A GRANDE GUERRA TURCA

Número de mortos: 384 mil1

Posição na lista: 89

Tipo: embate de culturas

Linha divisória ampla: turcos versus Santa Aliança

Época: 1682-99

Localização: sudoeste da Europa

Principais Estados participantes: Áustria, Turquia otomana

Estados participantes secundários: Veneza, Polônia, Papado, Rússia

Estado com participação quântica: Hungria

Quem geralmente leva a maior culpa?: Kara Mustafá

O cerco a Viena

Quando seu rei e sua nobreza foram expulsos pelos turcos na Batalha de Mohacs, em 1526, a Hungria deixou de ser uma nação viável. O país sem líder foi repartido entre os austríacos, no nordeste e os turcos otomanos, no sudeste, mas, um século depois, os húngaros sob o comando de Imre Thokoly tentaram expulsar os austríacos da sua metade da Hungria. Após sofrer uma série de derrotas, Thokoly percebeu que não conseguiria fazer isso sozinho. Esperando jogar uma grande potência contra a outra, pediu ajuda aos turcos.

Seu pedido chegou na hora certa. A elite da infantaria turca, os janízaros, aguardava uma guerra, de olho nos espólios, e a trégua de vinte anos entre Turquia e Áustria estava a ponto de expirar. Kara Mustafá, o último vizir procedente da família Koprulu e o poder por trás do trono da Turquia otomana, aproveitou a oportunidade. Ele organizou um ataque maciço contra Viena. Embora a declaração de guerra emitida pelos turcos fosse de agosto de 1682, preparar um exército invasor de mais de 140 mil homens e quatrocentos canhões atrasou a ofensiva até a primavera.

Embora soubessem que os turcos estavam vindo, os austríacos vacilaram em preparar Viena para um cerco. Uma centena de anos de paz havia feito com que negligenciassem as fortificações. As fortalezas estavam erodidas. Casas e árvores haviam se espalhado pelo que deveria ser um campo aberto para o fogo de artilharia. Inicialmente, o imperador Leopoldo I não conseguia decidir se o seu lugar seria junto ao seu exército ou a salvo do perigo, mas, finalmente, fugiu da cidade pouco antes de a vanguarda turca chegar, deixando meros 12 mil soldados regulares para coordenar a defesa da milícia.

Felizmente para a cristandade, os turcos também negligenciaram. Quando cercaram Viena, em julho de 1683, cavaram trincheiras e esperaram, fazendo incursões ocasionais, mas nunca atacando com vigor, mesmo quando uma brecha favorável aparecia na defesa do inimigo. De acordo com as leis de guerra daquele tempo, os soldados rasos podiam legalmente pilhar, por três dias e sem restrições, uma cidade tomada por assalto, mas uma cidade capitulada pacificamente pertencia ao sultão. Kara, aparentemente, preferiu esperar e capturar Viena intacta para o império, em vez de tomá-la rapidamente e ver seus soldados a destruírem. Em vez disso, os turcos estiveram ocupados em aterrorizar as cercanias, arrasando 4 mil aldeias próximas a Perchtoldsdorf.

O cerco durou o bastante para o imperador aliciar 81 mil mercenários do leste europeu a fim de salvar Viena. A espinha dorsal desse exército era formada por 25 mil homens sob o comando do rei João III Sobieski, o último grande rei da Polônia. Sobieski e seus Hussardos Alados Polonesesa mergulharam na retaguarda do campo turco. Excessivamente confiantes em seus sucessos, os turcos não haviam fortificado sua retaguarda contra tal ataque e seu acampamento foi aniquilado. Todos fugiram, abandonando grandes estoques de suprimentos, provisões e tesouros.2

Redução de danos

Procurando um culpado pela derrota, Kara Mustafá prendeu Imre Thokoly, o rebelde húngaro que o tinha envolvido naquela confusão. A prisão de seu líder afrontou as tropas húngaras, que então se bandearam para o lado austríaco, levando todos das fortalezas da Hungria turca com eles. Somente a esposa de Imre ficou no lado turco para provar a lealdade do seu marido e conseguiu manter sua solitária fortaleza contra os austríacos durante três anos de cerco, até que finalmente se rendeu e foi levada para o cativeiro.3

O sultão otomano Mehmed IV, no entanto, tinha outro bode expiatório em mente. Ordenou que Kara Mustafá fosse enforcado pelo seu fracasso, e a cabeça embalsamada do vizir foi enviada ao sultão num saco de veludo para provar que a ordem havia sido cumprida. A cabeça, durante séculos, foi levada para todo lado, até que, finalmente, acabou como troféu num estojo no museu da cidade de Viena, mas, em 1970, os edis ficaram sensibilizados e a colocaram no porão, onde os turistas não podiam olhar embasbacados para aquilo.

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O sultão mal sobreviveu ao seu vizir. O fracasso em Viena estimulou um golpe em Constantinopla e Mehmed foi trancado numa masmorra, enquanto seu irmão era elevado ao trono; no entanto, o novo sultão logo morreu (de causa natural), assim como o seguinte. Finalmente, o império se estabilizou com um sultão que viveu tempo bastante para negociar a paz.

Com o lado turco no caos, os austríacos lançaram-se sobre as planícies húngaras. Tomaram Budapeste em 1686 e alcançaram a sua maior vitória em Mohács, no ano de 1687, apagando assim a pecha da derrota cristã naquele mesmo lugar, tantas gerações anteriores.

Os sérvios e os outros cristãos balcânicos festejaram a sua libertação dos turcos; no entanto, antes que a Áustria pudesse consolidar totalmente o seu novo território, suas tropas foram retiradas e enviadas para o leste a fim de combater a França numa guerra não declarada. Sem defesa, o Kôsovo rendeu-se aos turcos outra vez e os sérvios nativos fugiram da retaliação turca. Então, os turcos empurraram os albaneses islâmicos para a região despovoada, o que iria ocasionar outra guerra, trezentos anos mais tarde, em 1999.4

Enquanto os austríacos avançavam por terra contra os turcos, uma frota veneziana conquistou o sul da Grécia dos otomanos. Quando os venezianos sitiaram Atenas, a guarnição turca armazenou sua munição na construção maior, mais seca e mais resistente da cidade – o Partenon. Elegante, perfeitamente proporcional e decorado com soberbas esculturas, esse templo sobrevivera basicamente intacto a dois milênios, mas então uma bala de canhão atingiu o depósito, detonando uma explosão maciça que destruiu a maior parte do edifício, deixando apenas as colunatas externas em pé.

a Esses cavalarianos realmente usavam asas gigantes em seus uniformes. Eram tempos em que a aparência amedrontadora era mais importante do que o aspecto prático.