[escutando Villa-lobos]
(São Paulo, 21 de abril de 1923)
A primeira voz do mato goteja nas franças, úmida deorvalho.[175]
O arrepio da brisa
murmúrios
cochichos
5 asa trépida no vale vasto, adormecido pela noite de estio.
Tudo acorda e se queda num bafo lânguido de sumo.[176]
... suspiro...[177]
É o dia mais uma vez.
O dia outra vez.
10 Vai se repetir a maravilha fantástica do dia...
Já surge no céu desnublado do oriente o pincel verde do sol.
E ele virá de novo pintar a mesma paisagem...
As mesmas árvores vão se equilibrar no quadro...
O mesmo ribeirão com o sombrio das águas fundas...[178]
15 De manhã riscarão o céu sempre gritos...
Ao meio-dia a natureza morrerá...
De tarde o pormenor romântico dum socó...[179]
... suspiro...
A madrugada enjoada se vira no leito elevado.
20 Dá as costas à terra pra não ver.
Seus cabelos duros[180]
Caem pesadamente pelas lombadas dos morros macios,
Desnudando-lhe o corpo.[181]
E sobre as almofadas do horizonte, preguiçosa,
25 Ela move as hercúleas coxas róseas.