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Para o Martin
Sou absolutamente a favor da assistência aos velhinhos no âmbito familiar. Como quase todos os filhos de pais divorciados, também eu desejo que os meus pais se juntem novamente. Quando precisarem que cuidem deles, só tenho de meter os seus respectivos parceiros num lar para a terceira idade e depois trato dos meus pais divorciados em casa, enfio-os na cama de casal até morrerem. Não consigo imaginar maior alegria. Há-de chegar o momento em que tudo vai depender de mim. Só preciso de paciência.
Desde que me conheço que tenho hemorróidas.
Higiene não é coisa a que eu dê importância.
Acordo na sala de recobro. Uma pessoa comporta-se sempre de uma maneira meio idiota depois de uma anestesia geral. Creio que a sala de recobro foi mesmo inventada para poupar os familiares a esse tipo de espectáculo.
Se apresentarmos uma desculpa por escrito depois de faltarmos podemos repetir mais tarde o teste. Vai daí, começo então a contar à mamã que estou a sentir umas pontadas em baixo, na barriga, do lado esquerdo. Umas pontadas cada vez mais fortes. Ela fica logo preocupada, porque sabe que isso é sinal de uma inflamação no apêndice. Apesar de o apêndice ficar à direita. Isso também eu sei. E começo a dobrar-me com dores. Ela leva-me logo ao médico de família, que me acompanhou durante toda a infância. Continuo a ir lá, é mais perto. Ele deita-me na marquesa e põe-se a apalpar a parte inferior da minha barriga. Pressiona do lado esquerdo, eu grito e gemo. Pressiona do lado direito, eu nem pio.
Eu cultivo abacateiros. Para além de foder, é esse o meu grande passatempo. Quando era miúda, a minha fruta, ou os meus legumes, ou lá o que é aquilo, preferidos eram os abacates. Comia-os cortados ao meio, com um bom pedaço de maionese no buraco. Por cima há que pôr muito pimentão picante em pó. Depois de comer ficava a brincar com o grande caroço. A minha mãe costumava dizer que as crianças não precisam de brinquedos, um tomate com bolor ou um caroço de abacate também servem.
Estou agora sozinha com a máquina onde se escondem as imagens da minha ferida. Não faço a mínima ideia do que me espera. O meu pulso dispara, a excitação provoca-me um ataque de suor.
Entra uma enfermeira. Pena não ser o Robin. Que se lixe, também lhe posso perguntar a ela.
Com que então, depois da operação e da explicação do Dr. Notz, toca a cagar e rir que a vida é bela, se não dermos cabo dela. Houve uma frase que eu ouvi com atenção, no meio do seu longo discurso: só recebo alta do hospital quando tiver umas bem sucedidas fezes sem vestígios de sangue. Na sua opinião, é esse o indicador de que a operação teve sucesso e tudo está sarado.
Abro os olhos e vejo uma mulher. Com aquela farda de enfermeira de hospital, mas de uma cor completamente diferente das que vi até agora. As das outras são azul-claras, a dela é verde-clara. Deve tê-la lavado na máquina com a roupa errada.
Dormi todo o resto da noite sem acordar. Só com dois comprimidos. Óptimo. Tento convencer-me de que é pouco. Para falar verdade, pensei que a noite ia ser pior. Em cima do armário de apoio está um comprimido numa tacinha de plástico do tamanho de um copo de aguardente. Mais um. Muito generoso, este Peter. Calculo que seja para as dores. Pronto, se é assim... Hoje tento levantar-me. Também tenho de ir ao quarto de banho. E com urgência. Não cheira bem aqui. Desta vez não é gás. O culpado só pode ser o meu cu, quem é que havia de ser?
A sua visita ainda foi mais breve do que a do papá. Do que é que estavas à espera, Helen?
Como se não bastasse o sangue que já perdi lá em baixo. Tenho tido mais do que fazer com a ferida do cu e agora aparece-me o sangue da menstruação. Tirando a leve irritação que o antecede, dou-me, no fundo, muito bem com o meu período menstrual. Quando estou a sangrar até costumo ficar cheia de tesão.
Eu já tive um amante muito velho. Gosto da palavra «amante», soa tão antiquada, é muito melhor do que dizer por exemplo «garanhão». Ele era muitos, mas mesmo muitos anos mais velho do que eu. Aprendi imenso com ele. Queria que eu soubesse tudo sobre a sexualidade masculina, para que de futuro nenhum homem pudesse gozar comigo. Agora sei pretensamente muito sobre a sexualidade masculina, mas não sei se o que aprendi é válido para todos os homens, ou se eram só as manias dele. Ainda tenho de tirar isso a limpo. Uma das suas teses principais postulava que se deve sempre enfiar o dedo no rabo de um homem quando se está fazer sexo com ele. Ajuda-os a virem-se. Até agora, só posso confirmar isso. Ficam doidos. Mas o melhor é não puxar à baila o assunto, nem antes nem depois. Devem achar que isso é coisa de paneleiros e ficam inibidos. Há que fazer isso simplesmente e depois comportarmo-nos como se nada tivesse acontecido.
Basta de meio ambiente. Está na altura de voltar a falar de mim. Há já algum tempo que apalpei uma coisa aqui no meu braço direito. Vamos lá ver o que isto é. Empurro o ombro para a frente, agarro nas banhas do braço e viro-as com força para a frente. Cá está ele. Como calculava, um ponto negro. Também não sei porque é que os braços estão sempre cheios deles. A minha má explicação própria é a seguinte: há ali uns pelinhos que às vezes querem crescer e porque naquela zona há sempre uma constante fricção com as t-shirts, os pelitos vão ficando debaixo da pele e inflamam-se.
Penso no Robin. Dispo-o. Deito-o completamente nu na minha cama de hospital e começo a lambê-lo, a partir do cóccix, muito lentamente, através de todas as reentrâncias das vértebras, até à nuca. Ele tem muitos sinais. Talvez devesse ir a um dermatologista. Seria uma peninha, se tivesse de morrer com cancro da pele. Mas ele é auxiliar de enfermagem, trabalha num hospital. Não vai morrer de uma doença não atempadamente reconhecida. Que morra atropelado por um carro, ou que se mate por causa de um amor infeliz. Porque se apaixonou por mim, por exemplo. Lambo-lhe novamente todas as protuberâncias costas abaixo. Até ao rego do rabo. Afasto-lhe as nádegas e lambo-lhe o olho do cu. Primeiro em círculos, sempre à volta. Consigo espetar e endurecer a língua, enterrar a ponta no seu esfíncter contraído. A minha mão esquerda desloca-se por baixo do seu cu até à pila. Que está tão dura como uma pedra alongada e coberta de pele quente. Enterro um pouco mais a ponta da língua no seu cu e seguro na mão fechada a sua glande. Quero que ele me ejacule com toda a força nos dedos fechados, para que o esperma escorra para o outro lado. E é isso mesmo que ele faz. Nem pode fazer outra coisa, porque eu continuo a agarrar-lhe a glande. Aperto-a com toda a força. Volto a abrir os olhos. Que grande debochado me saiu este Robin! Desato a rir. Fico toda satisfeita com a minha fantasia libidinosa. Nem sequer preciso de televisão para me entreter.
Não quero que ela me veja. Serpenteando em linhas suaves, a esfregona move-se pela superfície do chão. Um bicho que se aproxima de mim. Retenho a respiração. Pensamos sempre que é a respiração que nos vai atraiçoar. Mas, no fundo, é uma estupidez. Normalmente respiro de uma forma muito silenciosa. Ela começa junto à porta e vai avançando, ao longo da frente do armário, em direcção à cama. Em linhas serpenteantes. De um lado para o outro. Vejo migalhas que ela apanha e arrasta. Descubro cabelos, compridos e escuros, provavelmente meus, de quem é que haviam de ser? Pouco antes de se enredarem nas tranças molhadas da esfregona. A larga esfregona também empurra à sua frente ninhos de pêlos, aquelas lindos tufos em que se acumulam e emaranham cabelos com partículas de pó, raminhos e borbotos de lã das peúgas. Ela vai avançando lentamente, sempre a limpar, até ao armário metálico. De certeza que vai também passar a esfregona por baixo da cama, só de pensar na dor já estou a encolher as pernas. De facto. A previsão foi perfeita. Agora vejo o cabo encostado à cama. Parou de limpar. Oiço um barulho metálico. Está a abrir a tampa do caixote de lixo cromado que está em cima da mesa-de-cabeceira.
A quantidade de cabelos brancos que ele já tem. Qualquer dia morre. Isso quer então dizer que vou ter de me despedir dele brevemente. O melhor é ir-me já habituando à ideia; assim, quando acontecer não vai doer tanto. Vou apontar aqui no meu cérebro esquecido e esburacado: vai-te preparando, com toda a calma, para um dia destes teres de dizer adeus ao papá. Quando a altura chegar vão ficar todos muito admirados com a minha capacidade para ultrapassar o golpe. Chama-se a isto vencer a competição do luto graças a uma antecipação desse mesmo luto.
Empurram-me lá para dentro. Levantam-me e levam-me para uma outra cama. Cada uma das enfermeiras agarra numa das minhas pernas e penduram-na nas cintas compridas que descem do tecto. As pernas são presas pelos tornozelos e depois içadas para cima. Uma espécie de roldana. As minhas pernas estão esticadas para cima. Como na posição do ginecologista, mas mais radical ainda. Para que todos possam escarafunchar no meu cu. Estou a ver uns grandes pestanões por cima da máscara. São do Prof. Dr. Notz. O Robin levou sumiço. Não deve ter nervos para isto. O anestesista senta-se ao lado da minha cabeça e explica-me que vão ter de começar agora, porque eu estou a perder muito sangue. Também me diz que se tenho a sensação de ainda estar a sentir tudo é só porque ainda há um último restinho de sensibilidade. Na verdade, assegura, já só sinto agora uma ínfima parte daquilo que está a acontecer. Eles estenderam um pano verde entre a minha cabeça e o meu cu. Deve ser para o meu cu não ter de ver a expressão aterrorizada do meu rosto.
Agora já sei o que vou fazer. Quero fazer cocó. Não me posso levantar. Mas obrigo-me a fazê-lo. Quero tratar de mim própria. Senão agora, quando? Sempre é preferível fazer agora cocó pela primeira vez depois da operação de urgência, de uma forma controlada e com os médicos por perto, do que no sítio para onde vou, depois de sair daqui. Estou completamente confusa. Sinto tudo a andar à roda.
Cruzo os braços sobre o peito. Lembrei-me novamente de que estou quase a ir-me embora. O meu corpo e eu fazemos um ruído interno, uma espécie de mpfft, e lá por baixo sai uma torrente de uma qualquer substância. Quente. Pode ser tudo. De qualquer abertura. De momento, é-me impossível distinguir com rigor o que se passa lá em baixo.
Batem à porta e alguém entra intempestivamente. Por um instante, ainda pensei que era o meu irmão que tinha voltado para trás para falar comigo sobre o seu quase assassinato cometido pela nossa mãe.
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