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Marguerite Duras
Informações catalográficas:
Lol V. Stein nasceu aqui, em S. Tahla, onde viveu uma grande parte da juventude. O pai era professor na Universidade. Ela tem um irmão nove anos mais velho – nunca vi – dizem que mora em Paris. Os pais já morreram.
Lol, conta a Sra. Stein, foi trazida de volta a S. Tahla e permaneceu em seu quarto, sem sair para nada, durante algumas semanas.
Lol deixou S. Tahla, sua cidade natal, durante dez anos. Morou em U. Bridge.
Aplanar o terreno, escavá-lo, abrir sepulturas onde Lol se finge de morta, parece-me mais justo, já que se faz necessário inventar os elos que me faltam na história de Lol V. Stein, do que erguer montanhas, edificar obstáculos, acidentes. E acredito, por conhecer essa mulher, que ela teria preferido que eu suprisse dessa maneira a escassez dos fatos de sua vida. Aliás, é sempre a partir de hipóteses não-gratuitas e que, em minha opinião, já receberam um princípio de confirmação que o faço.
Logo que Lol o viu, reconheceu-o. Era ele quem tinha passado na frente de sua casa havia algumas semanas.
Ela chegou, na verdade, desceu de um ônibus lotado de pessoas que voltavam para casa ao anoitecer.
Durante os dias que se seguiram, Lol procurou o endereço de Tatiana Karl.
Trinta e seis anos, faço parte do corpo médico. Cheguei a S. Tahla há apenas um ano. Estou no serviço de Pierre Beugner no hospital departamental. Sou o amante de Tatiana Karl.
Jean Bedford retirou-se ao seu quarto. Tem um concerto amanhã. Faz exercícios de violino.
Ela volta após acompanhar os Beugner. Chega lentamente e encosta-se contra a porta-janela. Com o rosto abaixado, as mãos para trás agarradas à cortina, permanece lá. Vou cair. Uma fraqueza sobe pelo meu corpo, um nível se eleva, com o sangue inundado, o coração é de lama, mole, enxovalha-se, vai dormir. Quem ela encontrou em meu lugar?
Quando cheguei à janela do quarto do Hotel des Bois onde eu esperava Tatiana Karl, terça-feira, na hora marcada, era o fim do dia, e acreditei ver à meia-distância entre o sopé da colina e o hotel uma forma cinzenta, uma mulher, cuja lourice cendrada através das hastes do centeio não podia enganar-me; experimentei, embora esperasse por tudo, uma emoção bastante violenta cuja verdadeira natureza não soube logo, entre a dúvida e o espanto, o horror e a alegria, a tentação de gritar cuidado, de socorrer, de repelir para sempre ou de prender-me para sempre, por toda Lol V. Stein, de amor. Abafei um grito, desejei a ajuda de Deus, saí correndo, refiz o caminho, rodeei o quarto, só demais para amar ou para não mais amar, sofrendo, sofrendo da insuficiência deplorável de meu ser em conhecer esse acontecimento.
De repente, a lourice não foi mais igual, ela se mexeu, depois se imobilizou. Achei que devia ter percebido que eu tinha descoberto sua presença.
No dia seguinte, dou um jeito para ausentar-me do hospital durante uma hora à tarde. Procuro-a. Passo novamente diante do cinema diante do qual ela me viu. Passo diante de sua casa: a sala está aberta, o carro de Jean Bedford não está lá, é uma quinta-feira, ouço um riso de menina que vem do gramado para o qual dá a sala de bilhar, depois dois risos que se misturam, ela só tem filhas, três. Uma criada sai pela escada da entrada, jovem e muito bonita, de avental branco, toma uma alameda que dá no gramado, olha-me, parado na rua, sorri para mim, desaparece. Vou embora. Quero evitar ir ao Hotel des Bois, vou até lá, para o carro, contorno o hotel a bastante distância, faço a volta no campo de centeio, o campo está vazio, ela só vem quando estamos aí, Tatiana e eu. Vou novamente embora. Rodo devagar nas ruas principais, vem-me a ideia de que ela talvez esteja na região em que Tatiana mora. Ela está. Está no bulevar que passa pela frente da casa, a duzentos metros desta. Paro o carro e sigo
Portanto, houve essa refeição em casa de Lol.
Compareço ao encontro, às seis horas, no dia marcado. Tatiana provavelmente não virá.
Como da primeira vez, Lol já está lá na plataforma da estação, quase só, os trens dos trabalhadores são mais cedo, o vento fresco corre sob seu casacão cinza, sua sombra se alonga sobre a pedra da plataforma em direção às da manhã, está misturada a uma luz verde que vagueia e se apega em toda parte em miríades de pequenas faíscas ofuscantes, se apega a seus olhos que riem, de longe, e vêm ao meu encontro, seu minério de carne brilha, brilha, a descoberto.
Ela continua dormindo, na mesma posição. Há uma hora que dorme. A luz inclina-se um pouco. Seus cílios fazem uma sombra. Venta um pouco. Sua mão ficou no lugar em que adormeceu, um pouco mais enterrada na areia, não se veem mais as unhas.
Lol sonha com um outro tempo em que a mesma coisa que vai ocorrer ocorreria de modo diferente. De outro modo. Mil vezes. Em toda parte. Em outra parte. Entre outros, milhares que, da mesma maneira que nós, sonham com esse tempo, obrigatoriamente. Esse sonho me contamina.
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