Muitas vezes se afirma que a Primeira Guerra Mundial foi causada pela cultura: para ser mais exato, pela cultura do militarismo, que teria preparado tão bem os homens para a guerra pela qual ansiavam. Alguns homens certamente previram a guerra; mas quantos de fato a desejaram é questionável.
Se a Primeira Guerra Mundial foi causada por profecias autorrealizáveis, um dos primeiros profetas foi Headon Hill, cujo romance The Spies of Wight [Os espiões de Wight] (1899) gira em torno das maquinações sinistras dos espiões alemães contra a Grã-Bretanha.1 Esse foi o começo de uma série de obras de ficção que antecipavam uma futura guerra anglo-germânica. A New Trafalgar [Uma nova Trafalgar], de A. C. Curtis (1902), foi um dos primeiros romances a imaginar um rápido ataque naval alemão contra a Grã-Bretanha na ausência do Esquadrão do Canal da Mancha; felizmente, a Marinha Real contava com um novo navio de guerra mortífero que alcançou a vitória.2 No famoso conto The Riddle of the Sands [O enigma das areias] (1903), de Erskine Childers, os heróis Carruthers e Davies deparam com indícios de um plano alemão pelo qual
multidões de barcaças marítimas carregadas de soldados […] deveriam partir simultaneamente de sete pontos rasos em sete frotas ordenadas e, sendo escoltados pela Marinha imperial, atravessar o mar do Norte e se lançar sobre a costa inglesa.3
Seguindo uma invasão similar, Jack Montmorency, o estudante que é o herói de The Boy Galloper [O menino a galope] (também de 1903), de L. James, precisou deixar a escola e vestir seu uniforme do Corpo de Cadetes para enfrentar os alemães.4 Talvez a mais famosa de todas as invasões alemãs fictícias seja a concebida por William Le Queux em The Invasion of 1910 [A invasão de 1910] – um best-seller de tirar o fôlego, originalmente publicado em capítulos no jornal Daily Mail em 1906 – que imaginou a Inglaterra sendo invadida por um Exército alemão de 40 mil homens, invasão esta seguida de horrores como “A Batalha de Royston” e “O bombardeio de Londres”.5 Em When the Eagle Flies Seaward [Quando a águia voa para o mar] (1907), o Exército invasor é aumentado para 60 mil homens, mas a história é essencialmente a mesma; ambas terminam – sem dúvida, para alívio dos leitores ingleses – com a derrota dos invasores.6 Em The Death Trap [A armadilha mortal] (1907), de R. W. Cole, são os japoneses que vêm em socorro após a chegada do Exército invasor do Kaiser.7 Foi só em The Message [A mensagem] (também de 1907), de A. J. Dawson, que foi preciso encarar a possibilidade de uma inevitável derrota inglesa – levando a ocupação, reparações e perda de várias colônias.
No livro de Dawson, é significativo que o inimigo está dentro e fora: enquanto os pacifistas protestam a favor do desarmamento em Bloomsbury, um garçom alemão diz ao nosso herói: “Vaire shtrong, sare, ze Sherman Armay”*. Acontece que, antes da invasão, ele e milhares de outros imigrantes alemães vinham atuando como agentes secretos, de modo que “o Exército alemão conhecia cada maço de feno que havia entre Londres e a costa”.8 A Maker of History [Um fazedor de história] (1905), de E. Phillips Oppenheim, já havia abordado esse assunto. Conforme explica o “Capitão X”, o chefe da inteligência alemã em Londres:
Há, neste país, 290 mil jovens compatriotas seus e meus que cumpriram pena de prisão, e que sabem atirar […] escriturários, garçons e cabeleireiros […] a cada um deles é atribuído um trabalho. As fortalezas que protegem esta grande cidade podem ser impermeáveis de fora, mas de dentro – esta é outra questão.9
De maneira similar, em The Enemy in our Midst [O inimigo entre nós] (1906), de Walter Wood, há um “Comitê Alemão de Preparativos Secretos” preparando o terreno para um golpe em Londres. Houve inúmeras variações sobre esse tema: tantas, que o termo “spy fever” [“febre de espionagem”] parece justificado. Em 1909, foi publicado aquele que é, talvez, o romance mais influente de Le Queux: Spies of the Kaiser [Espiões do Kaiser], que afirmou a existência de uma rede secreta de espiões alemães na Grã-Bretanha.10 Também em 1909 saiu When England Slept [Quando a Inglaterra dormiu], do Capitão Curties; nele, Londres é ocupada durante a noite por um Exército alemão que entrou furtivamente no reino ao longo de semanas.11
Tais fantasias tampouco ficaram restritas à ficção sensacionalista. O viajante e poeta Charles Doughty produziu alguns versos estranhamente arcaicos sobre o assunto, com destaque para The Cliffs [Os penhascos] (1909) e, três anos mais tarde, The Clouds [As nuvens] – obras pouco usuais em que os invasores imaginados expressam as ideias de Le Queux em uma linguagem pseudochauceriana.12 A obra An Englishman’s Home [O lar de um inglês] (1909), do major Guy du Maurier, traduziu a mesma fantasia para o palco.13 Os estudantes também precisaram enfrentar o pesadelo da invasão. Começando em dezembro de 1913, a revista Chums publicou uma série sobre mais uma futura guerra anglo-germânica.14 Em 1909, a revista da escola Aldeburgh Lodge imaginou, com perspicácia, como seria o ensino às crianças em 1930, presumindo que, até lá, a Inglaterra teria se tornado meramente “uma pequena ilha na costa ocidental da Teutônia”.15
Até mesmo Saki (Hector Hugh Munro) – um dos poucos escritores populares do período que ainda é lido com algum respeito – também se aventurou no gênero. Em When William Came: A Story of London under the Hohenzollerns [Quando veio Guilherme: uma história de Londres sob os Hohenzollern] (1913), seu herói, Murrey Yeovil – “criado e educado como um elemento de uma raça governante” –, retorna dos confins da Ásia e depara com uma Grã-Bretanha conquistada, “incorporada ao Império Hohenzollern […] como uma Reichsland, uma espécie de Alsácia-Lorena banhada pelo mar do Norte em vez do Reno”, com cafés em estilo continental no “Regentstrasse” e multas em flagrante por caminhar na grama no Hyde Park.16 Embora Yeovil anseie por resistir à ocupação teutônica, ele se vê abandonado por seus contemporâneos tory (conservadores), que, junto com George V, fugiram para Délhi, deixando para trás uma equipe de colaboradores desprezível, incluindo a esposa amoral do próprio Yeovil, os amigos boêmios que ela tinha, vários pequenos burocratas e judeus “em toda parte”.17 Observe, aqui, o caráter estranhamente tolerável e até sedutor da conquista alemã – pelo menos para os bretões mais decadentes. O anterior North Sea Bubble [Bolha do mar do Norte] (1906), de Ernest Oldmeadow, também imaginou os alemães agradando seus novos vassalos com presentes de Natal universais e comida subsidiada. De fato, as maiores atrocidades infligidas pelos ocupantes na Grã-Bretanha alemã de Oldmeadow são a introdução de uma dieta de salsichas e sauerkraut, a grafia correta do nome de Handel nos programas dos concertos e a Independência da Irlanda.18
Os alemães também tiveram suas visões da guerra que estava por vir. Die Abrechnung mit England [O ajuste de contas com a Inglaterra] (1900), de Karl Eisenhart, imagina a Grã-Bretanha, derrotada na Guerra dos Bôeres, sendo atacada pela França. A Grã-Bretanha impõe um bloqueio naval, ignorando os direitos de neutralidade marítima; e é isso o que precipita a guerra entre a Grã-Bretanha e a Alemanha. Uma arma secreta alemã (o navio de guerra movido a eletricidade) decide a guerra em seu favor, e os alemães, felizes, colhem uma farta safra das colônias britânicas, incluindo Gibraltar.19 Em Der Weltkrieg: deutsche Träume [A Guerra Mundial: sonhos alemães] (1904), August Niemann imaginou “os Exércitos e as frotas da Alemanha, da França e da Rússia avançando juntos contra o inimigo comum” – a Grã-Bretanha – “que, com seu Exército poliposo, domina o globo”. A Marinha francesa e a alemã derrotam a Marinha Real inglesa, e um Exército invasor aporta no estuário do rio Forth.20 Max Heinrichka imaginou (em 100 Jahre deutsche Zukunft [O futuro da Alemanha em cem anos]) uma guerra anglo-alemã contra a Holanda, culminando em outra invasão alemã bem-sucedida. Como no relato de Niemann, a vitória permite à Alemanha adquirir partes escolhidas do Império.21 Mas nem todos os escritores alemães estavam tão confiantes. Sink, Burn, Destroy: Der Schlag gegen Deutschland [Afundar, queimar, destruir: o ataque à Alemanha] (1905) inverteu os papéis: aqui, é a Marinha britânica que derrota a alemã, e é Hamburgo que tem de aturar uma invasão britânica.22
Com base em tais indícios, seria fácil argumentar que a Primeira Guerra Mundial aconteceu, pelo menos em parte, porque as pessoas esperavam que acontecesse. De fato, livros como esses continuaram a ser produzidos mesmo depois que a profecia se concretizou. Le Queux lançou The German Spy: A Present-Day Story [O espião alemão: uma história atual] no fim de 1914, e a versão de Gaumont do filme The Invasion of 1910 [A invasão de 1910], antes banida, foi lançada sob o título If England were Invaded [Se a Inglaterra fosse invadida]. Hindenburg’s Einmarsch in London [A marcha de Hindenburg sobre Londres], de Paul Georg Münch, que imaginava a vitória de Tannenberg levando a uma invasão bem-sucedida através do canal da Mancha, foi publicado em 1915.23
Tais fantasias, no entanto, precisam ser vistas em um contexto mais amplo. Nem todos os profetas da guerra esperavam que esta ocorresse entre a Inglaterra e a Alemanha. De fato, praticamente nenhuma das obras do gênero publicadas antes de 1900 contemplava um inimigo alemão. Com presciência assustadora, os autores de The Great War of 189- [A Grande Guerra de 189-], publicado em 1891 no semanário ilustrado Black and White, iniciaram sua guerra imaginada nos Bálcãs com o assassinato de um membro da realeza (um atentado contra a vida do príncipe Ferdinando da Bulgária, aparentemente por agentes russos). Quando a Sérvia agarra a oportunidade e declara guerra à Bulgária, a Áustria-Hungria ocupa Belgrado, instando a Rússia a enviar tropas à Bulgária. A Alemanha honra suas obrigações do tratado mobilizando-se contra a Rússia em apoio à Áustria-Hungria, e a França honra as suas declarando guerra à Alemanha em apoio à Rússia. No entanto, há uma reviravolta na história. Tendo permanecido neutra no início – apesar de a Alemanha ter violado a neutralidade da Bélgica –, a Grã-Bretanha envia tropas a Trebizonda em apoio à Turquia, instando a França e a Rússia a declararem guerra contra ela. Segue-se um grande enfrentamento entre a esquadra britânica e a francesa na costa da Sardenha; e, nos arredores de Paris, duas batalhas breves e decisivas entre os Exércitos francês e alemão – este último, vencido por um heroico ataque francês.24 Em The Final War [A guerra final] (1893), de Louis Tracy, a Alemanha e a França conspiram para invadir e conquistar a Grã-Bretanha, mas no último instante os alemães passam para o lado dos britânicos, e é Paris que sucumbe a lorde Roberts: um triunfo para o poder anglo-saxão.25 Até mesmo William Le Queux começara sua carreira alarmista como francófobo e russófobo, e não como germanófobo: em seu The Poisoned Bullet [A bala envenenada] (também de 1893), os russos e os franceses invadem a Grã-Bretanha.26 Publicado mais tarde, England’s Peril: A Story of the Secret Service [Perigo na Inglaterra: uma história do Serviço Secreto] tem como vilão “Gaston La Touche”, chefe do serviço secreto francês.27
A Guerra dos Bôeres precipitou uma enxurrada de histórias similares em que os inimigos eram os franceses: The Campaign of Douai [A campanha de Douai] (1899), London’s Peril [Perigo na Inglaterra] (1900), The Great French War of 1901 [A Grande Guerra Francesa de 1901], The New Battle of Dorking [A nova Batalha de Dorking], The Coming Waterloo [A próxima Waterloo] e Pro Patria, este último de Max Pemberton (os quatro últimos de 1901), dois dos quais retratavam uma invasão francesa iniciada por um túnel no canal.28 Em The Invaders [Os invasores] (1901), de Louis Tracy, a invasão da Grã-Bretanha é uma iniciativa conjunta de franceses e alemães.29 A mesma combinação terrível aparece em A New Trafalgar [Uma nova Trafalgar] (1902) e em The Death Trap [A armadilha mortal] (1907), embora os franceses, nesse momento, mostrem uma tendência incrivelmente desleal de abandonar seus aliados alemães. O mesmo assunto atraiu escritores franceses, como o autor de La Guerre avec l’Angleterre [A guerra contra a Inglaterra] (1900).30
Há variações similares na literatura profética alemã. A extravagante ficção científica Berlin-Bagdad [Berlim-Bagdá] (1907), de Rudolf Martin, imaginou “O Império Mundial Alemão na Era dos Dirigíveis, 1910-1931”; mas, aqui, o principal conflito é entre a Alemanha e uma Rússia pós-revolucionária. Um ultimato à Inglaterra – antes da completa unificação da Europa sob a liderança alemã – surge como uma espécie de consequência inesperada, e logo é esquecido quando os russos iniciam um ataque aéreo contra a Índia.31
Deve-se salientar que muitos, na época, consideraram o mais febril dos alarmistas simplesmente risível. Em 1910, Charles Lowe, ex-correspondente do Times em Berlim, atacou livros como Spies of the Kaiser [Espiões do Kaiser], de Le Queux, não porque ele não acreditasse que o comando-geral alemão enviava oficiais para obter informações sobre a Inglaterra e outros inimigos em potencial, mas porque os indícios fornecidos por escritores como Le Queux eram muito fracos.32 Em 1908, a revista Punch parodiou cruelmente o coronel Mark Lockwood, um dos mais ruidosos maníacos por espionagem na Câmara dos Comuns.33 Um ano mais tarde, A. A. Milne satirizou Le Queux em “The Secret of the Army Aeroplane” [O segredo do aeroplano das Forças Armadas], também publicado na Punch:
– Conte-nos tudo, Ray – instou Vera Vallance, sua bela noiva de cabelo loiro, filha do almirante sir Charles Vallance.
– Bem, querida, é basicamente o seguinte – respondeu ele, com um olhar afetuoso […] – Na terça passada, um homem com o bigode penteado ao contrário desceu na estação Basingstoke e perguntou onde ficava a lanchonete. Isso me leva a acreditar que está a caminho uma tentativa covarde de acabar com nossa supremacia aérea.
– E mesmo diante desse fato o governo nega a atividade de espiões alemães na Inglaterra! – exclamou amargamente.34
Possivelmente a melhor de todas essas sátiras é The Swoop! or, How Clarence Saved England: A Tale of the Great Invasion [O ataque! Ou como Clarence salvou a Inglaterra: uma história da Grande Invasão] (1909), de P. G. Wodehouse, uma maravilhosa reductio ad absurdum em que, no feriado bancário do mês de agosto, o país é invadido ao mesmo tempo por alemães, russos, suíços, chineses, monegascos, marroquinos e pelo “Louco Mullah”. Nessa obra, a ideia de uma invasão alemã se torna tão lugar-comum que o cartaz de um jornaleiro diz o seguinte:
SURREY
JOGA MAL
EXÉRCITO ALEMÃO
APORTA NA INGLATERRA
Dirigindo-se freneticamente à coluna com as notícias de última hora, o herói escoteiro de Wodehouse encontra a notícia fatídica inserida de maneira quase imperceptível entre os resultados do críquete e os da última corrida de cavalos. “Fry sem dispensados, 104. Surrey 147 para 8. Um Exército alemão aportou em Essex esta tarde. Handicap de Loamshire: Spring Chicken, 1; Salome, 2; Yip-i-addy, 3. Correram sete.”35 As 11 charges de Heath Robinson sobre espiões alemães no semanário The Sketch (1910) são quase tão divertidas quanto, retratando alemães disfarçados de pássaros, alemães pendurados em árvores na Epping Forest, alemães em trajes de banho invadindo a praia de Yarmouth e até mesmo alemães disfarçados de objetos de exposição nas galerias greco-romanas do Museu Britânico.36
Os alemães também percebiam o absurdo da profecia de guerra. Há um mapa-múndi de 1907, visivelmente cômico, em que o Império Britânico é reduzido à Islândia, deixando o resto – inclusive “Kgl. Preuss. Reg. Bez. Grossbritannien” – para a Alemanha.37 Não sem esforço, o Vademecum fur Phantasiestrategen [Guia para estrategistas fantasiosos] (1908), de Carl Siwinna, consegue demolir efetivamente as profecias de guerra de ambos os lados do canal da Mancha.38
Acima de tudo, os profetas de guerra mais belicosos devem ser equiparados aos escritores mais pessimistas que, com discernimento, previram que uma grande guerra europeia seria uma calamidade. War in the Air [A guerra no ar] (1908), de H. G. Wells – ao contrário de seu equivalente alemão, de Rudolf Martins –, apresenta um apocalipse aéreo, em que a civilização europeia é “destruída” por bombardeios de dirigíveis, deixando apenas “ruína e cadáveres não enterrados e sobreviventes pálidos definhando em uma apatia mortal”.39 Um dos mais influentes de todos os livros britânicos sobre o assunto argumentava que as consequências seriam tão calamitosas em termos econômicos que a guerra simplesmente não aconteceria: pelo menos foi assim que muitos leitores interpretaram A grande ilusão, de Norman Angell (ver a seguir).
Além disso, nem todos os profetas de guerra alemães foram “pregadores” inequívocos. Em Der Zusammenbruch der alten Welt [O colapso do Velho Mundo] (1906), “Seestern” (Ferdinand Grauthoff, o editor do Leipziger Neuesten Nachrichten) previu que um pequeno confronto entre a Grã-Bretanha e a Alemanha por uma questão colonial como a Samoa poderia levar a “choque e ruína” e à “aniquilação” da “civilização pacífica”. Em retaliação à disputa pela Samoa, a Marinha Real inglesa ataca Cuxhaven, precipitando uma guerra europeia em grande escala. Esta se mostra demasiado custosa para ambos os lados. A história termina com uma acertada profecia (feita, curiosamente, pelo ex-primeiro-ministro conservador Arthur Balfour):
O DESTINO DO MUNDO JÁ NÃO ESTÁ NAS MÃOS DAS DUAS POTÊNCIAS NAVAIS DA RAÇA GERMÂNICA, JÁ NÃO ESTÁ COM A GRÃ-BRETANHA E COM A ALEMANHA, mas, em terra, pertence à Rússia e, no mar, aos Estados Unidos da América. São Petersburgo e Washington tomaram o lugar de Berlim e de Londres.40
De maneira similar, Die ‘Offensiv-Invasion’ gegen England [Invasão ofensiva contra a Inglaterra] (1907), de Karl Bleibtreu, imaginou um desastroso ataque marítimo alemão contra as bases navais britânicas (uma inversão do “complexo de Copenhague”, em que um ataque britânico análogo assombrou a imaginação dos estrategistas navais alemães).41 Apesar de causar grandes perdas, os alemães não conseguem resistir ao bloqueio britânico; o resultado é, mais uma vez, o enfraquecimento de ambos os lados. Assim, “toda guerra europeia só poderia beneficiar os outros continentes do mundo […] Uma guerra naval entre os britânicos e os alemães seria o começo do fim – o colapso do Império Britânico e da supremacia europeia sobre a Ásia e a África. Só uma união amistosa e duradoura das duas grandes raças germânicas pode salvar a Europa”.42 Tanto Grauthoff quanto Bleibtreu concluem suas narrativas com clamores febris – e um tanto modernos – pela união da Europa.
Sem dúvida, o fato de tantos autores diferentes terem sentido a necessidade de imaginar algum tipo de guerra futura nos seduz a concluir que uma guerra era provável na segunda década do século XX. Mas vale notar que, de todos os autores discutidos acima, nenhum foi capaz de prever com precisão como seria a guerra de 1914-1918. Conforme veremos, a ideia de uma invasão alemã à Grã-Bretanha, o mais popular de todos os cenários, estava totalmente divorciada da realidade estratégica. Noventa por cento da ficção de guerra revelou uma absoluta ignorância das limitações técnicas com que o Exército, a Marinha e a Força Aérea de ambos os lados tinham que lidar. De fato, somente alguns poucos escritores do período que antecedeu a guerra foram capazes de prevê-la com algum grau de exatidão.
Um deles foi Friedrich Engels, colaborador de Marx, que, em 1887, imaginou
um mundo de guerra de extensão e intensidade nunca vistas, se a corrida armamentista, levada ao extremo, finalmente colher seus frutos […] De 8 a 10 milhões de soldados matarão uns aos outros e dilapidarão a Europa como nenhuma nuvem de gafanhotos jamais fez. As devastações da Guerra dos Trinta Anos condensadas em três ou quatro anos e espalhadas por todo o continente; fome, epidemia, barbarização geral dos Exércitos e das massas, provocados por puro desespero; caos extremo nos negócios, na indústria e no comércio, terminando em bancarrota geral; o colapso dos velhos Estados e de sua sabedoria tradicional, de tal maneira que dúzias de coroas rolarão nas valas e não haverá ninguém para socorrê-las; a impossibilidade absoluta de prever como tudo isso irá terminar e quem serão os vitoriosos nessa batalha; só um resultado é totalmente certo: a exaustão geral e a criação de circunstâncias para a vitória final da classe trabalhadora.43
Três anos mais tarde, em seu último discurso ao Reichstag alemão, Helmuth von Moltke, o chefe aposentado do grande Estado-Maior prussiano, concebeu um conflito não muito diferente:
A era da guerra de gabinete ficou para trás – tudo que temos agora é a guerra do povo […] Cavalheiros, se a guerra que paira sobre nossa cabeça há mais de dez anos como a espada de Damocles – se essa guerra irromper, sua duração e seu fim serão imprevisíveis. As maiores potências da Europa, armadas como jamais se viu, entrarão em combate umas com as outras; nenhuma delas pode ser tão destruída em uma ou duas campanhas a ponto de admitir a derrota; serão obrigadas a concluir a paz em termos difíceis e não voltarão, mesmo um ano depois, para retomar a luta. Cavalheiros, pode ser uma guerra de sete ou 30 anos de duração – e pobre daquele que incendiar a Europa, que for o primeiro a acender o barril de pólvora.44
A mais detalhada de todas essas previsões mais precisas da guerra, entretanto, foi a obra de um homem que não era nem socialista nem soldado. Em Is War Now Impossible? [A guerra é hoje impossível?] (1899), a versão inglesa resumida – e com um título pouco adequado – de seu estudo de seis volumes, o financista Ivan Stanislavovich Bloch, de Varsóvia, argumentou que, por três razões, uma grande guerra europeia teria uma escala e um grau de destruição sem precedentes.45 Em primeiro lugar, a tecnologia militar havia transformado a natureza da guerra de tal maneira que eliminou a possibilidade de uma vitória rápida para o invasor. “O dia da baioneta acabou”; as cargas de cavalaria também eram obsoletas. Graças à maior rapidez e precisão dos fuzis, à introdução da pólvora sem fumaça, à maior penetração das balas e ao maior alcance e potência do canhão de retrocarga, as batalhas tradicionais em posição estabilizada não ocorreriam. Em vez do combate cara a cara, os homens atingidos em campo aberto iriam “simplesmente cair e morrer sem ver nem ouvir nada”. Por esse motivo, “a próxima guerra […] [seria] uma grande guerra de trincheiras”. De acordo com os cálculos meticulosos de Bloch, uma centena de homens em uma trincheira seria capaz de matar um Exército atacante até quatro vezes mais numeroso, enquanto este tentasse atravessar uma “zona de fogo” de 300 jardas de largura. Em segundo lugar, o aumento no tamanho dos Exércitos europeus significava que uma guerra envolveria 10 milhões de homens, e a batalha “se estenderia por uma frente enorme”. Assim, apesar das altas taxas de mortalidade (sobretudo entre os oficiais), “a próxima guerra [seria] longa”.46 Em terceiro lugar, e consequentemente, os fatores econômicos seriam “o elemento dominante e decisivo”. A guerra significaria:
a completa desarticulação de toda indústria e a suspensão de todas as fontes de fornecimento […] o futuro da guerra não [é] o combate, mas a fome; não o assassinato de homens, mas a bancarrota de nações e a destruição de toda a organização social.47
A desestabilização dos negócios afetaria o fornecimento de comida nos países dependentes da importação de grãos e de outros alimentos. O mecanismo de distribuição também seria afetado. Haveria ônus financeiros colossais, desemprego e, por fim, instabilidade social.
Tudo isso foi excepcionalmente visionário, ainda mais quando comparado com o lixo que os alarmistas escreviam. Mas até mesmo Bloch errou em uma série de aspectos importantes. Ele estava enganado, por exemplo, ao pensar que a próxima guerra seria entre a Rússia e a França, de um lado, e a Alemanha, a Áustria-Hungria e a Itália, do outro – embora o erro fosse totalmente compreensível em 1899. Ele também estava errado quando propôs que “o habitante da cidade não é, de forma alguma, tão capaz quanto o camponês de se deitar à noite no pântano e em posições expostas”, e que, por essa razão, e por sua autossuficiência agrícola, “a Rússia [seria] mais capaz de tolerar uma guerra do que nações mais organizadas”.48 Bloch também sobrestimou os benefícios do poder naval britânico. Uma Marinha menor do que a britânica, segundo afirmou, “não vale a pena manter […], pois uma Marinha inferior é apenas uma refém nas mãos da potência cuja frota é superior”. Isso colocava a Grã-Bretanha “em uma categoria diferente de todas as outras nações”.49 Logicamente, isso parece contradizer o argumento de Bloch sobre o provável impasse em terra. Afinal, se uma potência podia estabelecer uma dominação sem paralelos no mar, não seria possível conseguir algo similar em terra? Por outro lado, o que evitaria que outra potência construísse uma Marinha grande o suficiente para desafiar a da Grã-Bretanha? E, é claro, embora estivesse certo sobre quão terrível seria uma guerra europeia, Bloch estava enganado ao afirmar que isso tornaria a guerra insustentável em termos econômicos e sociais. A conclusão que ele tirou de sua análise foi, no fim das contas, demasiado otimista:
A guerra […] em que grandes nações, armadas até os dentes […], se jogam, com todos os seus recursos, em uma luta de vida ou morte […] é a guerra que, dia após dia, se torna cada vez mais impossível […] Uma guerra entre a Tríplice Aliança [Alemanha, Áustria e Itália] e a Aliança Franco-Russa […] se tornou absolutamente impossível […] As dimensões dos armamentos modernos e a organização da sociedade a tornaram uma impossibilidade econômica, e […] se houvesse alguma tentativa de demonstrar a imprecisão de minhas afirmações testando-as em grande escala, o resultado inevitável seria uma catástrofe que destruiria todas as organizações políticas existentes. Pois a grande guerra não pode ser travada, e qualquer tentativa de fazê-lo seria suicídio.50
Fazendo justiça a Bloch – que às vezes é malretratado como um idealista ingênuo –, ele fez um adendo crucial: “Eu não […] nego que é possível que as nações, arrastando os vizinhos consigo, submerjam numa terrível série de catástrofes que provavelmente resultaria na derrubada de todo governo civilizado e ordenado”.51 (É uma grande ironia que a maior aprovação ao livro tenha vindo do governo russo; ao que parece, foi a leitura de “um livro de um banqueiro de Varsóvia chamado Bloch” que inspirou Nicolau II em sua “súplica aos governantes” em 1898 e na subsequente Conferência de Paz de Haia.)52 O maior equívoco de Bloch foi ao negligenciar o fato de que tais revoluções dificilmente aconteceriam em todos os Estados combatentes ao mesmo tempo; o lado que postergasse a desintegração social por mais tempo venceria. Por essa razão, se uma guerra começasse, haveria um incentivo para continuá-la na esperança de que o outro lado ruísse primeiro. E isso, conforme veremos, foi mais ou menos o que aconteceu após 1914.
Em geral, aqueles que tentaram visualizar uma futura guerra tinham duas motivações: vender exemplares de seus livros (ou dos jornais que os publicavam em fascículos) ao público leitor e promover certo ponto de vista político. Assim, as fantasias paranoicas de William Le Queux foram úteis para proprietários de jornais como lorde Northcliffe (que redesenhou a rota de sua fictícia invasão alemã para que passasse por cidades com grande potencial de leitores do Daily Mail) e D. C. Thompson (que publicou Spies of the Kaiser [Espiões do Kaiser] em seu Weekly News, precedido por propagandas que ofereciam aos leitores 10 libras por informações sobre “Espiões estrangeiros na Grã-Bretanha”).53 “O que vende um jornal?”, perguntaram certa vez a um dos editores de Northcliffe. Ele respondeu: “A primeira resposta é ‘guerra’. A guerra não só cria uma oferta de notícias como também uma demanda por elas. Tão arraigada é a fascinação por uma guerra e por todas as coisas a ela associadas que […] um jornal só precisa ser capaz de colocar em seu anúncio ‘Uma grande batalha’ para que as vendas aumentem”.54 Depois da Guerra dos Bôeres, houve uma carência de guerras reais que fossem do interesse dos leitores britânicos. Le Queux e seus colegas forneceram à imprensa substitutos fictícios. (Um deles tem certa simpatia pelo oficial alemão que se recusou a emitir um passaporte a um correspondente do Daily Mail em Berlim em 1914 “porque acreditava que ele havia sido extremamente providencial ao promover a guerra”.)55
Os alarmistas também serviram para defender politicamente algum tipo de reforma no Exército. Invasion of 1910 [Invasão de 1910], de Le Queux, foi bem explícito em sua propaganda a favor de um sistema de serviço militar obrigatório, o programa que o marechal de campo lorde Roberts decidiu promover depois de ter renunciado ao posto de comandante-chefe. “Em toda parte, as pessoas estavam se lamentando de que os alertas solenes de lorde Roberts em 1906 haviam passado despercebidos, pois, se houvéssemos adotado seu programa de serviço militar universal, tal catástrofe terrível jamais teria ocorrido.” Essas palavras foram escolhidas com cuidado; de fato, fora Roberts quem o havia encorajado a escrever o livro.56 Entre outros que se interessaram por Le Queux estava o almirante lorde Charles Beresford, que realizou uma campanha paralela contra o modo como sir John Fisher usou a Frota do Canal.57 Alguns alarmistas também defendiam implicitamente as restrições à imigração ao equiparar estrangeiros e espiões: “Isso é o que dá fazer de Londres o asilo para toda a escória estrangeira da terra”, exclama o herói de A Maker of History [Um fazedor de história], de Oppenheim.58
Além disso, escritores como Le Queux exerceram um papel de extrema importância na criação do atual serviço de inteligência da Grã-Bretanha. Surgiu uma aliança improvável entre autores de obras sob encomenda e arrivistas militares como o tenente-coronel James Edmonds (mais tarde, o autor da história oficial britânica na Frente Ocidental) e o capitão Vernon Kell (“Major K”). Foi sobretudo por intermédio deles que se instaurou uma nova “agência de serviço secreto” de contraespionagem MO(t) (mais tarde, MO5(g)) como um desdobramento da MO5, a seção especial da Diretoria de Inteligência e Operações Militares do Exército (e precursora do MI5) do Gabinete de Guerra. Em grande medida, também foi culpa dessa aliança improvável que boa parte da inteligência britânica com relação à Alemanha no período que antecedeu a guerra foi distorcida por fantasias jornalísticas e pelos devaneios de aspirantes a caçadores de espiões.59
Isso não quer dizer que não houvesse espionagem. O Almirantado alemão certamente tinha uma série de agentes cujo trabalho era fornecer informações a Berlim sobre a Marinha Real britânica. Entre agosto de 1911 e o início da guerra, o MO5 prendeu cerca de dez suspeitos de espionagem, dos quais seis foram sentenciados à prisão.60 Os caçadores de espiões também identificaram uma gangue de 22 espiões trabalhando para Gustav Steinhauer, o oficial alemão da Marinha a cargo das operações de inteligência na Grã-Bretanha; todos, exceto um, foram presos em 4 de agosto de 1914, embora apenas um deles tenha sido de fato levado a julgamento.61 Conforme afirmou Christopher Andrew, o capitão Kell e sua equipe de 12 membros haviam “derrotado totalmente” a ameaça de espionagem alemã, ainda que esta fosse uma ameaça de “quinta categoria”.62 Outros 31 supostos espiões alemães foram capturados entre outubro de 1914 e setembro de 1917, dos quais 19 foram condenados à morte e dez foram presos; e 354 estrangeiros foram “recomendados para deportação”.63 Os alemães também tinham uma rede de agentes militares compilando indícios similares em suas fronteiras ocidental e oriental, nas áreas em que as tropas alemãs seriam mobilizadas no caso de uma guerra. Estes se mostraram cruciais para alertar o governo alemão sobre a mobilização russa em agosto de 1914.64
Por outro lado, a Grã-Bretanha também tinha seus espiões. Em 1901, o Gabinete de Guerra começou a investigar a área perto de Charleroi, na Bélgica, onde uma força expedicionária britânica possivelmente precisaria lutar no caso de uma guerra com a Alemanha.65 Na mesma época, Edmonds estava tentando organizar uma rede de espiões para o MO5 na própria Alemanha.66 A partir de 1910, o MO5 confiou formalmente ao comandante Mansfield Smith-Cumming (um oficial da Marinha aposentado com uma queda por aviões e carros velozes) a tarefa de espionagem no exterior: essa Divisão de Assuntos Exteriores foi o embrião do SIS (mais tarde, MI6).67 Em 1910-1911, seu agente Max Schultz (um negociante de navios naturalizado de Southampton) e quatro informantes alemães foram capturados na Alemanha e levados à prisão. Outro agente, John Herbert-Spottiswood, também foi preso, assim como dois oficiais entusiásticos que não estavam sob ordens do MO5 e decidiram, por iniciativa própria, inspecionar as defesas costeiras da Alemanha enquanto estavam de licença, e um advogado maluco, ex-aluno do Eton College, que tentou, sem sucesso, ser um agente duplo.68 Houve também espiões britânicos em Roterdã, Bruxelas e São Petersburgo.69 Lamentavelmente, os arquivos da Divisão de Assuntos Exteriores permanecem fechados, e por isso é difícil saber ao certo quão bem informada estava a Grã-Bretanha sobre os planos de guerra dos alemães. (Não muito, se considerarmos as dificuldades da Força Expedicionária Britânica para encontrar o inimigo em 1914.) De fato, a maior parte das informações coletadas por agentes britânicos parece estar relacionada com submarinos e zepelins. No entanto, ninguém achou que valia a pena (ou que seria divertido) decifrar os códigos em que os sinais militares estrangeiros eram transmitidos – uma grave omissão.
O extraordinário é a seriedade com que as alegações dos alarmistas foram recebidas por ministros e altos oficiais britânicos. Em um relatório entregue ao Comitê de Defesa Imperial em 1903, o coronel William Robertson, do Departamento de Inteligência do Gabinete de Guerra, argumentou que, no caso de uma guerra contra a Grã-Bretanha, a “melhor, se não a única, chance [da Alemanha] de trazer a disputa a um desfecho favorável seria desferir um golpe no cerne do Império Britânico antes que a Marinha Real pudesse exercer toda a sua força e colocar o inimigo na defensiva, bloqueando sua frota, destruindo seu comércio mercantil e inutilizando seu numeroso Exército”. Embora Robertson reconhecesse “que invasões ultramarinas são difíceis em qualquer circunstância; que, inevitavelmente, o adversário é alertado, já que não se pode mantê-lo ignorando por completo os preparativos iniciais; e que, mesmo que conseguisse atravessar o mar em segurança, uma força militar invadindo a Inglaterra acabaria tendo suas comunicações interrompidas”, ele insistiu, entretanto, que os alemães eram capazes de enviar “um Exército de 150 mil a 300 mil homens […] à costa oriental britânica”:
A força invasora, quando aportasse, poderia sobreviver no país e se manter sem provisões por várias semanas. Enquanto isso, seria de esperar que o efeito moral produzido sobre a densa população da Inglaterra, e o abalo à reputação britânica, levariam, se não à completa submissão, pelo menos a um Tratado pelo qual a Grã-Bretanha se tornaria um satélite da Alemanha.70
Até mesmo Eduardo VII temeu, em 1908, que seu primo, o Kaiser, tivesse um “plano” de “lançar um ou dois corps d’armée contra a Inglaterra, proclamando que ele veio não como inimigo do rei, mas como o neto da rainha Vitória, para livrá-lo da gangue socialista que está arruinando o país”.71 Altos oficiais do Ministério das Relações Exteriores britânico partilhavam do mesmo temor: o subsecretário permanente de Estado, sir Charles Hardinge, Eyre Crowe, nascido na Alemanha, e o próprio ministro das Relações Exteriores, sir Edward Grey, todos aceitavam que “os alemães estudaram e continuam estudando a questão da invasão”.72
Grey também não tinha dúvidas de que “um grande número de oficiais alemães passava as férias no país, em vários pontos do litoral sul e oriental […], onde possivelmente se encontram por nenhuma outra razão senão a de tomar notas estratégicas sobre nossa costa”.73 Richard Haldane, o ministro da Guerra, também passou a acreditar nisso, embora suas opiniões talvez tenham sido influenciadas pelo aumento no número de recrutas para o Exército Territorial – criado por ele – após a estreia da peça An Englishman’s Home [O lar de um inglês], de Du Maurier.74 Apesar de seu predecessor como primeiro-ministro ter rejeitado publicamente as afirmações de Le Queux, em 1909 Asquith instruiu um subcomitê especial do Comitê de Defesa Imperial a investigar as suspeitas de espionagem estrangeira levantadas por ele e por outros. Foi com base no relatório secreto desse subcomitê que o MO(t) foi instaurado.75 Nas palavras do relatório: “Os indícios obtidos não deixam dúvidas para o subcomitê de que existe um amplo sistema de espionagem alemã neste país”.76 Como ministro do Interior em julho de 1911, durante a segunda crise marroquina, Churchill ordenou o posicionamento de soldados no depósito de munições da Marinha, perto de Londres, temendo que “20 alemães determinados […] chegassem bem armados certa noite”.77 Na realidade, ao que tudo indica não havia nenhum agente militar alemão na Grã-Bretanha (apenas agentes da Marinha), apesar dos esforços de Kell e de seus colegas para encontrar a temida horda.78 De todo modo, a maior parte das informações que, segundo suspeitavam Le Queux e seus associados, os espiões alemães estavam tentando obter se encontrava disponível por um preço módico na forma de mapas do Almirantado e da Ordnance Survey*. Assim que a guerra começou, cerca de 8 mil estrangeiros suspeitos foram investigados com base em uma lista de 28.830 imigrantes concluída no mês de abril anterior; mas logo ficou claro que não havia nenhuma organização militar controlando-os.79 Em dezembro de 1914, o ministro do Comitê de Defesa Imperial, Maurice Hankey, continuava alertando que “25 mil alemães e austríacos em boa forma física continuavam à solta em Londres” e seriam capazes de “liquidar de uma só vez a maioria dos ministros”.80 O Exército secreto nunca se concretizou. Igualmente vãs foram as buscas por plataformas secretas de concreto onde, segundo se dizia, os alemães poderiam posicionar suas poderosas peças de artilharia de cerco.
Também na Alemanha os escritores belicosos costumavam ter uma motivação política e comercial para sua obra. O exemplo clássico é o general Friedrich von Bernhardi, cujo livro Deutschland und der nächste Krieg [A Alemanha e a próxima guerra] (1912) contribuiu para alimentar as inquietações dos britânicos com relação às intenções dos alemães. Bernhardi, um ex-general de cavalaria que havia trabalhado na Seção Histórica do Grande Estado-Maior antes de se aposentar precocemente, tinha relações próximas com August Keim, o líder da Liga do Exército Alemão, um grupo de interesse que defendia o aumento do tamanho do Exército. Muitas vezes citado como um texto clássico do militarismo prussiano, seu livro deve ser lido como uma propaganda da Liga do Exército, atacando não só o pacifismo e o antimilitarismo da esquerda, como também a pusilanimidade do governo alemão na segunda crise marroquina e – o que é mais importante – os argumentos dos conservadores dentro das Forças Armadas prussianas a favor da manutenção de um Exército relativamente pequeno.81
Mas o aspecto importante a observar é que, tanto na Grã-Bretanha quanto na Alemanha, os defensores de uma maior prontidão militar tiveram pouco sucesso e certamente não conseguiram convencer a maioria dos eleitores. Na Grã-Bretanha, os argumentos a favor de melhorar a “eficiência nacional” sem dúvida atraíram amplo interesse em todo o espectro político após os constrangimentos da Guerra dos Bôeres.82 Mas, quando surgiram propostas concretas para aumentar a prontidão do Exército – tal como o alistamento militar obrigatório –, elas se mostraram politicamente impopulares. A Liga pelo Serviço Militar Nacional, fundada por George Shee, teve em seu auge, em 1912, 98.931 membros e outros 218.513 “apoiadores” (que pagavam apenas um penny). Não mais de 2,7% da população masculina entre 15 e 49 anos era membro da Força Voluntária.83 Os escoteiros de Baden-Powell tinham 150 mil membros em 1913: uma proporção minúscula da juventude masculina do país.84 O alistamento militar apelou para uma curiosa mistura de oficiais aposentados, jornalistas e clérigos (como o vigário de Hampshire que pregou para 2 mil paroquianos com um panfleto intitulado “Pensamento Religioso e Serviço Militar”). Conforme admitiu Summers, as várias ligas patrióticas praticamente não tinham “nenhuma presença eleitoral”.85 Nem mesmo as frequentemente citadas celebrações em Mafeking após o cerco à cidade durante a Guerra dos Bôeres devem ser tomadas como indícios inequívocos de “jingoísmo” da classe trabalhadora.86
Na França, os mandatos de Raymond Poincaré como primeiro-ministro (de janeiro de 1912 a janeiro de 1913) e, em seguida, como presidente, foram marcados não só por discursos de um réveil national (simbolicamente, instituiu-se um feriado nacional em homenagem a Joana d’Arc), como também por ação. O general Joseph Joffre se tornou Chefe de Estado e major-general, um novo posto que lhe deu o comando supremo do Exército em tempos de guerra, e aprovou-se uma lei ampliando de dois para três anos o período de serviço militar. O Sindicato dos Professores (Syndicat des instituteurs) também foi dissolvido por dar seu apoio a uma sociedade antimilitarista, a Sou du Soldat.87 Mas nem mesmo esse ressurgimento do nacionalismo deve ser exagerado. Teve muito menos que ver com os assuntos exteriores do que com disputas internas por reforma eleitoral e tributária, e em particular com a necessidade de uma improvável aliança interpartidária contra os radicais sobre a questão da representação proporcional (que, apesar da oposição dos radicais, foi implementada em julho de 1912). Não houve nenhuma tentativa de desfazer o tratado comercial com a Alemanha negociado por Joseph Caillaux, ministro de Finanças sob ordem de Georges Clemenceau, em 1911; de fato, foi a Itália, e não a Alemanha, que Poincaré enfrentou após um pequeno incidente naval no começo de 1912. Théophile Delcassé, a escolha mais óbvia como um ministro antigermânico, foi ignorado. Na realidade, apenas uma minoria dos deputados – pouco mais de 200, de um total de 654 – pode ser identificada como apoiadora do ressurgimento do nacionalismo, e não menos de 236 deputados deram seu apoio à Lei dos Três Anos.88
Inevitavelmente, houve muito mais pesquisas sobre a direita radical alemã, já que seus componentes podem ser retratados como precursores do Nacional-socialismo. As obras de Geoff Eley, Roger Chickering e outros sobre o caráter das organizações nacionalistas radicais que defendiam mais armamentos antes de 1914 certamente contribuíram muito para desafiar a visão de que estas só representavam os interesses das elites conservadoras. Mesmo quando (como no caso da Liga Naval) estabelecidas para gerar apoio público a políticas governamentais de uma maneira que poderia ser legitimamente descrita como “manipuladora”, tais organizações atraíram apoiadores cujo militarismo superou em tal nível as intenções oficiais que, pouco a pouco, passaram a constituir uma espécie de “oposição nacional”. De acordo com Eley, isso refletiu a mobilização de grupos até então politicamente apáticos, atraídos sobretudo pela pequena burguesia – um elemento populista que desafiou a predominância de “notáveis” na vida associativa burguesa.89 Isso foi parte daquela “remodelação” da direita que, em sua visão, prefigurou a fusão, ocorrida após a guerra, entre as elites conservadoras, os nacionalistas radicais, os grupos de interesse da classe média baixa e os antissemitas num único movimento político: o nazismo.90 Mas a ideia de que as muitas organizações de lobby político envolvidas foram pouco a pouco se fundindo em uma entidade cada vez mais homogênea chamada “direita” subestima a complexidade, e até mesmo a ambiguidade, do nacionalismo radical. Além disso, tentar identificar a direita radical com um grupo social específico – a pequena burguesia – é ignorar a dominação permanente da elite Bildungsbürgertum não só nas organizações nacionalistas radicais, como também na evolução da ideologia nacionalista radical.
Em seus respectivos picos, as principais associações nacionalistas radicais alemãs afirmavam ter 540 mil membros, a maioria (331.900) na Liga Naval.91 No entanto, esse número exagera o nível de participação: algumas pessoas eram membros entusiásticos de mais de uma liga ou associação,92 ao passo que muitos outros membros só existiam no papel, tendo sido induzidos a meramente colaborar com a insignificante taxa de adesão.93 A composição social da Liga do Exército não confirma a teoria de um movimento massivo da classe média baixa. Dos 28 homens que estavam no Comitê Executivo da delegação de Stuttgart, oito eram oficiais do Exército, oito eram altos burocratas e sete eram homens de negócios; e, conforme se espalhou para cidades em Brandenburgo, na Saxônia, nos portos hanseáticos e além, atraiu tipos “notáveis” similares: burocratas em Posen; acadêmicos em Tübingen; homens de negócios em Oberhausen.94 A situação não é diferente no caso da Liga Pangermânica: dois terços de seus membros tinham nível universitário.95
Por sua vez, a única associação nacionalista verdadeiramente “populista”, a Associação dos Veteranos – que acolhia qualquer um que houvesse concluído o serviço militar –, era tudo menos radical em seu nacionalismo. Essa era a maior de todas as ligas germânicas: com 2,8 milhões de membros em 1912, superava até mesmo o Partido Social-Democrata (SPD), o maior partido político da Europa. Mas, com seus juramentos para a coroa e seus desfiles do Dia de Sedan, a Associação dos Veteranos era profundamente conservadora em sua ideologia. Nas palavras do ministro do Interior prussiano em 1875, constituía “um meio inestimável […] de manter viva a atitude leal […] nas classes médias baixas”.96 Isso dificilmente foi uma revelação para quem leu Der Untertan [O súdito] (1914), de Heinrich Mann, com seu anti-herói covarde Diederich Hessling.
Um aspecto relevante e muitas vezes negligenciado é a importância das formas radicais de protestantismo no nacionalismo radical do período guilhermino. Nos sermões protestantes sobre o tema da guerra entre 1870 e 1914, “a vontade de Deus” (Gottes Fügung) pouco a pouco se transformou na “liderança de Deus” (Gottes Führung): um conceito muito diferente. Vale notar que o sentimento militarista não era, de forma alguma, monopolizado por pastores ortodoxos como Reinhold Seeberg: teólogos liberais como Otto Baumgarten eram especialmente propensos a invocar “Jesu-Patriotismus”.97 Diante de tal competição, os católicos germânicos se sentiram obrigados a demonstrar que, na palavra de um de seus líderes, “Ninguém pode nos superar quando se trata do amor ao Príncipe e à Pátria”.98
Tais sentimentos religiosos foram influentes. Grande parte da retórica da Liga Pangermânica, por exemplo, era profundamente marcada pela escatologia cristã. Heinrich Class, um dos líderes mais radicais da Liga, declarou: “A guerra é sagrada para nós, já que despertará tudo que é grande e autossacrificante e altruísta em nosso povo e purificará nossa alma dos dejetos da pequenez egoísta”.99 A Liga do Exército foi preponderantemente uma liga protestante, fundada nos enclaves protestantes de Württemberg, de maioria católica, por um homem que havia sido expulso da Liga Naval por atacar o Partido de Centro, católico. Mas não foram apenas os nacionalistas radicais que refletiram o tom do protestantismo contemporâneo. O jovem Moltke havia se envolvido, por meio da esposa e da filha, com o teosofista Rudolf Steiner, cujas teorias derivavam, em grande medida, do Livro do Apocalipse – um nítido contraste com o austero pietismo huteriano de seu predecessor, o conde Alfred von Schlieffen.100
Tampouco é insignificante que Schlieffen gostasse de se identificar como “Dr. Graf Schlieffen” ao assinar suas correspondências com acadêmicos: nitidamente, muitos elementos do militarismo e do nacionalismo radical no período que antecedeu a guerra tinham suas raízes nas universidades, tanto quanto nas igrejas. Isso, é claro, não deve ser subestimado. Os acadêmicos alemães estavam longe de ser um grupo homogêneo de “guarda-costas da Casa de Hohenzollern”; e eminentes professores universitários, como o pangermânico Dietrich Schäfer, atacaram posturas nacionalistas radicais até mesmo em suas aulas inaugurais.101 Por outro lado, houve muitas faculdades que fizeram contribuições importantes à evolução da ideologia nacionalista radical, e não menos à história. A geopolítica, oriunda da geografia e da história, teve grande influência, em particular ao difundir a ideia de “isolamento”. Um estudante de filosofia como Kurt Riezler, o secretário particular de Bethmann Hollweg, podia compreender a inevitável “disputa de poder entre as nações” em termos derivados de Schopenhauer.102 Para outros, as teorias raciais forneciam uma justificativa para a guerra. O almirante Georg von Müller falou de “defender a raça germânica em oposição aos eslavos e aos romanos”, assim como Moltke;103 mas foram os germanistas universitários que, em 1913, deram uma conferência sobre “A exterminação dos não germânicos […] e a propagação da superioridade da ‘essência’ germânica”.104 Entre os membros da Liga do Exército, havia arqueólogos e oftalmologistas.105 Em síntese, quando o pangermânico Otto Schmidt-Gibichenfels – escrevendo para a Political-Anthropological Review – descreveu a guerra como um “fator indispensável de cultura”, ele resumiu perfeitamente sua importância para a elite educada alemã.106 Durante a guerra, Von Stranz, membro da Liga do Exército, fez uma declaração óbvia ao afirmar: “Para nós, não importa se ganhamos ou perdemos algumas colônias, ou se nossa balança comercial será 20 bilhões […] ou 25 bilhões […], o que realmente está em jogo é algo espiritual […]”.107 Betrachtungen eines Unpolitischen [Reflexões de um apolítico], de Thomas Mann, tornaria-se a clássica afirmação da crença de que a Alemanha estava lutando por Kultur contra a deprimente, efusiva e materialista Zivilisation da Inglaterra.108
Essa adequação sociológica entre a classe média educada e o nacionalismo radical explica que este último foi, em grande medida, uma continuação do Liberalismo Nacional alemão.109 A aula inaugural de Max Weber em Freiburgo continua sendo a mais famosa conclamação a uma nova era de nacional liberalismo sob a bandeira da Weltpolitik;110 mas há muitos outros ecos como esse. Por exemplo, uma importante contribuição veio dos historiadores, que criaram uma mitologia de unificação de enorme importância para os nacionais liberais: os proponentes guilherminos da Mitteleuropa, uma união de costumes dominada pelos germânicos – que veio a ser um dos objetivos de guerra oficiais da Alemanha –, remetendo conscientemente ao papel do Zollverein prussiano na unificação alemã.111 Acima de tudo, o Partido Nacional Liberal e a Liga do Exército trabalharam juntos nos debates sobre os projetos de lei de 1912 e 1913 que tratavam das Forças Armadas. O próprio Keim poderia alegar que “as questões militares não tinham nada a ver com regimes partidários” e procurar recrutar deputados tanto nos partidos conservadores quanto nos nacionais liberais; mas essa retórica de “apolitismo” foi o recurso usado pelos nacionalistas alemães, e na prática ele tinha mais chance de sucesso cooperando com Ernst Bassermann, o líder do Partido Nacional Liberal. O slogan deste último, “Bismarck vive no povo, mas não no governo”, dá um toque de “nacionalismo radical” ao cerne do Partido Nacional Liberal; o historiador Friedrich Meinecke usou linguagem similar.112 Foi Edmund Rebmann, um Nacional Liberal de Baden, que declamou, em fevereiro de 1913: “Nós temos as armas e estamos dispostos a usá-las”, se necessário, para alcançar “o mesmo que em 1870”.113 Havia muito pouca coisa no nacionalismo radical alemão que fosse de fato nova: assim como nos anos 1870, era composto essencialmente de notáveis tradicionalistas da classe média alta.
É claro, houve aqueles cujos impulsos revolucionários os levaram muito além da arena política do liberalismo alemão ultrapassado. Com presciência assustadora, Class afirmou que até mesmo uma guerra perdida seria bem-vinda, já que aumentaria “a atual fragmentação doméstica ao [ponto do] caos”, possibilitando que “a vontade poderosa do ditador” intercedesse.114 Não é de surpreender que um ou dois membros da Liga do Exército acabaram no Partido Nazista na década de 1920.115 Até mesmo o Kaiser, quando sonhava acordado com o poder ditatorial que não tinha, escolheu Napoleão como modelo.116 Visto nessa perspectiva, o argumento subjetivo de Modris Eksteins, de que a Primeira Guerra Mundial representava um choque cultural entre uma Alemanha modernista e revolucionária e uma Inglaterra conservadora, é preferível (independentemente das demais reservas que se possa ter a respeito) à velha visão de que a guerra foi causada pela determinação de uma Alemanha conservadora em defender “o ideal dinástico do Estado” contra “o princípio moderno democrático, nacional e revolucionário do autogoverno”. Isso só se tornou verdade em outubro de 1918, quando o presidente Woodrow Wilson revelou que uma revolução alemã seria uma condição para qualquer armistício.117 No entanto, permanece a questão de até que ponto o nacionalismo radical na Alemanha realmente diferia do de outros países europeus antes de 1914. Com o perdão de Eksteins, há boas razões para pensar que as similitudes superavam as diferenças.118
O manifesto “pacifismo” – a palavra foi cunhada em 1901 – foi, inegavelmente, um dos movimentos políticos menos exitosos do início do século XX.119 Mas considerar apenas aqueles que se denominavam pacifistas é subestimar o alcance do antimilitarismo popular na Europa.
Na Grã-Bretanha, o Partido Liberal ganhou três eleições seguidas, em 1906 e em janeiro e dezembro de 1910 (a terceira, como é sabido, com o apoio do Partido Trabalhista e do Partido Nacionalista Irlandês), contra uma oposição unionista e conservadora francamente mais militarista. A consciência Não Conformista, a crença cobdenista no livre-comércio e na paz, a preferência de William Gladstone, quatro vezes primeiro-ministro, pelo direito internacional em detrimento da Realpolitik, bem como sua aversão ao gasto militar excessivo e o desapreço histórico por um grande exército – estas foram apenas algumas das tradições liberais que pareciam implicar uma política pacífica, às quais poderíamos acrescentar as eternas e difusas inquietações do partido com a Irlanda e a reforma parlamentar.120 A estas, somou-se, com o “Novo Liberalismo” do período eduardiano, uma preocupação com finanças públicas redistributivas e questões “sociais”, bem como com uma série de teorias influentes como a de J. A. Hobson (sobre a relação maléfica entre interesses financeiros, imperialismo e guerra) ou a de H. W. Massingham (sobre os perigos da diplomacia secreta e a doutrina calculista do equilíbrio de poder). Tais ideias eram muito comuns na imprensa liberal – especialmente no Manchester Guardian, no Speaker e no Nation.121
Alguns escritores liberais foram menos pacifistas do que se costuma pensar. Uma das manifestações mais conhecidas do sentimento liberal no período anterior a 1914 é A grande ilusão, um tratado de Norman Angell (publicado pela primeira vez com esse título em 1910).122 À primeira vista, o livro de Angell é um modelo de argumento pacifista. A guerra, conforme afirma, é economicamente irracional: os ônus fiscais dos armamentos são excessivos, é difícil cobrar indenizações das potências derrotadas, “os negócios não podem ser destruídos nem capturados por uma potência militar” e as colônias não são uma fonte de receita fiscal. “Qual é a verdadeira garantia do bom comportamento de um Estado para com outro?”, pergunta Angell. “É a elaborada interdependência que, não só no sentido econômico, mas em todos os sentidos, faz que uma agressão injustificada de um Estado contra outro se volte contra os interesses do agressor.”123 Além disso, a guerra também é socialmente irracional, já que os interesses coletivos que unem as nações são menos reais do que aqueles que unem as classes:
O verdadeiro conflito não são os ingleses contra os russos, mas o interesse de todos os bons cidadãos – russos e ingleses – contra a opressão, a corrupção e a incompetência […] Veremos que, por trás de todo conflito entre os Exércitos ou governos da Alemanha e da Inglaterra, está o conflito, em ambos os Estados, entre a democracia e a autocracia, ou entre o socialismo e o individualismo, ou entre a reação e o progresso, independentemente de como nossas afinidades sociológicas o classificam.124
Angell também questiona o argumento de que o serviço militar obrigatório poderia, de todo modo, aprimorar a saúde moral de uma nação: ao contrário, significaria “a germanização da Inglaterra, ainda que um soldado alemão jamais chegasse a nosso solo”. Mais tarde, ele foi um ávido defensor da Liga das Nações, um membro do Parlamento pelo Partido Trabalhista e o ganhador do Prêmio Nobel da Paz em 1933, e tudo isso serviu para acentuar a reputação pacifista de A grande ilusão.
Mas não é bem assim. Por um lado, Angell escreveu o livro enquanto trabalhava para o ultra-alarmista Northcliffe, editando seu Continental Daily Mail; e uma leitura atenta do texto revela que este não é o inocente tratado pacifista da memória popular. O Capítulo 2, Parte 1, considera os “sonhos de conquista alemães” e conclui que “os resultados de [uma] derrota do Exército britânico e [a] invasão da Inglaterra” seriam “40 milhões de famintos”. De maneira similar, o Capítulo 3 pergunta: “Se a Alemanha anexasse a Holanda, quem se beneficiaria, os alemães ou os holandeses?”, e o Capítulo 4 faz a pergunta capciosa: “O que aconteceria se um invasor alemão saqueasse o Banco da Inglaterra?”. Ao afirmar, no Capítulo 6, que “a Inglaterra […] não é proprietária […] de suas colônias autogovernadas” e que elas não são “uma fonte de receita fiscal”, Angell também se pergunta: “A Alemanha poderia esperar se sair melhor? [É] inconcebível que ela pudesse lutar em nome de um experimento [tão] impraticável”.125 Em outras palavras, o que Angell está afirmando é que seria irracional que a Alemanha desafiasse militarmente a Grã-Bretanha.
De todo modo – prossegue –, para o restante do mundo é certamente interessante que o Império Britânico continue intacto. “O Império Britânico”, declara Angell com orgulho, “é composto, em grande parte, de Estados praticamente independentes, sobre cujos atos a Grã-Bretanha não só não exerce controle algum como já desistiu de levar adiante qualquer intenção de usar a força”.126 Além do mais, o Império é quem garante o “comércio por livre consentimento” e, assim, encoraja a “atuação de forças [econômicas] mais fortes do que a tirania do tirano mais cruel que já reinou a ferro e fogo”.127 (A última frase é cuidadosamente escolhida.) Angell revela seus verdadeiros ideais quando conclui:
São a prática e […] a experiência da Inglaterra que o mundo tomará como guias neste assunto […] A extensão do princípio dominante do Império Britânico para a sociedade europeia como um todo é a solução do problema internacional que este livro aborda. O dia do progresso por meio da força já passou; será o progresso por meio das ideias, ou progresso nenhum. E, uma vez que esses princípios de livre cooperação humana entre as comunidade são, em certo sentido, uma criação inglesa, cai sobre a Inglaterra a responsabilidade de lhes dar direção […]128
A grande ilusão, em outras palavras, é um tratado liberal imperialista dirigido à opinião alemã. Escrito em uma época de considerável antagonismo anglo-germânico sobre o programa naval alemão e a “febre de espionagem”, foi concebido para encorajar os alemães a abandonarem sua intenção de desafiar o poderio marítimo da Inglaterra. Evidentemente (a julgar por sua reputação duradoura como um tratado pacifista), o principal argumento do livro – que a Alemanha não seria capaz de derrotar a Inglaterra – foi camuflado com linguagem pacifista para que fosse invisível a muitos leitores. Mas não a todos. O visconde Esher – uma figura central no Comitê de Defesa Imperial e um homem cujo principal “objetivo” (conforme observou em janeiro de 1911) era “manter a superioridade esmagadora da Marinha Imperial Britânica” – abraçou com entusiasmo as ideias de Angell.129 O almirante Fisher descreveu A grande ilusão como “maná divino […] Assim o homem comeu o alimento dos anjos”.130 O redator-chefe e editor assistente do Daily Mail, H. W. Wilson, pôs o dedo na ferida quando observou com desdém para Northcliffe: “Muito perspicaz, e seria difícil escrever um livro melhor do que o dele em defesa dessa tese em particular; esperemos que ele tenha mais sucesso em enganar os alemães do que em me convencer”.131
Mais à esquerda, no Partido Trabalhista, houve, no entanto, um antimilitarismo mais genuíno. A peça de Fenner Brockway, The Devil’s Business [Negócio do diabo], escrita em 1914, antecipou vividamente a decisão do governo Asquith a favor da guerra poucos meses mais tarde, embora retratasse os membros do Gabinete como meros peões da indústria de armamentos internacional.132 Os “mercadores da morte” também foram alvo de The War of Steel and Gold [A guerra do aço e do ouro], de Henry Noel Brailsford, publicado em 1914. Keir Hardie e Ramsay MacDonald estavam entre aqueles, no movimento dos trabalhadores britânicos, que defendiam a ideia de uma greve geral como forma de impedir uma guerra imperialista. Ao mesmo tempo, a hostilidade de MacDonald para com a Rússia czarista e sua forte simpatia pelos sociais-democratas alemães o levaram a se opor firmemente à política externa germanófoba de Grey antes de 1914. O Partido Social-Democrata, conforme ele declarou em 1909, “jamais ofereceu apoio para que seu governo construísse a Marinha alemã”; o partido estava fazendo “esforços magníficos […] para estabelecer uma relação amistosa entre a Alemanha e nós”.133 Esse tipo de germanofilia era muito comum entre os fabianos, para quem não só o próprio Partido Social-Democrata como também o sistema de seguridade social alemão eram dignos de ser copiados. Por exemplo, Sidney e Beatrice Webb estavam prestes a embarcar em uma viagem de seis meses pela Alemanha para estudar “os avanços em ação estatal e cooperação alemã, sindicalismo e organização profissional” quando a guerra irrompeu em agosto de 1914, tendo passado grande parte do mês de julho debatendo os méritos da seguridade social com G. D. H. Cole e um grupo de “socialistas corporativos” inebriados de Oxford.134 George Bernard Shaw, um entusiástico admirador de Wagner, “clama[va] por uma aliança com a Alemanha” em 1912, e, no ano seguinte, passou a defender uma tríplice aliança contra a guerra entre a Inglaterra, a França e a Alemanha; ou, para ser preciso, um acordo duplo pelo qual, “se a França atacar a Alemanha, nós combinamos com a Alemanha de destruir a França, e se a Alemanha atacar a França, nós combinamos com a França de destruir a Alemanha”.135
Mas não foi só na esquerda que a germanofilia floresceu na Grã-Bretanha pré-guerra. O apelo do conde liberal alemão Harry Kessler por uma troca de cartas amigáveis entre intelectuais britânicos e alemães colheu assinaturas do escritor Thomas Hardy e do compositor Edward Elgar do lado britânico; Siegfried Wagner estava entre os alemães. Conforme isso indica, a música era importante: a temporada de primavera do Covent Garden em 1914 teve nada menos que 17 apresentações da ópera Parsifal, além de produções de Die Meistersinger, Tristão e Isolda e A valquíria, e, apesar do início da guerra, os bailes de 1914 continuaram a ser dominados por compositores alemães: Beethoven, Mozart, Mendelssohn, Strauss, Liszt e Bach.136 Várias figuras literárias inglesas tinham raízes alemãs – na verdade, nomes alemães: basta pensar em Siegfried Sassoon, Ford Madox Ford (batizado Joseph Leopold Ford Madox Hueffer) ou Robert Ranke Graves, sobrinho-bisneto do historiador Leopold von Ranke.137
Conforme admitiu, Graves descobriu que, na escola Charterhouse, a nacionalidade de sua mãe era “uma ofensa social” e se sentiu obrigado a “rejeitar o alemão” que havia nele. Nas universidades antigas, ao contrário, havia uma boa dose de germanofilia. A postura contrária à guerra de Bertrand Russell, o mais sábio dos filósofos, é bem conhecida; mas a experiência de Oxford nos anos que antecederam a guerra é muitas vezes ignorada. Nada menos que 335 estudantes alemães se matricularam em Oxford entre 1899 e 1914, incluindo 33 no último ano de paz, dos quais por volta de um sexto recebeu a bolsa de estudos Rhodes. Dentre os alemães em Oxford, estavam os filhos do primeiro-ministro prussiano, o príncipe Hohenlohe, do vice-almirante Moritz von Heeringen e do chanceler Bethmann Hollweg (Balliol, classe de 1908). A existência de clubes de graduandos, como o Hanover Club, a Sociedade Literária Alemã e a Sociedade Anglo-Germânica, que tinha 300 membros em 1909, é um testemunho da crença de pelo menos alguns graduandos britânicos na “Wahlverwandtschaft [afinidade eletiva] entre o Geist alemão e a Kultur de Oxford”.138 A maioria dos que receberam o doutorado honoris causa em Oxford em 1914 era de alemães: Richard Strauss, Ludwig Mitteis (o classicista de Dresden), o príncipe Lichnowsky, o embaixador, e o duque da Saxônia-Coburgo-Gota; também o advogado internacional austríaco Heinrich Lammasch.139 Em 1907, o próprio Kaiser também havia sido honrado com o título. O retrato que marcou a ocasião de seu doutorado honoris causa foi devolvido às paredes das Examination Schools nos anos 1980, depois de um longo período no esquecimento.140
A elevada proporção (28%) de alemães em Oxford que eram da nobreza também é um lembrete de que as relações entre a alta aristocracia alemã e a britânica – em particular, a família real e seus satélites – eram extremamente próximas. A rainha Vitória, metade alemã, havia se casado com o primo Alberto, 100% alemão, da Saxônia-Coburgo-Gota; entre seus genros estavam o Kaiser Frederico III, o príncipe Christian de Schleswig-Holstein e Henry de Battenberg, todos alemães; e, entre seus netos, o Kaiser Guilherme II, da Alemanha, e o príncipe Henrique, da Prússia. Laços dinásticos similares uniam as elites financeiras dos dois países: não só os Rothschild, como também os Schröder, os Huth e os Kleinwort lideravam famílias de banqueiros na City (o centro financeiro) de Londres que haviam se originado na Alemanha; os Rothschild, em particular, mantinham vínculos com seus parentes alemães. Lorde Rothschild era casado com uma parente sua nascida em Frankfurt, e seu filho Charles se casou com uma húngara.141
Na Alemanha, embora o pacifismo fosse recente e a social-democracia fosse suscetível à “integração negativa” (a tendência a se adequar diante da perseguição do Estado),142 permaneceu o fato de que apenas uma minoria dos alemães era militarista, e uma minoria deles era anglófoba. Com efeito, em 1906, o príncipe Bülow, o chanceler, postergou a ideia de uma guerra preventiva até que “surgisse uma causa capaz de inspirar o povo alemão”.143 Um ponto a destacar do chamado “conselho de guerra” do Kaiser, de dezembro de 1912, é que todos os líderes militares presentes tinham dúvidas de que a Sérvia fosse tal causa;144 e as pesquisas de opinião feitas em 1914 entre as camadas populares (em oposição à classe média educada) indicam que as tentativas subsequentes de alertar “o homem na rua” para o interesse da Alemanha na questão balcânica tiveram pouco resultado.145 Ao lado da Alemanha das ligas nacionalistas radicais, havia “outra Alemanha” (nos termos de Dukes e Remak) – uma Alemanha com universidades em busca de excelência, câmaras municipais movimentadas e editores de jornais independentes que parecem convidar a comparações com o último combatente da guerra, os Estados Unidos.146
Além disso, havia a Alemanha da classe trabalhadora organizada, cujos líderes estavam entre os mais críticos do militarismo na Europa. Jamais devemos esquecer que o partido mais bem-sucedido nas eleições do período que antecedeu a guerra foi o Social-Democrata (que também atraiu um número considerável de votos da classe média). Este foi sistematicamente hostil ao “militarismo” durante todo o período que antecedeu 1914; de fato, conquistou sua maior vitória eleitoral, em 1912, com uma campanha contra o “pão nosso de cada dia para o militarismo”, uma alusão ao fato de que o maior gasto em defesa tendia a ser financiado por tributação indireta na Alemanha (ver Capítulo 5). Ao todo, o Partido Social-Democrata obteve 4,25 milhões de votos em 1912 – 34,8% do total –, em comparação com 13,6% para os nacionais liberais, o partido mais comprometido com uma política externa agressiva e um aumento nos gastos miliares. Nenhum outro partido jamais obteve uma proporção tão alta dos votos no Segundo Reich.
De todos os teóricos do Partido Social-Democrata, Karl Liebknecht estava entre os antimilitaristas mais radicais. Para ele, o militarismo era um fenômeno duplo: o Exército alemão, Liebknecht argumentava, era ao mesmo tempo uma ferramenta para a defesa dos interesses capitalistas no exterior e um meio de controlar a classe trabalhadora alemã, diretamente, por meio da coerção ou, indiretamente, por meio da doutrinação militar:
O militarismo […] tem a tarefa de proteger a ordem social prevalente, de apoiar o capitalismo e toda reação contra a luta da classe trabalhadora por liberdade […] O militarismo germano-prussiano floresceu de maneira muito especial, devido às condições peculiares da Alemanha, semiabsolutistas e feudo-burocráticas.147
(Como que para ilustrar a validade dessa teoria, Liebknecht foi assassinado por soldados quando tentou encenar um golpe no estilo bolchevique em Berlim, em janeiro de 1919.)
O problema para os historiadores é que a campanha do Partido Social-Democrata contra o militarismo, embora tenha sido incapaz de evitar a Primeira Guerra Mundial, teve, posteriormente, enorme influência no mundo acadêmico. De maneira paradoxal, os antimilitaristas na sociedade guilhermina eram tão numerosos e tão vociferantes que passamos a acreditar em suas queixas sobre o militarismo da Alemanha, em vez de perceber que a própria quantidade de queixas é prova do contrário. Assim, existe hoje um número assombroso de estudos sobre o militarismo alemão, e nem todos eles reconhecem que o próprio termo se origina na propaganda de esquerda.148 Ainda em 1989-1990, os historiadores da tradição marxista-leninista continuavam repetindo os argumentos de Liebknecht: o militarismo, de acordo com Zilch, era uma expressão do “caráter agressivo da burguesia, associado com os junkers” e com suas “aspirações perigosas e reacionárias”.149
Mais influente na historiografia não marxista é a análise de Eckart Kehr. Uma espécie de Hobson alemão, Kehr aceitou o argumento do Partido Social-Democrata antes da guerra de que, na Alemanha guilhermina, houve uma aliança entre agricultores e industrialistas que encorajou, entre outras coisas, políticas militaristas. Ele apresentou dois atributos: primeiro, a aristocracia prussiana tinha o controle de seus parceiros menores entre os industrialistas e outros grupos burgueses reacionários; segundo (e aqui ele também lembrava marxistas posteriores, como Antonio Gramsci), o militarismo foi, em parte, criação de instituições estatais autônomas. Em outras palavras, era um argumento que deixava espaço para interesses burocráticos e departamentais, e também para interesses de classe. Mas esses atributos não diferenciam Kehr radicalmente dos marxistas ortodoxos. Quando se deixou levar por sua própria tese fundamental – a de que todas as decisões em política externa eram subordinadas a fatores socioeconômicos domésticos –, Kehr foi perfeitamente capaz de escrever em linguagem quase idêntica à de seus contemporâneos marxistas.
Os argumentos de Kehr, enterrados pela historiografia alemã após sua morte prematura, foram revividos por Hans-Ulrich Wehler nos anos 1960 e adotados por Fritz Fischer.150 De acordo com o clássico compêndio de Wehler sobre a Alemanha guilhermina, que seguia a linha de Kehr, o militarismo serviu não só a um propósito econômico (contratos de armamentos para a indústria), como também foi uma arma de último recurso em sua luta contra a Social-Democracia e um ponto de convergência para o chauvinismo popular, desviando a atenção do sistema político “antidemocrático” do Reich.151
Certamente, a ideia de que uma política externa agressiva poderia ajudar o governo do Reich a superar suas dificuldades políticas internas não foi fruto da imaginação de Kehr (ou de Liebknecht), mas uma estratégia de governo real. O ministro de Finanças prussiano Johannes Miquel e o príncipe Bülow, predecessor de Bethmann Hollweg como chanceler do Reich, sem dúvida se envolveram em exibições de força para fortalecer a posição dos partidos que apoiavam o Estado (os conservadores e os nacionais liberais) no Reichstag, exatamente como Bismarck havia feito antes deles. E de fato houve aqueles que, em 1914, acreditaram que uma guerra iria “fortalecer a mentalidade e a ordem patriarcal” e “evitar o avanço da Social-Democracia”.152
Mas é preciso fazer uma ressalva. A ideia de que uma política externa agressiva poderia enfraquecer o desafio político interno apresentado pela Esquerda dificilmente foi uma invenção da Direita alemã; havia se tornado uma espécie de clichê na França de Napoleão III e, na virada do século, era quase uma justificativa universal para políticas imperiais. Além disso, entre os políticos, generais, agricultores e industrialistas alemães havia muito menos acordo do que às vezes se afirma.153 Típico foi o fato de que pelo menos dois deputados do Partido Nacional Liberal para seções eleitorais de áreas rurais (Paasche e Dewitz) foram forçados a renunciar à Liga do Exército por pressão de seus apoiadores na Liga Agrária local, para quem o argumento da Liga do Exército a favor de um exército maior era de um radicalismo perigoso. Isso ilustra um aspecto importante a ser considerado: havia antimilitarismo até mesmo nas fileiras do próprio conservadorismo prussiano. Tampouco é persuasivo atribuir as decisões tomadas em Postdam e Berlim durante julho e agosto de 1914 à influência de uma “oposição nacional” radical. Conforme afirmou Bethmann com relação à extrema direita: “Com esses idiotas não se pode conduzir uma política externa”; ainda estava fresca na memória a segunda crise marroquina, quando o então ministro das Relações Exteriores Alfred von Kiderlen-Wächter foi extremamente constrangido pelas demandas severas da imprensa nacionalista radical.154
Por fim, e o que é mais importante, sucessivos chanceleres alemães estavam bem cientes de que o militarismo poderia ser um tiro pela culatra, sobretudo se levasse à guerra. Em 1908, Bülow disse ao príncipe herdeiro:
Hoje em dia, não se pode declarar nenhuma guerra sem que um povo inteiro esteja convencido de que esta é justa e necessária. Uma guerra, provocada de maneira leviana, mesmo se fosse ganha, teria um efeito negativo sobre o país, ao passo que, se resultasse em derrota, poderia acarretar a queda da dinastia […]155
Em junho de 1914, seu sucessor, o próprio Bethmann Hollweg, previu de maneira acertada que “uma guerra mundial, com suas consequências incalculáveis, fortaleceria tremendamente o poder da Social-Democracia, porque eles pregavam a paz, e derrubaria muitos do trono”.156 Ambos os homens tinham em mente a experiência da Rússia em 1905 – assim como o ministro do Interior da Rússia, Pyotr Durnovo, quando alertou Nicolau II em fevereiro de 1914 que “uma revolução social em sua forma mais extrema será inevitável se a guerra terminar mal”.157
O militarismo, então, estava longe de ser a força dominante na política europeia às vésperas da Grande Guerra. Ao contrário: estava em declínio político, sobretudo em consequência direta da democratização. A Tabela 1 mostra como o direito ao voto havia sido ampliado em todos os principais países na última metade do século XIX; às vésperas da guerra, conforme mostra a Tabela 2, os partidos socialistas francamente antimilitares estavam em ascensão eleitoral na maioria dos futuros países combatentes.
Tabela 1 Percentuais da população total com direito a voto para as câmaras inferiores, 1850 e 1900
|
1850 |
1900 |
França |
20 |
29 |
Prússia/Alemanha |
17 |
22 |
Grã-Bretanha |
4 |
18 |
Bélgica |
2 |
23 |
Sérvia |
0 |
23 |
Rússia |
0 |
15 |
Romênia |
0 |
16 |
Áustria |
0 |
21 |
Hungria |
0 |
6 |
Piemonte/Itália |
n/a |
8 |
Fonte: Goldstein, Political Repression in Nineteenth Century Europe, p. 4s.
Nota: O sufrágio universal teria concedido o voto a cerca de 40-50% da população.
Tabela 2 O voto socialista em países europeus selecionados às vésperas da guerra
País |
Data |
Percentual de votos |
Cadeiras socialistas |
Áustria |
1911 |
25,4 |
33 |
Bélgica |
1912 |
22,0 |
40 |
França |
1914 |
16,8 |
103 |
Alemanha |
1912 |
34,8 |
110 |
Itália |
1913 |
17,6 |
52 |
Rússia |
1912 |
n/a |
24 |
Grã-Bretanha |
1910 |
6,4 |
42 |
Fonte: Cook e Paxton, European Political Facts, 1900-1996, p. 163-267.
Na França, a eleição de abril de 1914 teve como resultado uma maioria de esquerda, e Poincaré precisou deixar o socialista René Viviani formar um governo. (Teria sido Caillaux se sua esposa não tivesse tomado a medida pouco usual de assassinar o editor-chefe Gaston Calmette, do jornal Figaro, para evitar a publicação de algumas das cartas do marido para ela.) Jean Jaurès, o socialista germanófilo, estava no auge de sua influência. Na Rússia, houve uma greve de três semanas nas obras da Putilov em Petrogrado, que depois de 18 de julho se espalhou para Riga, Moscou e Tbilisi. Mais de 1,3 milhão de trabalhadores – por volta de 65% de todos os operários russos – participaram de greves em 1914.158 Nem mesmo onde os socialistas não tinham grande influência havia maioria militarista: na Bélgica, o partido católico dominante resistiu incansavelmente aos esforços de aumentar a prontidão do país para a guerra. Mas em nenhum lugar a esquerda antimilitarista foi mais forte do que na Alemanha, onde o direito a voto estava entre os mais democráticos de toda a Europa. Mas os argumentos dos antimilitaristas da Alemanha no período pré-guerra se mostraram tão resistentes que ainda hoje é possível encontrá-los em livros escolares de história; com a consequência perversa de que subestimamos o alcance desse antimilitarismo na época. Os indícios são inequívocos: os europeus não estavam marchando para a guerra, mas dando as costas ao militarismo.
1. Esta seção se baseia, em grande medida, em I. Clarke, Great War. Ver também, do mesmo autor, Tale of the Next Great War e Voices Prophesying War.
2. I. Clarke, Great War, p. 129-139.
3. Childers, Riddle of the Sands, p. 248.
4. I. Clarke, Great War, p. 326ss.
5. Ibid., p. 139-152. De acordo com uma fonte, o livro vendeu 1 milhão de exemplares.
6. Ibid., p. 153-166. Ver também p. 225 da edição alemã, que omitiu esse final.
7. Ibid., p. 168-178.
8. Ibid., p. 339-354.
9. Andrew, Secret Service, p. 77.
10. Le Queux, Spies of the Kaiser.
11. I. Clarke, Great War, p. 356-363.
12. Ibid., p. 377-381.
13. Du Maurier foi um oficial no Corpo de Fuzileiros Reais: Andrew, Secret Service, p. 93.
14. Hynes, War Imagined, p. 46.
15. I. Clarke, Great War, p. 179s.
16. Saki, When William Came, p. 691-814.
17. Ibid., esp. p. 706-711. A ideia de que os judeus eram pró-alemães, um tanto surpreendente aos olhos de hoje, era uma panaceia da direita pré-1914 na Inglaterra. Não é preciso dizer que o Movimento Escoteiro desafia o estado de ânimo derrotista.
18. I. Clarke, Great War, p. 364-369.
19. Ibid., p. 87-98.
20. Ibid., p. 183-201, 390-398.
21. Ibid., p. 399-408.
22. Ibid., p. 385-390.
23. Ibid., p. 408ss.
24. Ibid., p. 29-71.
25. Ibid., p. 72-87.
26. Andrew, Secret Service, p. 74. A conversão de Le Queux à germanofobia só veio quando (assim como sir Robert Baden-Powell, o “herói” de Mafeking e fundador do Movimento Escoteiro) ele adquiriu, de uma gangue de falsificadores sediados na Bélgica, planos fictícios de uma invasão alemã: ibid., p. 83s.
27. Andrew, Secret Service, p. 68.
28. I. Clarke, Voices Prophesying War, p. 136-138.
29. Ibid., p. 102-108.
30. Andrew, Secret Service, p. 69.
31. Ibid., p. 233-247.
32. Ibid., p. 259-275.
33. Ibid., p. 276s. Sobre Lockwood, ver Andrew, Secret Service, p. 84.
34. Hiley, “Introduction”, p. ix-x.
35. I. Clarke, Great War, p. 313-323. No entanto, o livro não vendeu bem: Andrew, Secret Service, p. 78.
36. I. Clarke, Great War, p. 282-292.
37. Ibid., p. 214.
38. Ibid., p. 296-313.
39. Ibid., p. 233.
40. Ibid., p. 202-225.
41. Steinberg, “Copenhagen Complex”. Ao iniciar um ataque surpresa, lorde Nelson havia destruído a Marinha dinamarquesa no porto de Copenhague em 1801.
42. I. Clarke, Great War, p. 226-232.
43. Förster, “Dreams and Nightmares”, p. 4.
44. Ibid.
45. Bloch, Is War Now Impossible.
46. Ibid., p. xxxvii.
47. Ibid., p. lx.
48. Ibid., p. lii.
49. Ibid., p. lvi-lix.
50. Ibid., p. x-xi.
51. Ibid., p. xxxi.
52. G. Gooch e Temperley, British Documents, vol. I, p. 222. De acordo com Bloch, o “livro foi recomendado, por solicitação minha, pelo imperador da Rússia ao ministro da Guerra, com a orientação de que deveria ser avaliado por um conselho de especialistas”. Sua opinião era de que “nenhum outro livro poderia contribuir tanto para o sucesso da Conferência”: Bloch, Is War Now Impossible, p. xiii.
53. Sobre o papel da imprensa, ver Morris, Scaremongers.
54. Lasswell, Propaganda Technique, p. 192.
55. Innis, Press, p. 31.
56. Andrew, Secret Service, p. 73.
57. Morris, Scaremongers, p. 132-139; Mackay, Fisher of Kilverstone, p. 369, 385. Cf. Andrew, Secret Service, p. 81; Beresford foi um daqueles a quem Le Queux mostrou um “discurso” fictício em que o Kaiser supostamente declarou sua intenção de invadir a Inglaterra.
58. Andrew, Secret Service, p. 77.
59. D. French, “Spy Fever”, p. 355-365; Hiley, “Failure of British Counter-Espionage”, p. 867-889; Hiley, “Counter-Espionage”, p. 635-670; Hiley, “Introduction”, p. vii-xxxvi; Andrew, Secret Service, p. 90ss. A abertura, em 1997, dos arquivos MI5 (originalmente MO5) anteriores a 1919 revelou mais detalhes sobre os primeiros dias, verdadeiramente risíveis, de contraespionagem britânica.
60. Public Record Office (PRO) KV 1/7, List of Persons Arrested [Lista de presos], 4 de agosto de 1914. Ver também PRO KV 1/9, Relatório, 31 de julho de 1912; Kell, Relatório, 16 de agosto de 1912; Relatório, 29 de outubro de 1913; PRO KV 1/46, M.I.5 Historical Reports, G Branch Report, “The investigation of espionage”, vol. VIII (1921), Apêndice C; memorando do major R. J. Dake, 4 de janeiro de 1917. Ver também Andrew, Secret Service, p. 105-116 para um levantamento distorcido dos vários casos.
61. Andrew, Secret Service, p. 115ss. Mais uma vez, a ameaça que esses homens impuseram à segurança nacional foi praticamente nula.
62. Ibid., p. 120.
63. Hiley, “Counter-Espionage”, Apêndices C e D.
64. Trumpener, “War Premeditated”, p. 58-85.
65. Hiley, “Introduction”, p. xix-xxi.
66. Andrew, Secret Service, p. 89s.
67. PRO KV 1/9, Relatório Kell, 7 de novembro de 1910. Cf. Andrew, Secret Service, p. 121ss.
68. Andrew, Secret Service, p. 127-133. Ver também D. French, “Spy Fever”, p. 363; Andrew, “Secret Intelligence”, p. 12ss.
69. Andrew, Secret Service, p. 133ss.
70. PRO CAB 38/4/9, W. R. Robertson, “The Military Resources of Germany, and Probable Method of their Employment in a War Between Germany and England”, 7 de fevereiro de 1903.
71. Andrew, Secret Service, p. 88.
72. Morris, Scaremongers, p. 158.
73. PRO FO 800/61, de Grey para Lascelles, 22 de fevereiro de 1908. Cf. D. French, “Spy Fever”, p. 363.
74. Andrew, “Secret Intelligence”, p. 13. Talvez ele também desejasse evitar afirmações de germanofilia na imprensa direitista: Andrew, Secret Service, p. 92s, 98s.
75. Detalhes da campanha para tal agência em PRO KV 1/1, Organisation of Secret Service [Organização do Serviço Secreto]: nota preparada para o DMO, 4 de outubro de 1908; PRO KV 1/2, de Edmond para o DMO, 2 de dezembro de 1908; nota do Gabinete de Guerra para o chefe do Estado-Maior, 31 de dezembro de 1909; documento de Edmonds para o Estado-Maior, “Espionage in Time of Peace”, 1909. Cf. Public Record Office, M.I.5.
76. PRO CAB 3/2/1/47A, Relatório do subcomitê do CID: “The Question of Foreign Espionage in the United Kingdom”, 24 de julho de 1909. Ver também PRO KV 1/3, Memorando sobre a reunião para instaurar uma agência de serviço secreto, 26 de agosto de 1909.
77. Hiley, “Introduction”, p. xxi. Cf. Andrew, “Secret Intelligence”, p. 14.
78. PRO KV 1/9, Relatório Kell, 25 de março de 1910; PRO KV 1/10, Diário Kell, junho-julho 1911; PRO KV 1/9, Relatório Kell, 22 de novembro de 1911; Relatório Kell, 9 de abril de 1913; PRO KV 1/8, memória de William Melville, 1917 (um documento muito engraçado, embora sem intenção de sê-lo). Já em 1903, Melville, o ex-superintendente da Divisão Especial da Scotland Yard, havia começado a investigar estrangeiros suspeitos para o Ministério das Relações Exteriores.
79. PRO KV 1/9, Relatório Kell, 30 de abril de 1914. Cf. D. French, “Spy Fever”, p. 365; Hiley, “Counter-Espionage”, p. 637.
80. Hiley, “Introduction”, p. xxvii.
81. Bernhardi, Germany.
82. Searle, Quest; Searle, “Critics of Edwardian Society”, p. 79-96.
83. Summers, “Militarism in Britain”, p. 106, 113.
84. Bond, War and Society, p. 75.
85. Summers, “Militarism in Britain”, p. 120. Ver também Hendley, “‘Help Us to Secure’”, p. 262-288.
86. Price, Imperial War. Cf. Cunningham, “Language of Patriotism”, p. 23-28.
87. E. Weber, Nationalist Revival in France.
88. Sumler, “Domestic Influences”, p. 517-537.
89. Eley, Reshaping the German Right; Eley, “Wilhelmine Right”, p. 112-135. Ver também Chickering, We Men.
90. Eley, “Conservatives and Radical Nationalists”, p. 50-70.
91. Coetzee, German Army League, p. 4.
92. A Liga do Exército no sudoeste da Alemanha tinha relações com o Exército Voluntário da Juventude, com a Liga Alemã contra o Abuso de Bebidas Intoxicantes, com a Liga Alemã para o Combate à Emancipação da Mulher, com a Liga contra a Social-Democracia e com a Associação Geral da Língua Alemã – bem como com a Associação Württemberg para a Criação de Cães de Caça com Pedigree, algo improvável, mas revelador: Coetzee, German Army League, p. 55-58, 65.
93. Associar-se à Liga do Exército custava 1 marco, e os membros tinham direito a um jornal, Die Wehr, apresentações de slides e excursões regulares, e um jamboree de três dias uma vez ao ano.
94. Coetzee, German Army League, p. 76-104. A tentativa de Coetzee de traçar um perfil sociológico mais exato da Liga com base nas listas que mantinha dos membros mortos na guerra traz uma imagem similar: 29,4% eram soldados de carreira; 16,2%, funcionários públicos; 11,4%, acadêmicos ou professores; 7,7%, empresários; 8,9%, outras profissões; e apenas 6,5% eram escriturários (p. 90s). Infelizmente, há dificuldades metodológicas com esses números, já que naturalmente representam mais os jovens, sendo que outra amostra de 195 membros no período anterior à guerra revela que 90% tinham mais de 40 anos!
95. Chickering, We Men.
96. Düding, “Die Kriegsvereine im wilhelminischen Reich”, p. 108. Ver também Showalter, “Army, State and Society”, p. 1-18.
97. Greschat, “Krieg und Kriegsbereitschaft”, p. 33-55.
98. Leugers, “Einstellungen zu Krieg und Frieden”, p. 62. É significativo que as multi-dões em Berlim em 1º e 2 de agosto de 1914 cantaram não só a protestante Ein’ feste Burg ist unser Gott, como também a católica Grosser Gott wir loben Dich; Eksteins, Rites of Spring, p. 61.
99. Chickering, “Die Alldeutschen”, p. 25.
100. Bucholz, Moltke, Schlieffen, p. 109-114, 217-220, 273.
101. Bruch, “Krieg und Frieden”, p. 74-98. Era Dietrich Schäfer que Max Weber tinha em mente quando instou os acadêmicos a deixar a política do lado de fora da sala de aula.
102. Berghahn, Germany and the Approach of War, p. 203s.
103. Geiss, July 1914, p. 22, 43.
104. Bruch, “Krieg und Frieden”, p. 85s.
105. Coetzee, German Army League, p. 85s.
106. Ibid., p. 52; F. Fischer, War of Illusions, p. 194.
107. Coetzee, German Army League, p. 116.
108. Mann, Betrachtungen eines Unpolitischen.
109. Cf. Hildebrand, “Opportunities and Limits”, p. 91; Hillgruber, “Historical Significance”, p. 163.
110. Mommsen, Max Weber, p. 35-40.
111. Ver F. Fischer, War of Illusions, p. 4-7, 30ss, 259-271, 355-362; cf. Meyer, Mitteleuropa.
112. Kroboth, Finanzpolitik, p. 278; Eksteins, Rites of Spring, p. 91.
113. Förster, Der doppelte Militarismus, p. 279.
114. Coetzee, German Army League, p. 45-50; Chickering, “Die Alldeutschen”, p. 30.
115. Coetzee, German Army League, p. 119s.
116. Geiss, July 1914, p. 21s; Berghahn, Germany and the Approach of War, p. 144.
117. Eksteins, Rites of Spring, p. iv; Geiss, July 1914, p. 48.
118. Ver, em geral, Nicholls e Kennedy, Nationalist and Racialist Movements.
119. Ver especialmente Chickering, Imperial Germany.
120. Bentley, Liberal Mind, p. 11-15; Barnett, Collapse of British Power, p. 24ss.
121. Weinroth, “British Radicals”, p. 659-664.
122. Angell, Great Illusion. O brilhante título original era Europe’s Optical Illusion.
123. Ibid., p. 295.
124. Ibid., p. 137, 140.
125. Ibid., p. xi-xiii.
126. Ibid., p. 229.
127. Ibid., p. 268ss.
128. Ibid., p. 361. Grifo meu.
129. Offer, First World War, p. 261.
130. Ibid., p. 250.
131. Morris, Scaremongers, p. 266.
132. Hynes, War Imagined, p. 80.
133. Marquand, Ramsay MacDonald, p. 164ss.
134. Mackenzie e Mackenzie, Diary of Beatrice Webb, vol. III, p. 203s.
135. Holroyd, Bernard Shaw, vol. II, p. 341ss.
136. Hynes, War Imagined, p. 74s.
137. Graves, Goodbye, p. 11s, 25-31.
138. T. Weber, “Stormy Romance”.
139. Winter, “Oxford and the First World War”, p. 3.
140. Pogge von Strandmann, “Germany and the Coming of War”, p. 87s.
141. Ferguson, World’s Banker, Capítulo 30.
142. Groh, Negative Integration.
143. Winzen, “Der Krieg”, p. 180.
144. Geiss, Der lange Weg, p. 269.
145. Cf. Eksteins, Rites of Spring, p. 55-63, 193-197; e Ullrich, Kriegsalltag, p. 10-21.
146. Dukes e Remak, Another Germany, esp. p. 207-219. Ao tentar retratar o Reich como “ein Land wie andere auch”, Remak vai muito mais longe que outros críticos com a ideia de um Sonderweg alemão: cf. Blackbourn e Eley, Peculiarities of German History.
147. Liebknecht, Militarism and Anti-Militarism, p. 9-42.
148. Além de Ritter, Sword and the Sceptre, esp. vol. II: The European Powers and the Wilhelminian Empire, 1890-1914, ver Vagts, History of Militarism; Berghahn, Militarism. Ver, mais recentemente, Stargardt, German Idea of Militarism.
149. Zilch, Die Reichsbank, p. 40.
150. F. Fischer, War of Illusions, p. 13-25; F. Fischer, Bündnis der Eliten.
151. Wehler, German Empire, p. 155-162; Berghahn, Germany and the Approach of War, p. 4, 41, 213.
152. Ver Mayer, “Domestic Causes of the First World War”, p. 286-300; Groh, “‘Je eher, desto besser!’”, p. 501-521; Gordon, “Domestic Conflict and the Origins of the First World War”, p. 191-226; Witt, “Innenpolitik und Imperialismus”, p. 24ss. Ver também F. Fischer, War of Illusions, esp. p. 61, 83, 94, 258; Wehler, German Empire, p. 192-201. Cf. a crítica em Mommsen, “Domestic Factors in German Foreign Policy”, p. 3-43.
153. Eley, “Army, State and Civil Society”, p. 85-109.
154. Sobre o abismo cada vez maior entre o governo e a direita radical, ver Eley, Reshaping the German Right, p. 316-334; Mommsen, “Public Opinion and Foreign Policy”.
155. Bülow, Memoirs, p. 400.
156. Geiss, July 1914, p. 47.
157. Davies, Europe, p. 895.
158. Ferro, Great War, p. 179.