GENOCÍDIO EM BENGALA
Número de mortos: 1,5 milhão1
Posição na lista: 40
Tipo: limpeza étnica
Linha divisória ampla: Paquistão ocidental versus Paquistão oriental
Época: 267 dias, em 1971
Localização: Paquistão oriental
Principal Estado participante: Paquistão
Estado com participação quântica: Bangladesh
Estado participante secundário: Índia
Quem geralmente leva a maior culpa: Agha Mohammad Yahya Khan
Geografia
Como país, o Paquistão surgiu a partir de dois territórios distintos em lados opostos da Índia, os quais não compartilhavam nada mais do que a religião muçulmana e um passado imperial britânico. A ala ocidental do país, Paquistão ocidental, era o centro etnicamente variegado de poder político, enquanto a outra banda, o Paquistão oriental, falava principalmente o bengalês e era tratado pela ala ocidental como uma colônia pobre, atrasada. O fato de que a população do lado oriental fosse ligeiramente maior do que a do lado ocidental tornava a mistura perigosa.
Quando um tufão devastador atingiu o Paquistão oriental, em novembro de 1970, o governo federal não deu o socorro esperado. O ditador militar do Paquistão, Agha Mohammad Yahya Khan, estava mais preocupado com assuntos portentosos da política internacional. Como aliado tanto da China quanto dos Estados Unidos, o Paquistão serviu como intermediário nas conversações Nixon-Mao. Yahya estava na China quando o desastre aconteceu.
Embora centenas de milhares de pessoas de seu país tivessem sido carregadas para o mar pelas ondas criadas pela tempestade, o ditador pouco fez para ajudar os sobreviventes. Outros países, como a Grã-Bretanha, os Estados Unidos, a Alemanha Ocidental e outros, enviaram ajuda antes que o governo do Paquistão o fizesse. Devido à indiferença federal, os nacionalistas bengaleses da Liga Awami ganharam influência por todo o Paquistão oriental, e se posicionaram para as eleições que logo aconteceriam.
Política
Pode parecer estranho que o Paquistão tivesse, ao mesmo tempo, tanto eleições quanto um ditador, mas isso era uma coisa normal para eles. O governo do país flutuava historicamente entre meio democrático e meio autocrático. De fato, um pouco de cada uma dessas coisas não era inusitado. O Paquistão geralmente tem um Parlamento, uma imprensa livre e um judiciário independente, isto é, mais ou menos independente, mas a liderança nacional alterna-se entre militares e civis. O chefão é um homem forte entre os militares, que deixa o funcionalismo civil administrar o país desde que nada exploda, ou um presidente eleito, que governa via subornos e extorsões, e não força o exército a fazer nada que ele não queira. Independentemente do caminho percorrido, ao longo da vida, pelo governante no poder, o governo do Paquistão é geralmente focalizado na personalidade de seu líder.
Durante as eleições nacionais de dezembro de 1970, a Liga Awami, liderada pelo xeique Mujibur Rahman, conquistou quase todos os assentos do Paquistão oriental, dando àquela organização uma sólida maioria nacional, mas isso apenas convenceu Yahya de que as eleições livres haviam sido um erro. Não havia nenhum meio senão a junta entregar o governo a Mujibur, mas ela tinha de se confrontar com o desconfortável efeito colateral de restaurar a democracia no Paquistão. Enquanto os bengaleses permanecessem unidos, apoiando a Liga Awami, eles teriam o poder de governar todo o país.
Nesse ínterim, a votação mostrou que o Partido Progressita do Povo dominava o Paquistão ocidental, mas o líder da organização, Zulfikar Ali Bhutto, recusou-se a sentar num parlamento dirigido por Mujibur. Ele apresentou a ideia de uma federação com duas partes, a qual, sem surpresa, o colocaria como governante da metade ocidental. Conversações tripartites entre Bhutto, Mujibur e Yahya se arrastaram, até que os ânimos explodiram. Mujibur comandou uma série de greves e protestos na província de Bengala, do Paquistão oriental, e Yahya enviou soldados para prendê-lo e restaurar a ordem em fevereiro de 1971.
“Mate três milhões deles”, ordenou o presidente Yahya Khan a seus auxiliares mais íntimos, “e o resto virá comer nas nossas mãos.”2 Apologistas paquistaneses insistem agora que o presidente não quis dizer isso, literalmente.
Massacre
O general Tikka Khan assumiu o comando do exército no Paquistão oriental em 7 de março, e dentro de semanas começou a massacrar os bengaleses, começando pelas universidades. Os intelectuais bengaleses e os líderes políticos foram caçados. O exército matou 3 mil pessoas em Dacca no primeiro dia, 25 de março, e pelo menos 30 mil nos primeiros poucos dias, enquanto o restante dos habitantes fugia em pânico.
“A noite tranquila transformou-se num tempo de gemidos, choro e incêndios”, descreveu um general paquistanês em suas memórias. “O general Tikka lançou todos os meios a seu dispor como se estivesse atacando um inimigo. Em vez de desarmar as unidades bengalesas e aprisionar os líderes da área, como lhe fora ordenado, ele recorreu à política de terra arrasada e de matar os civis.”3
Na universidade, os soldados paquistaneses atearam fogo no dormitório das mulheres e atiraram com metralhadoras sobre as estudantes quando elas fugiam pelas portas.4 Na cidade de Hariharpara, perto de Dacca, os paquistaneses amontoaram prisioneiros em um armazém abandonado. À noite, amarrados juntos em grupos de seis, mais ou menos, eles foram levados para fora e forçados a entrar no rio até a cintura. Silhuetados por poderosas lâmpadas de arco, foram então fuzilados e os cadáveres deixados flutuar ao sabor da corrente.5
Archer Blood, o cônsul americano em Dacca, telegrafou para seu governo no dia 28 de março, com detalhes sobre o genocídio que acontecia, e implorou, sem sucesso, que os Estados Unidos intervissem. “Aqui em Dacca somos testemunhas mudas e horrorizadas de um reino de terror instaurado pelos militares paquistaneses.” Entretanto, o Departamento de Estado norte-americano precisava de Yahya Khan para seus contatos com Mao Tsé-tung, de modo que expediu ordens para não perturbar os paquistaneses.6
Não existira nenhum movimento separatista no Paquistão oriental antes de os massacres começarem, mas agora os sobreviventes começaram a se organizar em milícias para reagir, usando as armas que pudessem improvisar. Nesse ínterim, cerca de 30 milhões de bengaleses foram erradicados internamente durante esses meses, e qualquer coisa entre 6 e 10 milhões de refugiados bengaleses se derramaram pela Índia para escapar aos massacres. Assoberbado com o influxo maciço de gente morrendo de fome, desesperada, a Índia decidiu tornar o Paquistão oriental um lugar seguro para seu retorno. No dia 3 de dezembro, a Índia invadiu o Paquistão oriental, e já no dia 16 o exército paquistanês local se rendera. Isso permitiu a criação do Estado independente de Bangladesh.7