticos”. Não basta a utilização dos meios adequados para promover os respectivos fins; mais do que a adequação, a eficiência “exige satisfatoriedade na promoção dos fins atribuídos à administração”.101
Por esta razão, a função regulatória da licitação pressupõe o atendimento não apenas dos valores econômicos, mas, também, dos valores sociais, ambientais, entre outros.
Nesse contexto, o desenvolvimento nacional sustentável, com a previsão de margem de preferência para produtos manufaturados e para serviços nacionais, representa uma finalidade legítima do processo licitatório.
Registre-se que a revogação do art. 171 da CRFB pela EC 6/1995, que estabelecia a possibilidade de tratamento preferencial às empresas brasileiras de capital nacional, não impede a fixação de preferência para os produtos e serviços nacionais.
Não se trata, pois, de diferenciação inconstitucional, de caráter xenófobo.
A revogação do art. 171 do corpo da Constituição apenas fixou que a atribuição ou não de preferência a produtos nacionais não é matéria a ser tratada em sede constitucional, atribuindo-se, portanto, à legislação ordinária competência para tanto.
Ademais, não há que falar em conflito entre a política de Estado, delineada pela aludida emenda constitucional, que suprimiu os privilégios conferidos às empresas brasileiras de capital nacional, com a atual política de Governo, que privilegia a indústria nacional.
Há, tão somente, um conflito aparente de normas. Afinal, tendo em vista o princípio da Unidade da Constituição, não há que falar em conflito entre normas constitucionais.102 Afinal, ambas as políticas (de Estado e de Governo) possuem status constitucional, uma vez que conferir tratamento privilegiado às empresas nacionais tem amparo em uma política de Estado previamente delineada pela Constituição da República. Senão, vejamos.
O art. 3.º, II, da CRFB consagra o “desenvolvimento nacional” como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil.
O desenvolvimento de um país, é bom que se registre, não está restrito, somente, ao seu crescimento econômico.103
Muito ao contrário, o “direito ao desenvolvimento” comporta a conjugação de diversos outros fatores que materializam liberdades substanciais, por exemplo, o aumento da qualidade de vida dos cidadãos, o incremento da liberdade política, a promoção da inovação tecnológica e o aumento da adequação/funcionalidade das instituições. Nesse sentido, confiram-se os ensinamentos de Amartya Sen:104
O enfoque nas liberdades humanas contrasta com as visões mais restritas de desenvolvimento, como as que identificam desenvolvimento com crescimento do Produto Nacional Bruto (PNB), aumento de rendas pessoais, industrialização, avanço tecnológico ou modernização social. [...] Se a liberdade é o que o desenvolvimento promove, então existe um argumento fundamental em favor da concentração neste objetivo abrangente, e não em algum meio específico ou em alguma lista de instrumentos especialmente escolhida.
Da mesma forma, o art. 174, § 1.º, da CRFB remete ao legislador a competência para fixar “as diretrizes e bases do planejamento do desenvolvimento nacional equilibrado, o qual incorporará e compatibilizará os planos nacionais e regionais de desenvolvimento”.
Por fim, o mercado interno, na forma do art. 219 da CRFB, integra o patrimônio nacional e “será incentivado de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e socioeconômico, o bem-estar da população e a autonomia tecnológica do País, nos termos de lei federal”.
Daí por que Marcos Juruena Villela Souto já sustentava que o tratamento diferenciado dispensado às empresas nacionais, nos procedimentos licitatórios, é possível, mesmo após o advento da EC 6/1995, tendo em vista o disposto nos arts. 172 e 219 da CRFB. Nas palavras do autor:
Com efeito, a norma de desempate trata do capital estrangeiro quando em competição com o capital nacional, que aqui gera empregos, tecnologia e a decisão sobre repartição e investimento de lucros. A preferência é norma de fomento do mercado interno, na forma do art. 219, CF.105
Esta também é a orientação defendida por Carlos Pinto Coelho Motta:
Sob esse ângulo, não mais diríamos que o processo licitatório visa unicamente selecionar o contrato mais vantajoso para suprimento do setor público. Esta seria uma definição pobre, mesmo considerando os princípios da eficiência e da economicidade balizadores do instituto. A consciência do momento em que vivemos pleiteia uma nova concepção da licitação, a ser doravante entendida como um procedimento que resguarde o mercado interno – integrante do patrimônio nacional – e que incentive o desenvolvimento cultural e socioeconômico do País, nos precisos termos do art. 219 da Constituição Federal. É um conceito que incorpora a variável de “fomento”, decisiva para o tempo econômico atual.106
O fomento107 à indústria nacional, por meio da celebração de contratos administrativos, não é uma novidade estranha à regulação.
Tanto assim o é que os contratos de concessão para a exploração de petróleo – disciplinados no art. 26 da Lei 9.478/1997 –, por exemplo, preveem a obrigatoriedade da cláusula de Conteúdo Local, segundo a qual o concessionário que vier a explorar jazida petrolífera será obrigado a declarar que um percentual dos seus fornecedores de bens e de mão de obra é de origem nacional.108
Ora, se, no âmbito da regulação jurídica, os contratos de concessão já são utilizados para a promoção da indústria nacional, não há razão – lógica ou jurídica – que não legitime a formatação de procedimentos licitatórios com o mesmo desiderato.
Destarte, fixada a premissa de que a função regulatória da licitação possibilita a promoção de finalidades extraeconômicas nas contratações públicas, como é o caso do desenvolvimento nacional sustentável, o próximo passo é a análise das principais novidades introduzidas pela Lei 12.349/2010.
A primeira alteração de relevo trazida pela Lei 12.349, de 15.12.2010, foi a inclusão, no art. 3.º da Lei 8.666/1993, do princípio do desenvolvimento nacional sustentável, entre os princípios setoriais das licitações públicas.109
Com base na linha argumentativa suscitada no tópico anterior, que trouxe fundamentos axiológicos do pós-positivismo e do pluralismo jurídico que justificam a função regulatória da licitação, entende-se que esta inclusão se apresenta legítima para a implementação dessa nova diretriz às contratações públicas,110 visto que não apresenta mais ares de novidade a força normativa e cogente dos princípios jurídicos previstos na Constituição,111 o que, a toda evidência, contribuirá para dar efetividade às novas alterações legislativas.
Mais do que isso. Ao se acrescentar um princípio desse jaez no rol do art. 3.º, não há dúvida de que tal mandamento de otimização servirá como um norte interpretativo para a Lei 8.666/1993.
Dito de outro modo, não só as alterações legislativas trazidas pelo novel diploma devem ser interpretadas com base no princípio do dever de promoção do desenvolvimento nacional sustentável, como todos os dispositivos da Lei de Geral de Licitações e Contratos.112
Um exemplo ilustra o ponto: o art. 48, inciso II, da Lei 8.666/1993 preceitua que serão desclassificados os licitantes
[...] com preços manifestamente inexequíveis, assim considerados aqueles que não venham a ter demonstrada sua viabilidade através de documentação que comprove que os custos dos insumos são coerentes com os de mercado e que os coeficientes de produtividade são compatíveis com a execução do objeto do contrato, condições estas necessariamente especificadas no ato convocatório da licitação.
Este dispositivo, certamente, deverá ser interpretado de uma forma mais flexível para empresas que se utilizam de insumos nacionais.
Afinal, não faria qualquer sentido, com base nessa nova diretriz das contratações públicas, que um licitante, ao se utilizar, por exemplo, de produtos manufaturados nacionais, fosse desclassificado de um certame, ao argumento de que sua proposta é inexequível, caso os custos dos insumos nacionais sejam infimamente inferiores aos insumos alienígenas.
Essa legítima desequiparação em favor dos licitantes que adquiram insumos nacionais só poderá ocorrer – e isso é evidente – se não acarretar nenhum prejuízo à viabilidade econômica da contratação.
O importante é deixar assentada, nesse passo, a função interpretativa que esse novo princípio deve exercer em todo o regime de contratações públicas.
O referido diploma normativo estabeleceu, ainda, que podem ser previstas, nas licitações públicas, margens de preferência para produtos manufaturados e para serviços nacionais que atendam as normas técnicas brasileiras.113
Essa margem de preferência para os bens e produtos nacionais deve levar em consideração critérios como geração de emprego e renda, o efeito na arrecadação tributária, o desenvolvimento e inovação tecnológicos realizados no País e custo adicional dos produtos e serviços, tudo na forma prevista no § 6.º do art. 3.º da Lei 8.666/1993, com a redação conferida pela Lei 12.349/2010.
Tal margem de preferência, segundo o disposto no art. 2.º, incisos I e II, do Decreto 7.546, de 02.08.2011, que regulamenta o disposto nos §§ 5.º a 12 do art. 3.º da Lei 8.666/1993, e institui a Comissão Interministerial de Compras Públicas, pode ser normal ou adicional.
A margem de preferência normal diz respeito ao diferencial de preços entre os produtos manufaturados nacionais e serviços nacionais e os produtos manufaturados estrangeiros e serviços estrangeiros; a margem adicional, por sua vez, será cumulada com aquela, levando em conta o diferencial de preços entre produtos manufaturados nacionais e serviços nacionais, resultantes de desenvolvimento e inovação tecnológica realizados no País, e produtos manufaturados estrangeiros e serviços estrangeiros, o que permite assegurar preferência à contratação de produtos manufaturados nacionais e serviços nacionais.
Tais critérios de preferência encontram fundamento de validade no art. 218 da Constituição da República, cujos termos são os seguintes: “O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas”.
Do mesmo modo, tais diferenciações se compatibilizam com as diretrizes traçadas pela Lei 10.973/2004, que dispõe sobre incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo.
Nesse sentido, o art. 20 do referido diploma estabelece uma espécie de “reserva de mercado”, no âmbito de órgãos e entidades da Administração Pública, para as empresas nacionais que exerçam atividades relacionadas ao desenvolvimento tecnológico.114 Confira-se, por relevante, o seu teor:
Art. 20. Os órgãos e entidades da administração pública, em matéria de interesse público, poderão contratar empresa, consórcio de empresas e entidades nacionais de direito privado sem fins lucrativos voltadas para atividades de pesquisa, de reconhecida capacitação tecnológica no setor, visando à realização de atividades de pesquisa e desenvolvimento, que envolvam risco tecnológico, para solução de problema técnico específico ou obtenção de produto ou processo inovador [...].
A preocupação da política de desenvolvimento de um país, com a redução da dependência estrangeira no setor de desenvolvimento científico e tecnológico, é abordada, na seguinte passagem, por Gilberto Bercovici:115
O objetivo de uma política de desenvolvimento científico e tecnológico também é reduzir a necessidade de tecnologia importada e fortalecer as atividades científico-tecnológicas nacionais. A coordenação destes esforços de expansão e reorientação das atividades científicas pode favorecer a transformação do setor produtivo nacional e melhorar a capacidade do país em importar e assimilar adequadamente a tecnologia estrangeira.
Prossegue o autor, citando Francisco Sagasti116
A autonomia tecnológica de um país diz respeito à sua capacidade potencial autônoma de produzir internamente os bens e serviços essenciais para sua estratégia de desenvolvimento nacional. Sagasti destaca, no entanto, que esta ideia de autonomia tecnológica se aplica, de modo geral, para a ciência também, embora ninguém possa depender apenas de si mesmo em termos científicos. A autonomia científica está ligada à necessidade de a ciência fornecer a base para a autonomia tecnológica.
Nem se diga que a citada preferência poderia representar violação ao princípio da isonomia. O discrímen feito pela lei encontra fundamento razoável de validade na própria subjacência fática que ensejou a edição da norma.
O momento atual da economia do País – que vem exigindo, cada vez mais, o constante incremento dos investimentos em infraestrutura e na autossustentabilidade tecnológica do País – traz consigo a necessidade do fortalecimento da indústria nacional.
Essas medidas, na verdade, consagram o ideal da implementação do princípio da isonomia, na sua vertente material, isto é, tratar de forma desigual as situações, na medida em que se desigualam,117 posto que o contexto macroeconômico que, outrora, era de abertura da economia para capital estrangeiro, atualmente, diversamente, indica a necessidade de fortalecimento do mercado endógeno.
Essa sistemática atende, na mesma medida, ao princípio da proporcionalidade,118 nas suas três vertentes, a saber: (i) a medida é adequada, uma vez que se utiliza da função regulatória da licitação para formatar mercados, em prol o desenvolvimento do mercado nacional; é necessária, pois estabelece uma margem de preferência, que pode, inclusive, ser superada, em casos excepcionais, mas que não inviabiliza a participação de empresas estrangeiras nos procedimentos licitatórios pátrios; e proporcional em sentido estrito, na medida em que traz mais benefícios do que malefícios para as contratações administrativas, tendo em vista os consideráveis ganhos científicos e de desenvolvimento tecnológico que poderão ser angariados pelo País.
Enfim, trata-se, como já destacado, de uma tendência que permeia as contratações administrativas, no sentido de utilizar o “Poder de compra do Estado”, sob o viés de uma função regulatória da licitação, como um instrumento propulsor do desenvolvimento nacional.
Segundo o § 10, introduzido no art. 3.º da Lei 8.666/1993, as referidas margens de preferência poderão ser estendidas, total ou parcialmente, aos bens e serviços originários dos Estados Partes do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL).
Trata-se de dispositivo que vai ao encontro das diretrizes traçadas pelo Protocolo de Contratações públicas do MERCOSUL (MERCOSUL/CMC/DEC. 40/2003), instrumento que considera que “o marco normativo comum para as licitações públicas dos Estados Partes representam um passo fundamental para a devida transparência nos processos de Compras Governamentais”, em especial o seu art. 25, item 6, que possui o seguinte teor:
6. As ofertas de bens, serviços e obras públicas dos Estados Partes gozarão de uma preferência nas contratações públicas com respeito às de extrazona. Essa preferência se fará efetiva através da oportunidade concedida aos beneficiários do presente Protocolo de igualar a melhor oferta, mantidas como mínimo as características técnicas apresentadas na oferta inicial, sempre e quando a diferença entre estas não seja superior a 3% (três por cento), conforme o critério de avaliação das ofertas.
Do mesmo modo, o referido parágrafo está amparado no conceito de “direito administrativo global”.119 Trata-se de uma nova concepção do direito administrativo, segundo a qual, em decorrência da mundialização da economia, esse ramo deve se adequar às diretrizes – normativas e principiológicas – traçadas por blocos econômicos transnacionais.120
O Decreto 7.546/2011, ao regulamentar o referido regime de preferência, preceitua, em seu art. 3.º, § 2.º, que os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e demais poderes da União estão livres para estabelecer diferentes regimes de preferência, sendo facultado às entidades menores (Estados e Municípios) adotar as margens de preferências estabelecidas pelo Poder Executivo Federal.
Andou bem, nesse particular, o referido instrumento regulamentar, posto que, ao possibilitar que cada entidade da federação estabeleça o seu próprio regime de preferência, preservou o princípio federativo (previsto no art. 18 da CRFB), na medida em que não invade a autonomia administrativa das demais entidades federadas.
Além disso, o referido diploma faz com que essa nova sistemática não extrapole os limites da competência da União para a edição de normas gerais – as quais, é bom que se registre, se limitam a trazer diretrizes principiológicas para a produção normativa suplementar – em licitações e contratos, previstas no art. 22, inciso XXVII, da Constituição da República.
Cabe registrar que a necessidade de garantir o “desenvolvimento nacional sustentável” não autoriza: (i) o estabelecimento de vedação a produtos e serviços estrangeiros; e (ii) a admissão de margem de preferência para contratação de bens e serviços, sem a devida regulamentação por decreto do Poder Executivo.121
Nos termos do § 11 do art. 3.º da Lei 8.666/1993, incluído pela Lei 12.349/2010, as autoridades administrativas poderão, mediante apresentação de prévia justificativa, incluir nos editais de licitação para a contratação de bens, serviços e obras exigência de que o futuro contratado deva promover, em favor de determinado órgão ou entidade integrante da administração pública ou qualquer instituição por ela indicada a partir de processo isonômico, (i) medidas de compensação comercial, industrial ou tecnológica ou (ii) acesso a condições vantajosas de financiamento. Tais medidas poderão ser demandadas cumulativamente ou não, obedecida a forma estabelecida pelo Poder Executivo federal.
Nesse sentido, coube ao art. 2.º, III, do Decreto 7.546/2011 explicitar quais devem ser as medidas de “compensação industrial, comercial ou tecnológica”. Confira-se:
Qualquer prática compensatória estabelecida como condição para o fortalecimento da produção de bens, do desenvolvimento tecnológico ou da prestação de serviços, com a intenção de gerar benefícios de natureza industrial, tecnológica ou comercial concretizados, entre outras formas como (a) coprodução, (b) produção sob licença, (c) produção subcontratada, (d) investimento financeiro em capacitação industrial e tecnológica, (e) transferência de tecnologia, (f) obtenção de materiais e meios auxiliares de instrução, (g) treinamento de recursos humanos, (h) contrapartida comercial, ou (i) contrapartida industrial.
Não se trata, pois, de novidade no ordenamento jurídico pátrio. A exigência de práticas compensatórias é uma decorrência do estabelecimento de um regime de privilégio em favor de particulares. Como exemplo, cite-se a previsão do estabelecimento de compensação financeira pela exploração de recursos naturais,122 prevista no art. 20, § 1.º, da Constituição da República:
Art. 20. [...]
§ 1.º É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração.
Ainda objetivando dar efetividade ao princípio do desenvolvimento sustentável, acrescentou-se o inciso XXI ao art. 24 da Lei 8.666/1993, trazendo uma nova hipótese de licitação dispensável, na qual é levada à discricionariedade do gestor público a possibilidade de se utilizar da contratação direta para fomentar a constituição de alianças estratégicas e o desenvolvimento de projetos de cooperação envolvendo empresas nacionais, ICT e organizações de direito privado sem fins lucrativos voltadas para atividades de pesquisa e desenvolvimento, que objetivem a geração de produtos e processos inovadores.123
Pretende-se, com isso, estimular e apoiar a constituição de alianças estratégicas e o desenvolvimento de projetos de cooperação.
Ademais, poderá o Poder Público contratar sem licitação Instituição Científica e Tecnológica (ICT)124 que (i) compartilhe seus laboratórios, equipamentos, instrumentos, materiais e demais instalações com microempresas e empresas de pequeno porte em atividades voltadas à inovação tecnológica, para a consecução de atividades de incubação, sem prejuízo de sua atividade finalística, ou que (ii) permita a utilização de seus laboratórios, equipamentos, instrumentos, materiais e demais instalações existentes em suas próprias dependências por empresas nacionais e organizações de direito privado sem fins lucrativos voltadas para atividades de pesquisa, desde que tal permissão não interfira diretamente na sua atividade-fim, nem com ela conflite.
Nesse caso, ainda que possível a formalização de procedimento licitatório para escolha da melhor proposta, a contratação direta se justifica pela necessidade de a Administração Pública privilegiar instituição que favoreça o desenvolvimento tecnológico do País.
Em consonância com o art. 5.º da Lei 10.973/2004, também será dispensável a licitação caso a Administração Pública Federal pretenda adquirir participação minoritária de capital de empresa privada que objetive desenvolver projetos científicos e tecnológicos para obtenção de produtos ou processos inovadores.
A última hipótese de licitação dispensável refere-se à possibilidade de os órgãos e entidades da Administração Pública, em matéria de interesse público, poder contratar diretamente, para solução de problema técnico específico ou obtenção de produto ou processo inovador, empresa, consórcio de empresas e entidades nacionais de direito privado sem fins lucrativos voltadas para atividades de pesquisa, que sejam de reconhecida capacitação tecnológica no setor, visando à realização de atividades de pesquisa e desenvolvimento, que envolvam risco tecnológico.
Todo esse regime de contratação – que privilegia a indústria nacional – encontra amparo na não tão nova função regulatória do instituto da licitação, função esta que, embora, há muito, percebida por autores de vanguarda, só agora, após todos esses anos, vem ganhando ares de novidade nos textos normativos e nos colóquios de direito administrativo.
A instituição do regime de contratações públicas pautado no excesso de formalismos procedimentais não trouxe o benefício esperado, quando da substituição do Decreto-lei 2.300/1986 pela Lei 8.666/1993, que era, à época, diminuir a corrupção no bojo dos procedimentos licitatórios, por meio da redução da discricionariedade do Administrador e da ampliação dos mecanismos de controle.
Muito ao contrário. A instituição do procedimento licitatório burocrático trouxe uma série de consequências indesejáveis para as contratações da Administração Pública, dentre as quais destacam-se as seguintes: (i) O Estado acaba pagando preços superiores ao de mercado, tendo em vista que os licitantes embutem o custo de participar dessa procedimentalização – permeada por exigências, cada vez mais, complexas e detalhistas, sendo, muitas vezes, restritivas da competitividade –, o que gerou um incremento nos custos de transação nas contratações com o poder público; (ii) a morosidade tem sido a tônica desses procedimentos, na medida em que são intermináveis as contendas entre os licitantes – tanto em sede administrativa como no âmbito do Poder Judiciário –, principalmente nas fases de habilitação e de julgamento; (iii) toda essa lógica do processo pelo processo, considerando o procedimento licitatório como um fim em si mesmo, contribuiu para a onerosidade de todo o procedimento, acarretando contratações antieconômicas para o Estado.
Não era isso que se esperava de um procedimento de contratação administrativa que, anos mais tarde, iria orientar a implementação da Reforma do Estado, especialmente a partir da EC 19/1998, pautada nos ganhos de eficiência por meio da melhoria da qualidade dos resultados no relacionamento entre os setores públicos e privados, como ferramenta de abertura da economia e do mercado à competição. Em consequência, evidencia-se a necessidade de sua alteração.
Entretanto, não se desconsidera que existe um “custo político” em alterar, diretamente, a Lei 8.666/1993. A modificação do Estatuto de Licitações e Contratos, instrumento de contratação tão caro às Administrações Públicas do País afora, geraria um tormentoso trâmite legislativo no Congresso Nacional.
Tanto é verdade que, desde o projeto enviado pelo Ministério do Planejamento, nos idos de 1993 (PL 146/2003), até o projeto de lei enviado, recentemente, pelo Governo Federal (PLC 32/2007), no contexto do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), não tivemos avanços na reformulação completa da Lei Geral de Licitações e Contratos.
Por tal razão, optou-se por alterar o regime de contratações administrativas de forma setorial, sem modificar, diretamente, a Lei 8.666/1993. Assim ocorreu com a criação da modalidade pregão (Lei 10.520/2002), com a instituição do Sistema de Registro de Preços (Decreto 3.931/2001, revogado pelo Decreto 7.892/2013), com as normas relativas às licitações sustentáveis (Instrução Normativa 1/2010, expedida pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão), com o novo regramento para licitações de publicidade (Lei 12.232/2010), entre tantos outros exemplos.
É, pois, nesse contexto, que se inserem as alterações trazidas pelo Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), introduzidas pela Lei 12.462, de 05.08.2011, regulamentada pelo Decreto 7.581, de 11.10.2011. Registre-se que o referido Decreto incide exclusivamente sobre a Administração Federal, mas não se aplica aos Estados, DF e Municípios que possuem autonomia para edição dos seus decretos regulamentares.126
Afinal, o que poderia motivar mais a instituição de um novo regime de contratações públicas – orientado por parâmetros de eficiência, agilidade e economicidade – do que a necessidade de viabilizar a execução das obras de infraestrutura para realização dos eventos desportivos que serão realizados no País (a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016)?
O objetivo, portanto, do presente estudo é destacar as principais inovações desse regime diferenciado de contratações administrativas, de modo a contribuir para o aprimoramento do referido regime, bem como para que as inovações positivas, que, por ora, são transitórias e emergenciais, possam se tornar, ao final desses eventos desportivos, definitivas.
O denominado Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) foi instituído pela MP 527/2011, convertida na Lei 12.462/2011, com o principal objetivo de alterar as regras tradicionais de licitação, notadamente para as contratações relativas aos eventos esportivos (Copa de Mundo de 2014 e Olimpíadas de 2016).
As regras aplicáveis ao RDC incorporam inovações previstas em legislações especiais (ex.: normas do pregão e da PETROBRAS) de forma a desburocratizar o processo de contratação pública e reduzir os custos de sua realização.127
Entretanto, a constitucionalidade da Lei 12.462/2011, que estabelece normas sobre o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), tem sido questionada no âmbito acadêmico, bem como no âmbito do Supremo Tribunal Federal.128
Em resumo, os vícios de inconstitucionalidade do referido diploma legal podem ser divididos em duas categorias: vícios formais e vícios materiais.
Os vícios formais, em síntese, seriam os seguintes: a) ausência de relevância e urgência (art. 62 da CRFB) para edição da MP 527/2011, convertida posteriormente na Lei 12.462/2011; e b) abuso do poder de emenda parlamentar, tendo em vista que a redação original da MP 527/2011 não tratava do RDC, e o tema foi inserido no Congresso por emenda parlamentar (arts. 2.º, 59 e 62 da CRFB).129
Por outro lado, os alegados vícios materiais da Lei 12.462/2011 podem ser assim sintetizados: a) excesso de vagueza da norma e ampla margem de discricionariedade para regulamentação por parte de entidades administrativas, como a Autoridade Pública Olímpica (APO), o que violaria os arts. 22, XXVII, e 37, XXI, da CRFB; b) contratação integrada, com a elaboração do projeto básico pelo licitante vencedor, inexistindo critérios objetivos prévios para tratamento isonômico entre os interessados; c) remuneração variável; d) restrição à publicidade de determinados atos (sigilo) em afronta aos princípios da publicidade e da moralidade; e) pré-qualificação permanente, com a possibilidade de licitação restrita aos pré-qualificados, ofendidas a competitividade e a isonomia (art. 37, XXI, da CRFB); e f) relativização de exigências ambientais, com a previsão de compensações ambientais e aparente facultatividade no cumprimento dos requisitos de sustentabilidade ambiental (art. 225 da CRFB).
Quanto ao primeiro vício formal apontado, não nos parece possível concluir pela inconstitucionalidade da Lei 12.462/2011, tendo em vista a configuração da relevância e urgência para edição da MP 527/2011, especialmente pela proximidade dos eventos esportivos. Vale ressaltar que, apenas em situações muito excepcionais, o STF ingressa no controle do binômio da relevância e urgência das medidas provisórias.
Ainda que seja configurada, eventualmente, desídia por parte de alguns administradores públicos no planejamento e na execução dos projetos necessários aos referidos eventos esportivos, naquilo que se convencionou denominar de “urgência fabricada”, certo é que não pode a sociedade ser prejudicada pela não realização da Copa do Mundo e das Olimpíadas no País, devendo, no entanto, ser aplicadas sanções aos administradores responsáveis.
O segundo vício formal é bastante forte, uma vez que a jurisprudência do STF admite o poder de emenda parlamentar às medidas provisórias e aos Projetos de Lei de iniciativa do Executivo, desde que adimplidos dois requisitos básicos: a) pertinência temática e b) não pode haver aumento de despesa (salvo nos casos de projetos orçamentários). Da mesma forma, a eventual sanção presidencial não convalida o vício formal.130
Na hipótese, o RDC não possui, em princípio, pertinência temática com a matéria inicialmente prevista na MP 527/2011, o que levaria à inconstitucionalidade do diploma legislativo.
Não há dúvida de que a eventual declaração de inconstitucionalidade do RDC acarretará efeitos negativos para o País, praticamente inviabilizando os megaeventos esportivos.
Nesse contexto, o Judiciário não pode se afastar da necessidade de ponderação das consequências (econômicas, políticas e sociais) de suas decisões.131 Daí por que se defende que, caso aquela Egrégia Corte Constitucional entenda como insuperável a inconstitucionalidade formal deste diploma normativo (pelo alegado “abuso do poder de emenda”), sejam deferidos os efeitos dessa declaração de inconstitucionalidade, com fulcro no art. 27 da Lei 9.868/1999, de forma a não inviabilizar a realização dos referidos eventos desportivos, muito embora se defenda que essa pertinência temática só seria exigível nas matérias sujeitas à iniciativa legislativa privativa do chefe do Poder Executivo, elencadas no art. 61, inciso II, da Constituição da República. No caso, o tema relativo à licitação, por não estar inserido na competência legislativa privativa do chefe do Executivo, poderia ser incluído por emenda parlamentar.
Por fim, os alegados vícios materiais imputados ao RDC não devem prevalecer, conforme será destacado nos próximos itens.
O RDC somente poderá ser aplicado às licitações e contratos necessários à realização (art. 1.º, caput, e § 3.º, da Lei 12.462/2011): a) dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, constantes da Carteira de Projetos Olímpicos a ser definida pela Autoridade Pública Olímpica (APO); b) da Copa das Confederações da Federação Internacional de Futebol Associação – FIFA 2013 e da Copa do Mundo FIFA 2014, definidos pelo Grupo Executivo – GECOPA 2014 do Comitê Gestor instituído para definir, aprovar e supervisionar as ações previstas no Plano Estratégico das Ações do Governo Brasileiro para a realização da Copa do Mundo FIFA 2014 – CGCOPA 2014, restringindo-se, no caso de obras públicas, às constantes da matriz de responsabilidades celebrada entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios; c) de obras de infraestrutura e de contratação de serviços para os aeroportos das capitais dos Estados da Federação distantes até 350 km das cidades sedes dos mundiais referidos nos incisos I e II; d) das ações integrantes do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC (incluído pela Lei 12.688/2012); e) das obras e serviços de engenharia no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS (incluído pala Lei 12.745/2012); e f) das obras e serviços de engenharia para construção, ampliação e reforma de estabelecimentos penais e unidades de atendimento socioeducativo. (art. 1.º, § 3.º, da Lei 12.462/2011, incluído pala Lei 12.980/2014).132
Os objetivos do RDC encontram-se enumerados no art. 1.º, § 1.º, da Lei 12.462/2011: a) ampliação da eficiência nas contratações públicas e a competitividade entre os licitantes; b) promoção da troca de experiências e tecnologias em busca da melhor relação entre custos e benefícios para o setor público; c) fomento à inovação tecnológica; e d) garantia de tratamento isonômico entre os licitantes e a seleção da proposta mais vantajosa para a administração pública.
Como se pode perceber, trata-se de previsões que guardam compatibilidade com a tendência legislativa de implementar uma relação de sinergia na troca de experiências entre o poder público e a iniciativa privada na promoção de inovações tecnológicas, já veiculada tanto pelo regime instaurado pela Lei 12.349/2010, que estipulou o dever de a licitação fomentar o desenvolvimento nacional sustentável, como na Lei 10.973/2004, que dispõe sobre incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo.
A opção pela utilização do RDC deve constar, expressamente, do instrumento convocatório e resultará no afastamento das normas contidas na Lei 8.666/1993, exceto nos casos previstos nesta Lei (art. 1.º, § 2.º, da Lei 12.462/2011).133 Além disso, a licitação, no caso, deverá ser realizada, preferencialmente, sob a forma eletrônica (art. 13 do Decreto 7.581/2011).
Isto significa que, na omissão do instrumento convocatório, a licitação deverá observar as regras tradicionais de licitação. A utilização do RDC, portanto, depende de previsão expressa no instrumento convocatório, bem como de decisão administrativa devidamente motivada.
Em relação ao afastamento das regras previstas na Lei 8.666/1993, poder-se-ia cogitar de eventual inconstitucionalidade, sob o argumento de que as regras do RDC seriam específicas e deveriam respeitar as normas gerais de licitação.
Não nos parece haver qualquer vício de constitucionalidade neste ponto, tendo em vista os seguintes argumentos:
a) as normas gerais de licitações e contratos não são exclusividade da Lei 8.666/1993, existindo, atualmente, diversos exemplos de leis que consagram normas gerais, sem qualquer relação com aquele diploma legal (ex.: Lei 10.520/2002, que estabelece as normas gerais sobre o pregão);
b) existem precedentes do STF no sentido da viabilidade constitucional de instituição de normas gerais para determinados setores econômicos, com afastamento das normas da Lei 8.666/1993, como ocorreu, por exemplo, na confirmação da constitucionalidade do art. 210 da Lei 9.472/1997 (Lei Geral de Telecomunicações) que dispõe:
Art. 210. As concessões, permissões e autorizações de serviço de telecomunicações e de uso de radiofrequência e as respectivas licitações regem-se exclusivamente por esta Lei, a elas não se aplicando as Leis n.º 8.666, de 21 de junho de 1993, n.º 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, n.º 9.074, de 7 de julho de l995, e suas alterações; 134
c) da mesma forma, o STF já firmou a constitucionalidade do art. 67 da Lei 9.478/1997 e do Decreto 2.745/1998, que estipulam regras próprias de licitação para a PETROBRAS em detrimento das normas da Lei 8.666/1993.135
É possível concluir, desta forma, que o legislador poderia instituir novas normas gerais, sem qualquer relação de subordinação ou deferência com a Lei 8.666/1993.
Todavia, outra questão poderá ser suscitada: como suprir as eventuais lacunas apresentadas na Lei do RDC?
Em relação ao tema, o art. 1.º, § 2.º, da Lei 12.462/2011 dispõe que a Lei 8.666/1993 somente seria aplicável nos casos expressamente previstos na própria Lei do RDC.
Entendemos, contudo, que as omissões normativas devem ser superadas, especialmente pela necessidade de segurança jurídica e sistematicidade do ordenamento.
Não vislumbramos qualquer prejuízo na aplicação subsidiária da Lei 8.666/1993 ou de outros diplomas legais, nas situações de lacuna, ao RDC, desde que tais normas sejam compatíveis com aquelas previstas na Lei 12.462/2011.
Na hipótese de aquisição de bens e serviços comuns, o ideal, em caso de lacuna normativa, seria a aplicação subsidiária da legislação do pregão, modalidade de licitação disciplinada pela Lei 10.520/2002, em virtude de sua celeridade, mais compatível com a necessidade de viabilizar a contratação de bens e serviços comuns para a realização dos eventos desportivos que ocorrerão no País.
Os princípios que regem o RDC são essencialmente os mesmos aplicáveis às licitações em geral: legalidade, impessoalidade, moralidade, igualdade, publicidade, eficiência, probidade administrativa, economicidade, desenvolvimento nacional sustentável, vinculação ao instrumento convocatório e julgamento objetivo (art. 3.º da Lei 12.462/2011).
As diretrizes do RDC, conforme dispõe o art. 4.º da Lei 12.462/2011, alterado pela Lei 12.980/2014, podem ser assim enumeradas:
a) padronização do objeto da contratação relativamente às especificações técnicas e de desempenho e, quando for o caso, às condições de manutenção, assistência técnica e de garantia oferecidas;136
b) padronização de instrumentos convocatórios e minutas de contratos, previamente aprovados pelo órgão jurídico competente;137
c) busca da maior vantagem para a Administração Pública, considerando custos e benefícios, diretos e indiretos, de natureza econômica, social ou ambiental, inclusive os relativos à manutenção, ao desfazimento de bens e resíduos, ao índice de depreciação econômica e a outros fatores de igual relevância;
d) condições de aquisição, de seguros, de garantias e de pagamento compatíveis com as condições do setor privado, inclusive mediante pagamento de remuneração variável conforme desempenho, na forma do art. 10 da Lei;
e) utilização, sempre que possível, nas planilhas de custos constantes das propostas oferecidas pelos licitantes, de mão de obra, materiais, tecnologias e matérias-primas existentes no local da execução, conservação e operação do bem, serviço ou obra, desde que não se produzam prejuízos à eficiência na execução do respectivo objeto e que seja respeitado o limite do orçamento estimado para a contratação; e
f) parcelamento do objeto, visando à ampla participação de licitantes, sem perda de economia de escala.
São diretrizes que se encontram amparadas nos princípios da segurança jurídica (tanto no que tange à padronização dos objetos da contratação quanto dos instrumentos contratuais), da eficiência (no que se refere às variáveis de desempenho e de utilização das planilhas de custos dos licitantes) e da economicidade (na busca de maior retorno econômico para a Administração).
É possível perceber, ainda, que o RDC consagra a tendência da denominada “função regulatória da licitação”, segundo a qual a licitação não tem por objetivo apenas a busca pela economicidade nas contratações públicas, mas também a efetivação de outros valores constitucionais.138
Nesse sentido, a contratação por meio do RDC deve promover os seguintes valores:
a) preservação do meio ambiente (“licitações verdes”): preocupação com a disposição final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos gerados pelas obras contratadas; estipulação de condicionantes e compensação ambiental, que serão definidas no procedimento de licenciamento ambiental; utilização de produtos, equipamentos e serviços que, comprovadamente, reduzam o consumo de energia e recursos naturais; e possibilidade de exigência de requisitos de sustentabilidade ambiental para fins de habilitação na licitação (arts. 4.º, § 1.º, I, II, III, e 14, parágrafo único, II, da Lei 12.462/2011);139
b) respeito à ordem urbanística: as contratações devem ser precedidas de avaliação de impactos de vizinhança, na forma da legislação urbanística (art. 4.º, § 1.º, IV, da Lei 12.462/2011);
c) proteção do patrimônio cultural, histórico, arqueológico e imaterial, inclusive por meio da avaliação do impacto direto ou indireto causado pelas obras contratadas, com estipulação de medidas compensatórias aos impactos negativos sobre o referido patrimônio (art. 4.º, § 1.º, V, e § 2.º, da Lei 12.462/2011); e
d) promoção da acessibilidade para o uso por pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida (art. 4.º, § 1.º, VI, da Lei 12.462/2011).
Com base nessas perspectivas, pode-se afirmar que os instrumentos convocatórios formatados de acordo com normas do RDC regularão os mercados fornecedores de bens e serviços, de modo a adequá-los ao princípio do desenvolvimento sustentável, previsto no artigo 170, inciso VI, da CRFB, com redação modificada pela EC 42/2003.
O RDC estabelece regras próprias para aquisição de bens por parte da Administração, com destaque para as seguintes: a) possibilidade de indicação de marca por meio de decisão fundamentada; b) exigência da amostra do bem a ser adquirido; c) apresentação de certificação da qualidade do produto ou do processo de fabricação, inclusive sob o aspecto ambiental, por qualquer instituição oficial competente ou por entidade credenciada; e d) declaração do fabricante no sentido de ser solidariamente responsável pela execução do contrato, na hipótese em que o licitante for revendedor ou distribuidor (art. 7.º, I, da Lei 12.462/2011).
A indicação de marca na aquisição de bens por meio do RDC, acompanhada das respectivas justificativas, é admitida expressamente nas seguintes hipóteses: a) em decorrência da necessidade de padronização do objeto; b) quando determinada marca ou modelo comercializado por mais de um fornecedor for a única capaz de atender às necessidades da entidade contratante; ou c) quando a descrição do objeto a ser licitado puder ser melhor compreendida pela identificação de determinada marca ou modelo aptos a servir como referência, situação em que será obrigatório o acréscimo da expressão “ou similar ou de melhor qualidade” (art. 7.º, I, da Lei 12.462/2011).
É oportuno notar que, tradicionalmente, a indicação de marca é vedada, em regra, nas compras efetuadas pelo Poder Público (art. 15, § 7.º, I, da Lei 8.666/1993). Todavia, em situações excepcionais, devidamente justificadas, a indicação de marca sempre foi considerada viável, especialmente pela necessidade de padronização.
Em relação à aquisição de bens pela Administração, além da indicação de marca, é possível fixar exigência de amostra do bem no procedimento de pré-qualificação, na fase de julgamento das propostas ou de lances, desde que justificada a necessidade da sua apresentação (art. 7.º, I, da Lei 12.462/2011). Andou bem, neste particular, a referida norma ao não prever a exigência de amostras como requisito de habilitação, pois tal previsão, segundo o entendimento do TCU, impõe ônus excessivo aos licitantes, encarece o custo de participação em licitações e desestimula a presença de potenciais interessados.140
Na aquisição de bens, a Administração pode solicitar a apresentação pelos interessados de certificação da qualidade do produto ou do processo de fabricação, inclusive sob o aspecto ambiental, por qualquer instituição oficial competente ou por entidade credenciada (art. 7.º, III, da Lei 12.462/2011).
Ressalte-se que o TCU fixou entendimento de que a exigência de certificações técnicas (ex.: certificação ISO, registro no INPI etc.), tal como a exigência de amostras, não pode ser empregada como critério de habilitação em licitação, mas apenas como critério classificatório.141
Por fim, a Administração pode solicitar, motivadamente, a apresentação de carta de solidariedade emitida pelo fabricante, que assegure a execução do contrato, no caso de licitante revendedor ou distribuidor (art. 7.º, IV, da Lei 12.462/2011).
A exigência tem por objetivo garantir a execução do contrato e o atendimento do interesse público.
Vale lembrar que as aquisições de bens pelo Estado não são submetidas, em regra, ao CDC, uma vez que o Estado não é considerado, normalmente, consumidor, razão pela qual é afastada a solidariedade prevista nos arts. 12, 18, 19 e 25 do CDC.
Todavia, conforme já tivemos a oportunidade de mencionar em estudo sobre o tema,142 o Estado pode ser considerado consumidor em situações excepcionais, o que atrairia a responsabilidade solidária e objetiva de todos aqueles que participaram da cadeia de consumo, independentemente da “carta de solidariedade” prevista na Lei 12.462/2011.
Em virtude da possibilidade de existir vulnerabilidade técnica por parte dos agentes públicos em relação ao fornecedor do bem ou do serviço, o Estado pode ser considerado, em determinados casos, consumidor, na forma do art. 2.º do CDC.143
De qualquer forma, a partir da exigência da “carta de solidariedade” no RDC, o Estado assegura a solidariedade entre o fabricante e o revendedor/ distribuidor.144 Com isso, supera-se o óbice tradicionalmente apontado pelo TCU que era justamente a ausência de fundamento legal para exigência do referido compromisso de solidariedade.145
Outra importante inovação em relação à licitação tradicional é a previsão do regime de “contratação integrada” de obras e serviços de engenharia.
De acordo com o art. 8.º da Lei 12.462/2011, a execução indireta de obras e serviços de engenharia pode ser implementada por meio dos seguintes regimes: a) empreitada por preço unitário; b) empreitada por preço global; c) contratação por tarefa; d) empreitada integral; ou e) contratação integrada.
Os quatro primeiros regimes (empreitada por preço unitário, empreitada por preço global, contratação por tarefa e empreitada integral) já constavam do art. 10, II, da Lei 8.666/1993, havendo previsão de utilização, ainda, do quinto regime (contratação integrada) no RDC. O Poder Público deverá adotar, preferencialmente, os regimes de empreitada por preço global, de empreitada integral ou de contratação integrada, sendo certo que a utilização dos demais regimes dependerá de motivação (art. 8.º, §§ 1.º e 2.º, da Lei 12.462/2011).
A contratação integrada, que deve ser justificada sob o aspecto técnico e econômico, envolve a elaboração e o desenvolvimento dos projetos básico e executivo, a execução de obras e serviços de engenharia, a montagem, a realização de testes, a pré-operação e todas as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto. Ademais, o objeto da contratação integrada deve envolver, pelo menos, uma das seguintes condições: a) inovação tecnológica ou técnica; b) possibilidade de execução com diferentes metodologias; ou c) possibilidade de execução com tecnologias de domínio restrito no mercado (art. 9.º, caput e § 1.º, da Lei 12.462/2011, alterada pela Lei 12.980/2014). Trata-se de contratação na modalidade turn key ou EPC (Engineering, Procurement and Construction), similar ao que ocorre na empreitada integral, na qual o contratado fica obrigado a entregar a obra em condições de pleno funcionamento.
É possível constatar que uma das principais diferenças entre o regime de contratação integrada e os demais regimes é a desnecessidade de elaboração prévia do projeto básico devidamente aprovado pela autoridade competente. No caso da contratação integrada, o licitante vencedor será o responsável por sua elaboração (arts. 8.º, § 5.º, e 9.º, § 1.º, da Lei 12.462/2011).146
Isto não significa que o Poder Público não possui qualquer parâmetro para definir o objeto da contratação e fixar os critérios objetivos de julgamento.
É exigida a apresentação, no instrumento convocatório, do denominado “anteprojeto de engenharia”, que deverá conter as seguintes informações: a) a demonstração e a justificativa do programa de necessidades, a visão global dos investimentos e as definições quanto ao nível de serviço desejado; b) as condições de solidez, segurança, durabilidade e prazo de entrega; c) a estética do projeto arquitetônico; e d) os parâmetros de adequação ao interesse público, à economia na utilização, à facilidade na execução, aos impactos ambientais e à acessibilidade (art. 9.º, § 2.º, I, da Lei 12.462/2011).147 No caso de contratação integrada, é vedada a participação direta ou indireta nas licitações de pessoa física ou jurídica que elaborar o anteprojeto de engenharia (art. 3.º, § 1.º, II, do Decreto 7.581/2011).
A fixação do valor estimado da contratação será definida com apoio nos valores praticados pelo mercado, nos valores pagos pela Administração Pública em serviços e obras similares ou na avaliação do custo global da obra, aferida mediante orçamento sintético ou metodologia expedita ou paramétrica (art. 9.º, § 2.º, II, da Lei 12.462/2011, alterado pela Lei 12.980/2014).148
Aliás, as principais críticas direcionadas à contratação integrada residem justamente na eventual indefinição do objeto licitado e do valor orçado pela Administração.
Daí a importância dos atos praticados na fase interna da licitação, especialmente na definição técnica e com o máximo de objetividade, no anteprojeto de engenharia, do objeto a ser licitado.
No tocante ao tipo de licitação, a lei impõe que, na contratação integrada, seja adotado o critério de julgamento de técnica e preço (art. 9.º, § 2.º, III, da Lei 12.462/2011).
Interessante mencionar que o Decreto 7.581/2011, que regulamenta o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), de que trata a Lei 12.462/2011, com o objetivo de implementar o controle acerca do cumprimento dos requisitos presentes no termo de engenharia no âmbito das contratações integradas, prevê, em seu art. 70, § 4.º, a vinculação entre a remuneração do contratado à observância dos requisitos técnicos previstos nesses instrumentos.
É vedada a celebração de termos aditivos aos contratos celebrados com fundamento no RDC, salvo em duas hipóteses: a) para recomposição do equilíbrio econômico-financeiro decorrente de caso fortuito ou força maior; e b) por necessidade de alteração do projeto ou das especificações para melhor adequação técnica aos objetivos da contratação, a pedido da administração pública, desde que não decorrentes de erros ou omissões por parte do contratado, observados os limites previstos no § 1.º do art. 65 da Lei 8.666/1993 (art. 9.º, § 4.º, da Lei 12.462/2011).
É importante mencionar que a “contratação integrada” não é, verdadeiramente, uma grande novidade no ordenamento jurídico pátrio.
Não obstante a ausência de previsão na legislação tradicional de licitações, o referido regime encontra-se previsto no item 1.9 do Decreto 2.745/1998, que aprova o Regulamento do Procedimento Licitatório Simplificado da PETROBRAS, que dispõe:
1.9 Sempre que economicamente recomendável, a PETROBRAS poderá utilizar-se da contratação integrada, compreendendo realização de projeto básico e/ou detalhamento, realização de obras e serviços, montagem, execução de testes, pré-operação e todas as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto, com a solidez e segurança especificadas.
Não resta dúvida de que esse formato trará ganhos de eficiência para as contratações administrativas, uma vez que abre ao contratado a oportunidade de inovação e de proposição de técnicas e soluções para o desenvolvimento do objeto, reduzindo riscos e custos para os entes públicos.
Em virtude da necessidade de maior eficiência nas contratações públicas, com ênfase nos resultados, que devem ser efetivados pelos contratados, o legislador estabeleceu a possibilidade de remuneração variável, na contratação das obras e serviços, vinculada ao desempenho da contratada, com base em metas, padrões de qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega definidos no instrumento convocatório e no contrato (art. 10 da Lei 12.462/2011).
A estipulação da remuneração variável dependerá de motivação e de adequação aos limites orçamentários fixados pela Administração para a contratação (art. 10, parágrafo único, da Lei 12.462/2011).
A previsão de metas na execução de atividades de interesse do Estado representa uma tendência do Direito Administrativo atual, voltado para a busca de resultados eficientes, mormente a satisfação dos interesses constitucionalmente tutelados. No cenário da “Administração de Resultados”,149 os instrumentos jurídicos que flexibilizam a gestão administrativa representam uma importante ferramenta para garantir a eficiência administrativa.
A remuneração variável, prevista no RDC, foi influenciada pela experiência consagrada nas Parcerias Público-Privadas (PPPs). Nesse sentido, o art. 6.º, parágrafo único, da Lei 11.079/2004 dispõe que o contrato de PPP poderá prever o pagamento ao parceiro privado de remuneração variável vinculada ao seu desempenho, conforme metas e padrões de qualidade e disponibilidade definidos no contrato.
Trata-se, a rigor, de transformar os tradicionais contratos por prazo determinado e por escopo da Lei 8.666/1993 em contratos de performance.150
Não se trata, a rigor, de uma sanção por inexecução contratual, mas de um estímulo para o seu melhor cumprimento. A remuneração a ser efetuada pela Administração Contratante fica vinculada ao desempenho do contratado, o que servirá de incentivo para que estes prestem, em níveis desejados de qualidade, os serviços relacionados à infraestrutura que dará suporte aos eventos desportivos que serão realizados no País.
Da mesma forma, em âmbito federal, a Instrução Normativa 02/2008 do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão prevê o denominado “Acordo de Níveis de Serviços” com a estipulação de remuneração variável de acordo com o cumprimento das metas fixadas pela Administração.151
O procedimento de licitação do RDC, seguindo a tendência legislativa e as recomendações doutrinárias, consagra a inversão de fases da habilitação e de julgamento (art. 12, IV e V, da Lei 12.462/2011).
Em regra, a fase de julgamento antecederá a fase de habilitação, o que acarreta, por certo, maior celeridade à licitação, uma vez que a Administração, após o julgamento, analisará apenas os documentos formais de habilitação do licitante vencedor.
Excepcionalmente, a habilitação poderá anteceder a fase do julgamento, hipótese que dependerá de expressa previsão no instrumento convocatório e de motivação (art. 12, parágrafo único, da Lei 12.462/2011).
Trata-se, como já assinalado, de tendência da legislação atual que já havia consagrado a inversão da ordem das fases de habilitação e julgamento, por exemplo, para o pregão (art. 4.º, XII, da Lei 10.520/2002 – inversão obrigatória) e para as PPPs (art. 13 da Lei 11.079/2004 – inversão facultativa).
Essa tendência legislativa tem se mostrado salutar na gestão dos procedimentos licitatórios.152 Afinal, o dispêndio de tempo e recursos para o exame dos requisitos de habilitação de um licitante que, ao final do certame, não apresentará a melhor proposta à Administração Púbica vai de encontro às diretrizes emanadas dos princípios da Eficiência (art. 37 da CRFB) e da Economicidade (art. 70 da CRFB).153
Destaque-se que esta inovação legislativa trazida pelo RDC, diferentemente da sua previsão nos demais instrumentos legislativos que o antecederam, prevê uma lógica diversa para essa inversão procedimental.
Há, à luz do sistema consagrado no RDC, o dever de motivação para o administrador público, caso este pretenda adotar o sistema convencional de exame dos documentos de habilitação antes da abertura das propostas, além da necessidade de previsão expressa desta opção no instrumento convocatório.
Esses requisitos criam um ônus para o gestor público, caso opte pela adoção do procedimento convencional consagrado na Lei 8.666/1993. Entende-se como salutar a referida inovação legislativa, uma vez que, se, por um lado, essa faculdade permite que, excepcionalmente, seja utilizado o procedimento convencional, de modo a melhor atender, em concreto, o interesse público, de outro, dificulta que o administrador adote, injustificadamente, procedimentos ineficientes e burocráticos que militam em desfavor de parâmetros mundialmente consagrados de eficiência nas contratações administrativas.
Nas contratações com a utilização do RDC, a publicidade dos atos praticados é restringida em duas hipóteses: a) orçamento estimado para a contratação não será divulgado aos licitantes (art. 6.º da Lei 12.462/2011); e b) o procedimento licitatório e de pré-qualificação, em determinados casos, serão divulgados apenas em sítio eletrônico oficial centralizado de divulgação de licitações ou mantido pelo ente encarregado do procedimento licitatório na rede mundial de computadores (art. 15, § 2.º, da Lei 12.462/2011).
Em relação ao orçamento sigiloso, trata-se de regra distinta daquela consagrada no art. 40, § 2.º, II, da Lei 8.666/1993, que exige a apresentação, no anexo do edital de licitação, do orçamento estimado em planilhas de quantitativos e preços unitários.154
A necessidade de modificação da regra tradicional de licitação, com a previsão do orçamento sigiloso, sempre foi defendida por parcela da doutrina, especialmente para evitar que a divulgação do orçamento influenciasse a elevação dos valores constantes das propostas e a formação de cartel entre os licitantes, dado que, sem a ciência do preço estimado pela Administração, fica mais difícil de fazer combinações entre concorrentes.
Nesse sentido, por exemplo, Marcos Juruena Villela Souto, antes da introdução do RDC, sustentava:
Outro tema dos mais polêmicos diz respeito à necessidade de divulgar ou não a estimativa de preços em que se calca a Administração para realizar ou não a despesa. [...]
Ocorre que, se divulgados esses valores, reduz-se em muito a margem de competição, retornando aos mesmos problemas que levaram à supressão da licitação por preço-base, que era o grande número de empates.
Logo, é preciso interpretar a norma também de acordo com o método histórico, além de utilização do princípio da competitividade.
Destarte, para evitar tais problemas, não deve haver publicação de valores, adotando como critério de aceitabilidade a ser divulgado no edital “os valores mínimos e máximos constantes dos cadastros de preços da Administração, calcados em pesquisas de mercado e em contratos da Administração, os quais estarão disponíveis para fins de recurso em caso de desclassificação por eventual incompatibilidade”; é possível, também, esclarecer que tal disponibilidade da estimativa dar-se-á na sessão de julgamento.155
Esta também é a recomendação da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), contida no Guidelines for fighting bid rigging in public procurement (Diretrizes para combater o conluio entre concorrentes em contratações públicas):
Use um preço máximo somente quando ele for baseado em minuciosa pesquisa de mercado e os funcionários estejam convencidos de que ele é muito competitivo. Não publique o preço, mas o mantenha confidencial, em arquivo, ou o deposite junto a outra autoridade pública.156
Da mesma forma, o TCU já decidiu que admitiu a restrição da divulgação do orçamento da licitação na modalidade pregão, conforme demonstra o trecho da ementa a seguir mencionado:
Na licitação na modalidade pregão, o orçamento estimado em planilhas de quantitativos e preços unitários não constitui um dos elementos obrigatórios do edital, devendo estar inserido obrigatoriamente no bojo do processo relativo ao certame. Ficará a critério do gestor, no caso concreto, a avaliação da oportunidade e conveniência de incluir esse orçamento no edital ou de informar, no ato convocatório, a sua disponibilidade aos interessados e os meios para obtê-lo.157
Em suma: no RDC exige-se a fixação do orçamento estimado para contratação, restringindo-se apenas a sua divulgação aos licitantes. Com o intuito de evitar eventuais arbitrariedades, o orçamento deverá ser disponibilizado permanentemente aos órgãos de controle externo e interno, na forma do art. 6.º, § 3.º, da Lei 12.462/2011.
Quanto à segunda hipótese de restrição da publicidade no RDC, nos procedimentos licitatórios e de pré-qualificação, nas licitações cujo valor não ultrapasse R$ 150.000,00 para obras ou R$ 80.000,00 para bens e serviços, inclusive de engenharia, é dispensada a publicação de extrato do edital no Diário Oficial ou em jornal diário de grande circulação.
Nessas hipóteses, a publicidade do edital se resume à divulgação em sítio eletrônico oficial centralizado de divulgação de licitações ou mantido pelo ente encarregado do procedimento licitatório na rede mundial de computadores (art. 15, § 2.º, da Lei 12.462/2011).
Entendemos, contudo, que a restrição à publicidade dos editais, apesar de ganhos de economicidade, coloca em risco o princípio da impessoalidade e a possibilidade de controle social dos atos do Poder Público, posto que o Brasil ainda sofre do problema da “exclusão digital”, sendo certo que grande parte da população não tem acesso aos computadores e/ou à internet.
Não se defende, aqui, a tese ingênua e irreal de que a publicação nos Diários Oficiais confere efetiva publicidade aos atos do Poder Público. No máximo, este procedimento garante a “publicidade formal”, mas não a “publicidade material”, uma vez que a imensa maioria da população não tem acesso ou o hábito (ou tempo) de ler o Diário Oficial.
Por esta razão, entendemos que a publicidade do edital deve ser a mais ampla possível, evitando-se restrições que diminuam a competitividade e a efetivação do controle social. Talvez, no futuro, com a inserção da população no mundo digital, a publicidade por meio da internet seja suficiente para efetivação das mencionadas finalidades.
No RDC, as licitações podem adotar os modos de disputa aberto e fechado, que poderão ser combinados na forma do regulamento (art. 16 da Lei 12.462/2011).
Ressalte-se que a combinação de lances escritos e verbais foi consagrada em algumas normas recentes, por exemplo, as relativas ao pregão (art. 4.º, VII e VIII, da Lei 10.520/2002) e às PPPs (art. 12, III, “b”, da Lei 11.079/2004).
A inovação no RDC é a possibilidade de apresentação de “lances intermediários” na disputa aberta, assim considerados aqueles iguais ou inferiores ao maior já ofertado, quando adotado o julgamento pelo critério da maior oferta, ou iguais ou superiores ao menor já ofertado, quando adotados os demais critérios de julgamento (art. 17, § 2.º, da Lei 12.462/2011).
Por fim, é admitido, na forma a ser estabelecida em regulamento, o reinício da disputa aberta, após a definição da melhor proposta e para a definição das demais colocações, sempre que existir uma diferença de pelo menos 10% entre o melhor lance e o do licitante subsequente (art. 17, § 1.º, II, da Lei 12.462/2011).
As licitações no RDC serão pautadas pelos seguintes critérios de julgamento: a) menor preço ou maior desconto; b) técnica e preço; c) melhor técnica ou conteúdo artístico; d) maior oferta de preço; ou e) maior retorno econômico (art. 18 da Lei 12.462/2011).
O critério de julgamento e os respectivos parâmetros objetivos deverão ser definidos no instrumento convocatório, desconsiderando as vantagens não previstas no edital, inclusive financiamentos subsidiados ou a fundo perdido (art. 18, §§ 1.º, 2.º e 3.º, da Lei 12.462/2011).
Na utilização do critério “menor preço ou maior desconto” será considerado o menor dispêndio para a administração pública, incluindo os custos indiretos, quando objetivamente mensuráveis, observados os parâmetros mínimos de qualidade definidos no instrumento convocatório (art. 19, caput e § 1.º, da Lei 12.462/2011).
O critério do maior desconto terá como referência o preço global fixado no instrumento convocatório, sendo o desconto estendido aos eventuais termos aditivos, e, no caso de obras ou serviços de engenharia, o percentual de desconto apresentado pelos licitantes deverá incidir linearmente sobre os preços de todos os itens do orçamento estimado constante do instrumento convocatório (art. 19, §§ 2.º e 3.º, da Lei 12.462/2011).
Em relação ao critério “técnica e preço”, a sua utilização é indicada para as seguintes contratações: a) objeto de natureza predominantemente intelectual e de inovação tecnológica ou técnica; ou b) que possam ser executados com diferentes metodologias ou tecnologias de domínio restrito no mercado, pontuando-se as vantagens e qualidades eventualmente oferecidas para cada produto ou solução (art. 20, § 1.º, da Lei 12.462/2011).
O Poder Público indicará no instrumento convocatório os fatores de ponderação distintos para valorar as propostas técnicas e de preço, sendo o percentual de ponderação mais relevante limitado a 70%, conforme dispõe o art. 20, § 2.º, da Lei 12.462/2011.
Quanto ao critério “melhor técnica ou conteúdo artístico”, que poderá ser utilizado para a contratação de projetos, inclusive arquitetônicos, e trabalhos de natureza técnica, científica ou artística, excluindo-se os projetos de engenharia, o instrumento convocatório definirá o prêmio ou a remuneração que será atribuída aos vencedores (art. 21, caput e parágrafo único, da Lei 12.462/2011).
O critério “maior oferta de preço”, por sua vez, será utilizado no caso de contratos que resultem em receita para a administração pública, admitindo-se a dispensa de comprovação de qualificação técnica e econômico-financeira, conforme dispuser o regulamento (art. 22, caput e § 1.º, da Lei 12.462/2011).
Da mesma forma, no julgamento pela maior oferta de preço, o Poder Público poderá exigir a comprovação do recolhimento de quantia a título de garantia, como requisito de habilitação, limitada a 5% do valor ofertado. Nesse caso, o mencionado valor será perdido em favor da Administração se o licitante vencedor não efetivar o pagamento no prazo estipulado (art. 22, §§ 2.º e 3.º, da Lei 12.462/2011).
Por fim, o critério “maior retorno econômico” será utilizado exclusivamente nos “contratos de eficiência”, e o objetivo é selecionar a proposta que proporcione a maior economia para a Administração decorrente da execução do contrato (art. 23 da Lei 12.462/2011).
Considera-se contrato de eficiência aquele que tem por objeto a prestação de serviços, que pode incluir a realização de obras e o fornecimento de bens, com o objetivo de proporcionar economia ao contratante, na forma de redução de despesas correntes, sendo o contratado remunerado com base em percentual da economia gerada (art. 23, § 1.º, da Lei 12.462/2011).
No contrato de eficiência, os riscos são assumidos pelo contratado e influenciam diretamente na respectiva remuneração, uma vez que a ausência da economia prevista contratualmente acarretará as seguintes consequências: a) a diferença entre a economia contratada e a efetivamente obtida será descontada da remuneração da contratada; b) se a diferença entre a economia contratada e a efetivamente obtida for superior à remuneração da contratada, será aplicada multa por inexecução contratual no valor da diferença; e c) a contratada sujeitar-se-á, ainda, a outras sanções cabíveis caso a diferença entre a economia contratada e a efetivamente obtida seja superior ao limite máximo estabelecido no contrato (art. 23, § 3.º, da Lei 12.462/2011).
Tradicionalmente, o critério utilizado para desempate entre duas ou mais propostas nas licitações é o sorteio (art. 45 § 2.º, da Lei 8.666/1993).
No entanto, em relação às licitações submetidas ao regime do RDC, a legislação procurou estabelecer outros critérios de desempate, que devem ser adotados preferencialmente, tendo em vista a necessidade de se ampliar a competitividade entre os licitantes, garantindo a obtenção da melhor proposta.
Nesse sentido, o art. 25 da Lei 12.462/2011 dispõe que, em caso de empate entre duas ou mais propostas, serão utilizados os seguintes critérios de desempate, nesta ordem: a) disputa final, em que os licitantes empatados poderão apresentar nova proposta fechada em ato contínuo à classificação; b) avaliação do desempenho contratual prévio dos licitantes, desde que exista sistema objetivo de avaliação instituído (Administração Pública de Resultados); c) critérios de preferência para os seguintes bens e serviços: produzidos no País, produzidos ou prestados por empresas brasileiras com tecnologia desenvolvida no País, produzidos ou prestados por empresas que invistam em pesquisa e no desenvolvimento de tecnologia no País ou produzidos de acordo com processo produtivo básico (art. 3.º, § 2.º, da Lei 8.666/1993 c/c o art. 3.º da Lei 8.248/1991); e d) sorteio.
As licitações no RDC poderão ser antecedidas da pré-qualificação permanente que tem por objetivo identificar: a) fornecedores que reúnam condições de habilitação exigidas para o fornecimento de bem ou a execução de serviço ou obra nos prazos, locais e condições previamente estabelecidos; e b) bens que atendam às exigências técnicas e de qualidade da administração pública (art. 30 da Lei 12.462/2011).
O procedimento de pré-qualificação ficará permanentemente aberto para a inscrição dos eventuais interessados (art. 30, § 1.º, da Lei 12.462/2011).
É permitida a realização de licitações direcionadas à participação exclusiva dos pré-qualificados, nas condições estabelecidas em regulamento (art. 30, § 2.º, da Lei 12.462/2011).
As condições para realização de licitação restrita aos pré-qualificados encontram-se enumeradas no art. 86 do Decreto 7.581/2011, quais sejam: a) a convocação para a pré-qualificação deve estabelecer que as futuras licitações serão restritas aos pré-qualificados; b) a referida convocação deve apontar a estimativa de quantitativos mínimos que a Administração Pública pretende adquirir ou contratar nos próximos doze meses, bem como os prazos para publicação do edital; e c) a pré-qualificação deve ser total, contendo todos os requisitos de habilitação técnica necessários à contratação.
Nas licitações destinadas aos pré-qualificados, somente será permitida a participação de licitantes que, na data da publicação do respectivo instrumento convocatório, preencherem dois requisitos (art. 86, § 2.º, do Decreto 7.581/2011): a) já tenham apresentado a documentação exigida para a pré-qualificação, ainda que o pedido de pré-qualificação seja deferido posteriormente; e b) estejam regularmente cadastrados.
Ademais, nas licitações restritas, a Administração enviará convite por meio eletrônico a todos os pré-qualificados no respectivo segmento, além de garantir a publicidade do instrumento convocatório (art. 86, §§ 3.º e 4.º, do Decreto 7.581/2011).
A pré-qualificação, que terá validade de até um ano, poderá ser efetuada nos grupos ou segmentos, segundo as especialidades dos fornecedores, bem como poderá ser parcial ou total, contendo alguns ou todos os requisitos de habilitação ou técnicos necessários à contratação, assegurada, em qualquer hipótese, a igualdade de condições entre os concorrentes (art. 30, §§ 3.º, 4.º e 5.º, da Lei 12.462/2011).
Mencione-se, por oportuno, que a pré-qualificação também é permitida nas licitações reguladas pela Lei 8.666/1993, restringindo-se a sua utilização, no entanto, às concorrências quando o objeto da licitação recomendar análise mais detida da qualificação técnica dos interessados (art. 114 da Lei 8.666/1993).
É oportuno o registro de que a pré-qualificação nas licitações tem por objetivo identificar interessados em uma futura competição, não representando, pois, a competição em si ou mesmo uma etapa de habilitação, que define o universo de competidores.158
Em outras palavras, a pré-qualificação fixa um direito de participação na licitação em favor dos que foram nela identificados, definindo-se um padrão de qualidade mínima a ser atendida na competição a ser realizada.
Daí a vantagem de se introduzir este procedimento de forma permanente, pois a Administração, ao mesmo tempo em que já estipula standards para suas futuras contratações, o faz sem a necessidade de identificação dos recursos orçamentários que financiarão tal ou qual empreendimento.159
A habilitação no RDC, assim como ocorre nas licitações tradicionais, poderá ser comprovada por meio de certificados cadastrais.
Os registros cadastrais, quando existentes, serão válidos por até um ano e ficarão permanentemente abertos para a inscrição de interessados (art. 31, caput e § 1.º, da Lei 12.462/2011).
A inovação, em relação às licitações tradicionais, é a anotação do desempenho contratual do licitante no respectivo registro cadastral. A intenção do legislador é incrementar as informações constantes do registro para que passe a ser utilizado como fonte de consulta para as futuras contratações.
No RDC, o Sistema de Registro de Preços (SRP/RDC) observará as seguintes condições (art. 32, § 2.º, da Lei 12.462/2011): a) efetivação prévia de ampla pesquisa de mercado; b) seleção de acordo com os procedimentos previstos em regulamento; c) desenvolvimento obrigatório de rotina de controle e atualização periódicos dos preços registrados; d) definição da validade do registro (a ata de registro de preço tem prazo de validade entre três meses e um ano, na forma do art. 99, parágrafo único, do Decreto 7.581/2011); e e) inclusão, na respectiva ata, do registro dos licitantes que aceitarem cotar os bens ou serviços com preços iguais ao do licitante vencedor na sequência da classificação do certame, assim como dos licitantes que mantiverem suas propostas originais.
Na forma do art. 89 do Decreto 7.581/2011. O SRP/RDC poderá ser adotado nas seguintes hipóteses: a) quando, pelas características do bem ou serviço, houver necessidade de contratações frequentes; b) quando for mais conveniente a aquisição de bens com previsão de entregas parceladas ou contratação de serviços remunerados por unidade de medida ou em regime de tarefa; c) quando for conveniente a aquisição de bens ou a contratação de serviços para atendimento a mais de um órgão ou entidade, ou a programas de governo; e d) quando, pela natureza do objeto, não for possível definir previamente o quantitativo a ser demandado pela Administração.
O critério de julgamento na licitação para o registro de preços é o menor preço, o maior desconto ou técnica e preço, sendo admitida, após o encerramento da etapa competitiva, a redução de preços das propostas dos licitantes ao valor igual ao da proposta do licitante melhor classificado. Quando houver a apresentação de novas propostas, sem que haja prejuízo para o licitante melhor classificado, os preços serão registrados nesta ordem: a) os preços e quantitativos do licitante melhor classificado durante a etapa competitiva; b) os preços e quantitativos dos licitantes que, após novas propostas, aceitaram cotar seus bens ou serviços em valor igual ao do licitante melhor classificado; e c) os preços e quantitativos dos demais licitantes classificados, conforme a ordem de classificação (arts. 90, II, 97 e 98 do Decreto 7.581/2011, alterado pelo Decreto 8.251/2014).
Não é exigida a indicação orçamentária para realização do registro de preços, mas apenas para a formalização do contrato ou instrumento equivalente (art. 91 do Decreto 7.581/2011).
Os contratos decorrentes do SRP/RDC poderão ser alterados, mas sofrerão acréscimo de quantitativos (art. 100, §§ 1.º e 2.º, do Decreto 7.581/2011).
A existência do SRP não obriga a Administração a firmar os contratos que deles poderão advir, sendo facultada a realização de licitação específica, assegurada ao licitante registrado preferência em igualdade de condições (art. 32, § 3.º, da Lei 12.462/2011 e art. 101, caput e parágrafo único, do Decreto 7.581/2011).
O art. 102 do Decreto 7.581/2011 admite o efeito carona no SRP/RDC, ou seja, a adesão à ata de registro de preços, dentro do prazo de vigência, por órgão ou entidade que não tenha participado da licitação. A participação dos órgãos e entidades aderentes (“caronas”), nesse caso, deve respeitar as seguintes condições: a) não poderão contratar quantidade superior à soma das estimativas de demanda dos órgãos gerenciador e participantes (§ 2.º); b) a quantidade global de bens ou serviços que poderão ser contratados pelos órgãos aderentes não poderá ser superior a cinco vezes a quantidade prevista para cada item (§ 3.º); c) os fornecedores registrados, por sua vez, não serão obrigados a contratar com órgãos aderentes (§ 4.º).
Quanto ao efeito carona entre Entes Federados diversos, o art. 106 do Decreto 7.581/2011 veda a participação de órgãos e entidades federais nas atas de registros de preços elaboradas por Estados, DF e Municípios, ressalvada a possibilidade de adesão da Autoridade Pública Olímpica (APO) às atas gerenciadas pelos respectivos consorciados.160
Por outro lado, é permitida a adesão de órgãos e entidades estaduais, distritais e municipais à ata de registro de preço gerenciada pela Administração federal (art. 106, parágrafo único, do Decreto 7.581/2011).
O denominado “catálogo eletrônico de padronização de compras, serviços e obras” no RDC consiste em sistema informatizado, de gerenciamento centralizado, destinado a permitir a padronização dos itens a serem adquiridos pela administração pública que estarão disponíveis para a realização de licitação (art. 33 da Lei 12.462/2011).
O referido catálogo poderá ser utilizado em licitações cujo critério de julgamento seja a oferta de menor preço ou de maior desconto, e conterá toda a documentação e procedimentos da fase interna da licitação, assim como as especificações dos respectivos objetos, conforme disposto em regulamento (art. 33, parágrafo único, da Lei 12.462/2011).
O art. 45 da Lei 12.462/2011 trata dos pedidos de esclarecimento/impugnações, dos recursos administrativos e das representações nas licitações promovidas pelo RDC.
De acordo com a sobredita norma, o sistema genérico de impugnações pode ser assim resumido:
a) pedidos de esclarecimento e impugnações ao instrumento convocatório no prazo mínimo de: a.1) até dois dias úteis antes da data de abertura das propostas, no caso de licitação para aquisição ou alienação de bens; ou a.2) até cinco dias úteis antes da data de abertura das propostas, no caso de licitação para contratação de obras ou serviços;
b) recursos, no prazo de cinco dias úteis contados a partir da data da intimação ou da lavratura da ata, em face: b.1) do ato que defira ou indefira pedido de pré-qualificação de interessados; b.2) do ato de habilitação ou inabilitação de licitante; b.3) do julgamento das propostas; b.4) da anulação ou revogação da licitação; b.5) do indeferimento do pedido de inscrição em registro cadastral, sua alteração ou cancelamento; b.6) da rescisão do contrato, nas hipóteses previstas no inciso I do art. 79 da Lei 8.666/1993; b.7) da aplicação das penas de advertência, multa, declaração de inidoneidade, suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a administração pública; e
c) representações, no prazo de cinco dias úteis contados a partir da data da intimação, relativamente a atos de que não caiba recurso hierárquico.
Vale ressaltar que, nas licitações tradicionais, os recursos administrativos interpostos contra decisões de habilitação/inabilitação do licitante e de julgamento das propostas possuem efeito suspensivo, podendo a autoridade competente, motivadamente e presentes razões de interesse público, atribuir eficácia suspensiva aos demais recursos.
No entanto, a legislação do RDC silenciou a respeito do efeito suspensivo, valendo, portanto, a regra de que os recursos serão recebidos exclusivamente com efeito devolutivo.
Por fim, o recurso será dirigido à autoridade superior, por intermédio da autoridade que praticou o ato recorrido, cabendo a esta reconsiderar sua decisão no prazo de cinco dias úteis ou, nesse mesmo prazo, fazê-lo subir, devidamente informado, devendo, neste caso, a decisão do recurso ser proferida dentro do prazo de cinco dias úteis, contados do seu recebimento, sob pena de apuração de responsabilidade (art. 45, § 6.º, da Lei 12.462/2011).
Além das sanções previstas na Lei 8.666/1993, o art. 47 da Lei 12.462/2011 estabelece o impedimento de participação em licitações e contratações promovidas pela União, Estados, Distrito Federal ou Municípios, pelo prazo de até cinco anos, sem prejuízo das multas previstas no instrumento convocatório e no contrato, bem como das demais cominações legais, o licitante que: a) convocado dentro do prazo de validade da sua proposta não celebrar o contrato; b) deixar de entregar a documentação exigida para o certame ou apresentar documento falso; c) ensejar o retardamento da execução ou da entrega do objeto da licitação sem motivo justificado; d) não mantiver a proposta, salvo se, em decorrência de fato superveniente, devidamente justificado; e) fraudar a licitação ou praticar atos fraudulentos na execução do contrato; f) comportar-se de modo inidôneo ou cometer fraude fiscal; ou g) der causa à inexecução total ou parcial do contrato.
Ademais, a referida sanção administrativa acarretará o descredenciamento do licitante, pelo prazo de até cinco anos, dos sistemas de cadastramento dos entes federativos que compõem a Autoridade Pública Olímpica (APO).161
Deve-se registrar que andou bem o legislador nesse ponto, uma vez que, ao estipular as condutas que ensejam a aplicação da penalidade de impedimento de contratar com o poder público, restringiu a discricionariedade do administrador em aplicar penalidades administrativas, o que evita a prática de arbitrariedades no gerenciamento de contratos administrativos, previsão que encontra amparo nos alicerces de um Estado Democrático de Direito.
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1 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 9. ed. São Paulo: Dialética, 2002. p. 303-305; CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 22. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 236-237.
2 SOUTO, Marcos Juruena Villela. Igualdade e competitividade em face de participação de cooperativas nas licitações. Direito administrativo em debate. 2.ª série. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 309-322; PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Comentários à lei das licitações e contratações da administração pública. 7. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p. 175-178.
3 Nesse sentido: STJ, REsp 1.141.763/RS, 2.ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ 04.03.2010 (Informativo de Jurisprudência do STJ n. 424); STJ, REsp 1.185.638//RS, 2.ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 10.09.2010.
4 Enunciado 331 do TST: “I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei 6.019, de 03.01.1974). II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988). III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta. IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial. V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada. VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.” O referido enunciado foi alterado após a decisão do STF proferida no julgamento da ADC 16/DF (Informativo de Jurisprudência do STF n. 610).
5 Ressalte-se que o TCU considerou constitucional o tratamento diferenciado consagrado por estes diplomas normativos às microempresas e às empresas de pequeno porte (TCU, Plenário, Acórdão 1231/08, Rel. Min. Guilherme Palmeira, DOU 30.06.2008).
6 De acordo com o TCU: “É indevida, em avaliação inicial, a concessão do benefício estipulado no art. 44 da Lei Complementar 123/2006 a consórcio de empresas cuja soma dos faturamentos anuais extrapole o limite previsto no art. 3.º, inciso II, dessa lei.” TCU, Comunicação de Cautelar, TC-042.183/2012-0, Rel. Min. José Jorge, 21.11.2012 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 133).
7 Da mesma forma, o art. 4.º do Decreto 6.204/2007 dispõe: “A comprovação de regularidade fiscal das microempresas e empresas de pequeno porte somente será exigida para efeito de contratação, e não como condição para participação na licitação”. Nesse sentido: TCU, Acórdão 976/12, Plenário, Rel. Min. José Jorge, 25.04.2012 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 103).
8 Antes da alteração promovida pela LC 147/2014, o prazo para regularização da documentação era de dois dias úteis. Registre-se que o art. 43, § 1.º, da LC 123/2006, alterado pela LC 147/2014, conferiu discricionariedade ao administrador para prorrogar esse prazo (“prorrogável por igual período, a critério da Administração Pública”). No entanto, o art. 4.º, § 3.º, do Decreto 6.204/2007 garante o direito à prorrogação, salvo se houver urgência na contratação ou prazo insuficiente para o empenho, devidamente justificados.
9 Nesse sentido: JUSTEN FILHO, Marçal. O estatuto da microempresa e as licitações públicas. São Paulo: Dialética, 2007. p. 69; GARCIA, Flavio Amaral. As microempresas e as empresas de pequeno porte nas licitações públicas – aspectos polêmicos. Licitações e contratos administrativos. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 86. Em sentido contrário, admitindo o empate ficto nos tipos de licitação “melhor técnica” e “técnica e preço”: FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Licitações e o novo estatuto da pequena e microempresa: reflexos práticos da LC n.º 123/06. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 37.
10 Sobre o valor, a Orientação Normativa/AGU 10 dispõe: “A definição do valor da contratação levará em conta o período de vigência do contrato e as possíveis prorrogações para: (...) a) a realização de licitação exclusiva (microempresa, empresa de pequeno porte e sociedade cooperativa) (...)”. Mencione-se, ainda, a Orientação Normativa/AGU 47: “Em licitação dividida em itens ou lotes/ grupos, deverá ser adotada a participação exclusiva de microempresa, empresa de pequeno porte ou sociedade cooperativa (art. 34 da Lei n.º 11.488, de 2007) em relação aos itens ou lotes/grupos cujo valor seja igual ou inferior a R$ 80.000,00 (oitenta mil reais), desde que não haja a subsunção a quaisquer das situações previstas pelo art. 9.º do Decreto n.º 6.204, de 2007”.
11 Nesse sentido: MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Eficácia nas licitações e contratos. 12. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2011. p. 999; SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Edgar. Licitações e o novo estatuto da pequena e microempresa: reflexos práticos da LC n.º 123/06. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p. 128.
12 Em abono à nossa tese, o TCU decidiu: “O fato de a empresa estar excluída do regime de tributação do Simples Nacional por realizar cessão ou locação de mão de obra (art. 17, inciso XII, da Lei Complementar 123/2006) não implica o seu impedimento para participar de certames licitatórios auferindo os benefícios da referida lei complementar, pois o que confere a condição de micro ou empresa de pequeno porte é a receita bruta obtida em cada ano-calendário, e não o regime de tributação”. TCU, Plenário, Acórdão 1.100/14, Rel. Min. Benjamin Zymler, 30.04.2014 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 195).
13 Decreto 6.204/2007: “Art. 11. Para fins do disposto neste Decreto, o enquadramento como microempresa ou empresa de pequeno porte dar-se-á nas condições do Estatuto Nacional da Microempresa e Empresa de Pequeno Porte, instituído pela Lei Complementar 123, de 14 de dezembro de 2006, em especial quanto ao seu art. 3.º, devendo ser exigido dessas empresas a declaração, sob as penas da lei, de que cumprem os requisitos legais para a qualificação como microempresa ou empresa de pequeno porte, estando aptas a usufruir do tratamento favorecido estabelecido nos arts. 42 a 49 daquela Lei Complementar. Parágrafo único. A identificação das microempresas ou empresas de pequeno porte na sessão pública do pregão eletrônico só deve ocorrer após o encerramento dos lances, de modo a dificultar a possibilidade de conluio ou fraude no procedimento”.
14 No mesmo sentido: SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Edgar. Licitações e o novo estatuto da pequena e microempresa: reflexos práticos da LC nº 123/06. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p. 37-39; GARCIA, Flávio Amaral. Licitações e contratos administrativos. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 82.
15 TCU, Acórdão 2505/09, Plenário, Rel. Min. Augusto Nardes, DOU 30.10.2009; TCU, Acórdão 2144/07, Plenário, Rel. Min. Aroldo Cedraz, DOU 15.10.2007. Da mesma forma, a Orientação Normativa/ AGU 7 dispõe: “O tratamento favorecido de que tratam os arts. 43 a 45 da Lei Complementar 123, de 2006, deverá ser concedido às microempresas e empresas de pequeno porte independentemente de previsão editalícia”.
16 Art. 47, caput e parágrafo único, da LC 123/2006, com redação dada pela LC 147/2014: “Art. 47. Nas contratações públicas da administração direta e indireta, autárquica e fundacional, federal, estadual e municipal, deverá ser concedido tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte objetivando a promoção do desenvolvimento econômico e social no âmbito municipal e regional, a ampliação da eficiência das políticas públicas e o incentivo à inovação tecnológica. Parágrafo único. No que diz respeito às compras públicas, enquanto não sobrevier legislação estadual, municipal ou regulamento específico de cada órgão mais favorável à microempresa e empresa de pequeno porte, aplica-se a legislação federal”. Saliente-se que o art. 49, I, da LC 123/2006, que exigia previsão editalícia, para aplicação dos benefícios às MEs e EPPs, foi revogado pela LC 147/2014, razão pela qual deve ser revista a Orientação Normativa/AGU 7, que dispõe: “O tratamento favorecido de que tratam os arts. 43 a 45 da Lei Complementar n.º 123, de 2006, deverá ser concedido às microempresas e empresas de pequeno porte independentemente de previsão editalícia”.
17 Nesse sentido: JUSTEN FILHO, Marçal. O estatuto da microempresa e as licitações públicas. São Paulo: Dialética, 2007. p. 77; SANTANA, Jair Eduardo; GUIMARÃES, Edgar. Licitações e o novo estatuto da pequena e microempresa: reflexos práticos da LC nº 123/06. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p. 26; GARCIA, Flávio Amaral. Licitações e contratos administrativos. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 76. Em sentido contrário, admitindo a regulamentação por decreto, vide: MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Eficácia nas licitações e contratos. 12. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2011. p. 998.
18 Art. 34 da Lei 11.488/2007: “Aplica-se às sociedades cooperativas que tenham auferido, no ano-calendário anterior, receita bruta até o limite definido no inciso II do caput do art. 3.º da Lei Complementar n.º 123, de 14 de dezembro de 2006, nela incluídos os atos cooperados e não cooperados, o disposto nos Capítulos V a X, na Seção IV do Capítulo XI, e no Capítulo XII da referida Lei Complementar”.
19 No sentido da necessidade de previsão expressa no edital como condição para participação de consórcios em licitações, vide: SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo contratual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 194; PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Comentários à lei das licitações e contratações da administração pública. 7. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p. 443; MOREIRA, Egon Bockmann. Os consórcios empresariais e as licitações públicas – considerações em torno do art. 33 da Lei n.º 8.666/93. ILC, ano XI, n. 126, p. 758, ago. 2004; MARQUES NETO, Floriano Peixoto de Azevedo. Limitação no número de consorciados admitidos em licitações BLC, v. 5, p. 320, 2004.
20 Sobre o tema, vide: FREITAS, Rafael Véras de. O combate aos cartéis nas licitações (visando à Copa do Mundo de 2014 e às Olimpíadas de 2016). RDPE, Belo Horizonte, ano 9, n. 33, p. 169-204, jan.-mar. 2011.
21 Nesse sentido: JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 9. ed. São Paulo: Dialética, 2002. p. 498. Da mesma forma, o TCU já afirmou que, “embora discricionária, nos termos do caput do art. 33 da Lei n.º 8.666/1993, quando houver a opção da Administração pela restrição à participação de consórcios na licitação, tal escolha deve ser precedida das devidas justificativas no respectivo processo administrativo, especialmente quando a vedação representar risco à competitividade do certame” (TCU, Plenário, Acórdão 1636/07, Rel. Min. Ubiratan Aguiar, DOU 17.08.2007). Vide, também: Informativos de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU ns. 106, 128 e 129.
22 TCU, Plenário, Acórdão 718/11, Rel. Min. Valmir Campelo, 23.03.2011 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 55).
23 Cabe registrar que a Lei impõe a constituição formal do consórcio antes da assinatura do contrato, mas não há imposição de constituição de sociedade dotada de personalidade jurídica própria. Nesse sentido: MOREIRA, Egon Bockmann. Os consórcios empresariais e as licitações públicas – considerações em torno do art. 33 da Lei n.º 8.666/93. ILC, ano XI, n. 126, p. 758, ago. 2004.
24 Segundo o TCU, é irregular a exigência de garantia de proposta para todas as empresas participantes de consórcio, mesmo que de modo proporcional à participação de cada uma. A garantia pode ser satisfeita por qualquer uma das integrantes, ainda que tenha participação minoritária. As empresas formadoras do consórcio são responsáveis solidárias pelos atos praticados na licitação, por força do disposto no art. 33, V, da Lei 8.666/1993. TCU, Plenário, Acórdão 1.790/14, Rel. Min. Benjamin Zymler, 09.07.2014 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 205).
25 Nesse sentido, por exemplo: MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 359. No mesmo sentido, vide: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 336-337; CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 22. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 214-215; RIGOLIN, Ivan Barbosa. Contrato administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 133.
26 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 339.
27 PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Comentários à lei das licitações e contratações da administração pública. 7. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p. 55.
28 O Decreto 3.788/2001, que regulamenta a Lei 9.717/1998, dispõe sobre o Certificado de Regularidade Previdenciária – CRP, exigível para celebração de acordos, contratos, convênios ou ajustes, bem como de empréstimos, financiamentos, avais e subvenções em geral de órgãos ou entidades da Administração direta e indireta da União. Vale lembrar que o art. 5.º da Lei n.º 12.453/2011 dispõe: “Ficam suspensas, até 30 de junho de 2012, as exigências de regularidade fiscal previstas no art. 62 do Decreto-lei n.º 147, de 3 de fevereiro de 1967, no § 1.º do art. 1.º do Decreto-lei n.º 1.715, de 22 de novembro de 1979, na alínea c do inciso IV do art. 1.º da Lei n.º 7.711, de 22 de dezembro de 1988, na alínea b do art. 27 da Lei n.º 8.036, de 11 de maio de 1990, no art. 1.º da Lei n.º 9.012, de 30 de março de 1995, e na Lei n.º 10.522, de 19 de julho de 2002, sem prejuízo do disposto no § 3.º do art. 195 da Constituição Federal, nas contratações de operações de crédito e renegociações de dívidas realizadas com instituições financeiras públicas, que tenham como mutuários os contribuintes a que se refere o art. 6.º desta Lei”.
29 FURTADO, Lucas Rocha. Curso de direito administrativo. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2010. p. 356.
30 GARCIA, Flávio Amaral. Licitações e contratos administrativos. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 229.
31 TCU, Plenário, Acórdão 1331/08, Rel. Min. Benjamin Zymler, DOU 11.07.2008.
32 Vale lembrar que o STF considerou constitucional a utilização do leilão para desestatização de linhas de serviço de transporte rodoviário. STF, Tribunal Pleno, MS 27.516/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, DJe 05.12.2008, p. 104 (Informativo de Jurisprudência do STF n. 525).
33 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 137.
34 ARAGÃO, Alexandre Santos de. Direito dos serviços públicos. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 577.
35 Nesse sentido: SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito das concessões. 5. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 46-47.
36 O art. 31 da Lei 9.074/1995 dispõe: “Art. 31. Nas licitações para concessão e permissão de serviços públicos ou uso de bem público, os autores ou responsáveis economicamente pelos projetos básico ou executivo podem participar, direta ou indiretamente, da licitação ou da execução de obras ou serviços”.
37 Em suas razões de veto, o Chefe do Executivo afirmou: “O inciso II do art. 11 permite que apenas a elaboração do projeto executivo das obras seja delegada ao parceiro privado. Dessume-se do seu texto que a Administração teria a obrigação de realizar o projeto básico das obras. Isto seria reproduzir para as parcerias público-privadas o regime vigente para as obras públicas, ignorando a semelhança entre as parcerias e as concessões – semelhança esta que levou o legislador a caracterizar as parcerias público-privadas brasileiras como espécies de concessões, a patrocinada e a administrativa. As parceiras público-privadas só se justificam se o parceiro privado puder prestar os serviços contratados de forma mais eficiente que a administração pública. Este ganho de eficiência pode advir de diversas fontes, uma das quais vem merecendo especial destaque na experiência internacional: a elaboração dos projetos básico e executivo da obra pelo parceiro privado. (...)”. As razões de veto foram apresentadas na Mensagem 1.006, de 30.12.2004. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/Msg/Vep/VEP-1006-04.htm>. Acesso em: 10 maio 2012.
38 Na lição de Mauricio Portugal Ribeiro: “no caso do projeto de concessão ou PPP envolver obras, a Lei de Concessões, no que é seguida pela Lei de PPP, exige que a Administração disponibilize os ‘elementos do projeto básico’ da obra (art. 18, inc. XV, da Lei 8.987/95). ‘Elementos do projeto básico’ é bem menos do que o projeto básico da obra”. O estudo deve ser suficiente, afirma o autor, para definir claramente os indicadores de desempenho que o parceiro privado deverá cumprir e para estimar os custos de investimento e operacionais ao longo de todo o contrato. RIBEIRO, Mauricio Portugal. Concessões e PPPs: melhores práticas em licitações e contratos. São Paulo: Atlas, 2011. p. 40-41.
39 Nesse sentido, admitindo a elaboração dos projetos, básico e executivo, pelos concessionários, posiciona-se a maioria da doutrina: MOREIRA, Egon Bockmann. A experiência das licitações para obras de infraestrutura e a nova Lei de Parcerias Público-Privadas. Parcerias Público-Privadas. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 131; FREITAS, Juarez. PPPs: natureza jurídica. Curso de direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2006. v. I, p. 706; NETO, Benedicto Porto. Licitação para contratação de Parceria Público-Privada. Parcerias Público-Privadas. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 147-148; ARAGÃO, Alexandre Santos de. As Parcerias Público-Privadas – PPPs no Direito positivo brasileiro. Revista de Direito da Associação dos Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, vol. XVII, p. 80-82, 2006; MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Eficácia nas concessões, permissões e parcerias. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. p. 270; SUNDFELD, Carlos Ari. Guia Jurídico das Parcerias Público-Privadas. Parcerias Público-Privadas. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 40. Aliás, a elaboração dos projetos mencionados pelo particular interessado na contratação também foi admitida pelo denominado “Regime Diferenciado de Contratações Públicas” (RDC), na forma do art. 9.º, caput e § 1.º, da Lei 12.462/2011.
40 Art. 21 da Lei 8.987/1995: “Art. 21. Os estudos, investigações, levantamentos, projetos, obras e despesas ou investimentos já efetuados, vinculados à concessão, de utilidade para a licitação, realizados pelo poder concedente ou com a sua autorização, estarão à disposição dos interessados, devendo o vencedor da licitação ressarcir os dispêndios correspondentes, especificados no edital”.
41 Diversos Estados editaram regulamentação específica sobre PMI, a saber: Minas Gerais (Decreto 44.565/2007), Ceará (Decreto 30.328/2010), Bahia (Decreto 12.653/2011), Goiás (Decreto 7.365/2011), Rio de Janeiro (Decreto 43.277/2011), São Paulo (Decreto 57.289/2011).
42 As vantagens na utilização da PPP não devem ficar adstritas ao campo econômico (economicidade), devendo ser ponderadas e demonstradas, também, as vantagens sociais, ambientais, dentre outras. Nesse sentido: FREITAS, Juarez. PPPs: natureza jurídica. Curso de direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, 2006. v. I, p. 707.
43 Sobre a relação entre a PPP e a Lei de Responsabilidade Fiscal, vide: VALLE, Vanice Lírio do. Parcerias público-privadas e responsabilidade fiscal: uma conciliação possível. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. Apesar da polêmica no enquadramento do contrato de PPP como endividamento de despesas de capital ou pagamento de despesas de custeio, Marcos Juruena Villela Souto sustenta que o instituto se enquadra melhor como despesa de custeio, pois a Administração busca a gestão privada do serviço. SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo das parcerias. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 43.
44 A Portaria da Secretaria do Tesouro Nacional 614, de 21 de agosto de 2006, estabelece normas gerais relativas à consolidação das contas públicas aplicáveis aos contratos de Parceria Público-Privada – PPP, de que trata a Lei 11.079/2004.
45 Os arts. 22 e 28 da Lei 11.079/2004 dispõem: “Art. 22. A União somente poderá contratar parceria público-privada quando a soma das despesas de caráter continuado derivadas do conjunto das parcerias já contratadas não tiver excedido, no ano anterior, a 1% (um por cento) da receita corrente líquida do exercício, e as despesas anuais dos contratos vigentes, nos 10 (dez) anos subsequentes, não excedam a 1% (um por cento) da receita corrente líquida projetada para os respectivos exercícios”. (...) “Art. 28. A União não poderá conceder garantia ou realizar transferência voluntária aos Estados, Distrito Federal e Municípios se a soma das despesas de caráter continuado derivadas do conjunto das parcerias já contratadas por esses entes tiver excedido, no ano anterior, a 5% (cinco por cento) da receita corrente líquida do exercício ou se as despesas anuais dos contratos vigentes nos 10 (dez) anos subsequentes excederem a 5% (cinco por cento) da receita corrente líquida projetada para os respectivos exercícios”(Redação dada pela Lei 12.766, de 2012).
46 Na forma do art. 2.º, III, da LRF, a empresa estatal dependente é a “empresa controlada que receba do ente controlador recursos financeiros para pagamento de despesas com pessoal ou de custeio em geral ou de capital, excluídos, no último caso, aqueles provenientes de aumento de participação acionária”. Em sentido semelhante, o art. 1.º, § 1.º, II, da Resolução 40/01 do Senado Federal dispõe: “Art. 1.º (...) § 1.º Considera-se, para os fins desta Resolução, as seguintes definições: (...) II – empresa estatal dependente: empresa controlada pelo Estado, pelo Distrito Federal ou pelo Município, que tenha, no exercício anterior, recebido recursos financeiros de seu controlador, destinados ao pagamento de despesas com pessoal, de custeio em geral ou de capital, excluídos, neste último caso, aqueles provenientes de aumento de participação acionária, e tenha, no exercício corrente, autorização orçamentária para recebimento de recursos financeiros com idêntica finalidade”.
47 Nesse sentido: PRADO, Lucas Navarro. Condições prévias para a licitação de uma PPP. Estudos sobre a Lei das Parcerias Público-Privadas. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 67. Essa também é a tese consagrada no Manual de demonstrativos fiscais, aprovado pela Portaria STN 407/2011, que, ao tratar do demonstrativo das despesas de PPP, estabelece: “Devem abranger as despesas com a parcela fixa da contraprestação pecuniária, com a parcela variável vinculada ao desempenho do parceiro privado e com os diferentes riscos provisionados”. Brasil. Secretaria do Tesouro Nacional. Manual de demonstrativos fiscais: aplicado à União e aos Estados, Distrito Federal e Municípios / Ministério da Fazenda, Secretaria do Tesouro Nacional. 4. ed. Brasília: Secretaria do Tesouro Nacional, Coordenação-Geral de Normas de Contabilidade Aplicadas à Federação, 2011, p. 353.
48 O art. 39 da Lei 8.666/1993 dispõe: “Sempre que o valor estimado para uma licitação ou para um conjunto de licitações simultâneas ou sucessivas for superior a 100 (cem) vezes o limite previsto no art. 23, inciso I, alínea ‘c’, desta Lei, o processo licitatório será iniciado, obrigatoriamente, com uma audiência pública concedida pela autoridade responsável com antecedência mínima de 15 (quinze) dias úteis da data prevista para a publicação do edital, e divulgada, com a antecedência mínima de 10 (dez) dias úteis de sua realização, pelos mesmos meios previstos para a publicidade da licitação, à qual terão acesso e direito a todas as informações pertinentes e a se manifestar todos os interessados”.
49 Já tivemos a oportunidade de tratar do princípio da participação administrativa em outro trabalho: OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. A constitucionalização do direito administrativo: o princípio da juridicidade, a releitura da legalidade administrativa e a legitimidade das agências reguladoras. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 107-120. A exigência de submissão da minuta do edital de licitação à prévia consulta popular também se encontra em outras legislações, por exemplo: art. 8.º da Lei 11.284/2006 (concessão florestal), art. 39 da Lei 8.666/1993 (licitações para contratações de valores elevados) etc.
50 Sobre a preocupação ambiental nas licitações, podem ser citados os seguintes exemplos: art. 6.º, XII da Lei 12.187/2009, que institui a Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC); Instrução Normativa 1/2010 do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, que “dispõe sobre os critérios de sustentabilidade ambiental na aquisição de bens, contratação de serviços ou obras pela Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional”; arts. 4.º, § 1.º, I, II, III, e 14, parágrafo único, II, da Lei 12.462/2011 (RDC).
51 Art. 10 da Lei 6.938/1981, Anexo 1 da Resolução 237/1997 e art. 2.º da Resolução 1/1986 do CONAMA.
52 De acordo com Lucas Navarro Prado, “a expedição das diretrizes também se assenta na ideia de explorar a eficiência produtiva do particular, fazendo-o realizar o licenciamento ao ensejo da elaboração do projeto básico das obras necessárias à execução do escopo contratual”. PRADO, Lucas Navarro. Condições prévias para a licitação de uma PPP. Estudos sobre a Lei das Parcerias Público-Privadas. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 85.
53 A inversão de fases, com a realização do julgamento antes da etapa de habilitação, foi consagrada no pregão (art. 4.º, XII, da Lei 10.520/2002). Enquanto a inversão é obrigatória no pregão, na concorrência para contratação de PPP a inversão é uma faculdade da Administração Pública, pois o art. 13 da Lei 11.079/2004 dispõe que “o edital poderá prever a inversão da ordem das fases de habilitação e julgamento”. A inversão de fases de habilitação e julgamento também foi prevista no Regime Diferenciado de Contratação – RDC (art. 12, IV e V, da Lei 12.462/2011).
54 Em sentido semelhante, defendendo a obrigatoriedade da inversão, vide: CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 24. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 407; FORTINI, Cristiana. Contratos administrativos: franquia, concessão, permissão e PPP. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 148.
55 SUNDFELD, Carlos Ari. Guia Jurídico das Parcerias Público-Privadas. Parcerias público-privadas. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 39-40.
56 Em sentido semelhante: GARCIA, Flavio Amaral. Licitações e contratos administrativos. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 420.
57 Mencione-se, por exemplo, que nas licitações submetidas ao Regime Diferenciado de Contratações (RDC), a legislação adotou outros critérios de desempate, que devem ser adotados preferencialmente ao sorteio, tendo em vista a necessidade de se ampliar a competitividade entre os licitantes, garantindo a obtenção da melhor proposta. Nesse sentido, o art. 25 da Lei 12.462/2011 dispõe que, em caso de empate entre duas ou mais propostas, serão utilizados os seguintes critérios de desempate, nesta ordem: a) disputa final, em que os licitantes empatados poderão apresentar nova proposta fechada em ato contínuo à classificação; b) avaliação do desempenho contratual prévio dos licitantes, desde que exista sistema objetivo de avaliação instituído (Administração Pública de Resultados); c) critérios de preferência para os seguintes bens e serviços: produzidos no País, produzidos ou prestados por empresas brasileiras com tecnologia desenvolvida no País, produzidos ou prestados por empresas que invistam em pesquisa e no desenvolvimento de tecnologia no País ou produzidos de acordo com processo produtivo básico (art. 3.º, § 2.º, da Lei 8.666/1993 c/c art. 3.º da Lei 8.248/1991); e d) sorteio.
58 É importante notar que o art. 6.º da Lei 11.107/2005 dispõe que a associação pública integra a Administração indireta de todos os entes consorciados, sem mencionar a pessoa de direito privado. Entendemos, contudo, que a omissão não tem o condão de afastar a pessoa de direito privado do rol de entidades administrativas, especialmente por se tratar de pessoa instituída pelo Poder Púbico.
59 O art. 23, II, “a”, da Lei 8.666/1993 dispõe: “Art. 23. As modalidades de licitação a que se referem os incisos I a III do artigo anterior serão determinadas em função dos seguintes limites, tendo em vista o valor estimado da contratação: [...] II – para compras e serviços não referidos no inciso anterior: a) convite – até R$ 80.000,00 (oitenta mil reais)”.
60 “Art. 26. As dispensas previstas nos §§ 2.º e 4.º do art. 17 e no inciso III e seguintes do art. 24, as situações de inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8.º desta Lei deverão ser comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos”.
61 Nesse sentido: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 489.
62 Os Decretos-leis 9.403/1946 e 9.853/1946 atribuíram, respectivamente, à CNI e à CNC o encargo de criação do Serviço Social da Indústria (SESI) e do Serviço Social do Comércio (SESC). Existem, todavia, outros exemplos de Serviços Sociais Autônomos, por exemplo: SENAI (criação autorizada pelo Decreto-lei 4.048/1942), SENAC (criação autorizada pelo Decreto-lei 9.621/1946) etc.
63 A exigência de autorização legal para a criação dos Serviços Sociais Autônomos decorre da necessidade de lei impositiva das contribuições sociais, espécie tributária, e da sua respectiva destinação. Em outras palavras: não se trata da autorização legislativa prevista no art. 37, XIX, da CRFB, mas, sim, da necessidade de lei (princípio da legalidade) para criação de tributos e para o seu repasse às mencionadas pessoas privadas, tendo em vista o disposto no art. 240 da CRFB.
64 O STF, no julgamento do pedido liminar na ADI 1923 MC/DF, confirmou a constitucionalidade da Lei 9.637/1998. Sustentava-se a inconstitucionalidade, entre outros argumentos, pelo fato de a referida Lei admitir o repasse de benefícios públicos para entidades privadas sem licitação (Informativo de Jurisprudência do STF n. 474). É importante notar que o mérito da ação encontra-se pendente de julgamento.
65 Na lição de Paulo Modesto, “as entidades de colaboração não são delegadas do Estado e não gozam de prerrogativas de direito público, processuais ou materiais. Não editam atos administrativos nem estão sujeitas ao processo administrativo para decidir. São entidades privadas, não estatais, que colaboram com o Estado, mas não se equiparam a ele ou a qualquer órgão do Poder Público” (O direito administrativo do terceiro setor: a aplicação do direito público às entidades privadas sem fins lucrativos. Terceiro setor e parcerias na área de saúde. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 32).
66 Marçal Justen Filho, ao analisar a formalização do contrato de gestão, afirma a “necessidade de prévia licitação para configurar o contrato de gestão e escolher a entidade privada que será contratada”, salvo as situações de dispensa e de inexigibilidade, bem como de credenciamento (Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 9. ed. São Paulo: Dialética, 2002. p. 36). No mesmo sentido: STJ, 1.ª Turma, REsp 623.197/RS, Min. José Delgado, DJ 08.11.2004, p. 177.
67 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 22. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 244-245; TCU, Plenário, Acórdão 1.006/11, Rel. Min. Ubiratan Aguiar, 20.04.2011 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 59).
68 Ressalte-se que o art. 81 do Anteprojeto de Lei de Normas Gerais sobre Administração Pública Direta e Indireta, entidades paraestatais e entidades de colaboração dispõe que os instrumentos jurídicos celebrados com as entidades privadas sem fins lucrativos não se submetem às normas da Lei 8.666/1993, salvo no tocante ao disposto no art. 116 daquela Lei. O texto integral do anteprojeto encontra-se disponível em: <http://www.planejamento.gov.br/secretarias/upload/Arquivos/seges/comissao_jur/arquivos/090729_seges_Arq_leiOrganica.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2011.
69 Nesse sentido, por exemplo: art. 7.º da Lei 9.637/1998.
70 Em sua redação originária, o art. 23 do Decreto 3.100/1999 não tornava obrigatória a utilização do concurso de projetos, que dependeria da análise discricionária do Poder Público. O TCU, analisando a questão, determinou ao Poder Executivo a realização de aperfeiçoamento no Decreto 3.100/1999 para, entre outras medidas, tornar, em princípio, obrigatória a realização do concurso de projetos (TCU, Plenário, Decisão 931/1999, Rel. Min. Marcos Vilaça, BTCU 78/1999). Com a alteração promovida pelo Decreto 7.568/2011, o concurso de projetos passou a ser obrigatório.
71 Em relação ao chamamento público, o art. 7.º da Portaria Interministerial MP/MF/CGU 507/2011 dispõe: “Para a celebração dos instrumentos regulados por esta Portaria com entes públicos, o órgão ou entidade da Administração Pública Federal poderá, com vista a selecionar projetos e órgãos ou entidades públicas que tornem mais eficaz a execução do objeto, realizar chamamento público no SICONV, que deverá conter, no mínimo: I – a descrição dos programas a serem executados de forma descentralizada; e II – os critérios objetivos para a seleção do convenente ou contratado, com base nas diretrizes e nos objetivos dos respectivos programas. Parágrafo único. Deverá ser dada publicidade ao chamamento público, pelo prazo mínimo de 15 (quinze) dias, especialmente por intermédio da divulgação na primeira página do sítio oficial do órgão ou entidade concedente, bem como no Portal dos Convênios”.
72 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Natureza jurídica dos serviços sociais autônomos. RDA, v. 207, p. 93, jan.-mar. 1997.
73 Decreto 5.504/2005: “Art. 1.º Os instrumentos de formalização, renovação ou aditamento de convênios, instrumentos congêneres ou de consórcios públicos que envolvam repasse voluntário de recursos públicos da União deverão conter cláusula que determine que as obras, compras, serviços e alienações a serem realizadas por entes públicos ou privados, com os recursos ou bens repassados voluntariamente pela União, sejam contratadas mediante processo de licitação pública, de acordo com o estabelecido na legislação federal pertinente. [...] § 5.º Aplica-se o disposto neste artigo às entidades qualificadas como Organizações Sociais, na forma da Lei n.º 9.637, de 15 de maio de 1998, e às entidades qualificadas como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, na forma da Lei n.º 9.790, de 23 de março de 1999, relativamente aos recursos por elas administrados oriundos de repasses da União, em face dos respectivos contratos de gestão ou termos de parceria”. Todavia, o art. 11 do Decreto 6.170/2007, que dispõe sobre as normas relativas às transferências de recursos da União mediante convênios e contratos de repasse, afirma que a aquisição de produtos e a contratação de serviços com recursos da União transferidos a entidades privadas sem fins lucrativos deverão observar “os princípios da impessoalidade, moralidade e economicidade, sendo necessária, no mínimo, a realização de cotação prévia de preços no mercado antes da celebração do contrato”.
74 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 22. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 512-513.
75 Em relação ao Sistema “S”: TCU, Plenário, Decisão 907/97, Rel. Min. Lincoln Magalhães da Rocha, DOU 26.12.1997. Quanto às “OS” e “OSCIP”: TCU, Plenário, Acórdão 1.777/05, Rel. Min. Marcos Vinicios Vilaça, DOU 22.11.2005. Em decisões posteriores, as 1.ª e 2.ª Câmaras do TCU afirmaram a necessidade de adoção da modalidade pregão, preferencialmente eletrônico, para aquisição de bens e serviços comuns pelo Sistema S e OS, com a utilização de recursos públicos, tendo em vista os princípios da eficiência e da economicidade. TCU, Acórdão 3.153/12, 2.ª Câmara, Rel. Min. José Jorge, 08.05.2012 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 105); TCU, Acórdão 5.613/12, 1.ª Câmara, Rel. Min. José Múcio Monteiro, 18.09.2012 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 124). Recentemente, o TCU afirmou que as entidades do Sistema S “não estão obrigadas a seguir rigorosamente os termos da Lei 8.666/1993 e não são alcançadas pelo comando contido no art. 4.º do Decreto 5.450/2005, que impõe a utilização da modalidade pregão para a aquisição de bens e serviços comuns, no âmbito da União. Tais entidades, que não integram a Administração Direta e nem a Indireta, estão obrigadas ao cumprimento de seus regulamentos próprios, os quais devem estar pautados nos princípios gerais do processo licitatório e consentâneos ao contido no art. 37, caput, da Constituição Federal.” TCU, Plenário, Acórdão 1.392/13, Rel. Min. Raimundo Carreiro, 05.06.2013 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 154). O Plenário do TCU tem afirmado a desnecessidade de realização de licitação por entidades privadas, que recebem recursos oriundos de convênios celebrados com entes da Administração Federal, admitindo-se a adoção de procedimentos simplificados, desde que observem os princípios da igualdade, legalidade, moralidade, publicidade e eficiência administrativa. TCU, Acórdão 1.907/12, Plenário, Rel. Min. José Jorge, 18.07.2012 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 116).
76 OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Administração pública, concessões e terceiro setor. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 293-297. Registre-se que as entidades do Terceiro Setor não podem inovar na ordem jurídica, por meio de seus regulamentos próprios, instituindo novas hipóteses de dispensa e de inexigibilidade de licitação, haja vista que a matéria deve ser disciplinada por norma geral, de competência privativa da União. TCU, Plenário, Acórdão 1.785/13, Rel. Min. Marcos Bemquerer Costa, DOU 10.07.2013 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 159).
77 Sobre o tema, vide nosso artigo OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende; FREITAS, Rafael Véras de. A função regulatória das licitações e o desenvolvimento nacional sustentável: o regime jurídico introduzido pela Lei nº 12.349/10. Revista Brasileira de Direito Público – RBDP, Belo Horizonte, ano 10, n. 38, p. 9-30, jul./set. 2012.
78 A “função regulatória” da licitação foi mencionada de forma pioneira no Brasil por Marcos Juruena Villela Souto (Direito administrativo contratual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 6, 105, 328 e 424).
79 Sobre a natureza do processo administrativo, vide: MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 5. ed. São Paulo: RT, 2001. p. 204.
80 Como há muito leciona Marcos Juruena Villela Souto: “A vedação constante do art. 3.º da Lei n.º 8.666/93 é apenas para exigências que frustrem o caráter competitivo da licitação. Ora, quando o objetivo for exatamente o de preservar ou restaurar esse caráter competitivo e o próprio mercado onde a competição se desenvolve, é lícito aplicar a ideia de função regulatória da licitação” (Direito administrativo das parcerias. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 10-11).
81 Nesse sentido, confira-se a seguinte decisão do Tribunal de Contas da União: “A restrição à competitividade, causada pela ausência de informações essenciais no instrumento convocatório, é causa que enseja a nulidade da licitação” (Acórdão 1556/2007 Plenário (Sumário).
82 Não se trata mais de uma tendência excepcional. O Estado, atualmente, integra a ordem econômica, como ressalta Fabio Nusdeo: “[...] a figura mesma do Estado intervencionista se supera, pois a palavra intervenção traz em si o signo da transitoriedade, conota uma arremetida seguida de retirada, trai, em suma, uma situação excepcional, anormal. Não é essa, porém, a nova realidade. O Estado não mais intervém no sistema econômico. Integra-o. Torna-se um seu agente e um habitual partícipe de suas decisões (Curso de economia: introdução ao direito econômico. São Paulo: RT, 1997. p. 216).
83 POSNER, Richard A. Natural Monopoly and its regulation. Washington, EUA: Cato, 1999.
84 A função instrumental da concorrência é defendida em SALOMÃO FILHO, Calixto. Direito concorrencial: as condutas. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 47-48.
85 Marçal Justen Filho, da mesma forma, ressalta a instrumentalidade da licitação (Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 12. ed. São Paulo: Dialética, 2002. p. 74).
86 Sobre a função regulatória da licitação, vide: SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo das parcerias. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 86-89; Idem. Direito administrativo contratual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 6, p. 105, 328 e 424; FERRAZ, Luciano. Função regulatória da licitação. A&C Revista de Direito Administrativo e Constitucional, v. 37, p. 133-142, 2009; GARCIA, Flávio Amaral. Licitações e contratos administrativos. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 73-75.
87 Assim preceitua o art. 6.º, XII, da Lei: “Art. 6.º São instrumentos da Política Nacional sobre Mudança do Clima: [...] XII – as medidas existentes, ou a serem criadas, que estimulem o desenvolvimento de processos e tecnologias, que contribuam para a redução de emissões e remoções de gases de efeito estufa, bem como para a adaptação, dentre as quais o estabelecimento de critérios de preferência nas licitações e concorrências públicas, compreendidas aí as parcerias público-privadas e a autorização, permissão, outorga e concessão para exploração de serviços públicos e recursos naturais, para as propostas que propiciem maior economia de energia, água e outros recursos naturais e redução da emissão de gases de efeito estufa e de resíduos” (grifo nosso).
88 Destaque-se que o Livro Verde sobre a modernização da política de contratos públicos da UE – Para um mercado dos contratos públicos mais eficiente na Europa, publicado em 2011, propõe a utilização dos contratos públicos para proteção do meio ambiente. Sobre o tema, vide: ESTORNINHO, Maria João. Curso de direito dos contratos públicos. Coimbra: Almedina, 2012. p. 415-441.
89 As licitações com essa característica têm sido referidas pelo signo de “licitações verdes”, e o Brasil tem divulgado tal inovação inclusive no âmbito da Rede Interamericana de Compras Governamentais (RICG). A esse respeito consta notícia no site oficial do Ministério do Planejamento da União intitulada Planejamento apresenta “licitação verde” em conferência latino-americana. Disponível em: <http://www.planejamento.gov.br/noticia.asp?p=not&cod=6694&cat=94&sec=7>. Acesso em: 20 dez. 2010.
Além disso, confira-se: CSIPAI, Luciana Pires. Guia prático de licitações sustentáveis do núcleo de assessoramento jurídico em São Paulo – AGU. Disponível em: <http://www.agu.gov.br/sistemas/site/templatetexto.aspx?idconteudo=138067&id_site=777>. Acesso em: 20 dez. 2010; e o site do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão voltado às compras públicas sustentáveis. Disponível em: <http://cpsustentaveis.planejamento.gov.br/>. Acesso em: 20 dez. 2010.
90 Esse é o teor do art. 43 da LC 123/2006: “Art. 43. As microempresas e empresas de pequeno porte, por ocasião da participação em certames licitatórios, deverão apresentar toda a documentação exigida para efeito de comprovação de regularidade fiscal, mesmo que esta apresente alguma restrição”.
91 Confira-se o teor do art. 44 da LC 123/2006: “Art. 44. Nas licitações será assegurada, como critério de desempate, preferência de contratação para as microempresas e empresas de pequeno porte. § 1.º Entende-se por empate aquelas situações em que as propostas apresentadas pelas microempresas e empresas de pequeno porte sejam iguais ou até 10% (dez por cento) superiores à proposta mais bem classificada”.
92 “Art. 24. É dispensável a licitação: XXVII – na contratação da coleta, processamento e comercialização de resíduos sólidos urbanos recicláveis ou reutilizáveis, em áreas com sistema de coleta seletiva de lixo, efetuados por associações ou cooperativas formadas exclusivamente por pessoas físicas de baixa renda reconhecidas pelo poder público como catadores de materiais recicláveis, com o uso de equipamentos compatíveis com as normas técnicas, ambientais e de saúde pública.”
93 “Art. 24. [...] XX – na contratação de associação de portadores de deficiência física, sem fins lucrativos e de comprovada idoneidade, por órgãos ou entidades da Administração Pública, para a prestação de serviços ou fornecimento de mão de obra, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado.”
94 Confira-se, por relevante, o teor do seu art. 1.º: “Art. 1.º Nas contratações diretas e nas licitações realizadas por órgãos e entidades da Administração Pública Estadual direta e indireta, deverão constar dos respectivos editais, a obrigatoriedade para a empresa com 100 (cem) ou mais empregados de demonstrar o preenchimento de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) de seus cargos com beneficiários da Previdência Social reabilitados ou com pessoa portadora de deficiência habilitada, na seguinte proporção: I – até duzentos empregados, 2% (dois por cento); II – de duzentos e um a quinhentos empregados, 3% (três por cento); III – de quinhentos e um a mil empregados, 4% (quatro por cento); ou IV – mais de mil empregados, 5% (cinco por cento). Parágrafo único. A procuradoria Geral do Estado elaborará a minuta-padrão das cláusulas contratuais e editalícias decorrentes do caput deste artigo”.
95 A partir do reconhecimento da normatividade do texto constitucional e de sua superioridade hierárquica, a interpretação de todo e qualquer ramo do Direito passou a depender da sua adequação às normas constitucionais. Sobre a constitucionalização do Direito Administrativo, vide: OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. A constitucionalização do direito administrativo: o princípio da juridicidade, a releitura da legalidade administrativa e a legitimidade das agências reguladoras. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.
96 GARCIA FIGUEROA, Alfonso. La teoría del derecho en tiempos de constitucionalismo. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). 2. ed. Madrid: Trotta, 2005. p. 165-166.
97 GIANNINI, Massimo Severo. Derecho administrativo. Madrid: MAP, 1991. v. I, p. 76 e ss.
98 LOEWENSTEIN, Karl. Teoria de la Constitución. Barcelona: Ariel, 1976. p. 422.
99 A necessidade de eficiência na atuação administrativa também é mencionada em outras passagens do texto constitucional, a saber: a) os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário devem instituir e manter sistema de controle interno com a finalidade de “comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado” (art. 74, II, da CRFB); b) a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública devem ser disciplinados pela legislação, com o objetivo de garantir a eficiência (art. 144, § 7.º, da CRFB). Da mesma forma, o referido princípio encontra-se previsto no art. 2.º da Lei 9.784/1999.
100 No Direito Comparado, a análise do resultado já pode ser encontrada em estudos monográficos recentes, com destaque para duas obras italianas: SORRENTINO, Giancarlo. Diritti e partecipazione nell’amministrazione di resultato. Napoli: Editoriale Scientifica, 2003; e SPASIANO, Mario R. Funzione amministrativa e legalità di resultado. Torino: Giappichelli, 2003. No Brasil, o estudo do resultado como novo paradigma do Direito Administrativo foi destacado por Diogo de Figueiredo Moreira Neto na obra: Quatro paradigmas do direito administrativo pós-moderno, Belo Horizonte: Fórum, 2008.
101 ÁVILA, Humberto. Moralidade, razoabilidade e eficiência. REDAE, Salvador, Instituto de Direito Público da Bahia, n. 4, out.-nov.-dez. 2005, p. 21 e 23-24. Disponível em: <www.direitodoestado.com.br>. Acesso em 1.º jun. 2010.
102 De acordo com as lições de J. J. Gomes Canotilho: “Como ponto de orientação, guia de discussão e factor hermenêutico de decisão, o princípio da unidade obriga o intérprete a considerar a constituição na sua globalidade e a procurar harmonizar os espaços de tensão existentes entre as normas constitucionais (ex.: princípio do Estado de Direito e o princípio democrático, princípio unitário e princípio da autonomia regional e local). Daí que o intérprete deva sempre considerar as normas constitucionais não como normas isoladas e dispersas, mas sim como preceitos integrados num sistema interno unitário de normas e princípios” (Direito constitucional e teoria da Constituição. 5. ed. Coimbra: Almedina, 2002. p. 1208).
103 Fábio Nusdeo descortina o significado da expressão “desenvolvimento” na Constituição: “Já na atual Constituição de 1988, a expressão perdeu o seu qualificativo econômico para aparecer de maneira mais ampla e correta como desenvolvimento nacional (art. 3.º, II), quedando-se, pois, fora do Título VII dedicado à Ordem Econômica e Financeira. Como já acima assinalado, o desenvolvimento não pode ser restringido ao campo puramente econômico, devendo abarcar necessariamente o institucional, o cultural, o político e todos os demais. [...] Assim, investimentos em setores sociais como educação, saúde, habitação, se, num primeiro momento, parecem desviar recursos das aplicações diretamente produtivas ou econômicas, como estradas, usinas e poços de petróleo, na realidade irão poupar um conjunto muito severo de custos a se manifestarem logo adiante pela queda de produtividade da mão de obra, pelo aumento da criminalidade pelo solapamento da coesão social e tantos outros. Aliás, tem sido a constatação destes custos o que tem levado a se repensar o conceito e as manifestações do desenvolvimento” (Desenvolvimento econômico – um retrospecto e algumas perspectivas. In: SALOMÃO FILHO, Calixto (Coord.). Regulação e desenvolvimento. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 19).
104 SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. p. 17.
105 SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo contratual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 12.
106 MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Temas polêmicos de licitações e contratos. FCGP, Belo Horizonte, ano 8, n. 92, p. 7, ago. 2009.
107 As peculiaridades da atividade de fomento são assim delineadas por André de Labaudere: “Mais do que obrigar, o Estado procura levar os agentes econômicos a comprometerem-se em determinadas direcções. Emprega hoje em dia, para isso, e bastante largamente, o processo do acordo convencional” (Direito público econômico. Coimbra: Almedina, 1985. p. 428).
108 Confira-se, por relevante, o disposto na cláusula 3.5 da Portaria ANP 180, de 05.06.2003: “3.5 As empresas Concessionárias deverão manter à disposição da ANP, pelo prazo de 5 anos após o término da Fase de Exploração ou Etapa de Desenvolvimento, todos os registros comprobatórios, na forma de declaração de origem fornecida pelo fornecedor do bem ou serviço ou outro comprovante inequívoco, de que os bens e serviços declarados como locais atendem aos conceitos de Bem de Produção Nacional e Serviço Prestado no Brasil dos Contratos de Concessão”.
109 A atual redação do art. 3.º da Lei 8.666/1993 elenca os três objetivos da licitação, quais sejam: a) garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, b) selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e c) promover o desenvolvimento nacional sustentável. Ivan Barbosa Rigolin, ao tratar da MP 495/2010, convertida na Lei 12.349/2010, apresenta visão crítica à inserção da “promoção do desenvolvimento nacional” no art. 3.º da Lei 8.666/1993. Em suas palavras, “a ideia é péssima, porque em seu nome é de se imaginar quantas atrocidades jurídicas serão propiciadas em nome desse demagógico, deslocadíssimo e inteiramente fora de propósito patriotismo, verdadeira patriotada, em detrimento da proposta efetivamente mais vantajosa para o momento da administração local que licita” (RIGOLIN, Ivan Barbosa. Lei de licitações é novamente alterada – A MP n.º 495, de 19.7.10. FCGP, Belo Horizonte, ano 9, n. 104, p. 23, ago. 2010).
110 Nesse sentido, confira-se trecho da exposição de motivos E.M.I. 104/ MP/MF/MEC/MCT, que seu origem ao referido ato normativo: “9. Considera-se, nesse sentido, que a orientação da demanda do setor público preferencialmente a produtos e serviços domésticos reúne condições para que a atuação normativa e reguladora do Estado efetive-se com maior eficiência e qualidade do gasto público e, concomitantemente, possa engendrar poderoso efeito multiplicador na economia mediante: (i) aumento da demanda agregada; (ii) estímulo à atividade econômica e à geração de emprego e renda; (iii) incentivo à competição entre empresas domésticas, particularmente no que tange a setores e atividades de pesquisa e desenvolvimento tecnológico; (iv) mitigação de disparidades regionais; e (v) incentivo à geração de emprego em segmentos marginais da força de trabalho”.
111 Nesse sentido, confira-se a lição de Konrad Hesse: “A constituição jurídica logra conferir forma e modificação à realidade. Ela logra despertar ‘a força que reside na natureza das coisas’, tornando-a ativa. Ela própria converte-se em força ativa que influi e determina a realidade política e social. Essa força impõe-se de forma tanto mais efetiva quanto mais ampla for a convicção sobre a inviolabilidade da Constituição, quanto mais forte mostrar-se essa convicção entre os principais responsáveis pela vida constitucional. Portanto, a intensidade da força normativa da Constituição apresenta-se, em primeiro plano, como uma questão de vontade normativa, de vontade da Constituição” (A força normativa da Constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Fabris, 1991. p. 24).
112 Carlos Pinto Coelho Motta, ao comentar as alterações promovidas pela MP 495/2010, convertida na Lei 12.349/2010, sustenta: “Nesse contexto, a Medida Provisória sob foco trata, sim, de pôr em prática, especificamente nas contratações públicas, inclusive na modalidade pregão (art. 2.º MP n.º 495/10), as medidas próprias e legítimas tendentes à realização da política nacional de garantia do desenvolvimento econômico e do incentivo ao mercado interno, instituída por força do regime republicano” (Licitações nacionais como instrumento de efetivação dos princípios constitucionais de desenvolvimento nacional e do incentivo ao mercado interno. FGCP, Belo Horizonte, ano 9, n. 107, p. 10, nov. 2010).
113 Confiram-se os §§ 5.º a 8.º acrescentados no art. 3.º da Lei 8.666/1993: “Art. 3.º [...] § 5.º Nos processos de licitação previstos no caput, poderá ser estabelecido margem de preferência para produtos manufaturados e para serviços nacionais que atendam a normas técnicas brasileiras. § 6.º A margem de preferência de que trata o § 5.º será estabelecida com base em estudos revistos periodicamente, em prazo não superior a 5 (cinco) anos, que levem em consideração: I – geração de emprego e renda; II – efeito na arrecadação de tributos federais, estaduais e municipais; III – desenvolvimento e inovação tecnológica realizados no País; IV – custo adicional dos produtos e serviços; e V – em suas revisões, análise retrospectiva de resultados. § 7.º Para os produtos manufaturados e serviços nacionais resultantes de desenvolvimento e inovação tecnológica realizados no País, poderá ser estabelecido margem de preferência adicional àquela prevista no § 5.º. § 8.º As margens de preferência por produto, serviço, grupo de produtos ou grupo de serviços, a que se referem os §§ 5.º e 7.º, serão definidas pelo Poder Executivo federal, não podendo a soma delas ultrapassar o montante de 25% (vinte e cinco por cento) sobre o preço dos produtos manufaturados e serviços estrangeiros” (grifo nosso). Registre-se, por oportuno, que o Decreto 7.601, de 07.11.2011, estabelece a aplicação de margem de preferência nas licitações realizadas no âmbito da Administração Pública federal para aquisição de produtos de confecções, calçados e artefatos, para fins do disposto no art. 3.º da Lei 8.666/1993.
114 Essa diretriz já havia sido traçada, por exemplo, no âmbito do Complexo Industrial da Saúde, estando explícita na Resolução 374/2008 para que o “poder de Compra do Estado” seja empregado em prol do desenvolvimento industrial da área da saúde: “Art. 4.º As diretrizes estabelecidas para o Programa Nacional de Fomento à Produção Pública e Inovação no Complexo Industrial da Saúde são: VI – utilizar estrategicamente o poder de compra do Estado na área da saúde em articulação com políticas de fomento ao desenvolvimento industrial” (grifo nosso).
115 BERCOVIVI, Gilberto. Direito econômico do petróleo e dos recursos minerais. São Paulo: Quartier Latin, 2011. p. 214.
116 SAGASTI, Francisco R. Tecnologia, planejamento e desenvolvimento autônomo. São Paulo: Perspectiva, 1986. p. 17-20 e 151-152, apud BERCOVICI, Gilberto. Direito econômico do petróleo e dos recursos minerais. São Paulo: Quartier Latin, 2011. p. 214.
117 Nesse sentido, confira-se J.J Gomes Canotilho: “Esta a justificação de o princípio da proibição do arbítrio andar sempre ligado a um fundamento material ou critério material objectivo. Ele costuma ser sintetizado da forma seguinte: existe uma violação arbitrária da igualdade jurídica quando a disciplina jurídica não se basear num: (i) fundamento sério; (ii) não tiver um sentido legítimo; (iii) estabelecer diferenciação jurídica sem um fundamento razoável” (Direito constitucional e teoria da Constituição. 5. ed. Coimbra: Almedina, 2002).
118 Luis Roberto Barroso explicita o conteúdo do princípio da proporcionalidade: “Há, ainda, um terceiro requisito, igualmente desenvolvido na doutrina alemã, identificado como proporcionalidade em sentido estrito. Cuida-se, aqui, de uma verificação da relação custo-benefício da medida, isto é, da ponderação entre os danos causados e os resultados a serem obtidos. Em palavras de Canotilho, trata-se “de uma questão de medida ou desmedida para se alcançar um fim: pesar as desvantagens dos meios em relação às vantagens do fim”. Assim é que dele se extraem os requisitos (a) da adequação, que exige que as medidas adotadas pelo Poder Público se mostrem aptas a atingir os objetivos pretendidos; (b) da necessidade ou exigibilidade, que impõe a verificação da inexistência de meio menos gravoso para atingimento dos fins visados; e (c) da proporcionalidade em sentido estrito, que é a ponderação entre o ônus imposto e o benefício trazido, para constatar se é justificável a interferência na esfera dos direitos dos cidadãos” (Interpretação e aplicação da Constituição. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 209).
119 Essa concepção do Direito Administrativo é assim explicada por Carlos Ari Sundfeld: “Eis, então, o direito global: a) variadas cadeias de normas, algumas geradas no ‘mercado jurídico interno’, outras tantas de origem externa (diga-se: de diferentes origens externas); b) uma complexa estrutura de órgãos, uns estatais, outros internacionais, produzindo e aplicando direito; c) por fim, a mundialização da economia fazendo valer seus interesses: tanto forçando a reforma dos Estados e criando-lhes uma nova organização, como impondo novas regulações para todo tipo de assunto (das relações trabalhistas às compras estatais; dos mercados financeiros aos serviços públicos; das patentes industriais aos sistemas previdenciários...)” (A administração pública na era do direito global. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ – Centro de Atualização Jurídica, ano I, v. 1, n. 2, maio 2001. Disponível em: <http://www.direitopublico.com.br>. Acesso em: 20 out. 2010.
120 De acordo com Benedict Kingsbury, Nico Krisch e Richard B. Stewart, a expressão Global Administrative Law compreende “os mecanismos, princípios, práticas e entendimentos apoiados pela sociedade que promovem ou afetam a responsabilização dos departamentos administrativos globais, assegurando que cumpram standards de transparência, participação, fundamentação das decisões e legalidade, fornecendo revisões eficazes das regras e decisões tomadas” (tradução livre) (The emergence of Global Administrative Law. Law and Contemporany Problems, North Carolina: Duke University School of Law, v. 68, n. 3 e 4, p. 17 e 29, 2005).
121 TCU, Plenário, Acórdão 1.317/13, Rel. Min. Aroldo Cedraz, DOU 29.05.2013 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 153); TCU, Plenário, Acórdão 1.550/13, Rel. Min. José Múcio Monteiro, DOU 19.06.2013 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 156).
122 O art. 45 da Lei 9.478/1997, que dispõe sobre a política energética nacional, as atividades relativas ao monopólio do petróleo, institui o Conselho Nacional de Política Energética e a Agência Nacional do Petróleo, exige o pagamento das seguintes compensações financeiras pela exploração desse recurso mineral: bônus de assinatura; royalties; participação especial; pagamento pela ocupação ou retenção de área; participações governamentais constantes.
123 Nesse sentido, o art. 24, XXI, da Lei 8.666/1993 dispõe: “Art. 24. [...] XXI – para a aquisição de bens e insumos destinados exclusivamente à pesquisa científica e tecnológica com recursos concedidos pela Capes, pela Finep, pelo CNPq ou por outras instituições de fomento a pesquisa credenciadas pelo CNPq para esse fim específico”.
124 Confira-se, por relevante, a definição de ICT constante da Lei 10.973/2004: “Art. 2.º Para os efeitos desta Lei, considera-se: [...] V – Instituição Científica e Tecnológica – ICT: órgão ou entidade da administração pública que tenha por missão institucional, dentre outras, executar atividades de pesquisa básica ou aplicada de caráter científico ou tecnológico”.
125 Sobre o tema, vide nosso artigo: OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende; FREITAS, Rafael Véras de. O Regime Diferenciado de Contratações públicas (RDC) e a administração de resultados. Revista Brasileira de Direito Público, n. 35, out.-dez. 2011.
126 No mesmo sentido, confira-se: MOREIRA, Egon Bockmann; GUIMARÃES, Fernando Vernalha. Licitação pública: a Lei Geral de Licitação – LGL e o Regime Diferenciado de Contratação – RDC. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 43-44; ZYMLER, Benjamin; DIOS, Laureano Canabarro. Regime Diferenciado de Contratação – RDC. Belo Horizonte: Fórum, 2013. p. 21.
127 Com o mesmo pensamento otimista acerca da nova sistemática de contratação, confiram-se Carlos Ari Sundfeld e Mario G. Sapiro: “Enfim, o RDC é imune a riscos e blindado contra a corrupção? Não. Mas a aposta em uma lei menos formalista não parece ser uma aventura. As suas inovações decorrem de boas experiências da administração pública e também das más experiências proporcionadas pela Lei 8.666. A atual configuração das contratações públicas não é satisfatória. Bem por isso, projetos piloto como RDC são bem-vindos. Que a Copa sirva ao menos como uma janela de oportunidade para uma boa reforma da gestão pública” (Oportunidade para uma necessária reforma da Lei 8.666 por Carlos Ari Sundfeld e Mario G. Shapiro – Uma Copa para uma nova licitação. Valor Econômico, 27 out. 2011).
128 Até a edição do presente livro, constavam duas ADIs que questionavam o RDC no STF, ambas de relatoria do Min. Luiz Fux, pendentes de julgamento: a) ADI 4.645, proposta pelo PSDB, DEM e PPS; e b) ADI 4.655, apresentada pela Procuradoria-Geral da República.
129 O texto inicial da MP 527/2011 limitava-se a instituir a Secretaria de Aviação Civil, a promover as correspondentes alterações na estrutura do Poder Executivo Federal e a autorizar a prorrogação de contratos temporários para exercício de funções no controle de tráfego aéreo. Na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei de Conversão inseriu as normas sobre o RDC.
130 Nesse sentido, por exemplo: STF, Tribunal Pleno, ADI 2.113/MG, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe-157 21.08.2009, p. 130.
131 Sobre a importância do pragmatismo e do consequencialismo no Direito Administrativo, vide trabalho de nossa autoria: OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. A releitura do direito administrativo à luz do pragmatismo jurídico. RDA, v. 256, p. 129-163, jan.-abr. 2011.
132 Segundo a jurisprudência do TCU, “a utilização do Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC em obras com término posterior à Copa do Mundo de 2014 – ou às Olimpíadas de 2016, conforme o caso – só é legítima nas situações em que ao menos fração do empreendimento tenha efetivo proveito para a realização desses eventos esportivos, e desde que reste evidenciada a inviabilidade técnica e econômica do parcelamento das frações da empreitada a serem concluídas a posteriori, em respeito ao disposto nos artigos 1.º, incisos de I a III; 39 e 42 da Lei 12.462/2011, c/c o art. 23, § 1.º, da Lei 8.666/93”. TCU, Acórdão 1.538/12, Plenário, Rel. Min. Valmir Campelo, 20.06.2012 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 111).
133 No primeiro edital realizado sob o RDC publicado, no Brasil, pela Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (INFRAERO), foi expressa a sua submissão a esse novo regime de contratação. Transcreva-se o item 3.1 do referido edital: “3.1. A presente licitação reger-se-á pelo disposto neste Edital e seus Anexos, pela Lei n.º 12.462, de 05 de agosto de 2011, pelo Decreto n.º 7.581, de 11 de outubro de 2011”. Disponível em: <http://licitacao.infraero.gov.br/arquivos_licitacao/2011/SRNE/001_ADNE_SBJP_2011_RDC/Edital_RDC_Projeto.pdf>. Acesso: 1.º nov. 2011.
134 Nesse sentido: STF, Pleno, ADI 1.668 MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 16.04.2004, p. 52 (Informativo de Jurisprudência do STF n. 119).
135 Nesse sentido: STF, 2.ª Turma, AC-MC-QO 1193/RJ, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 30.06.2006, p. 18 (Informativo de Jurisprudência do STF n. 426).
136 A padronização também é exigida para as compras no art. 15, I, da Lei 8.666/1993.
137 O TCU tem admitido a utilização de minuta-padrão, previamente aprovada pela assessoria jurídica, quando houver identidade de objeto e não restarem dúvidas acerca da possibilidade de adequação das cláusulas exigidas no contrato pretendido às cláusulas previamente estabelecidas. TCU, Acórdão 873/11, Plenário, Rel. Min. Ubiratan Aguiar, 06.04.2011 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 57).
138 Sobre o tema, vide: SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo das parcerias. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 86-89; SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo contratual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 6, p. 105, 328 e 424; FERRAZ, Luciano. Função regulatória da licitação. A&C Revista de Direito Administrativo e Constitucional, v. 37, p. 133-142, 2009; GARCIA, Flávio Amaral. Licitações e contratos administrativos: casos e polêmicas. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 73-75.
139 A preocupação com a sustentabilidade ambiental é uma das principais tendências nas contratações públicas naquilo que se convencionou chamar de “licitações verdes”. Mencione-se, por exemplo, o art. 6.º, XII, da Lei 12.187/2009, que institui a Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC): “art. 6.º São instrumentos da Política Nacional sobre Mudança do Clima: [...] XII – as medidas existentes, ou a serem criadas, que estimulem o desenvolvimento de processos e tecnologias, que contribuam para a redução de emissões e remoções de gases de efeito estufa, bem como para a adaptação, dentre as quais o estabelecimento de critérios de preferência nas licitações e concorrências públicas, compreendidas aí as parcerias público-privadas e a autorização, permissão, outorga e concessão para exploração de serviços públicos e recursos naturais, para as propostas que propiciem maior economia de energia, água e outros recursos naturais e redução da emissão de gases de efeito estufa e de resíduos”.
140 Transcreva-se a ementa do julgado: “Representação. Licitação. Pregão presencial. Suspensão cautelar do certame. Oitiva. Exigência de apresentação de amostras antes da fase de julgamento. Ilegalidade. Possível restrição à competitividade do certame. Conhecimento. Representação prejudicada ante a perda de objeto. Determinações corretivas. A exigência de amostras a todos os licitantes, na fase de habilitação ou de classificação, além de ser ilegal, pode impor ônus excessivo aos licitantes, encarecer o custo de participação na licitação e desestimular a presença de potenciais interessados” (TCU, Plenário, Acórdão 1.113/08, Rel. Min. André Luís, DOU 13.06.2008). Em outra oportunidade, o TCU decidiu: “A exigência de apresentação de amostras em pregão presencial é admitida apenas na fase de classificação das propostas e somente do licitante provisoriamente classificado em primeiro lugar”. TCU, Acórdão 3.269/12, Plenário, Rel. Min. Raimundo Carreiro, 28.11.2012 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 134).
141 TCU, Plenário, Acórdão 512/09, Rel. Min. Aroldo Cedraz, DOU 31.03.2009; TCU, Plenário, Acórdão 1.832/11, Rel. Min. Raimundo Carreiro, DOU 18.07.2011 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 71); TCU, Plenário, Acórdão 1.085/11. Rel. Min. José Múcio, 27.04.2011 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 60).
142 OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Os serviços públicos e o Código de Defesa do Consumidor: limites e possibilidades. BDA, v. 2, p. 172-188, 2010.
143 Nesse sentido: GARCIA, Flávio Amaral. Licitações e contratos administrativos. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 243-250. Em sentido contrário, não admitindo a figura do “Estado consumidor”, pois inexistente a vulnerabilidade: JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 9. ed. São Paulo: Dialética, 2002. p. 520.
144 Em sentido favorável à exigência de carta de solidariedade, vide: FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. REOLON, Jaques Fernando. Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC). FCGP, Belo Horizonte, ano 10, n. 117, p. 25, set. 2011.
145 Sobre o tema, o TCU decidiu: “Representação. Licitação. Procedência. Anulação. Para habilitação de licitantes em pregão eletrônico, deve ser exigida, exclusivamente, a documentação disposta no art. 14 do Decreto n.º 5.450/2005. Dessa forma, indiscutível é a falta de amparo legal para exigência de declaração de compromisso de solidariedade do fabricante do produto como condição para habilitação, o que conduz à anulação do processo licitatório” (TCU, Plenário, Acórdão 1729/08, Rel. Min. Valmir Campelo, DOU 22.08.2008).
146 No entanto, a Lei veda a realização de obras e serviços de engenharia por meio de RDC sem o projeto executivo art. 8.º, § 7.º, da Lei 12.462/2011.
147 De acordo com o art. 74, § 1.º, do Decreto 7.581/2011, o anteprojeto deve conter, quando couber, os seguintes documentos técnicos: I – concepção da obra ou serviço de engenharia; II – projetos anteriores ou estudos preliminares que embasaram a concepção adotada; III – levantamento topográfico e cadastral;
IV – pareceres de sondagem; e V – memorial descritivo dos elementos da edificação, dos componentes construtivos e dos materiais de construção, de forma a estabelecer padrões mínimos para a contratação.
148 O art. 8.º, §§ 3.º e 4.º, da Lei 12.462/2011 estabelece: “Art. 8.º [...] § 3.º O custo global de obras e serviços de engenharia deverá ser obtido a partir de custos unitários de insumos ou serviços menores ou iguais à mediana de seus correspondentes ao Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (Sinapi), no caso de construção civil em geral, ou na tabela do Sistema de Custos de Obras Rodoviárias (Sicro), no caso de obras e serviços rodoviários. § 4.º No caso de inviabilidade da definição dos custos consoante o disposto no § 3.º deste artigo, a estimativa de custo global poderá ser apurada por meio da utilização de dados contidos em tabela de referência formalmente aprovada por órgãos ou entidades da administração pública federal, em publicações técnicas especializadas, em sistema específico instituído para o setor ou em pesquisa de mercado”.
149 Sobre a “Administração de resultados”, vide: OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Princípios do direito administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 107-110; SORRENTINO, Giancarlo. Diritti e partecipazione nell’amministrazione di resultato. Napoli: Editoriale Scientifica, 2003; SPASIANO, Mario R. Funzione amministrativa e legalità di resultado. Torino: Giappichelli, 2003; e MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Quatro paradigmas do direito administrativo pós-moderno. Belo Horizonte: Fórum, 2008.
150 RIBEIRO, Mauricio Portugal; PRADO, Lucas Navarro. Comentários à lei de PPP: fundamentos econômico-jurídicos. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 193.
151 Vide art. 11 da referida Instrução Normativa: “Art. 11. A contratação de serviços continuados deverá adotar unidade de medida que permita a mensuração dos resultados para o pagamento da contratada, e que elimine a possibilidade de remunerar as empresas com base na quantidade de horas de serviço ou por postos de trabalho. § 1.º Excepcionalmente poderá ser adotado critério de remuneração da contratada por postos de trabalho ou quantidade de horas de serviço quando houver inviabilidade da adoção do critério de aferição dos resultados. § 2.º Quando da adoção da unidade de medida por postos de trabalho ou horas de serviço, admite-se a flexibilização da execução da atividade ao longo do horário de expediente, vedando-se a realização de horas extras ou pagamento de adicionais não previstos nem estimados originariamente no instrumento convocatório. § 3.º Os critérios de aferição de resultados deverão ser preferencialmente dispostos na forma de Acordos de Nível de Serviços, conforme dispõe esta Instrução Normativa e que deverá ser adaptado às metodologias de construção de ANS disponíveis em modelos técnicos especializados de contratação de serviços, quando houver. § 4.º Para a adoção do Acordo de Nível de Serviço é preciso que exista critério objetivo de mensuração de resultados, preferencialmente pela utilização de ferramenta informatizada, que possibilite à Administração verificar se os resultados contratados foram realizados nas quantidades e qualidades exigidas, e adequar o pagamento aos resultados efetivamente obtidos”.
152 Em sentido oposto, confira-se MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Eficácia nas licitações e contratos. 12. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2011. p. 67.
153 No mesmo sentido, Leonardo Coelho Ribeiro, ao analisar o art. 12 da MP 489/2010, que disciplinava o regime diferenciado, mas que perdeu a sua eficácia, assim se posicionou: “A medida propicia diversos efeitos positivos, a saber: (i) economia procedimental, uma vez que a inversão pode ser capaz de exonerar a Administração Pública de analisar a habilitação de todos os concorrentes; (ii) mitiga a litigiosidade relativa aos documentos de habilitação que costuma ocorrer entre os licitantes nas licitações tradicionais, impedindo ou, ao menos, dificultando que isso sirva de barreira à entrada de outros licitantes; (iii) reforça a celeridade e a eficiência do procedimento licitatório” (O regime de licitações e contratos administrativos para Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. Boletim de Licitações e Contratos, p. 450, maio 2011).
154 De acordo com o TCU, a opção por orçamento aberto ou fechado em licitação regida pelo RDC insere-se na esfera de discricionariedade do gestor. TCU, Acórdão 3.011/12, Plenário, Rel. Min. Valmir Campelo, 08.11.2012 (Informativo de Jurisprudência sobre Licitações e Contratos do TCU n. 131).
155 SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo contratual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 149.
156 No original: “Use a maximum reserve price only if it is based on thorough market research and officials are convinced it is very competitive. Do not publish the reserve price, but keep it confidential in the file or deposit it with another public authority” (OCDE. Guidelines for fighting bid rigging in public procurement (Diretrizes para combater o conluio entre concorrentes em contratações públicas). Disponível em: <http://www.oecd.org/dataoecd/27/19/42851044.pdf>, p. 7. Acesso em: 17 set. 2011).
157 TCU, Plenário, Acórdão 114/07, Rel. Min. Benjamin Zymler, DOU 09.02.2007.
158 Nesse sentido, confiram-se os sempre atuais ensinamentos de Hely Lopes Meirelles: “Pré-qualificação (art. 114) é a verificação prévia das condições das firmas, consórcios ou profissionais que desejam participar de determinadas e futuras concorrências de um mesmo empreendimento. Não se confunde com a habilitação preliminar nas concorrências, porque esta se faz em cada concorrência e aquela se realiza para todas as concorrências de um empreendimento certo, que pode exigir uma única ou sucessivas concorrências. Também não se confunde com pré-classificação das propostas, mesmo porque na pré-qualificação os interessados não apresentam proposta, mas tão somente documentação comprobatória das condições técnicas, econômicas e jurídicas pedidas no edital como necessárias à execução do objeto do futuro contrato” (Direito administrativo brasileiro. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 95-97).
159 Nesse sentido, vide: FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Vade-mécum de licitações e contratos. Belo Horizonte: Fórum, 2004. p. 783-784.
160 Sobre o “efeito carona” no Sistema de Registro de Preços, vide item 1.6.1.
161 A Autoridade Pública Olímpica (APO) é formada pela União, Estado do Rio de Janeiro e Município do Rio de Janeiro, na forma do protocolo de intenções previsto na Lei 12.396/2011. O Decreto 7.560, de 08.09.2011, dispõe sobre os procedimentos a serem observados pelos órgãos da Administração Pública federal quanto às ações do Poder Executivo federal no âmbito da Autoridade Pública Olímpica (APO).