Um barman mais velho veio se juntar à nossa conversa no bar Cape Cod Room, no Hotel Del Prado. Quando soube que eu estava escrevendo um livro sobre o dia da bomba, ele me contou como havia sido aquele dia para ele, como havia sido o dia naquele mesmo bar em que estávamos sentados. Falava com uma voz nasalada de W. C. Fields* e tinha um nariz vermelho como um grande morango maduro.
– Naquela época, o bar não se chamava Cape Cod Room – disse ele. – Não tínhamos essas balditas redes e conchas por toda parte. O bar se chamava Tenda Navajo naquela época. Tinha mantas indígenas e crânios de vacas pendurados nas paredes. Tinha pequenos tambores nas mesas. As pessoas deveriam tocar os tambores quando quisessem fazer o pedido. Tentaram me obrigar a usar um cocar, mas me recusei. Um dia, um índio navajo de verdade entrou no bar e me disse que os navajos não viviam em tendas. “Isso é uma baldita vergonha”, eu disse a ele. Antes, isso aqui era o Bar Pompeia, com bustos de gesso por toda parte. Mas não importa que nome deem ao bar, nunca mudam os balditos lustres. As balditas pessoas que vêm aqui nunca mudam e nem essa baldita cidade aí fora. No dia em que jogaram a baldita bomba de Hoenikker nos japoneses, um vagabundo entrou e tentou filar um drinque. Queria que eu lhe desse um drinque de graça porque o mundo estava acabando. Então, preparei para ele um coquetel “Delícia do Fim do Mundo”. Coloquei uma dose de creme de menta num abacaxi oco, acrescentei chantilly e pus uma cereja em cima. “Pronto, seu filho da puta miserável”, eu disse a ele, “para não dizer que nunca fiz nada por você.” Outro cara entrou dizendo que ia largar o emprego no Laboratório de Pesquisa; disse que todo projeto de cientista fatalmente acaba virando uma arma, de um jeito ou de outro. Falou que não queria mais ajudar os políticos com suas balditas guerras. O sobrenome dele era Breed. Perguntei se ele era parente do chefe daquele baldito Laboratório de Pesquisa. Ele disse que era um baldito parente, sim. Disse que era o baldito filho do chefe do Laboratório de Pesquisa.
* Famoso comediante, ator e escritor norte-americano do começo do século 20. Era conhecido pela voz nasalada e pelo mau humor dos seus personagens. [N. de E.]