1. Segundo o relato de James Barrie (1860-1937) em seu livro de ensaios The Greenwood Hat (1930), o nome Wendy foi inspirado em Margaret (1888-94), a filha de um de seus amigos próximos, o poeta vitoriano William Ernest Henley (1849-1903). Margaret, que faleceu aos seis anos de idade, chamava Barrie de “fwendy”, em vez de “friend” (amigo).

2. O autor satiriza um dos hábitos ingleses de sua época, o de imaginar a vida no Oriente como sendo algo exótico e inescrutável.

3. Napoleão Bonaparte (1769-1821), líder político e militar durante os últimos estágios da Revolução Francesa. Imperador da França de 1804 a 1814, estabeleceu a hegemonia francesa sobre a maior parte da Europa.

4. No padrão monetário inglês pré-decimal, adotado até 1971 e vigente, portanto, quando Peter Pan foi escrito, uma libra equivalia a vinte xelins, e um xelim equivalia a doze pence. Oralmente, as quantias eram ditas sem indicação do nome da moeda: “uma libra e dezessete” significa uma libra e dezessete xelins; “dezoito xelins e três” significa dezoito xelins e três pence; e “duas, nove e seis” significa duas libras, nove xelins e seis pence.

5. Os filhos de Arthur (1863-1907) e Sylvia Llewelyn Davies (1866-1910), além de terem inspirado Barrie a escrever Peter Pan, batizaram alguns dos personagens da história. George era o filho mais velho dos Davies, John era o segundo filho, Peter o terceiro e Michael, o quarto. O autor ficou amigo dos garotos em um de seus passeios em Kensington Gardens e veio a conhecer os pais posteriormente, em 1898, durante um jantar. Após a morte de Arthur – e, logo depois, de Sylvia – James Barrie teve um papel importante na criação das crianças. A peça de Allan Knee The Man Who Was Peter Pan (1998) aborda a relação do autor com a família Llewelyn Davies e serviu de base para o filme Em busca da Terra do Nunca (2004).

6. Moeda inglesa cunhada em 1663 e extinta em 1813. Recebeu esse nome porque o ouro utilizado em sua produção vinha da região da Guiné, na África. No sistema monetário pré-decimal, um guinéu equivalia a vinte e um xelins, e meio guinéu equivalia a dez xelins e seis pence.

7. Raça de cães de grande porte, originária da ilha canadense de Terra Nova. Considerada uma raça dócil, é conhecida por sua capacidade de nadar e por realizar salvamentos no mar.

8. Kensington Gardens é um dos parques públicos reais de Londres, localizado na região central da cidade, ao lado do Hyde Park. James Barrie morava a uma curta distância do local e lá conheceu os irmãos Llewelyn Davies. Em Peter Pan em Kensington Gardens, de 1906, o autor afirma: “Vocês precisam entender que será difícil acompanhar as aventuras de Peter Pan, a menos que estejam familiarizados com o Kensington Gardens.”

9. Originário da Ásia, o ruibarbo (Rheum rhabarbarum) começou a ser utilizado como alimento e fitoterápico no século XIII, na Inglaterra. Além de ingrediente frequente para tortas e sobremesas, o talo da planta pode ser usado como estimulante digestivo para crianças. A folha é altamente tóxica, embora fosse consumida em saladas até o início do século XX.

10. É possível que o personagem de James Barrie seja mais um derivado do culto ao deus grego Pã, fenômeno que percorreu a era eduardiana. Em um ensaio intitulado “Pan’s Pipes” (1881), o escritor escocês Robert Louis Stevenson (1850-94) proclama que “para os jovens e para as mentes abertas e adequadas, Pã não está morto”. O deus dos bosques também é o herói de Puck of Pook’s Hill (1906) do poeta britânico Rudyard Kipling (1865-1936), e é representado pelo personagem Dickon em O jardim secreto (1911) da escritora inglesa Frances Hodgson Burnett (1849-1924). Em 1904 ocorre a estreia da peça de Barrie, Peter Pan, or The Boy Who Wouldn’t Grow Up, que servirá de base para o romance Peter and Wendy (que seria rebatizado como Peter Pan), de 1911.

11. “Never-Never” (Nunca-Nunca) era o modo como se descreviam algumas das regiões inabitadas da Austrália no século XIX. Nos primeiros esboços da peça, a ilha de Peter Pan era chamada “Never Never Never Land”, em vez de apenas Neverland (Terra do Nunca)

12. Fazer esqueletos de folhas era um passatempo de donas de casa da Inglaterra vitoriana. As folhas eram embebidas em água da chuva para amolecerem e seus veios ficarem ressaltados. Depois eram escovadas, o que eliminava toda a superfície da folha, restando apenas os veios. O produto final podia ser pintado e utilizado em decorações para a casa.

13. A sombra, por vezes, é utilizada na literatura como metáfora para a manifestação da alma. É deste modo que figura nos contos “Sombra – uma parábola” (1835), de Edgar Allan Poe (1809-49), e em “O pescador e a sua alma” (1888), de Oscar Wilde (1854-1900).

14. Expressão latina oriunda da prece Confiteor, da Igreja Católica. Significa “minha culpa”.

15. O título do capítulo faz eco ao nono verso do poema “The Stolen Child” (A criança roubada), do livro The Wanderings of Oisin and Other Poems (1889) do escritor irlandês William Butler Yeats (1865-1939): “Come away, O human child!” (Vinde, ó crianças!). O poema retrata crianças que, de mãos dadas com fadas, chegam a uma frondosa ilha longe dos problemas do mundo.

16. Em francês no original: condição do homem ou animal bem nutrido, gordo, bem fornido, “cheinho”.

17. Quando um dos grandes amigos de James Barrie, o escritor escocês Robert Louis Stevenson, o convidou para visitá-lo em sua casa em Upolu (uma das ilhas do arquipélago de Samoa), as instruções foram “pegue o barco para São Francisco e minha casa é a segunda à esquerda”.

18. Em Artful Dodgers: Reconceiving the Golden Age of Children’s Literature (2009), de Marah Gubar, existe o relato de que, nas primeiras exibições da peça, várias crianças atiravam dedais no palco durante esta passagem.

19. Em Peter Pan em Kensington Gardens, James Barrie explica que Peter escapou de tornar-se humano aos sete dias de idade, quando, ao avistar as árvores do Kensington Gardens, esqueceu que era um bebê de pijama e saiu voando por cima das casas em direção ao parque.

20. A exclamação de Wendy talvez não seja de empolgação: na tradição popular, as fadas costumam roubar as crianças.

21. No original Christmas pudding: sobremesa tradicional de Natal que tem origem nos tempos medievais, antes do estabelecimento da Igreja anglicana. Atualmente é constituída de frutas secas cozidas com especiarias e deve ser servida flambada com conhaque.

22. Em Peter Pan em Kensington Gardens, o autor explica que em certa ilha nascem todos os pássaros que viram meninos e meninas. Se as crianças apertarem suas têmporas com força é possível que se lembrem de quando foram pássaros.

23. O autor empresta seu próprio nome ao Capitão James Gancho. Nos primeiros rascunhos da peça, Gancho assumia a postura de um diretor de colégio, e é sugerido que havia estudado em Eton – a mesma escola que quatro dos irmãos Llewelyn Davies frequentaram.

24. Barba Negra (c.1680-1718) foi um dos mais renomados piratas de todos os tempos. Nascido Edward Teach, o pirata inglês tornou-se personagem do folclore norte-americano por causa de seus saques nas costas do mar caribenho.

25. Long John Silver, que também atendia pelos apelidos Barbecue e Sea-Cook, é o grande vilão do livro A ilha do tesouro (1883), de Robert Louis Stevenson, amigo de James Barrie. Esta é uma das várias referências que Barrie faz ao livro – e, nesse caso, com um paralelismo: na obra de Stevenson, Long John Silver é descrito como “o único homem que Flint temeu”.

26. No original “bite their thumbs at each other”: literalmente morder os polegares, gesto então considerado altamente ofensivo e citado por Shakespeare em Romeu e Julieta, Ato I, Cena I.

27. No original “Execution Dock”, local no leste de Londres onde, por mais de quatrocentos anos, foram executados piratas, contrabandistas e amotinados. Os últimos enforcados neste local foram os marinheiros George Davis e William Watts, em dezembro de 1830, condenados por terem assassinado um capitão de navio.

28. Além de A ilha do tesouro, James Barrie leu muitos outros livros de piratas – como História geral dos piratas (1724), do capitão Charles Johnson – em busca de detalhes e nomes para os personagens de Peter Pan. Contudo, Cecco não parece ter sido inspirado em nenhum deles, e é possível que seja uma homenagem a Cecco Hewlett, filho do escritor inglês Maurice Hewlett.

29. Na primeira versão do livro, “Gao”. Nas edições mais recentes, o termo por vezes é substituído por “Goa”, que é o menor dos estados indianos e foi colônia portuguesa até 1961. Tal alteração justifica-se pela referência, em A ilha do tesouro, à “abordagem do barco Vice-rei das Índias ao largo de Goa” e pela subsequente menção a moedas de ouro portuguesas.

30. O episódio das chicotadas ocorre em A ilha do tesouro, de Robert Louis Stevenson.

31. O Capitão Henry Morgan (1635-88), corsário inglês que saqueou boa parte do Caribe.

32. Por ser irlandês, Barrica era o único católico do grupo.

33. Em francês no original: contador de histórias.

34. Carlos II (1630-85), rei na Inglaterra após a morte de Oliver Cromwell (1599-1658) e da restauração da monarquia. Reinou de 1660 até sua morte, e seu modo de se vestir, assim como o de Luís XIV (1638-1715) da França, seu contemporâneo, tornou-se famoso pela extravagância.

35. Família nobre de origem bretã. Deteve o trono da Escócia, e depois a coroa da Inglaterra, até 1714 quando a rainha Ana Stuart (1665-1714) morreu sem deixar descendentes.

36. Termo que já foi utilizado para descrever os aborígenes australianos e, no sul dos Estados Unidos, os filhos de escravos africanos. Acredita-se que a origem do termo seja a palavra da língua portuguesa “pequenino”.

37. Filha de Júpiter e Latona, e irmã gêmea de Febo, Diana é a deusa da lua e da caça na mitologia romana. Caçadora infatigável e indiferente ao amor, é geralmente representada com um arco e acompanhada por um cão ou um cervo.

38. Para alguns é considerado um espírito do oceano que naufraga navios e que pode assumir diversas formas, já em algumas regiões equatoriais é um dos muitos nomes do diabo. Na literatura foi citado por Daniel Defoe (1660-1731) em Four Years Voyages of Captain George Roberts (1726), Tobias Smollett (1721-71) em The Adventures of Peregrine Pickle (1751), Washington Irving (1783-1859) em Adventures of the Black Fisherman (1824), Herman Melville (1819-91) em Moby Dick (1851) e Charles Dickens (1812-70) em Bleak House (1852). Recentemente figurou como um dos vilões da série de filmes Piratas do Caribe.

39. Em Peter Pan em Kensington Gardens, há um capítulo com o mesmo título. Nele, fadas constroem uma pequena casa em volta de Maimie Mannering – a personagem que, naquele livro, conhece Peter Pan – quando ela passa uma noite inteira dentro do parque para acompanhar uma festa das fadas.

40. Rainha das fadas e governadora dos sonhos no folclore inglês. Na quarta cena do primeiro ato de Romeu e Julieta (1597), William Shakespeare descreve Mab por meio do personagem Mercúcio: “Assim posta,/ noite após noite ela galopa pelo/ cérebro dos amantes que, então, sonham/ com coisas amorosas … .” (Tradução de Carlos Alberto Nunes.)

41. Escolhido por Barrie para batizar o navio de Gancho, Caveira e Ossos, ou Jolly Roger, no original, é o termo genérico pelo qual são chamadas as bandeiras usadas para identificação de um navio pirata.

42. Quando James Barrie contou a George Llewelyn Davies (1893-1915) que Peter Pan guiava as crianças que morriam até a Terra do Nunca, o menino proferiu a frase que fecha este capítulo.

43. Nesta passagem o narrador sofre a mesma falta de memória que as crianças que visitam a Terra do Nunca. Ao longo do livro, Barrie faz o narrador identificar-se com diferentes personagens e muda sua visão e opinião, constantemente.

44. É possível que o autor estivesse brincando com a alcunha “A grande mãe branca” dedicada à rainha Vitória (1819-1901). “Grande pai branco” é também o nome dado pelos norte-americanos nativos ao presidente dos Estados Unidos.

45. Cabia às mulheres vitorianas cumprir alguns “estágios” de luto. O luto completo (no qual os trajes deveriam ser completamente negros) durava um ano e um dia; o segundo luto (no qual joias e elementos decorativos eram permitidos), nove meses; e a terceira fase ou meio-luto (no qual roupas de tonalidade cinza e violeta eram permitidas) estendia-se por três a seis meses.

46. Em francês no original: camisola.

47. A visão do autor era muito distinta da propagada pelos estudiosos de sua época. Os escritos europeus e americanos afirmavam que as táticas de guerra dos “selvagens” limitavam-se a assaltos e emboscadas.

48. É, no teatro, a parede imaginária que isola a plateia, separando-a do que está sendo encenado. O termo, contudo, pode ser aplicado a qualquer tipo de ficção. Na versão teatral de Peter Pan, James Barrie rompe essa parede ao pedir para o público bater palmas para salvar Sininho.

49. Mais conhecido como Capitão Kidd, William Kidd (1645-1701) foi um marinheiro escocês, condenado à morte por pirataria. Inicialmente contratado por nobres ingleses e americanos para combater piratas franceses, sua fama como pirata cresceu por conta de sua crueldade com os inimigos e também a bordo. Na literatura, foi imortalizado por Edgar Allan Poe em “O escaravelho de ouro” (1843), pelo escritor norte-americano Washington Irving (1783-1859) em “The Devil and Tom Walker” (1824) e por Robert Louis Stevenson em A ilha do tesouro; já na cultura pop, é citado na canção “Bob Dylan’s 115th Dream”, do cantor americano Bob Dylan.

50. Em seu ensaio “Hook and Ahab: Barrie’s Strange Satire on Melville” (1965), o acadêmico David Park Williams propõe que Peter Pan seja uma espécie de paródia ou sátira ao clássico de Herman Melville, Moby Dick. Assim, a perseguição à baleia empreendida por Ahab é replicada, ao revés, na perseguição do crocodilo ao Capitão Gancho. Além disso, os dois capitães carregariam os mesmos adjetivos em seus respectivos livros: “sinistro”, “sombrio” e “inescrutável”.

51. Segundo Pauline Chase (1885-1962), a atriz que interpretou Peter Pan entre 1906 e 1913, em Nova York, depois que a peça acabava algumas crianças esperavam para falar com o Capitão Gancho. O intuito era dizer que o amavam, mas acabavam mudas diante da assustadora figura e seu gancho.

52. A parte dianteira do convés até o primeiro mastro.

53. O gato de nove rabos (cat o’ nine tails), ou simplesmente gato, é um chicote com múltiplas tiras que foi usado como um instrumento de punição pela Marinha e Exército britânicos até 1881.

54. Na Bíblia, Jonas tenta fugir da incumbência que Deus lhe deu em um navio com destino a Társis. Enfurecido, Deus manda uma grande tempestade e o navio quase naufraga. É somente quando Jonas é lançado ao mar que a fúria divina se aplaca.

55. Curiosamente, apesar da superstição de que mulheres a bordo trazem má sorte aos navios, acreditava-se que ostentar imagens femininas na proa traria proteção à embarcação.

56. Jogo praticado em Eton, a tradicional escola inglesa onde alguns dos irmãos Llewelyn Davies estudaram. O jogo, uma espécie de variação do rúgbi, se dá em uma estreita faixa de campo junto a uma parede.

57. Novamente uma possível referência de Barrie ao livro A ilha do tesouro, onde, como vimos, Long John Silver é descrito como “o único homem que Flint temeu”.

58. Ainda que se recuse a crescer, nesta passagem Peter Pan emula o comportamento de um personagem adulto, do mesmo modo que todas as crianças fazem durante seu crescimento. No filme de Steven Spielberg, Hook – A volta do Capitão Gancho (1991), Peter Pan cresce, e é seu filho Jack quem enxerga em Capitão Gancho uma figura paterna.

59. O título que Magrelo recebe é uma ironia de Barrie aos protocolos da aristocracia britânica, já que uma mulher torna-se lady ao casar-se com um lorde, mas um homem não se tornará lorde ao casar-se com uma lady.

60. A frase é exatamente a mesma que Wendy pronuncia no início do capítulo 3.

61. A última menina citada no livro foi batizada em homenagem à mãe de James Barrie, Margaret Ogilvy.