A GUERRA GRECO-TURCA
Número de mortos: 400 mil1
Posição na lista: 81
Tipo: colapso do Estado
Linha divisória ampla: Grécia versus Turquia
Época: 1919-22
Localização: Turquia
Quem geralmente leva a maior culpa: gregos, por parte dos turcos, e turcos, por parte dos gregos. Nunca ponham os dois no mesmo aposento.
Os turcos otomanos foram amplamente derrotados na Primeira Guerra Mundial, de modo que o sultão em Constantinopla vivia agora sob o domínio das potências Aliadas vitoriosas, que o forçaram a abrir mão de seu império. Os franceses e ingleses abocanharam a maioria das províncias árabes, e os italianos desembarcaram uma força de ocupação no sul da Anatólia, que é a península da Turquia asiática. Os gregos queriam expandir-se no litoral da Turquia, onde minorias gregas ainda viviam sob o domínio otomano. Infelizmente, os gregos e turcos constituíam um emaranhado por toda a Anatólia, de modo que não era fácil traçar uma fronteira clara entre eles.
O primeiro-ministro grego Eleftherios Venizelos, principal arquiteto do golpe palaciano que colocou a Grécia do lado vitorioso na Primeira Guerra Mundial, fez desembarcar um exército em Esmirna, hoje chamada Izmir, em maio de 1919, visando anexar essa cidade na Turquia, mas predominantemente grega, a seu país. Quase ao mesmo tempo, entretanto, o general turco Mustafá Kemal, mais tarde cognominado de Ataturk, denunciou o sultão e seus tratados, e tentou reviver a periclitante noção de nacionalidade do país, estabelecendo um governo de oposição no interior, em Ancara.
No verão de 1920, o exército grego partiu de Esmirna para o interior, na direção de Ancara, mas os soldados se indisciplinaram e fizeram brutalidades quando cruzavam o território turco. Conforme filtravam, para fora da zona de guerra, relatos do comportamento grego para com os civis turcos, a Grécia perdeu bastante do apoio internacional que angariara no começo da guerra.
Em outubro de 1920, o rei Alexandre da Grécia morreu de uma mordida de macaco que infeccionou,a de modo que o trono passou para seu pai, o rei Constantino, destronado em 1917 por ser pró-Alemanha. Quase ao mesmo tempo, o primeiro-ministro Venizelos perdeu a reeleição. O rei Constantino ainda guardava ressentimentos pelo fato de ter sido destronado, de modo que expulsou do governo os amigos de seu filho. A maioria dos oficiais gregos em campanha foram imediatamente exonerados e substituídos por inexperientes oficiais leais ao novo regime.
“A subsequente demonstração de incompetência militar foi espantosa, e (o correspondente de guerra Ernest) Hemingway relatou que os novos oficiais de artilharia ‘massacraram sua própria infantaria’.”2
Durante 1921, os turcos detiveram todas as ofensivas gregas e os levaram a um impasse. A maré virou na sangrenta Batalha do Rio Sakarya, em agosto de 1921.3 Um ano mais tarde, em agosto de 1922, Mustafá Kemal lançou uma ofensiva que rompeu as linhas gregas e os empurrou para o litoral. Enfurecidos com a derrota, os gregos “atearam fogo a vilarejo após vilarejo, enquanto fugiam através deles, deixando um rastro de ruínas fumegantes”.4
Os gregos retiraram-se para o porto de Esmirna, deixando milhares de refugiados para trás, enquanto os civis gregos fugiam da retaliação dos turcos. O exército grego partiu atabalhoadamente de Esmirna, mas não havia navios em quantidade suficiente para evacuar os civis. Logo chegou o exército turco e começou a saquear e incendiar o quarteirão armênio. Os incêndios ateados logo ficaram maiores e se propagaram, levados para o quarteirão grego pelos ventos e pelos próprios turcos. Enquanto o fogo varria a cidade de 13 a 15 de setembro, gregos e armênios desesperados enxameavam sobre o cais, em busca de navios que os levassem para a segurança. Durante toda a noite, os turcos chegaram para estuprar os refugiados ou para lançá-los do cais para o mar, e só pararam quando os navios na baía ligaram seus holofotes sobre eles e ameaçaram disparar os canhões. Os turcos reuniram todos os homens armênios de idade para lutar e os conduziram para o interior, e essa foi a última notícia que se teve deles.
Oficialmente, 2 mil pessoas morreram no incêndio, mas cerca de 200 mil gregos e armênios desapareceram e nunca mais se teve notícias deles. Os turcos juram que o incêndio foi acidental e que ficou fora de controle, mas coincidentemente o quarteirão turco foi poupado da devastação que destruiu o restante da cidade.
Uma vez determinado que a fronteira iria continuar como estava, os dois países, para se adequar à situação, expulsaram as pessoas que pertenciam à outra etnia. A fim de acabar com qualquer desculpa para outra invasão grega no futuro, a Turquia reuniu à força todos os gregos e os expulsaram do país. A Grécia então decidiu abrir espaço para os gregos que chegavam e expulsou todos os turcos. Como os turcos terminaram com o controle de todos os territórios disputados, havia três vezes mais gregos do que turcos do lado errado da fronteira.
Aproximadamente 375 mil turcos e 1,25 milhão de gregos foram erradicados e exilados, tornando esse o maior assentamento em massa da história até aquela data. Definitivamente os gregos levaram a pior na limpeza étnica, e foram expulsos com menos preparação e menos espaço nos navios. A Grécia teve dificuldade em absorver todos aqueles novos imigrantes. Atenas e Salônica ficaram entupidas, com o dobro de sua população normal, e 875 mil refugiados gregos, quase três quartos do total, necessitaram de ajuda governamental para sobreviver. Por volta de 1923, a mortalidade entre os recém-chegados se aproximava de 45%, com a devastação ocasionada pela malária, disenteria e tifo entre os refugiados.5
a “Talvez não seja exagero dizer que um quarto de milhão de pessoas morreu por causa da mordida desse macaco” (Winston Churchill, The World Crisis [A crise mundial], vol. 5 [Londres: Butterworth, 1929], p. 409).