Sumário: 23.1. Fundamento – 23.2. Dispositivo legal – 23.3. Natureza jurídica e conceito – 23.4. Requisitos legais: 23.4.1. Agressão injusta; 23.4.2. Agressão atual ou iminente; 23.4.3. Agressão a direito próprio ou alheio; 23.4.4. Reação com os meios necessários; 23.4.5. Uso moderado dos meios necessários – 23.5. Legítima defesa e vingança – 23.6. Desafio e legítima defesa – 23.7. Espécies de legítima defesa: 23.7.1. Quanto à forma de reação; 23.7.2. Quanto à titularidade do bem jurídico protegido; 23.7.3. Quanto ao aspecto subjetivo de quem se defende; 23.7.4. Legítima defesa da honra; 23.7.5. Legítima defesa presumida; 23.7.6. Legítima defesa sucessiva – 23.8. Legítima defesa contra a multidão – 23.9. Legítima defesa contra pessoa jurídica – 23.10. Legítima defesa nas relações familiares – 23.11. Legítima defesa e aberratio ictus – 23.12. Legítima defesa de terceiro e consentimento do ofendido – 23.13. Diferença entre estado de necessidade e legítima defesa – 23.14. Existência simultânea de legítima defesa e de estado de necessidade – 23.15. Legítima defesa e relação com outras excludentes: admissibilidade – 23.16. Legítima defesa e relação com outras excludentes: inadmissibilidade – 23.17. Legítima defesa e desobediência civil: distinção – 23.18. Questões.
O instituto da legítima defesa é inerente à condição humana. Acompanha o homem desde o seu nascimento, subsistindo durante toda a sua vida, por lhe ser natural o comportamento de defesa quando injustamente agredido por outra pessoa. Como argumenta Galdino Siqueira:
Tão visceralmente ligada à pessoa se manifesta a defesa, isto é, a faculdade de repelir pela força o ataque no momento em que se produz, que CÍCERO, na sua oração – Pro Milone, a reputa como um direito natural, derivado da necessidade – non scripta sed nata lex, proposição verdadeira, se considerarmos o substratum fisiológico e psicológico da defesa, como reação do instinto de conservação que brota e se desenvolve independente de qualquer regulamentação.1
Em razão da sua compreensão como direito natural, a legítima defesa sempre foi aceita por praticamente todos os sistemas jurídicos, ainda que muitas vezes não prevista expressamente em lei, constituindo-se, dentre todas, na causa de exclusão da ilicitude mais remota ao longo da história das civilizações.
De fato, o Estado avocou para si a função jurisdicional, proibindo as pessoas de exercerem a autotutela, impedindo-as de fazerem justiça pelas próprias mãos. Seus agentes não podem, contudo, estar presentes simultaneamente em todos os lugares, razão pela qual o Estado autoriza os indivíduos a defenderem direitos em sua ausência, pois não seria correto deles exigir a instantânea submissão a um ato injusto para, somente depois, buscar a reparação do dano perante o Poder Judiciário.
Nos termos do art. 25 do Código Penal: “Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”.
Como se extrai do art. 23, II, do Código Penal, a legítima defesa é causa de exclusão da ilicitude. Destarte, o fato típico praticado em legítima defesa é lícito. Não configura crime.
O conceito decorre do art. 25 do Código Penal: trata-se da causa de justificação consistente em repelir injusta agressão, atual ou iminente, a direito próprio ou alheio, usando moderadamente dos meios necessários.
A análise do art. 25 do Código Penal revela a dependência da legítima defesa aos seguintes requisitos cumulativos: (1) agressão injusta; (2) atual ou iminente; (3) direito próprio ou alheio; (4) reação com os meios necessários; e (5) uso moderado dos meios necessários.
Esses requisitos, pois, podem ser divididos em dois blocos:
Agressão é toda ação ou omissão humana, consciente e voluntária, que lesa ou expõe a perigo de lesão um bem ou interesse consagrado pelo ordenamento jurídico.
Trata-se de atividade exclusiva do ser humano. Não pode ser efetuada por um animal, ou por uma coisa, por faltar-lhes a consciência e a voluntariedade ínsitas ao ato de agredir.
Portanto, animais que atacam e coisas que oferecem riscos às pessoas podem ser sacrificados ou danificados com fundamento no estado de necessidade, e não na legítima defesa, reservada a agressões emanadas do homem.
Nada impede, entretanto, a utilização de animais como instrumentos do crime, como nos casos em que são ordenados, por alguém, ao ataque de determinada pessoa. Funcionam como verdadeiras armas, autorizando a legítima defesa. Exemplo: “A” determina ao seu cão bravio o ataque contra “B”. Esse último poderá matar o animal, acobertado pela legítima defesa.
A agressão pode emanar de um inimputável. O inimputável pratica conduta consciente e voluntária, apta a configurar a agressão. O fato previsto em uma lei incriminadora por ele cometido é típico e ilícito. Falta-lhe apenas a culpabilidade. A agressão é tomada em sentido meramente objetivo, não guardando vínculo nenhum com o subjetivismo da culpabilidade.
É pacífico na doutrina, entretanto, que a condição de inimputável do agressor, se conhecida do agredido, impõe a este maior diligência no evitar, e maior moderação no repelir o ataque. Assim, não haveria desonra na fuga, e a esta, se possível e capaz de afastar a agressão, deve recorrer o agredido.2
Há posições em sentido contrário. É o caso de Nélson Hungria, que equiparava os inimputáveis aos seres irracionais. A defesa contra o ataque deles originado, consequentemente, não caracterizava legítima defesa, mas estado de necessidade.
Em regra, a agressão é praticada por meio de uma ação, mas nada impede a sua veiculação por omissão, quando esta se apresenta idônea a causar danos e o omitente tinha, no caso concreto, o dever jurídico de agir. Mezger fornece o exemplo do carcereiro que tem o dever de liberar o recluso cuja pena já foi integralmente cumprida. Com a sua omissão ilícita, inevitavelmente agride um bem jurídico do preso, autorizando a reação em legítima defesa.3
Além disso, a agressão deve ser injusta.
Agressão injusta é a de natureza ilícita, isto é, contrária ao Direito. Pode ser dolosa ou culposa. É obtida com uma análise objetiva, consistindo na mera contradição com o ordenamento jurídico.
Não se exige, para ser injusta, que a agressão seja prevista como infração penal. Basta que o agredido não esteja obrigado a suportá-la. Exemplo: pode agir em legítima defesa o proprietário do bem atingido por um “furto” de uso.
A agressão injusta deve ser atual ou iminente.
Ao contrário do estado de necessidade, em que o legislador previu expressamente somente o perigo atual, na legítima defesa admite-se seja a agressão atual ou iminente.
Não pode o homem de bem ser obrigado a ceder ao injusto. Seria equivocado exigir fosse ele agredido efetivamente para, somente depois, defender-se. Exemplificativamente, não está ele obrigado a ser atingido por um disparo de arma de fogo para, após, defender-se matando o seu agressor. Ao contrário, com a iminência da agressão é permitida a reação imediata contra o agressor, desde que presente o justo receio quanto ao ataque a ser contra ele perpetrado.
Atual é a agressão presente, isto é, já se iniciou e ainda não se encerrou a lesão ao bem jurídico. Exemplo: a vítima é atacada com golpes de faca.
Iminente é a agressão prestes a acontecer, ou seja, aquela que se torna atual em um futuro imediato. Exemplo: o agressor anuncia à vítima a intenção de matá-la, vindo à sua direção com uma faca em uma das mãos.
A agressão futura (ou remota) e a agressão passada (ou pretérita) não abrem espaço para a legítima defesa. O medo e a vingança não autorizam a reação, mas apenas a necessidade de defesa urgente e efetiva do interesse ameaçado. Com efeito, admitir-se a legítima defesa contra agressão futura seria um verdadeiro convite para o duelo, desestimulando a pessoa de recorrer à autoridade pública para a tutela de seus direitos. E a agressão pretérita caracterizaria nítida vingança.
A agressão injusta, atual ou iminente, deve ameaçar bem jurídico próprio ou de terceiro.
Qualquer bem jurídico pode ser protegido pela legítima defesa, pertencente àquele que se defende ou a terceira pessoa. Em compasso com o auxílio mútuo que deve reinar entre os indivíduos, o Código Penal admite expressamente a legítima defesa de bens jurídicos alheios, com amparo no princípio da solidariedade humana.
E na legítima defesa de terceiro, a reação pode atingir inclusive o titular do bem jurídico protegido. O terceiro funciona como agredido e defendido, simultaneamente. Exemplo: “A”, percebendo que “B” se droga compulsivamente e não aceita conselhos para parar, decide agredi-lo para que desmaie, e, assim, deixe de ingerir mais cocaína, que o levaria à morte.
Não mais existem as limitações antigas que autorizavam a legítima defesa apenas em relação à vida ou ao corpo. Vige atualmente a mais larga amplitude de defesa dos bens jurídicos, pois o Direito não pode distingui-los em mais ou menos valiosos, amparando os primeiros e relegando os últimos ao abandono.
Em suma, é todo o patrimônio jurídico do indivíduo que se deve ter por inviolável, e no qual ninguém poderá penetrar pela força sem o risco de se ver repelido com a força necessária.4
É possível o emprego da excludente para a tutela de bens pertencentes às pessoas jurídicas, inclusive do Estado, pois atuam por meio de seus representantes e não podem defender-se sozinhas. Veja-se o exemplo da pessoa que, percebendo uma empresa ser furtada, luta com o ladrão e o imobiliza até a chegada da força policial.
Admite-se, também, a legítima defesa do feto. Deveras, o art. 2.º do Código Civil resguarda os direitos do nascituro, que podem ser defendidos por terceiros. É o caso do agente que, percebendo estar a gestante na iminência de praticar um autoaborto, a impede, internando-a posteriormente em um hospital para que o parto transcorra normalmente.
Embora com alguma controvérsia, pode-se ainda falar em legítima defesa do cadáver. Nada obstante não seja titular de direitos, a utilização da causa justificativa encontra amparo no reconhecimento que o Estado lhe confere, em respeito à sociedade e aos seus familiares, criando, inclusive, crimes destinados a esse desiderato, como se dá com a destruição, subtração ou ocultação, e também com o vilipêndio a cadáver (CP, arts. 211 e 212).5
Meios necessários são aqueles que o agente tem à sua disposição para repelir a agressão injusta, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem, no momento em que é praticada.
A legítima defesa não é desforço desnecessário, mas medida que se destina à proteção de bens jurídicos. Não tem por fim punir, razão pela qual deve ser concretizada da forma menos lesiva possível.
O calor do momento da agressão, todavia, impede sejam calculados os meios necessários de forma rígida e matemática. Seu cabimento deve ser analisado de modo flexível, e não em doses milimétricas. A escolha dos meios deve obedecer aos reclamos da situação concreta de perigo, não se podendo exigir uma proporção mecânica entre os bens em conflito.6
O meio necessário, desde que seja o único disponível ao agente para repelir a agressão, pode ser desproporcional em relação a ela, se empregado moderadamente. Imagine-se um agente que, ao ser atacado com uma barra de ferro por um desconhecido, utiliza uma arma de fogo, meio de defesa que estava ao seu alcance. Estará caracterizada a excludente.
Acerca desse tema, curial a leitura de Bento de Faria:
O homem que é subitamente agredido, não pode, na perturbação e na impetuosidade da sua defesa, proceder a operação de medir a sangue frio e com exatidão se há algum outro recurso para o qual possa apelar, que não o de infligir um mal ao seu agressor; se há algum meio menos violento a empregar na defesa, se o mal que inflige excede ou não o que seria necessário à mesma defesa. É preciso considerar os fatos como eles ordinariamente se apresentam, e reconhecer as fraquezas inerentes à natureza humana, não se exigindo dela o que ela não pode dar; reconhecer mesmo as exigências sociais, que podem justificar o emprego de certos meios de defesa, suposto não seja absoluta a necessidade desse emprego.7
Se o meio empregado for desnecessário, estará configurado o excesso, doloso, culposo ou exculpante (sem dolo ou culpa), dependendo das condições em que ocorrer.
Ao contrário do que ocorre no estado de necessidade, a possibilidade de fuga ou o socorro pela autoridade pública não impedem a legítima defesa. Não se impõe o commodus discessus, isto é, o agredido não está obrigado a procurar a saída mais cômoda e menos lesiva para escapar do ataque injusto.
O Direito não pode se curvar a uma situação ilícita. Ademais, lhe é vedado obrigar que alguém seja pusilânime ou covarde, fugindo de um ataque injusto quando pode legitimamente se defender.
Há situações, entretanto, em que a fuga do local se mostra a medida mais coerente, não acarretando vergonha ou humilhação. Exemplo: o agente, agredido injustamente por sua mãe, que deseja feri-lo em um acesso inesperado de fúria provocado por fatores até então ignorados, age corretamente ao fugir, quando em tese poderia até mesmo lesioná-la para fazer cessar o ataque.8
Caracteriza-se pelo emprego dos meios necessários na medida suficiente para afastar a agressão injusta.
Utiliza-se o perfil do homem médio, ou seja, para aferir a moderação dos meios necessários o magistrado compara o comportamento do agredido com aquele que, em situação semelhante, seria adotado por um ser humano de inteligência e prudência comuns à maioria da sociedade.
Essa análise não é rígida, baseada em critérios matemáticos ou científicos. Comporta ponderação, a ser aferida no caso concreto, levando em conta a natureza e a gravidade da agressão, a relevância do bem ameaçado, o perfil de cada um dos envolvidos e as características dos meios empreendidos para a defesa.
O art. 25 do Código Penal não a exige expressamente, mas firmaram-se doutrina e jurisprudência no sentido de que, assim como no estado de necessidade, a legítima defesa reclama também proporcionalidade entre os bens jurídicos em conflito.
O bem jurídico preservado deve ser de valor igual ou superior ao sacrificado, sob pena de configuração do excesso. Exemplo: não pode invocar legítima defesa aquele que mata uma pessoa pelo simples fato de ter sido por ela ofendido verbalmente.
Nada obstante o caráter objetivo da legítima defesa, exige-se a existência, naquele que reage, da vontade de defender-se. Seu ato deve ser uma resposta à agressão de outrem, e esse caráter de reação precisa estar presente nos dois momentos de sua atuação: o objetivo e o subjetivo.
Entretanto, não exclui a legítima defesa a circunstância de o agente unir ao fim de defender-se uma finalidade diversa, tal como a vingança, desde que objetivamente não exceda os requisitos da necessidade (uso dos meios necessários) e da moderação (emprego moderado de tais meios). Exemplo: “A”, com o desejo antigo de matar “B”, em razão de brigas pretéritas, aproveita-se do ataque injustificado de seu desafeto para eliminar a sua vida.
Não há legítima defesa no desafio, no duelo, no convite para a luta. Os contendores respondem pelos crimes praticados.
A divisão da legítima defesa tem como parâmetros a forma de reação, a titularidade do bem jurídico protegido e o aspecto subjetivo daquele que se defende.
Adotando-se como parâmetro a forma de reação, a legítima defesa pode ser:
a) Agressiva, ou ativa: é aquela em que a reação contra a agressão injusta configura um fato previsto em lei como infração penal. Exemplo: provocar lesões corporais no agressor.
b) Defensiva, ou passiva: é a legítima defesa na qual aquele que reage limita-se a impedir os atos agressivos, sem praticar um fato típico. Exemplo: segurar os braços do agressor para que ele não desfira socos.
Na hipótese em que o parâmetro for a titularidade do bem jurídico protegido, a legítima defesa pode ser própria e de terceiro.
a) Própria: é aquela em que o agente defende bens jurídicos de sua titularidade.
b) De terceiro: é aquela em que o agente protege bens jurídicos alheios.
No que tange ao aspecto subjetivo daquele que se defende, a legítima defesa pode ser:
a) Real: é a espécie de legítima defesa em que se encontram todos os requisitos previstos no art. 25 do Código Penal. Exclui a ilicitude do fato (CP, art. 23, II).
b) Putativa ou imaginária: é aquela em que o agente, por erro, acredita existir uma agressão injusta, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem. Exemplo: “A” foi jurado de morte por “B”. Em determinada noite, em uma rua escura, encontram-se. “B” coloca a mão no bolso, e “A”, acreditando que ele iria pegar uma arma, mata-o. Descobre-se, posteriormente, que “B” tinha a intenção de oferecer-lhe um charuto para selar a paz.
O fato típico praticado permanece revestido de ilicitude, e seus efeitos variam em conformidade com a teoria adotada no tocante às descriminantes putativas (Capítulo 15, item 15.8).
c) Subjetiva ou excessiva: é aquela em que o agente, por erro de tipo escusável, excede os limites da legítima defesa. É também denominada de excesso acidental. Exemplo: “A”, de porte físico avantajado, parte para cima de “B”, para agredi-lo. Este, entretanto, consegue acertar um golpe violento, fazendo seu inimigo desmaiar. Não percebe, contudo, que “A” estava inconsciente e, com medo de ser agredido, continua a desferir socos desnecessários. Não responde pelo excesso, em face de sua natureza acidental.
Embora diminuída, ainda subsiste polêmica acerca da admissibilidade da legítima defesa da honra.
A honra, direito fundamental do homem, é inviolável por expressa disposição constitucional (art. 5.º, X).
E como o art. 25 do Código Penal não faz distinção entre os bens jurídicos, também pode ser alcançada pela legítima defesa.
Mas a honra não pode ser isoladamente considerada. Deve ser analisada em determinado contexto, pois pode ser dividida em três aspectos distintos: respeito pessoal, liberdade sexual e infidelidade conjugal.
O respeito pessoal, que engloba a dignidade e o decoro, é ofendido pelos crimes contra a honra: calúnia, difamação e injúria. Para a sua tutela, admite-se o emprego de força física, necessária e moderada, visando impedir a reiteração das ofensas. E, a propósito, no campo da injúria, a retorsão imediata, que consiste em outra injúria, é passível de perdão judicial (CP, art. 140, § 1.º).
No âmbito da liberdade sexual (livre disposição do corpo para fins sexuais), também se autoriza a legítima defesa. É o caso da pessoa que pode ferir ou até mesmo matar quem tenta lhe estuprar.
Há, finalmente, a infidelidade conjugal. Aí reside a maior celeuma, relativa à legítima defesa da honra na órbita do adultério. No passado, admitia-se a exclusão da culpabilidade para os crimes passionais motivados pelo adultério. Atualmente, depois de muita discussão, e, notadamente, com a evolução da sociedade e com o respeito aos direitos da mulher, prevalece o entendimento de que a traição conjugal não humilha o cônjuge traído, mas sim o próprio traidor, que não se mostra preparado para o convívio familiar.
Além disso, respeita-se o caráter fragmentário e a subsidiariedade do Direito Penal, que não deve ser chamado para resolver o impasse, pois o ordenamento jurídico prevê outras formas menos gravosas para essa finalidade. Com efeito, admite-se a separação, e também o divórcio litigioso, fundados na violação dos deveres do matrimônio. E ainda no campo civil, tem-se aceitado até mesmo a indenização por danos morais ao cônjuge prejudicado pela traição.
Essa posição se reforça com a descriminação do crime de adultério, revogado pela Lei 11.106/2005.
Deveras, se não se admite sequer a responsabilidade penal de quem trai o seu cônjuge, com maior razão infere-se que o Direito Penal não autoriza a legítima defesa da honra, principalmente com o derramamento de sangue do traidor.
A tipicidade funciona como indício da ilicitude. Portanto, todo fato típico presume-se ilícito.
Inverte-se o ônus da prova: quem alega qualquer excludente da ilicitude, aí se inserindo a legítima defesa, deve provar a sua ocorrência. Por esse motivo, não se admite a legítima defesa presumida.
No Êxodo (XXII, 2-3) constava:
Se um ladrão for encontrado forçando a porta ou escavando a parede da casa, e, sendo ferido, morrer, aquele que o feriu não será réu de morte. Se, porém, fez isto depois de ter nascido o sol, cometeu um homicídio, e ele mesmo morrerá.
No direito romano falava-se expressamente em legítima defesa presumida. Como lembra Jorge Alberto Romeiro: “A noite autorizava, ainda, para os romanos, a presunção de legítima defesa em favor daquele que matasse um ladrão, quando surpreendido furtando, pelo justo receio do ataque”.9
Constitui-se na espécie de legítima defesa em que alguém reage contra o excesso de legítima defesa. Exemplo: “A” profere palavras de baixo calão contra “B”, o qual, para calá-lo, desfere-lhe um soco. Em seguida, com “A” já em silêncio, “B” continua a agredi-lo fisicamente, autorizando o emprego de força física pelo primeiro para defender-se.
É possível essa legítima defesa, pois o excesso sempre representa uma agressão injusta.
Prevalece o entendimento pela sua admissibilidade, pois o instituto da legítima defesa reclama tão somente uma agressão injusta, atual ou iminente, a direito próprio ou alheio, emanada de seres humanos, pouco importando sejam eles individualizados ou não.10
Em sentido contrário a opinião de Vincenzo La Medica, para quem o comportamento de defesa contra a multidão configura estado de necessidade.11
É possível a legítima defesa contra pessoa jurídica, uma vez que esta exterioriza a sua vontade por meio da conduta de seres humanos, permitindo a prática de agressões injustas.12 Exemplo: o funcionário de uma empresa escuta, pelo sistema de som, ofensas à sua honra. Para impedir a reiteração da conduta, pode destruir o alto-falante que transmite as palavras inadequadas.
Duas situações distintas podem ser visualizadas: (1) agressões dos pais contra os filhos; e (2) agressões entre os cônjuges.
Na relação entre pais e filhos, os castigos moderados inserem-se no campo do exercício regular de direito, impedindo a intervenção de terceiras pessoas.
Se, entretanto, os castigos forem imoderados e excessivos, caracterizam agressão injusta, autorizando a legítima defesa pelo descendente, por outro familiar ou mesmo por pessoa estranha.
No tocante às relações entre os cônjuges, não tem qualquer deles mando ou hierarquia sobre o outro, em face da regra contida no art. 226, § 5.º, da Constituição Federal: “Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”.
Nesses termos, se o marido agredir injustamente a mulher, ou vice-versa, será cabível a legítima defesa por qualquer deles, ou mesmo por outro familiar ou terceira pessoa.13
Se repelindo uma agressão injusta, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem, o agente atinge pessoa inocente, por erro no emprego dos meios de execução, subsiste em seu favor a legítima defesa. Exemplo: “A” se defende de tiros de “B”, revidando disparos de arma de fogo em sua direção. Acerta, todavia, “C”, que nada tinha a ver com o incidente, matando-o.
Incidirá ainda a justificativa se o agente atingir a pessoa almejada e também pessoa inocente. No exemplo acima, “A” mataria “B” e “C”.
De fato, o art. 73 do Código Penal é peremptório ao estabelecer que o crime considera-se praticado contra a pessoa visada, permitindo a conclusão de que essa regra aplica-se inclusive para efeito de exclusão da ilicitude.
A questão que se coloca é: para o exercício da legítima defesa de terceiro é necessário o seu consentimento para ser protegido de uma agressão injusta?
A resposta pode ser negativa ou positiva, dependendo da natureza do bem jurídico atacado.
Em se tratando de bem jurídico indisponível, será prescindível o consentimento do ofendido. Exemplo: um homem agride cruelmente sua esposa, com o propósito de matá-la. Aquele que presenciar o ataque poderá, sem a anuência da mulher, protegê-la, ainda que para isso tenha que lesionar ou mesmo eliminar a vida do covarde marido.
Diversa será a conclusão quando tratar-se de bem jurídico disponível. Nessa hipótese, impõe-se o consentimento do ofendido, se for possível a sua obtenção. Exemplo: um homem ofende com impropérios a honra de sua mulher. Por mais inconformado que um terceiro possa ficar com a situação, não poderá protegê-la sem o seu assentimento.
Não se olvide, porém, que mesmo no caso de bem jurídico disponível, estará caracterizada a legítima defesa putativa quando o terceiro atuar sem o consentimento do ofendido.
Estado de necessidade e legítima defesa são causas legais de exclusão da ilicitude (CP, art. 23, I e II). Além disso, ambos têm em comum o perigo a um bem jurídico, próprio ou de terceiro.
Mas diferenciam-se claramente.
Na legítima defesa, o perigo provém de uma agressão ilícita do homem, e a reação se dirige contra seu autor.
Por outro lado, no estado de necessidade agressivo o perigo é originário da natureza, de seres irracionais ou mesmo de um ser humano, mas, para dele se safar, o agente sacrifica bem jurídico pertencente a quem não provocou a situação de perigo. Exemplo: “A”, para salvar-se de uma enchente, subtrai o barco de “B”.
No estado de necessidade defensivo o agente sacrifica bem jurídico de titularidade de quem causou a situação de perigo. Exemplo: “A” mata um touro bravio de seu vizinho, que não consertou a cerca da fazenda, e por esse motivo estava o animal pronto a atacar crianças que nadavam em um pequeno riacho. A reação dirige-se contra a coisa da qual resulta o perigo, e não contra a pessoa que provocou a situação perigosa.
Em alguns casos, contudo, a situação de perigo ao bem jurídico é provocada por uma agressão lícita do ser humano que atua em estado de necessidade. Como o ataque é lícito, eventual reação caracterizará estado de necessidade, e não legítima defesa. Exemplo: “A” e “B” estão perdidos no deserto, e a água que carregam somente saciará a sede de um deles. “A”, em estado de necessidade, furta a água de “B”, o qual, para salvar-se, mata em estado de necessidade seu companheiro.
É possível que uma mesma pessoa atue simultaneamente acobertada pela legítima defesa e pelo estado de necessidade, quando, para repelir uma agressão injusta, praticar um fato típico visando afastar uma situação de perigo contra bem jurídico próprio ou alheio. Exemplo: “A”, para defender-se de “B”, que injustamente desejava matá-lo, subtrai uma arma de fogo pertencente a “C” (estado de necessidade), utilizando-a para matar o seu agressor (legítima defesa).
Os requisitos previstos no art. 25 do Código Penal revelam a admissibilidade da legítima defesa nos seguintes casos:
a) Legítima defesa real contra legítima defesa putativa
A legítima defesa real pressupõe uma agressão injusta. E essa agressão injusta estará presente na legítima defesa putativa, pois aquele que assim atua, atacando terceira pessoa, o faz de maneira ilícita, permitindo a reação defensiva. Exemplo: “A” caminha em área perigosa. De repente, visualiza “B” colocando a mão no interior de sua blusa, e, acreditando que seria assaltado, “A” saca uma arma de fogo para matar “B”. Este último, entretanto, que iria apenas pegar um cigarro, consegue se esquivar dos tiros, e, em seguida, mata “A” para se defender.
A legítima defesa real é o revide contra agressão efetivamente injusta, enquanto a legítima defesa putativa é a reação imaginária, erroneamente suposta, pois existe apenas na mente de quem a realiza. No exemplo mencionado, “A” agiu em legítima defesa putativa, ensejando a legítima defesa real por parte de “B”.
Esse raciocínio é também aplicável a todas as demais excludentes da ilicitude putativas (estado de necessidade, exercício regular de direito e estrito cumprimento de dever legal).
b) Legítima defesa putativa recíproca (legítima defesa putativa contra legítima defesa putativa)
Ocorre na hipótese em que dois ou mais agentes acreditam, erroneamente, que um irá praticar contra o outro uma agressão injusta, quando na verdade o ataque ilícito não existe. Exemplo: “A” e “B”, velhos desafetos, encontram-se em local ermo. Ambos colocam as mãos nos bolsos ao mesmo tempo, e, em razão disso, partem um para cima do outro, lutando até o momento em que desmaiam. Posteriormente, apura-se que “A” iria oferecer a “B” um cigarro, enquanto este, que havia perdido a fala em um acidente, entregaria àquele um pedido escrito de desculpas pelos desentendimentos pretéritos.
c) Legítima defesa real contra legítima defesa subjetiva
Legítima defesa subjetiva, ou excessiva, é aquela em que o indivíduo, por erro escusável, ultrapassa os limites da legítima defesa. Daí ser também chamada de excesso acidental. No momento em que se configura o excesso, a outra pessoa – que de agressor passou a ser agredido –, pode agir em legítima defesa real, uma vez que foi praticada contra ele uma agressão injusta. Veja o exemplo: “A”, de porte físico avantajado, parte para cima de “B”, para agredi-lo. Este, entretanto, consegue acertar um golpe violento, fazendo seu inimigo desistir da contenda. “B” não nota, todavia, que “A” já estava imóvel, e continua a atacá-lo, desnecessariamente. A partir daí, essa agressão se torna injusta, e “A” poderá agir em legítima defesa real contra o excesso de “B”.
d) Legítima defesa real contra legítima defesa culposa
Tal situação é possível, pois para a legítima defesa importa somente o caráter injusto da agressão, objetivamente considerado, independente do elemento subjetivo do agente. Exemplo: “A”, sem adotar maior cautela, confunde “B” com uma pessoa que havia prometido matá-lo tão logo o encontrasse, e passa a efetuar disparos de arma de fogo para atingi-lo. “B” poderá, contra essa agressão injusta culposamente perpetrada, agir acobertado pela legítima defesa real.
e) Legítima defesa contra conduta amparada por causa de exclusão da culpabilidade
Será sempre cabível a legítima defesa contra uma agressão que, embora injusta, esteja acobertada por qualquer causa de exclusão da culpabilidade. Exemplo: “A” chega ao Brasil vindo de um país em que não há proteção sobre a propriedade de bens móveis. Não possui, pois, conhecimento acerca do caráter ilícito da conduta de furtar (erro de proibição). Dirige-se à residência de “B” para subtrair diversos de seus pertences. Assim agindo, autoriza “B” a repelir a agressão injusta em legítima defesa do seu patrimônio.
a) Legítima defesa real recíproca (legítima defesa real contra legítima defesa real)
Não é cabível, pois o pressuposto da legítima defesa é a existência de uma agressão injusta. E, se a agressão de um dos envolvidos é injusta, automaticamente a reação do outro será justa, pois constituirá uma simples atitude de defesa. Consequentemente, apenas este último estará protegido pela causa de exclusão da ilicitude.
b) Legítima defesa real contra outra excludente real
Por idênticos motivos aos ligados à não aceitação da legítima defesa real recíproca, é inadmissível a relação da legítima defesa real com o estado de necessidade real, com o exercício regular de direito real, e, finalmente, com o estrito cumprimento de dever legal real.
O fundamento, vale ressaltar, é simples: se a outra excludente é real, não haverá a agressão injusta da qual depende a legítima defesa real.
Desobediência civil é a resistência do cidadão à atividade estatal, em razão de reputá-la abusiva e contrária ao interesse público.14 No campo penal, consiste na prática de um fato típico contra bem jurídico pertencente ao Poder Público, como no exemplo daquele que destrói uma porta para transitar em prédio municipal fechado em razão de greve no setor público. Nos ensinamentos de Günther Jakobs:
Se o sacrifício do bem consiste em lesão de um bem jurídico penalmente típica, que se executa como protesto contra determinado comportamento estatal, reconhecendo sem embargo a legitimidade deste Estado e do Direito que se vulnera, este modo de proceder se denomina desobediência civil, quando a infração do Direito não deixa de ser moderada e somente afeta a bens de natureza pública.15
Em nossa opinião, a desobediência civil não importa na configuração da legítima defesa. De fato, a todos é assegurado o direito de não se conformar com as posturas estatais, mas de forma pacífica e ordenada. A lesão a bens jurídicos, mediante a prática de condutas penalmente típicas, não pode ser tolerada, sob pena de acarretar em anarquia e desordem pública.
1. (Ministério Público/PR – 2011) Sobre as causas de justificação, assinale a alternativa incorreta:
(A) a legítima defesa pode ser utilizada para repelir injusta agressão, atual ou iminente, a bem jurídico próprio ou de terceiro, derivada de ações dolosas ou culposas;
(B) a agressão injusta, atual ou iminente, a bem jurídico, praticada por inimputável portador de doença mental, não autoriza a legítima defesa, mas pode autorizar o estado de necessidade;
(C) o erro de tipo permissivo constitui erro sobre os pressupostos fáticos de uma causa de justificação;
(D) para a teoria dos elementos negativos do tipo, assim como para a teoria bipartida de fato punível, matar alguém em situação de legítima defesa constitui fato atípico;
(E) a ação do guarda penitenciário que mata, com certeiro disparo de arma de fogo, um preso que fugia em direção à mata, após transpor o muro externo da unidade prisional, não é justificável pelo estrito cumprimento do dever legal.
2. (MAGISTRATURA DO TRABALHO – TRT 16.ª REGIÃO/2011) Considere as afirmativas abaixo a assinale a alternativa CORRETA: I – De acordo com o Código Penal Brasileiro, atua sob o manto da legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem. II – Em consonância com a doutrina nacional não se admite legítima defesa real contra legítima defesa real, mas a admite nas hipóteses de legítima defesa real contra legítima defesa putativa. III – De acordo com o Código Penal Brasileiro, considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. IV – No estado de necessidade, o perigo pode ser o resultado de conduta humana, como também força maior ou caso fortuito, enquanto a legítima defesa somente é possível contra agressão humana ou ataque espontâneo de animal irracional.
(A) Estão corretas apenas as afirmativas I e IV.
(B) Estão incorretas as afirmativas I e III.
(C) Estão incorretas as afirmativas II e III.
(D) Está incorreta apenas a afirmativa I.
(E) Está incorreta apenas a afirmativa IV.
3. (Magistratura do Trabalho – TRT 21.ª Região/2010) Não há exclusão de ilicitude, de acordo com a lei penal:
A) quando o fato típico é praticado pelo trabalhador autônomo, com a idade de 21 anos, no exercício regular de um direito;
(B) quando o fato típico é praticado pela pessoa física do empregador do sexo masculino, com a idade de 65 anos, em estado de necessidade;
(C) quando o fato típico é praticado pela empregada doméstica, com a idade de 60 anos, em situação de fundado temor;
(D) quando o fato típico é praticado pelo trabalhador avulso, com a idade de 70 anos, em legítima defesa;
(E) nenhuma das respostas é correta.
4. (XXI Juiz do trabalho – TRT/15.ª Região 2006) Assinale a alternativa incorreta:
(A) age, em legítima defesa, quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, ainda que futura, a direito seu;
(B) usar de grave ameaça para favorecer interesse alheio contra parte em processo administrativo, constitui crime de coação no curso do processo;
(C) o crime é culposo quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia;
(D) o desconhecimento da lei penal é inescusável, contudo, pode constituir circunstância atenuante;
(E) se o crime é cometido em estrita obediência a ordem de superior hierárquico, não manifestamente ilegal, só é punível o autor da ordem.
5. (Juiz Federal – TRF/5.ª Região 2007) Acerca das causas excludentes da ilicitude e culpabilidade, julgue o próximo item.
Para a teoria unitária, diferentemente do que ocorre com a teoria diferenciadora, todo estado de necessidade é justificante, inexistindo estado de necessidade exculpante.
6. (23.º Promotor de Justiça – MPU/MPDFT) Acerca do estado de necessidade, assinale a opção incorreta.
(A) estado de necessidade justificante exclui a ilicitude do fato e possui previsão legal, tanto na parte geral como na parte especial do CP.
(B) estado de necessidade defensivo ocorre quando o ato necessário se dirige contra a coisa de que promana o perigo para o bem jurídico ofendido.
(C) estado de necessidade agressivo se verifica quando o ato necessário se dirige contra coisa diversa daquela de que promana o perigo para o bem jurídico.
(D) Não é possível o reconhecimento de estado de necessidade recíproco.
7. (TJRJ – 2013) João e Paulo são amigos e colegas de faculdade. João avista Paulo na via pública e, movido por animus jocandi, encosta o dedo indicador nas costas de Paulo, falseia a voz e anuncia um “assalto”. João determina a Paulo que não olhe para trás, e prosseguem assim, andando juntos, o dedo indicador de João sob a sua camisa e ao mesmo tempo encostado nas costas de Paulo, simulando o cano de uma arma de fogo. Pedro, amigo de Paulo, mas que não conhece João, visualiza a cena e interpreta que Paulo está prestes a ser morto por João. Nesse momento, Paulo ameaça reagir, e João, em voz alta, diz que irá atirar. Todas as pessoas que tiveram a atenção atraída para a cena intuíram que Paulo seria morto e com Pedro não foi diferente. Pedro, então, saca arma de fogo e efetua um disparo contra João. O tiro foi mal executado e acaba por atingir e matar Paulo.
A partir de tal caso hipotético, é de se considerar que Pedro agiu
(A) em legítima defesa de terceiro, mas em razão do erro e do excesso cometeu homicídio culposo.
(B) amparado por causa excludente de culpabilidade e, apesar do erro quanto à pessoa, não se vislumbra crime algum.
(C) em legítima defesa putativa de terceiro e cometeu erro na execução, motivo pelo qual praticou homicídio culposo.
(D) em legítima defesa putativa de terceiro e cometeu erro na execução, motivo pelo qual não se vislumbra crime algum.
8. (Promotor Substituto/MPE-PR – MPE-PR/2013) Assinale a alternativa incorreta:
(A) Cabe legítima defesa real contra legítima defesa putativa;
(B) Cabe legítima defesa real contra quem age sob coação moral irresistível;
(C) Cabe legítima defesa real contra estado de necessidade real;
(D) Cabe legítima defesa real contra agente inimputável;
(E) Cabe legítima defesa real contra quem age com excesso derivado de legítima defesa real.
9. (Delegado de Polícia/PC-ES – FUNCAB/2013) O policial militar Efigênio estava efetuando uma ronda, quando se deparou com dois elementos que se agrediam, um deles já bastante ferido. Solicitou que parassem de brigar, mas eles não o atenderam. Apesar do PM portar um bastão, que seria suficiente para contê-los, efetuou um disparo com sua arma de fogo para o ar, haja vista o local não ser habitado. Entretanto, o agressor que estava em vantagem não se intimidou e partiu em sua direção para agredi-lo, ocasião em que Efigênio efetuou um disparo contra o agressor, causando-lhe lesões, que o levaram a permanecer durante trinta e cinco dias em coma. Pode-se, então, afirmar que o policial militar Efigênio:
(A) praticou o crime de homicídio doloso tentado, pois obrou em excesso doloso da legítima defesa.
(B) praticou o crime de homicídio culposo tentado, pois obrou em excesso culposo da legítima defesa.
(C) praticou o crime de lesão corporal grave, pois obrou em excesso doloso da legítima defesa.
(D) praticou o crime de lesão corporal grave, pois obrou em excesso culposo da legítima defesa.
(E) não praticou crime, pois obrou nos estritos limites da legítima defesa.
GABARITO: As respostas destes testes encontram-se no final do livro.
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1 SIQUEIRA, Galdino. Tratado de direito penal. Parte geral. Rio de Janeiro: José Konfino, 1947. t. I, p. 314.
2 BRUNO, Aníbal. Direito penal – Parte geral. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1967. t. I, p. 362.
3 MEZGER, Edmund. Tratado de derecho penal. Trad. espanhola José Arturo Rodrigues Muñoz. Madrid: Revista de Derecho Privado, 1955. t. I, p. 453.
4 BRUNO, Aníbal. Direito penal – Parte geral. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1967. t. I, p. 365.
5 É a posição de MANZINI, Vicenzo. Trattato di diritto penale italiano. 5. ed. Torino: Torinese, 1981. v. II, p. 388.
6 Nesse sentido: LINHARES, Marcello Jardim. Legítima defesa. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 344.
7 FARIA, Bento. Código penal brasileiro comentado. Rio de Janeiro: Distribuidora Record, 1961. v. II, p. 192.
8 É também o entendimento de GARCIA, Basileu. Instituições de direito penal. 4. ed. 37.ª tiragem. São Paulo: Max Limonad, 1975. t. I, v. I, p. 306.
9 ROMEIRO, Jorge Alberto. A noite no direito e no processo penal. Estudos de direito e processo penal em homenagem a Nélson Hungria. Rio de Janeiro: Forense, 1962. p. 183.
10 LINHARES, Marcello Jardim. Legítima defesa. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 166.
11 LA MEDICA, Vincenzo. O direito de defesa. Trad. Fernando de Miranda. São Paulo: Saraiva: 1942. p. 48-49.
12 MARSICO, Alfredo de. Diritto penale – Parte generale. Napoli: Jovene, 1937. p. 105.
13 Assim também LA MEDICA, Vincenzo. O direito de defesa. Trad. Fernando de Miranda. São Paulo: Saraiva: 1942. p. 116-119.
14 Para um estudo aprofundado do assunto: GARCIA, Maria. Desobediência civil: direito fundamental. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004.
15 JAKOBS, Günther, Derecho penal – Parte general. Fundamentos y teoría de la imputación. 2. ed. Trad. espanhola Joaquin Cuello Contreras e Jose Luis Serrano Gonzales de Murillo. Madrid: Marcial Pons, 1997.